Izzy Nobre's Blog, page 33
October 2, 2014
10 jogos que marcaram a minha infância (parte 1)
Lá no 99 Vidas, cunhei a expressão “infância multiplayer”. Uso-a pra me referir a pequenos artefatos da nossa infância que todos compartilhamos, independente de condições sociais/culturais, religião e área em que moramos. Acredito que o apelo do 99 Vidas (que é até onde sei o maior podcast brasileiro tratando de games antigos e apresentado por dois cearenses e que traz 99 no nome) é justamente o fato de que games foram muito presentes na nossa infância multiplayer.
Tá rolando uma corrente em que usuários de mídias sociais falam um pouco sobre os 10 jogos que mais marcaram suas vidas. Durante a confecção deste post eu comecei a achar aliás que 10 é pouco pra alguém que foi basicamente CRIADO pelos games, como é o meu caso. Mas vamos lá então. Os jogos não estão em nenhuma ordem de importância, vou citá-los à medida que me lembro deles.
Super Mario World
Embora a lista não esteja em ordem de importância, ESSE tem que ser citado primeiro. Super Mario World moldou meu caráter, basicamente. Uma das coisas mais legais do jogo, pra mim, era o sistema de mapa que posicionava as fases em locais distintos, como se fossem cidades. Isso dava uma noção geográfica distinta; ajudava a visualizar a longa jornada do encanador italiano — e permitia democraticamente o seu direito de ir e vir de uma fase já conquistada pra outra anterior.
Conceitualmente, Super Mario World é quase perfeito. Um mascote carismático, uma evolução gráfica incrível do console predecessor, gameplay que se tornaria a métrica para o gênero, e uma trilha sonora literalmente inesquecível. Poucos jogos se comparam a SMW — mais precisamente, Super Mario World 2: Yoshi Island e a série Donkey Kong Country.
Command and Conquer
Até 1995, eu havia sido treinado a compreender games como “uma caminhada, da esquerda pra direita, de um protagonista que pega uns power ups e pula em cima/atira em inimigos, até chegar num ponto específico do mapa que então termina a fase”.
Uma das minhas Revistas do CR-ROM trazia um demo de Command and Conquer. Vendo os screenshots na matéria da revista (como era legal aquele formato, né? Ler sobre o jogo, depois instalar no PC pra ver qual era…) eu não consegui sequer ENTENDER o jogo. Quem sou eu aí? Tou vendo tanques, e bonequinhos, e aviões… mas qual eu controlo…?
Não tive interesse de instalar o jogo pra descobrir — além do fato de que ele requeria 50 mb, o que na época era um espaço absurdo no disco rígido.
Aí, algum tempo depois, fui na casa dos meu primo Eduardo. Lá vi-o jogando Command and Conquer em todo o seu esplendor e imediatamente eu me apaixonei por aquele gameplay. Cheguei em casa, procurei o CD com a demo do jogo, e instalei prontamente contrariando a regra do meu pai de não instalar jogos grandes.
Settlers 2
Foi difícil decidir entre Settlers 1 (também conhecido como Serf City); Settlers 2 acabou ganhando por dois motivos — primeiro, foi indubitavelmente o que eu mais joguei entre os dois. Segundo, porque é o que eu mais jogo atualmente (faz muito tempo que nem vejo o Settlers 1, aliás).
Settlers 2 é uma série icônica porém meio underground de RTS com um gameplay bem diferenciado: além de não controlar as unidades diretamente, você precisa estabelecer uma cadeia de produção eficiente e co-dependente.
É assim: quando tu começa tua cidade, cê precisa de materiais de construção — pedras e tábuas de madeira. Pra obter pedras, basta mineirar as pedreiras na região. Madeira é um pouco mais complexo; você precisa cortar árvores, e então levar as toras para madeireiras, onde elas serão então transformadas em tábuas.
Todos os produtos no jogo requerem níveis variados de processamento, e com isso você tem como resultado uma cidade bastante viva, com habitantes trabalhando e indo daqui pracolá com produtos embaixo do braço em variados estágios de produção. O fazendeiro colhe o trigo, um trabalhador leva o trigo pro moinho, onde você o vê sendo transformado em farinha. Outro cara leva a farinha pra padaria; um outro traz um balde de água.
O padeiro junta os dois e transforma em pão, que é então usado pra alimentar os mineiros que extraem carvão das montanhas. O carvão é então usado pra derreter minério de ferro e com isso, construir vigas que são usados pelo ferreiro e assim vai.
Parece loucamente complexo, mas nem é.
Full Throttle
Assim como Command and Conquer abriu meus olhos pra todo um novo estilo de gameplay, Full Throttle me apresentou a um formato completamente inédito pra mim até então — o point and click adventure. Ou, como eu compreendia na época, o filme interativo.
Inicialmente eu não consegui sequer jogar Full Throttle. A versão que eu tinha veio com o meu kit multimídia importado, e portanto era totalmente em inglês. Não entendi a introdução, não entendi quem era quem ou o que queriam, não entendi porra nenhuma.
Um dia, sei lá como, pintou lá em casa um CD piratex com “Full Throttle” escrito à canetinha por cima (certamente oriundo de algum dos amigos técnicos de informática do meu pai). Sendo isso anos depois do primeiro contato com o jogo, pus no PC pra revisitar aquele game enigmático e, pra minha surpresa, tratava-se da versão brasileira, traduzida pela Brasoft.
Devo ter zerado Full Throttle 3 ou 4 vezes na vida, o que é relativamente impressionante considerando que há zero replay value no jogo.
Super Return of the Jedi
Os games da série Star Wars pro SNES se destacam por serem excelente jogos de plataformas baseados numa licença de filme, algo relativamente raro na indústria. Nem todo filme serve como adaptação pra jogo, e por causa disso você acaba visitando cenários e enfrentando bichos que nada tem a ver com a trama original. Talvez pela densidade do universo do George Lucas, isso acabou não sendo um problema quando converteram a saga pros jogos eletrônicos.
Este foi outro jogo que eu zerei incansavelmente. Sendo muito fã da trilogia original, era uma delícia passear pelos ambientes do filme. Descobri eventualmente um cheat code que permitia usar qualquer personagem em qualquer fase; embora não fizesse muito sentido ver um ewok chutando bundas na Estrela da Morte, eu achava divertidíssimo.
Essa é a primeira parte dos 10 jogos que marcaram minha infância. Aguarde que em breve sai a segunda parte.

September 30, 2014
5 brinquedos icônicos dos anos 90 (e como explica-los pra garotada atual)
Não sei se é por causa da chegada da adultice (mano, em menos de 2 meses eu completo 30 anos…) ou por saber que os textos com os quais vocês mais se identificam são os em que eu choramingo por causa da infância que ficou pra trás, mas eu ando muito nostalgico ultimamente.
Volta e meia me surpreendo discutindo com meu irmao ou com amigos MSNísticos sobre os “bons tempos” que deixamos pra trás. Tempos em que nao precisavamos pagar contas, ou impostos, ou parcela do carro, ou aluguel, nem tínhamos que ocupar nossa mente com a aflição de decidir uma carreira ou se preocupar patologicamente em se tornar bastante bem sucedido pra que bata aquela característico arrependimento sua ex-namorada cada vez que ela se atrever a visitar seu perfil no Facebook.
Como sinto saudade daqueles tempo quando nossas únicas preocupações eram achar uma revista com cheat codes pra Duke Nukem 3D e chegar em casa a tempo de assistir o finzinho de Carrossel (pra quem estudava de tarde, como eu)!
Minha mãe não mentiu pra mim – a infância realmente acaba quando menos se espera. Quando eu era mais novo, a matriarca Nobre vivia me alertando a respeito de aproveitar bastante a infância. Assim como pilhas AAA, meias sociais e o telefone daquela garota da faculdade que te dá o maior mole, a sua infância desaparece quando você mais precisa dela.
Eu não prestei muita atenção no que minha mãe dizia porque eu estava ocupado aproveitando a minha infância, mas a mensagem tem seu valor de qualquer forma.
Você aí, leitor de dezesseis anos de idade, sem dinheiro, possivelmente virgem, e absolutamente desesperado com a certeza de que não passará no vestibular numa faculdade federal e que apanhará em casa quando chegar no dia seguinte tentando convencer os pais que cursar uma faculdade particular é uma idéia melhor — estou falando contigo. Olhe em sua volta.
Essa casa confortável em que você mora? O dia chegará em que esse conforto te custará esforço e dinheiro, e o estado de conservação e organização dela ficará por sua conta. Sua comidinha sempre posta na mesa no momento que o relógio da sala bate o meio dia? Bem, espero que você goste de nissin miojo, porque é isso que você comerá por alguns meses quando sair de casa pra tocar a vida por conta própria. Essa internet que você se acostumou a usar com uma frequência diária que a “minha geração” (discadona 56kbps na veia) só podia sonhar a respeito? Ela não é grátis.
Aproveite enquanto dá, porque esse free ride vai acabar um dia. Confie em mim.
Ai meu deus do céu, eu tenho muita saudade de ser criança, puta que pariu. Mas isso não significa que as lembranças dos tempos dourados estão eternamente relegadas ao pretérito perfeito. Pelo contrário: é justamente essa choradeira papo-de-velho que faz as experiências infantis parecerem muito mais gloriosas do que realmente eram. E por causa disso irei neste texto relembrar relíquias do passado que alguns de nós compartilhamos, e alguns de vocês jamais terão o excelentíssimo prazer de não apenas ganhar de Natal, mas de trazê-lo pra escola (sob risco de confiscamento por professores fascistas) pra provocar admiração e inveja nos amiguinhos escolares.
Acompanhem-me por mais essa viagem pela minha incrivelmente desinteressante infância!

A Promessa
Educar crianças na emergente “rodovia digital” que aparecia no horizonte e acostuma-las a lidar com esses tais de computadores.
A Realidade
Era essencialmente uma calculadora com botões coloridos, num formato que vagamente lembra um computador. “Mais que um brinquedo, quase um computador!” Quem não lembra desse safadíssimo slogan? Eu certamente lembro, porque foi ele que me levou a atormentar meus pais diariamente por três ou quatro meses até que eles decidissem que a única forma de me silenciar seria comprar essa merda pra mim no próximo Natal.
O que era o Pense Bem? O Pense Bem era um brinquedo eletrônico fabricado pela Tec Toy no começo dos anos 90. Apesar da propaganda evidentemente enganosa, o Pense Bem era exatamente o que alegava não ser (um brinquedo), e estava muitíssimo longe de ser aquilo com o qual eles o comparavam (um computador). O Pense Bem era um computador na mesma proporção que um relógio de pulso é um computador.
Talvez “Pense Bem, O COMPUTADOR DE BRINQUEDO” fosse uma chamada mais comercialmente honesta, mas perdia totalmente o apelo semi-tecnológico tão característico dos anos 90. Em outras palavras, a única coisa que o Pense Bem tinha em semelhança com um computador é que ambos são escritos com auxílio da letra M.
Além de primitivas funções musicais que me permitiam reproduzir 20% da música tema de Jurassic Park para o fictício deleite de meus pais, o “computador” tinha algumas atividades matemáticas (o aparelho jogava uma adição/soma/divisão/subtração com um dos fatores como incógnita, e você tinha que descobrir a resposta. O outro joguinho era essencialmente um “descubra a média aritmética entre estes dois números!”), um joguinho de memória no estilo Simon Says, e alguns outros badulaques que se perderam na minha memória. Um das brincadeiras mais interessantes do troço eram os livros de atividades. Livrarias e lojas de brinquedos na época vendiam livros com perguntas sobre os mais variados assuntos; ao digitar um código de 4 dígitos que aparecia na contra-capa do livro, você podia então usar o Pense Bem pra responder as múltiplas escolhas de cada pergunta.
Eu tinha vários livros com personagens da Disney, livros sobre Astronomia, Biologia, e um bizarríssimo “Livro Pense Bem Plebiscito”, talvez produzido na esperança de educar a molecada sobre aquele plebiscito de 1993. Ganha três reais quem adivinhar qual era o meu livro menos favorito, que eu eventualmente acabei trocando na escola por algum boneco qualquer dos Comandos em Ação.
Apesar de obviamente não atingir as expectativas criadas pelas propagandas enganosas, a posse do meu Pense Bem me proporcionou popularidade jamais antes vista na escola — até o momento que meus amiguinhos perceberam que a parada era simplesmente uma calculadora com botões coloridos e LCD vermelho, e deixaram de dar atenção ao meu brinquedo. Isso é o que devem chamar de “quinze minutos de fama”, apesar de que no meu caso ficaram faltando os outros catorze.
Que fim levou?
Eu me lembro como se fosse ontem — eu havia passado o dia inteiro provocando meu irmão de maneiras juvenis e bastante engraçadas pra todo mundo exceto pra ele. O moleque se emputeceu de vez, catou o primeiro objeto que viu pela frente (um sapato) e arremessou-o e minhas direção com motivação homicida. Meus refletos apurados me permitiram desviar do projétil de uma forma que seria plagiada anos mais tarde no longa-metragem Matrix.
Escapei do atentado, mas o objeto inanimado que estava bem atrás de mim não teve tanta sorte. O sapato acertou meu Pense Bem em cheio, destruindo a tela do aparelho. Liguei o bicho pra testa-lo e percebi que a tela ainda estava de boa, era só o plástico que a cobria que rachou no meio. Menos mal.
Chilitos

A Promessa
“É a mesma coisa que XÍTOS, meu filho. Só que é mais barato!” dizia minha querida vovó. E eu sei que não é brinquero, mas eu deixei tanto resíduo de Chilitos nos meus brinquedos que ele se torna um brinquedo honorário.
A Realidade
Ela estava certa. Chilitos tinha o mesmo sabor que Cheetos. Isso é, num mundo alternativo em que Cheetos era fabricado inteiramente com isopor e cola escolar.
“Que demônios é Chilitos?”, você está perguntando a si mesmo retoricamente. Bem, meu amigo, eu compreendo sua ignorância. Duvido muito que alguém que tenha vivido fora do glorioso estado do Ceará durante toda sua vida tenha a menor chance de entrar em contato com CHILITOS.
E você não sabe o que estava perdendo. Chilitos era um salgadinho comumente vendido nas mercearias nos arredores do Jardim América/Montese, que é a área onde minha avó mora. Pra você ter uma idéia da natureza underground da parada, Chilitos era vendido em sacos plásticos transparentes selados com nada mais nada menos que ligas elásticas do tipo que alguém usa pra projetar um pedaço de papel contra a orelha de um amiguinho.
Não havia nenhum tipo de informação na embalagem — não tinha nome, nem logotipo da empresa fabricante, peso, valor nutricional (AHAHAHAH até parece), absolutamente nada. Aliás, a própria alcunha do produto era essencialmente folclore regional, passado de boca a boca, já que não havia na embalagem nada que sequer sugerisse que a pessoa que o produziu se preocupou em dar um nome à criação. Tudo sugeria que o tal do salgadinho era fabricado caseiramente em algum muquifo do bairro, utilizando todos os métodos clandestinos possíveis.
E se o sabor da parada oferece alguma pista, é que os Chilitos eram fabricados por complexos processos alquimísticos que transformavam isopor, papelão e corante amarelo em um item alimentício que poucas pessoas nesse planeta tiveram a honra de experimentar. Ainda não está convencido da undergroundzice da parada? Mencionei que o salgadinho custava DEZ CENTAVOS? Bom, agora mencionei.
Ir à casa da minha vó e não comer Chilitos como lanche vespertino era como ir a Paris e não tirar uma foto na frente da Torre Eiffel usando uma camisa da seleção e em seguida uploadear no Facebook com uma legenda que lê “EU EM PARIS, SOH PRA KEM PODE”.
Usei imagem de um salgadinho Fofura porque é o que temos hoje como referência de Cheetos genérico, foi impossível achar um registro do Xilito em formato jpg. Só que o Fofura já é uma parada de produção super formal e industrializada. O único valor de produção do Chilitos é que eles vinham com dinheirinho de brinquedo dentro do saco, que a molecada colecionava. E não tinha dentro de um pacotinho selado nem nada, era um dinheirinho estilo Banco Imobiliário enfiado dentro da parada da forma mais precária imaginável.
Que fim levou?
Assim como todos as outras porcarias alimentícias que eu ingeria impunemente quando moleque, os Chilitos que eu consumia avidamente enquanto assistia Chaves sentado na sala da casa da vovó se manifestaram na forma de um dos mais poderosos casos de caganeira em toda a história humana registrada. Se bem que, por dez centavos, até que valia a pena. Sem contar no valor agregado da possibilidade de não dar descarga e surpreender o próximo visitante do banheiro com fezes amarelas.

A promessa
Realize seu grande sonho — seja um engenheiro ferroviário, caso você seja uma criança estranha. Baterias não incluídas.
A realidade
Nesse caso não houve decepção alguma: o Ferrorama era exatamente o que se propunha a ser, supondo que a palavra “propunha” exista na língua portuguesa, porque eu sinceramente não lembro dessa palavra e estou com uma ligeira sensação de que acabei de inventa-la.
O Ferrorama foi apenas um em uma longa série de brinquedos que meu pai queria muito obter, mas disfarçava como presente pra mim e pro meu irmão na esperança de não ouvir reclamações da minha mãe.
Meu pai, que nunca vai deixar de ser uma criança no que diz respeito a brinquedos, nem mesmo esperava um evento de costumeira troca de presentes pra aparecer com algum pacote debaixo do braço. Ou seja, nem meu aniversário era — eu chego em casa e lá estava ele sentado na sala, montando os trilhos do brinquedo e com um sorrisão na cara. “Pra você ó, Israel”, disse ele enquanto mal tirava os olhos da parada, todo animado com o prospecto de sua ferroviária em miniatura.
Quando ele finalmente cansava de brincar com a parada e ia fazer algo mais proveitoso, eu e meu irmão tomavam o lugar dele. Livros viravam suporte pra pontes. Travesseiros viravam túneis. As grossas colunas de madeira que sustentavam a mesa de jantar da sala viraram enigmáticos cânions, perigosamente estreitos, do alto dos quais um solitário tusken raider caça droids pra revender pro mercado negro dos jawas.
Não havia limites pra imaginação — lembro que um dia joguei um ônibus de brinquedo no meio dos trilhos e impiedosamente atropelei-o com a locomotiva, a fim de emular aquela cena de O Fugitivo, que estava em cartaz na época e cuja cena de destruição ferroviária featuring Harrison Ford e um gordo aleatório atiçaram minha imaginação infantil.
(Já mencionei isso inúmeras vezes aqui e no mveu vlog — uma de minhas taras infantis era usar meus brinquedos pra reproduzir cenas de filmes, chegando até a deitar no chão e fechar um dos olhos, pra simular o ângulo da câmera na tomada e tudo)
Vou deixar uma coisa clara aqui. “Brincar com Ferrorama” é uma expressão que não faz muito sentido. Você montava o trilho, ligava o trem, e pronto. Acabava aí a sua interação com o brinquedo. Seu primo Autorama ao menos era controlado diretamente pelos pirralhos com o controlinho na mão, dava pra apostar corrida e tudo.
Já o Ferrorama por outro lado era totalmente automático. Você sentava e assistia o trenzinho atravessar o percurso dele por horas até as pilhas acabarem ou sua mãe descobrir que você não apenas não arrumou o quarto como era condição de brincar com o Ferrorama, mas ainda roubou pilhas de outros eletrodomésticos pra liga-lo.
Apesar disso, a parada era inexplicavelmente viciante e divertida.
Que fim levou?
Quem teve Ferrorama lembra que aquelas pecinhas nas extremidades de cada trilho que permitiam a conexão entre os mesmos quebravam com muita facilidade. Some isso ao fato de que graças às nossas inúmeras mudanças, a caixa do brinquedo foi perdida e tivemos que guardar os trilhos dentro de um imenso saco plástico que era frequentemente derrubado no chão ou pisoteado em momentos de desatenção.
O resultado dessa infeliz mistura é que nossos trilhos não se conectavam mais com muita firmeza, impossibilitando que eu revisitasse outras cenas cinematográficas clássicas de desastres de trens.
Walkie talkies

A promessa
A mágica da telecomunicação a seu alcance! Agora você pode coordenar à distância suas estratégias de apertar campainhas dos vizinhos e sair correndo!
A realidade
Morei por três anos no Paraná, e como cumprimento de alguma lei estadual paranaense meus pais iam anualmente ao Paraguai comprar nossos presentes de Natal.
Em dezembro de 1993 havia uma única caixa embaixo da nossa árvore, e meus pais me avisaram que o presente “era pra nós dois”. Eu e meu irmão nos entreolhamos desconfiadamente. Essa estratégia de “o presente é pros dois” é um dos truques mais velhos do livro de truques de pais mãos-de-vaca.
Dessa vez ao menos o presente podia ser razoavelmente dividido pros dois, já que se tratava de um par de walkie talkies.
Como manda o roteiro de brinquedos chineses vendidos no Paraguai, nossos comunicadores portáteis pessoais eram de baixíssima qualidade. O auto-falante tornava nossas vozes praticamente irreconhecíveis, e a péssima recepção só viabilizava a brincadeira se estivéssemos praticamente um ao lado do outro.
Ou seja, era essencialmente o mesmo que usar duas latas e um pedaço de linha de costura, porém pior.
Mas isso não nos impediu de imitar as melhores cenas de nossos filmes infantis favoritos, em que os protagonistas juvenis utilizam walkie talkies pra desenrolar algum plano elaborado contra adultos ou coisas parecidas. Infelizmente a única coisa que sabíamos fazer na época em matéria de traquinagem em grupo era tocar campainhas e sair correndo. Adicionamos os inteiramente dispensáveis walkie talkies na brincadeira e tudo parecia mais legítimo e profissional.
Pior que eu não sabia nem utilizar a parada direito, a despeito da simplicidade do brinquedo. Como em todo walkie talkie, os nossos tinham botões pra se comunicar em código morse, o que é mais ou menos uma admissão do fabricante de que ninguém poderia usar o brinquedo de forma satisfatória usando a própria voz.
Acontece que eu não tinha a menor idéia do que era código morse e achava que a função servia pra irritar o seu interlocutor, já que ele cortava a fala dele no meio. Só descobri o que era o código anos depois, após ler o Manual do Escoteiro Mirim de um primo.
Mas aí já era tarde demais, porque…
Que fim levaram?
…no ano seguinte, um vizinho me fez o favor de destruir meu walkie talkie. Sem motivo aparente, o garoto girou o botão de volume até a última casa e além. Quando ouvi o característico “plec” que indica plástico quebrando e notei que o botão girava livremente na mão do moleque, sem a familiar resistência provocada por travas mecânicas dentro do aparelho.
Só o libertei de uma firme chave de braço mediante à promessa de que ele explicaria a situação pra mãe dele e me presentearia com um novo walkie talkie, se possível dentro de 24 horas.
O moleque nunca mais falou comigo, e por muita infelicidade se mudou do bairro pouco tempo após esse incidente. Se seu nome é Marcel e você morava na Rua Marília no bairro Jardim Veraliz e estudou no Colégio Adventista em Londrina, VOCÊ ME DEVE UM WALKIE TALKIE PORRA. Dois aliás, porque a destruição de um tornou o outro inútil.
Isso porque eu tou sendo gente boa. Se eu fosse ajustar a inflação e os juros de todos esses anos, essencialmente você me deveria uma Ferrari.
Hoje, na era da telecomunicação instantânea em aparelhos portáteis, acho que walkie talkies perderam totalmente seu appeal.

Armatron
A promessa
Um braço robótico mais ou menos portátil controlado por você. Essencialmente, o Santo Graal dos brinquedos nerd dos anos 80/90.
A realidade
O Armatron é essencialmente o motivo pelo qual eu sempre perdoarei meus pais por suas inúmeras falhas como progenitores. Tenho certeza absoluta que meu pai comprou o brinquedo pra si mesmo, mas já que isso resultou no privilégio de ser um dos poucos moleque sque sequer chegaram a ter contato com a parada, considerarei como se tivesse sido um presente pra mim mesmo assim.
Produzido pela americana (e extinta) Radio Shack, o Armatron era na verdade um jogo. Tá vendo aquela caixinha plástica ali, com as bolas azuis e tal? Então. O objetivo da parada era abrir a caixa, remover os itens de dentro dela, posiciona-los numa outra base plástica, e fechar a caixa. Tudo cronometrado pelo timer mecânico do braço robótico.
Tá vendo aqueles quadradinhos alaranjados na frente dos controles analógicos que moviam o bicho? Então, usando um disquinho plástico você setava um número qualquer de quadradinhos, que funcionavam como um contador. A cada minuto um quadradinho ia embora, e quando o último quadradinho se passasse, o Armatron se desligava.
Assim, você decidia o nível de dificuldade da brincadeira. O que era muito legal pra impressionar os amiguinhos que se matavam pra completar a tarefa no tempo máximo permitido, enquanto você os empurrava pro lado e completava tudo em menos de um minuto. Um precursor do que, anos mais tarde, veio a se tornar minha forma favorita de jogar Pump it Up/Guitar Hero/Rock Band — se exibindo pros amigos com menos coordenação motora.
Pra ser ainda MAIS filho da puta, eu às vezes tirava dos controles o adesivo que explicava como operar o braço robótico, deixando meus amigos ainda MAIS na merda.
Como regra obrigatória que rege brinquedos, gambiarras e badulaques em geral, as pequenas pecinhas adicionais que compunham o aspecto de jogo foram perdidas em pouco tempo. Não que isso fosse um grande problema, porque o simples ato de controlar o Armatron era divertidíssimo.
Se você não teve a oportunidade de receber um Armatron de presente durante sua infância, isso significa que seus pais não te amam e/ou que você foi o resultado de uma gravidez acidental.
Uma das coisas mais curiosas sobre o Armatron é que ele era quase inteiramente mecânico. Havia um único motor na base, e ao usar os controles você ativava e desativava engrenagens que transmitiam os movimentos ao longo do braço. Como resultado disso, ele fazia um barulho do caralho:
Outro comentário digno de nota é que meu pai, que por muitos anos atuou como técnico em eletrônica, ficou um dia de saco cheio de gastar dinheiro comprando pilhas pra essa porra. Ele desmontou o bicho, sacou qual que era a potência requerida, e soldou no brinquedo uma entrada pra um carregador que ele tinha sobrando no quartinho de badulaques que era meio que uma pequena oficina eletrônica.
O Armatron passou a funcionar inteiramente independente de pilhas a partir desse dia; meu pai, sendo muito perfeccionista, deu um acabamento MEGA profissional à entrada do carregador; parecia realmente feature nativo do brinquedo.
Que fim levou?
Acabamos presenteando um primo meu de Fortaleza com o Armatron, creio que porventura da vinda ao Canadá, que limitava muito o que podíamos trazer. Até onde me consta, funciona até hoje.
Essas foram algumas das coisas que marcaram meus anos juvenis. O que te causa mais saudade a respeito da sua infância perdida? Os comentários tão aí pra isso.

September 28, 2014
[ Vídeos da Semana ] YMCA, iPhone 6 e traumas!
Olá turma! Como está o seu domingo? Tá de boa? Óbvio que não, o domingo de ninguém a essa hora está “de boa”. Você está contemplando neste exato momento as consequências de faltar no trabalho/faculdade, de tão sem saco pra essas coisas que você está. Eu te conheço, rapaz!
Então, estes foram os vídeos que publiquei nesta semana!
Vamos à YMCA?
Neste Daily Drive, levo os senhores e senhoras à YMCA daqui do bairro (além de bater um papo sobre manutenção automobilística).
Você tem algum trauma?
Eu tenho. Envolve um cachorro desgraçado e uma mordida que deixou cicatriz física e mental até hoje.
Vamos (tentar) comprar um iPhone 6!
A minha primeira tentativa de pôr minhas mãos cearenses nessa maravilha tecnológica falhou miseravelmente e está tudo aí, registrado em vídeo para o seu deleite internético.
Ah, e tem uma resenha do iPhone 6 Plus chegando!

September 22, 2014
Como eu comecei a nadar com um iPod
Esta é uma lontra.

Catei justo uma imagem dela comendo, e não é sem querer!
Então, sabe o meu estimadíssimo amigo Evandro de Freitas? Juntos nós formamos o poderoso Megazord 50% do 99 Vidas – alguns diriam até que os melhores 50% –, o mais honesto podcast de games da internet brasileira.
Eu e ele pegamos o hábito de chamar pessoas gordas/sedentárias de LONTRAS. E faz sentido — você sabe o que uma lontra faz? Lontras só ficam comendo o tempo todo. São bolas de gordura com patinhas. O Evandro já abandonou a lontrice há algum, e eu decidi recentemente, de novo, que devo acompanha-lo na jornada rumo ao IMC saudável.
Só que tem um problema. Eu odeio me exercitar. Acho academia impossivelmente entediante; aquela natureza “desligue seu cérebro e execute este serviço braçal repetitivo por uma hora” realmente não é pra mim. Fiz a matrícula na academia do hospital desde que comecei a trabalhar lá, e se fui 20 vezes é muito. Considerando que estou lá TODO DIA, e trabalho lá desde fevereiro de 2013, é uma frequência comparável a da maioria dos deputados na câmara.
Tenho duas bicicletas aqui em casa, mas descobri rapidinho que andar de bicicleta me deixa com agonia tipo “ah, já tou longe demais de casa — melhor voltar logo” (fui um hobbit numa vida passada, acho). Isso quando eu não estou levando tombos por aí.

É estatisticamente inevitável que haja algum leitor do HBD que nunca havia de fato visto uma lontra até ler este post. Isto significa que pra este leitor, lontras estão comendo 100% do tempo.
Tenho também uma ergométrica, mas eu me sinto um hamster naquela porra. Esse negócio de ficar pedalando loucamente sem sair do lugar também não é pra mim.
E então o Evandro ofereceu a solução — natação. E não apenas isso, mas ele tem um truque secreto arcano pra tornar o esporte ainda mais divertido: um iPod cheio de músicas e podcasts, lacrado dentro de um case e fones à prova dágua.
Após ponderar por 2 ou 3 segundos, decidi que essa é a MELHOR idéia do mundo. Não apenas natação é um exercício super completo, mas também é a única atividade física que eu vejo como realmente prazerosa. Do tipo que se você convida alguém pra te acompanhar, QUALQUER pessoa fica empolgada.
Você berra, “Vamo pra academia!!!“, e talvez um amigo marombeiro se amarre na idéia.
Você oferece um “Vamo fazer cooper!” e eu imediatamente penso que o meu GTA5 tá muito mais interessante.
Um “Vamos andar de bicicleta!!!” talvez seja o único que resulte em uma resposta positiva do convidado, e ainda assim é uma atividade exclusivista — se o sujeito não tem uma bicicleta, ele fica chupando o dedo.
Mas um “vamos pra piscina!” causa, universalmente, gritos de alegria e empolgação de qualquer pessoa que ouça. Quem não curte uma piscina, mano?! QUEM? Me diga quem. Diga um nome sequer. Você não é capaz de dizer. Apenas pessoas sem alma.
Só de escrever essa frase já tou louquinho pra terminar essa porra de artigo logo e correr pra YMCA.

Aparentemente é divertido ficar lá
Teria eu então FINALMENTE achado o mítico elemento em toda história de gordos que ficaram esbeltos — uma atividade física REALMENTE prazerosa? Seria por ISSO que as outras tentativas falharam?!
Era a hora de experimentar.
No domingo, convidei minha mãe pra ir comigo. Minha mãe é uma hábil nadadora (pratica há uns 10 anos, acho), e consegue no auge de seus 50 e tantos anos dar múltiplas idas e voltas na piscina olímpica da YMCA com uma facilidade que me humilha.
Enquanto isso, meu crawl torto começou a falhar já na metade da piscina — em parte pelo meu péssimo condicionamento físico, e em parte porque tenho um ombro bichado que limita os ângulos de movimento e, por isso, a efetividade da minha braçada.
Pior, ficar ofegante numa piscina significa que você vai acidentalmente beber alguns litros de urina infantil em sua tentativa de puxar o ar. Eu parava e tossia, enquanto minha mãe observava e ria.

Sim, eu sei que fico estranho sem óculos.
Apesar disso, eu tava me divertindo bastante — como já foi comentado, é quase quanticamente impossível não se divertir numa piscina. Imagino que até os defuntos afogados em piscinas tem sorrisos no rosto. Coitados dos legistas, que visão do inferno.
Voltei pra casa animado com a primeira fase da deslontrização, mas faltava o elemento musicopodcastal. Passei numa lojinha de usados e achei este iPod nano cor de rosa.
CLARO que tinha que ser cor de rosa. Comprei.

Era CAD$50; por causa do pequeno amassadinho no canto interior esquerdo, o cara fez por CAD$40.
Pronto.
Agora, faltava o case e headphones à prova dagua. O Evandro recomendou estes, que vejo agora ter ACABADO de abaixar de preço. Era 17 dólares ontem mesmo, tenho certeza. Não posso garantir muita qualidade, mas até hoje o iPod do Evandro não quebrou, então taí.
Como eu estava na pilha da natação, mandei a paciência pro caralho e agi com minha usual afobadíssima impulsividade. Achei uma loja lá na puta que o pariu que vendia um case aí de grife famosa entre a turma que gosta de nadar ouvindo música.
50 conto o case, 30 conto os headphones. A propósito, acho uma chatice redundante ter que ficar explicando que a unidade monetária que eu uso aqui é o dólar canadense (o tal CAD$ que você viu lá em cima). SEMPRE que eu cito valores que eu paguei por alguma coisa aqui, suponha que são dólares canadenses.
Pronto. Com o case e o headphone, eu mal podia esperar pra experimentar a natação com o add-on musical. Quando alguém fala que “fulano mal podia esperar”, geralmente é um exagero. Eu LITERALMENTE não consegui esperar: mesmo já tendo ido nadar naquele dia, voltei em casa, peguei o short, e parti pra YMCA de novo.
O intervalo foi TÃO PEQUENO, aliás, que o voucher do estacionamento que eu paguei na primeira vez ainda tava válido. Daí você tira a minha empolgação. “Quero ver se vai continuar mês que vem“, você já deve estar pensando, de tão ranzinza e sem amor humano no coração que você é. Saia do meu site, você precisa é de Jesus.
Voltei na YMCA, enfiei o iPod no case, e pulei na piscina e comecei a dar braçadas sem ritmo ou habilidade em direção ao outro lado. Imagine um porco com câimbra tentando atravessar o rio São Francisco.

Esta imagem é uma cortesia daquelas aulas de geografia da quinta série
Segundos após começar a ouvir um 99Vidas, ouvi estalos no headphone, e o som baixando até ficar o aparelho ficar totalmente silencioso.
PUTA QUE O PARIU. Como é que no PRIMEIRO DIA, usando um case caro e chique de nadadores riquinhos, eu consigo a proeza de queimar a porra do iPod comprada pra essa ÚNICA FINALIDADE?!?!?
Saí da piscina apavorado, 50% puto e 50% “pelo menos vai render um Todo Dia Tem Uma Merda“. Percebi que a tela ainda tava acesa, e não consegui entender o problema. Algum tempo depois veio o estalo — o ruído era a clickwheel sendo ativada pela fricção da água empurrando o plástico do case contra o iPod. Isso fazia a clickwheel rodar, abaixando o volume da música.
UFA. Menos mal!
Aí veio o dilema — ativo o lock do iPod pra impedir que a água da piscina ataque de DJ, ou não…? Uma vez no case, a configuração escolhida não poderia ser alterada. Tentar mover o switch significaria ficar aplicando pressão no plástico do case com a unha, ou seja: péssima idéia.
Por causa da inquietude mental eu raramente ouço uma música inteira completa, fico mudando de 30 em 30 segundos praticamente — sim, esse é o nível da minha hiperatividade/habilidade de se entediar rapidamente –, então o jeito era deixar destravado e ficar aguentando os estalinhos da clickwheel girando.
Mais tarde, ao voltar pra casa, eu lembrei que é possível desativar esses estalos quando a clickwheel é usada. Maravilha!
Termino este post já colocando o calção de banho pra ir à YMCA. Não é tão longe daqui, mas como já tá ficando tarde e estou com pouco tempo — ainda tenho que gravar vlog hoje! –, vou de carro mesmo pra agilizar as coisas.
Convido os broders a experimentarem nadar com um mp3 player e musiquinhas/podcasts. Deve ser bizarro pros salva-vidas o gordinho nerd dando gargalhadas DO NADA no meio da piscina, mas fazer o que.

September 17, 2014
Explicando o Tiririca (e sua candidatura) pra um gringo
Uma das coisas legais de morar no exterior é o inenarrável prazer de mostrar aos gringos algumas peculiaridades sobre o Brasil. O choque e a surpresa que eles demonstram ao serem apresentados a algumas maluquices tupiniquins servem como um excelente lembrete de que tem muita coisa maluca no Brasil que a gente aceita pura e simplesmente por falta de referencial.
Como algumas idiossincrasias brasileiras são assim desde sempre, nunca achamos estranho. Se você tivesse nascido com uma piroca na testa, e vivesse cercado de pessoas que também tinham estrovengas brotando do meio da cabeça, a falta de um estromalho na cachola é que te pareceria estranho.

Imagine se um dia eu cair numa auditoria do Fisco canadense e tiver que explicar que é assim que eu pago meu aluguel — photoshopando porcamente uma piroca na testa de uma pobre coitada
E como estamos justamente em tempos chatíssimos de eleições (que é quando pseudo-intelectuais cegamente partidaristas acreditam serem os únicos que compreendem a sociedade e como conserta-la) uma das coisas mais divertidas é apresentar minha coitada esposa ao horário eleitoral gratuito brasileiro.
É o mesmo prazer meio sádixo de ver aqueles candidatos sem qualquer tino artístico fazendo teste pra aparecer num American Idol da vida (e pagando um mico tão intenso que exposição prolongada a esses vídeos deve até causar esterilidade), com a exceção de que é bem mais deprimente porque o futuro do nosso país está em jogo — e com o agravante de que mostrar isso pra alguém de fora é uma completa vergonha nacional.
Hoje eu reapresentei a Bebba ao Tiririca. Alguns anos atrás, por ocasião da sua primeira candidatura, expliquei à minha esposa que o sujeito era um palhaço de circo (que eu mesmo conheci pessoalmente numa apresentação low budget em Fortaleza em 1997 ou 1998, antes da sua fama nacional). E adicionei que, por motivos que eu até poderia explicar a ela mas que seriam ainda mais vergonhosos pro nosso país, resolveu partir pra vida política.
Digo isso porque foi mais fácil dar de ombros e dizer “haha, que loucura né?”, do que explicar que a manobra política do partido pelo qual ele se elegeu é basicamente a versão brasiliense do cavalo de tróia. Sério, veja a ficha dos indivíduos que foram indiretamente eleitos junto com o Tiririca.
O que não deu pra omitir da explicação foram os slogans das campanhas Tiririca em 2010. Tive que explicar pra minha mulher que o palhaço (literal e figurativamente falando) essencialmente admite que não sabe exatamente qual a função do cargo pra qual concorre, mas que quando chegar lá vai não apenas aprender mas também explicar pros seus eleitores — a insinuação óbvia é que nem estes sabem o que um deputado faz, o que é verdadeiro a respeito de uns 97% da população brasileira.
A coisa toma tons Terry Gillianescos de absurdismo quando traduzi pra minha esposa que a rima “vote Tiririca/pior do que tá, não fica“:
“Ó, é o seguinte: ele está abertamente dizendo que a situação geral do Brasil é o status final, definitivo e insuperável de esculhambação. Sendo assim literalmente impossível tornar a situação pior, que diferença faz votar nele? Não tem como piorar mesmo. Ele não está oferecendo nenhuma plataforma através da qual ele melhoraria a situação — ele está simplesmente pedindo o favor de que votem nele porque foda-se afinal de contas, não tem como ficar mais errado do que já é.”
A cara da minha esposa era indescritível, e ficou pior ainda quando comentei que a candidatura dele talvez fosse anulada porque existe a forte suspeita de que o sujeito não sabe escrever.
Eu tenho certeza que no fundo ela passou os últimos 4 anos acreditando que o vídeo é uma paródia qualquer do YouTube e eu estava simplesmente me aproveitando da sua ignorância sobre o nosso país pra pregar-lhe uma peça.
Hoje revisitei o assunto, explicando pra ela que ele não apenas se elegeu, como foi além disso o segundo deputado federal com mais votos na história lamentavel da política brasileira. E que está se recandidatando, usando dessa vez piadinhas sobre o “papel” de um deputado e um trocadilho sobre o nome da capital do país:
Ela me perguntou porque DIABOS alguém em sã consciência votaria nesse sujeito DE NOVO. Eu expliquei que é provavelmente o que os motivou a votar pela primeira vez — o conceito do “voto de protesto”, um processo em que o brasileiro vota no candidato mais absurdamente ridículo como uma forma de mandar uma mensagem sobre a condição internacionalmente envergonhante da nossa democracia.
Sim, confirmei a ela, é isso mesmo: no Brasil “protestamos” contra a política contribuindo mais ainda pra sua desgraça.
Penso que isso é um subproduto da estúpida obrigação do voto. Pra entender melhor quão absurdo é obrigar alguém a exercer um direito após atingir uma certa idade, imagine se fôssemos igualmente obrigados a nos casar aos 20 anos ou a comprar um carro ao chegar nos 25. Apenas num ambiente em que o sujeito é OBRIGADO a sair de casa pra votar em alguém, seja lá quem for, Tiririca e outros candidatos que usam e abusam do absurdismo em suas propagandas políticas poderiam prosperar.
Neste momento você possivelmente CORREU pro google pra me mandar este link nos comentários, que informa que o Tiririca foi eleito “um dos melhores deputados do ano”. IZZY SEU HIPSTER SUJO PAGA PAU DE AMERICANO E DESMERECEDOR DO BRASIL, você estaria digitando neste exato momento, ENQUANTO VOCÊ VOCIFERA CONTRA O TIRIRICA E SEUS ELEITORES ELE SE DESTACOU ENTRE TODOS OS OUTROS PARLAMENTARES!!!, já consigo prever seu comentário.
Em nenhum momento do seu comentário indignado você parou pra realmente ler a matéria e compreender que aparentemente a única métrica usada pra determina-lo “melhor deputado” é “compareceu ao trabalho com mais frequência que os outros”.
Como se o melhor aluno fosse simplesmente aquele que não falta as aulas que ele tem como obrigação assistir. Imagina um funcionário exigindo um aumento declarando-se “o melhor trabalhador desta porra aqui” simplesmente porque ele comparece no escritório nos dias em que é pago para estar lá.
Tiririca não é o “melhor deputado” porríssima nenhuma; se isso for de fato verdade nosso país tá mais fodido do que imaginávamos.
Minha mulher fica chocada com o Tiririca e sua candidatura porque ela não vive num local onde candidatos do Partido da Galhofa são lugar comum em todas as eleições (aqueles clássicos que tentam se eleger usando nada senão aparências ridículas ou bordões humorísticos e tal), e onde não se “vota por protesto” também. Pra gente, Senhor Deputado Federal Tiririca nem é lá tãããão estranho.
Afinal, se tem um país que merece um político palhaço, é o Brasil.

September 15, 2014
E essa agora — o Brasil refilmou O Mentiroso, com menos Jim Carrey ou graça
Nem dá pra reclamar plenamente da parada porque me deu, afinal de contas, um bom motivo pra atualizar o blog.
É o seguinte. Lembra de O Mentiroso, o filme de 1997 em que o Jim Carrey interpretava um advogado subitamente impedido de mentir por motivos mágicos?
Então, a Paris Filmes definitivamente lembra, e suponho que ela espera que nós não. Se liga no trailer de O Candidato Honesto:
Sabe quando você leva um amigo seu pra conhecer um círculo social tangente, e o rapaz começa a fazer alguma mongolice lamentável, te deixando com uma cara similar a essa?
Então. Foi com exatamente essa cara que eu vi aquele trailer, tamanha é a vergonha de uma cópia tão descarada.
Basicamente, eles pegaram a premissa de um sujeito que construiu uma carreira com mentiras e se vê obrigado a contar apenas verdades, por causa do desejo de alguém.
Se você fosse parar pra apontar o dedo berrando NÃO É ORIGINAL!!!! quando o assunto é cinema, você ia cansar rapidinho e ir fazer alguma outra coisa. Arquetipos, progressões de trama e tropes de forma geral são reutilizados liberalmente em Hollywood, muito similar àquele seu hábito de usar a camiseta, tirar e jogar no chão, depois vestir de novo, e de novo, no máximo se submetendo a dar uma cheiradinha antes pra analisar a condição.
O problema é que tem filmes com temáticas similares (Matrix e Inception ambos lidam com realidades simuladas, por exemplo), e tem a cópia descarada da premissa da história. O Candidato Honesto cai sem perdão nessa segunda categoria.
Porra mano, até as caras e bocas do Carrey o tal Leandro Hassum emula. Aos que sugeririam que o ator “já faz essas coisas tem tempo e é inclusive conhecido por isso”, isso não é um ponto positivo que defenda O Candidato Honesto da crítica de plágio: fica aí então mais óbvia a escolha do sujeito. Quem melhor pra servir como Jim Carrey tupiniquim neste O Mentiroso made in Brazil do que um ator conhecido pelo seu humor físico/expressões faciais?
Eu tenho a coragem de apostar que o filme vai ter uma cena EXATAMENTE igual a essa. Igualzinha. O cara chega, esculacha um grupo sendo obrigado a falar a verdade (e achando que vai se foder por isso), e no final sai por cima. Eu GA RAN TO pra você que o filme vai ter essa cena, e suspeito aliás que não apenas uma.
Olha só, eu vou até dar o braço ao torcer que o próprio O Mentiroso não se apoiava em um roteiro completamente original – aquele velho conflito do pai workaholic que não dá atenção pra família (e no final aprende a ser um homem melhor) é manjada até não poder mais. E até admito abertamente que a idéia de um sujeito que construiu uma carreira com base em mentiras se ver subitamente incapacitado de mentir funciona infinitamente melhor no contexto de política. Em O Mentiroso, a trama era simplesmente um único caso que o cara ganha justamente por contar a verdade a despeito das consequências disso pro próprio cliente, e se reconciliar com a família.
A mesma premissa transplantada pra uma capital nacional, por outro lado, tem ramificações bem mais abrangentes, e por isso acho muito mais interessante.
O problema é que essa porra tá bebendo TANTO da fonte d’O Mentiroso, que eu aposto que o filme se resume a isso que vimos no trailer, somado a algum “sucesso” adquirido acidentalmente por falar só a verdade (igual o Fletcher Reed), e finalmente o arco se fecha com o cara aprendendo alguma importante lição e sendo um sujeito melhor.
E pior: no trailer — onde geralmente mostram os MELHORES momentos do filme — usaram não uma, mas duas (DUAS!) piadas Praça é Nossísticamente previsíveis de switcharoo (o sujeito fala algo, o interlocutor fala “Você está se referindo a A, né?”, ao que o outro responde “não, B!”) que vieram diretamente da cartilha de piadinhas de tio metido a humorista.
No momento EXATO que o cara que contracena com o Leandro Hassum na última cena do trailer fala “Ô João, político não tem isso não, João“, vai me dizer que você não sabia exatamente como seria o resto do diálogo…?
Tangente a isso, tenho outra pergunta:
Por que o frame de créditos de todo filme nacional parece um macacão de Fórmula 1? Se você precisa de uma prova do ditado popular que “muitos cozinheiros estragam a sopa”, aí está.

September 11, 2014
[ Frugalidade ] Há como ser geek de tecnologia, porém frugal?
Hoje aqui no HBD Social Media & Restaurante Self Service vamos falar sobre um assunto sobre o qual leio bastante ultimamente.
Eu já sei até o que você está pensando e nem é por causa dos meus genes mutantes que meu médico se recusa a admitir que eu tenho.
“Izzy Nobre falando sobre frugalidade IZZY NOBRE FALANDO SOBRE FRUGALIDADE RSRSRSRS FAZ ME RIR É COMO O MALAFAIA FALANDO SOBRE DIREITOS HUMANOS OU O MALAFAIA FALANDO SOBRE QUALQUER COISA NA REAL”
Sim, de fato eu construí ao longos dos anos internéticos uma imagem de um esbanjador megaconsumista que joga dinheiro fora à toa na fútil e incessante busca dos gadgets do momento. Acho que este seria um excelente momento pra corrigir essa imagem.
De fato, eu adoro tecnologia. Acompanho e participo ativamente do culto ao chip. Tenho iPhone, iPad, Macbook, ereader, câmeras digitais, múltiplos consoles portáteis, etc.
Por algum motivo, no entanto, pessoas vêem isso e pensam que o sujeito comprou tudo no mesmo dia, de tanto que odeia o próprio dinheiro. Ou que esses gastos com tecnologia são a ponta do iceberg de um estilo de vida esbanjador. Que o sujeito não faz a menor idéia do que é um estilo de vida frugal, porque certamente endividou-se até a alma pra brincar com passatempos eletrônicos.
Certamente muita gente se encaixa nesse perfil — ainda mais no Brasil, que por políticas protecionistas sem qualquer sentido tarifam produtos importados com valores absurdos –, mas eu queria iniciar essa série sobre finanças e frugalidade explicando que não é meu caso.
O motivo pelo qual eu posso ter essas coisinhas são dois, na verdade. Primeiro…
Esses eletrônicos é que são extremamente acessíveis aqui no Canadá
Pra te dar uma noção, eu paguei na época míseros 300 dólares canadenses pra upgradear meu iPhone 4 pro iPhone 5, que saiu dois anos depois.

Alguns achariam que upgradear de 2 em 2 anos é um exagero financeiramente irresponsável, mesmo assim.
Pra obter esse preço tive que renovar meu contrato com a minha operadora, sim, mas entenda que isso não tem o estigma que tem aí no Brasil. TODO MUNDO aqui compra celulares subsidiados por um contrato com a operadora, ao contrário do nosso país onde fugimos de obrigações contratuais com prestadoras de serviço como o diabo foge da cruz feita de cruzinhas menores que por sua vez foram ungidas com o sangue do Papa.
Pra você compreender melhor o que 300 dólares significa pra vida financeira do canadense médio: trabalhos de fast food aqui costumam pagar entre 11 e 14 dólares por hora, numa semana de trabalho de 40 horas. Vamos com a média então, CAD$ 12.50 por hora.
Assim, um trabalhador de fast food tira exatamente 2 mil dólares por mes, antes dos impostos. Acaba saindo uns 1700 dólares líquidos, mais ou menos.
Ou seja: com o salário líquido de UM MÊS DE TRABALHO, um funcionário de fast food poderia comprar, se quisesse, CINCO iPhones.
Mas sei que vocês realmente gostam de celulares desbloqueados, então usemos isso como exemplo. Com o salário de um mês, um balconista do McDonalds pode comprar o iPhone 6 Plus de 128gb, o modelo mais caro oferecido pela Apple.

E sobraria dinheiro.
(Lembrando que este hipotético sujeito com literalmente um dos salários mais baixos do país tem acesso — além de pequenos luxos consumistas como o gadget do momento — a boa saúde, segurança, infraestrutura pública, e outras coisas. Algumas das vantagens de morar num país entre os 10 com maiores índices de desenvolvimento humano. Mas isso é assunto pra outro post, não quero deixar você ainda MAIS revoltado com o Brasil no momento)
Como se pode ver, esses pequenos luxos eletrônicos são infinitamente mais acessíveis aqui. Além disso, tem outro fator.
Eu sou INCRIVELMENTE frugal em todas as outras esferas, que é justamente o que me permite gastar dinheiro com tecnologia.
Eu não bebo, não uso drogas, não faço nada no fim de semana, ou em qualquer outro dia pra ser sincero. Há MESES não compro roupas novas, e geralmente compro sapatos baratos que faço durar por ANOS. Não faço basicamente NADA da vida a não ser trabalhar no hospital, e então voltar pra casa e trabalhar aqui no site e no meu canal.
O único luxo a que me dou direito é comer no restaurante do hospital quando não tive tempo de preparar comida, e fazer esses upgrades tecnológicos uma vez a cada dois anos.
Por isso, embora você às pense que eu sou um consumista super esbanjador, nem é o caso — é uma questão de como priorizo os meus gastos. Meu irmão, que caga e anda pra tecnologia, prefere gastar dinheiro com roupas de marca, por exemplo.
É possível, sim, ser frugal e ainda assim fã de tecnologia — especialmente quando você fatora o QUANTO você usará o aparelho em questão.
Darei um exemplo prático. Em 2008, enjoyei meu primeiro auge financeiro: um emprego que pagava 18 dólares por hora (até então meu salário mais alto na vida inteira), além de dividir apê com outras 2 pessoas e não ter carro.
Eu estava torrando dinheiro de uma forma inacreditável, e o fato de que eu não comecei uma poupança NESSA época me causa raiva até hoje. Em uma ocasião, eu comprei o volante da Microsoft pro Xbox 360 porque haveria uma festinha lá em casa e eu achei que seria bacana comprar pra galera jogar Burnout.
Ninguém jogou; o Rock Band ao lado dominou a atenção do núcleo videogamico da confraternização
Era esse volante. Na época, se me lembro bem, paguei uns 200 dólares por ele. Eu sequer curto jogo de corrida. Foi um gasto absurdamente desnecessário, se compararmos com um aparelho como um smartphone — que uso pra me comunicar com família, amigos e leitores, gerenciar meu site e meu canal — que são fontes de renda, afinal de conta, em vez de um simples hobby –, entre inúmeras outras coisas.
Hoje eu JAMAIS gastaria dinheiro com algo tão supérfluo, que eu SEI que usarei pouquíssimo. É por isso que passei ANOS sem consoles de mesa — quando eu e meu irmão prosseguimos cada um em direção à sua própria casa, na “partilha de bens” ele fez questão de ficar com os consoles, e eu não fiz questão de comprar substitutos pra eles.
Eu sabia que eu não ia extrair deles um valor equivalente ao preço da etiqueta. Preferi ficar sem.
Outra atitude minha em relação a gadgets, e que eu compreendo que é um pouco mais difícil no Brasil, é que eu sigo o seguinte algoritmo pra comprar um novo eletrônico (ou qualquer outra coisa na real):
Simples assim. Os nossos bons amigos Visa e Master Card condicionaram gerações a avaliar a hipotética compra de um objeto em termos de “tem limite no cartão? Tem? Então foda-se“. Pra muita gente, essa é a única variável que importa.
Esse algoritmo está fatalmente errado, e leva muitos a dívidas inescapáveis.
Convido-os a adotar um novo sistema. Como falei, sei que no Brasil é um POUCO mais difícil, mas não é impossível. Se você não pode comprar à vista, se compromete o seu orçamento mensal, e se você no fundo sabe que nem vai de fato usar a parada pra algo útil ou constante… refreie o impulso de abrir a carteira. Deixe passar a vontade.
Não sou nenhum especialista no assunto, mas quero ter uma conversa frequente com vocês aqui no HBD sobre hábitos de frugalidade, repensar consumismo, e priorizar experiências em vez de posses. Vamos de mãos dadas dominar o mundo financeiro!

September 8, 2014
[ Vídeos da semana ] Jennifer Lawrence, 1984, e placa do YouTube!
Olá moçada! De boa na lagoa? Suave na nave? Sussa na montanha russa? Temos uma nossa seção aqui no Hoje é um Bundinha.
Toda semana — preferivelmente no domingo, mas ontem eu estava cansado demais de viagem DÁ UM DESCONTO PORRA — escreverei um post resumindo os vídeos que soltei durante a semana.
O que rola é o seguinte: há um tempo, eu usava um serviço de automatização pra postar um textos aqui no HBD sempre que eu jogasse um novos vídeo no YouTube. Eu tinha desativado o texto automático que o IFTTT postava aqui porque como era automatizado, tinha uma aparência muito… bem, automática. Era muito genérico, e com exceção de remédios, tudo genérico é uma bosta.
Era útil, sim, mas eu não tava gostando muito daquela natureza pasteurizada dos textos automáticos. Escrever um texto específico (e que complemente) pra CADA vídeo seria o ideal, mas lembrando que eu também tenho um emprego “de verdade”, nem sempre me sobra tempo pra isso. Pensei em fazer um novo formato então: um texto dominguístico resumindo os 3 vídeos da semana.
O próximo vai ser no domingo, pra sair junto com a newsletter que também atrasou essa semana (comentei que viajei, né) então fique ligado!
Jennifer Lawrence “caiu na net”?
Neste vídeo, explico a situação do The Fappening — incluindo como alguns punheteiros que saíram catando as fotos na web talvez tenham MUITO com o que se preocupar.
Você já leu 1984?
Dizer que 1984 é um dos mais importantes e influentes trabalhos literários do século XX é chover no molhado, então me observe falando isso por seis minutos.
Muito obrigado, galera!
Graças aos inscritos do meu canal, ganhei uma plaquinha de prata que — na excelente comparação do Patrão Felipe Aguiar, é meio que análogo àqueles discos de prata/ouro/platina que o Gugu dava pros artistas. Por onde andará o Maurício Manieri, aliás?

September 4, 2014
5 coisas que todo mundo gosta, menos eu
Já deixo claro no começo do texto o seguinte disclaimer: esse post vai ser chato pra caralho. Ao continuar lendo, você está se sujeitando voluntariamente a ele, e está abrindo mão do direito de se sentir putinho e revoltado.
Eu vivi a vida toda me sentindo um cara estranho, diferente, meio marginalizado. Era um nerd magricelo que gostava de videogame e quadrinhos numa época em que não tínhamos uma sitcom sem graça regendo o mundo a aceitar nerdice como algo cool, por exemplo. Isso cimentou em mim, desde criança, aquela sensação de não pertencer ao grupo.
Outra parada que contribui pra isso é que tenho hábitos alimentares estranhos que sempre fazem as pessoas levantar as sobrancelhas (“Você não come NENHUMA verdura? Que coisa mais estranha. E esse miojo com batata palha? Que porra é essa, mano? Se não é ilegal, bem que deveria ser!” é uma reação comum quando alguém fala comigo sobre comida).
Tem outros exemplos bons também mas eu tava jogando Blackthorne do SNES, que é foda pra caralho, e agora eu esqueci tudo; o ponto é que quase toda a minha vida eu me senti isolado da maioria das pessoas porque meus gostos nunca batem com os das pessoas ao meu redor.
E se sentimento é exacerbado quando vejo pessoas próximas de mim falando animadamente sobre isso ou aquilo que aparentemente é muito importante pra eles, e eu não consigo me interessar nem fazendo força; nem fingindo falsa admiração só pra ser cortês. Por exemplo…
The Big Bang Theory
Vou ser sincero: na primeira vez que vi a série, achei o maior barato. Um seriado de dois nerds baixinhos e franzinos, definitivamente fora do padrão convencional de beleza, falando detalhadamente sobre filmes baseados em quadrinhos e emuladores?! Incrível. Jamais esperava que algo daquele naipe caísse no gosto popular. Que época excelente pra ser um nerd!
…só que aí eu comecei a prestar mais atenção no seriado. Na realidade, The Big Bang Theory não é de fato um seriado nerd, ou sequer inteligente. O seriado capitaliza exclusivamente no fato de que cultura nerd está em alta, e como os nerds salivam pavlovianamente e batem palmas feito focas retardadas quando ouvem qualquer termo geek que eles reconhecem (NINTENDO 64, EU SEI O QUE É ISSO!!!1111), as piadas são completamente dispensáveis no seriado.
Basta mencionar algo que eles conhecem e pronto — “MELHOR SERIADO DO MUNDO MEU DEEEEUUUSSSS”.
Veja esta cena, como melhor exemplo dos clichês “humorísticos” da série:
Auto-explicativo. Sheldon, o típico personagem semi-autista misantropo que a internet adora endeusar por motivos que apenas revelam nossa própria mongolice coletiva, fala pra Penny que está “jogando Mario 64 num emulador mal programado de Nintendo 64″. Entram as risadas enlatadas e a automática aceitação do seriado pelo demográfico (que se auto-entitula) nerd.
Aí que tá. Por que cargas dágua dizer que está jogando emulador deveria provocar risadas, exatamente…? Qual a piada ali…? Não houve piada alguma. Imagina você chegar no seu amigo, perguntar “o que tu tá fazendo, Raimundo?”, “rodando Megaman X no meu PSP”, e em seguida alguém que esteja presenciando esse diálogo cair nas gargalhadas.
Talvez seja por isso que The Big Bang Theory, assistido sem as risadas de fundo, é 0% engraçado e 100% constrangedor.
Futebol
Com uma única exceção — aquele intervalo de 4 em 4 anos quando nossa nação é reconhecida como melhor no mundo em alguma coisa, ainda que essa “alguma coisa” seja simplesmente louros passados porque faz umas 3 Copas que nossa Seleção tá uma bosta –, eu cago e ando pra futebol. E olha que nem na Copa eu me interesso tanto assim.
Não consigo me importar. Sempre atribuí esta indiferença pelo fato de que meu pai é igualmente alheio a futebol, e por isso não tive nenhuma influência familiar me inspirando a torcer pra este ou aquele clube.
Eu simplesmente não consigo me importar. Não consigo ver qualquer importância nas competições furiosas entre torcedores de times tradicionalmente adversários, por exemplo. É possivelmente o tipo de fé cega mais sem propósito que existe no planeta.
Religião, ao menos, se trata (teoricamente) de algo que definirá o seu além-vida; faz algum sentido levar a ferro e fogo, afinal, ir pro inferno é coisa séria. Política também, já que isso rege a direção de um país inteiro.
Mas e futebol, mano? Escolher este ou aquele time é algo totalmente arbitrário, o que torna a rivalidade entre torcedores completamente mongolóide. Você defende o partido X porque acredita na plataforma e na ideologia, e defende o deus Y porque está plenamente convencido de que a mensagem dele à humanidade é a Verdade. Mas time de futebol, que você escolhe porque… era o mesmo do seu pai? O uniforme é bonito? Tem mais vitórias no momento?
Os fãs de futebol que me perdoem, mas eu acho o seu hobby muito sem graça, e a animosidade que ele gera nas torcidas literalmente mongolóide.
E já que falamos de política…
Política
Tenho algumas teorias.
A primeira é que eu sou, com plena franqueza, muito burro pra acompanhar ou compreender política brasileira. Não é hipérbole ou falsa modéstia não, eu tenho até medo de fazer teste de QI e descobrir que sou tipo o Forrest Gump, tamanha é a minha consciência da própria burrice. Então, vejo isso como um possível motivo pra minha indiferença política.
A outra é igualmente plausível. Morando fora do Brasil há 11 anos (oficialmente um cidadão canadense desde 2012), eu abro uma legítima gargalhada quando alguém me pergunta na total seriedade se penso em algum dia voltar a morar no Brasil. Só de imaginar a cara totalmente honesta do sujeito perguntando isso eu tenho vontade de rir de novo.
Pra que DIABOS alguém na minha situação se importaria com a política brasileira?
E tem outra coisa. A máquina política brasileira já é tão eternamente tóxica, tão perenemente sebosa, tão irreversivelmente cagada por oligarquias criminosas e alianças imorais, que só mesmo o maior dos idealistas pensa que o Brasil mudará diametralmente caso este ou aquele partido ganhe. Na real, não importa quem ganhe, a estrutura de poder é homogeneamente escrota, e pessoas do lado oposto dos espectros políticos estão cagando pra você e pro status quo do povo brasileiro em geral.
Vou te contar uma parada: Não vai fazer diferença quem ganhe essa eleição. Ou qualquer outra. Assim como pouco fez diferença, na real, quem ganhou as 5 ou 6 eleições passadas.
Os impostos e juros continuarão altos, a violência vai continuar uma bosta, você mesmo vai continuar reclamando de tudo e sonhando com um dia imigrar pros EUA ou Austrália ou Canadá, e sempre que retornar ao Brasil de uma viagem ao exterior continuará passando pelas tradicionais duas semanas de total insatisfação com o país.
Continuaremos sendo a Xa. maior economia do mundo, uma estatítica que os nacionalistas papaguearão com orgulho, enquanto uma miríade de pessoas continuará vivendo assim:
O Brasil vai continuar a mesma merda de sempre; quem vota no PT vai continuar vilificando quem vota no PSDB, e vice versa, mesmo que a Dilma ou o Aécio Neves curassem o câncer, a AIDS, e inventassem carros voadores durante seu mandato.
Aliás esse espírito de “ahhh mas o partido tal estivesse no poder, finalmente o país mudará/minha vida melhorará!” serve apenas pra provar que estamos completamente entregues ao paternalismo governamental. É a versão adulta do “papai, terminei, vem me limpar!”
Entende porque eu vejo as intermináveis pelejas políticas no Twitter com o mesmo interesse de alguém que observa tinta secando num muro recém-pintado?
Game of Thrones

Eu AVISEI que você ia ficar puto com esse post, agora aguenta porra
De forma concisa, é o seguinte: eu morrerei sem jamais assistir nenhum episódio dessa série, sem nunca ler uma página, sem sequer me importar o bastante pra decorar o nome de um personagem, nem mesmo que por pura osmose/bruteforce de tanto ver vocês falando dessa parada no Twitter.
Não é despeito nem nada, por mais que pareça. Juro. É que simplesmente não consigo me importar. Eu não me interesso em fantasia medieval em geral, e não me interesso neste programa em particular.
Vejo vocês falando animadamente da série, dos eventos dela, de quem o autor matou dessa vez, e não consigo nem sentir indiferença. É algo menor que isso. É tipo, meio que passa batido pelos meus olhos. Tenho tipo um filtro mental, ultimamente eu nem leio mais quando vocês falam sobre a série.
Qualquer evento de premiação
Emmy’s, Oscar, MTV Awards, Troféu Imprensa… se envolve alguém recebendo um troféu e fazendo discurso choroso e/ou aproveitando o palanque pra dar liçãozinha de moral sobre a causa dujour, eu cago e ando. Você jamais me verá acompanhando essas porras ou tecendo comentários a respeito no Twitter.
Talvez seja a natureza totalmente subjetiva dessas premiações (você seria capaz de quantificar quão melhor, exatamente, The King’s Speech é do que The Social Network? Claro que não). Talvez seja o fato de que eu acho meio whatever uma indústria se auto-congratulando — é meio que como eu dar ao HBD o prêmio de Melhor Blog Brasileiro de 2014.
Possivelmente é porque eu sou totalmente indiferente ao mundo do culto ao tapete vermelho, da bajulação/fofoca sobre celebridades, do tradicional “quem estava melhor vestido?” e todas outras essas babaquices que são de longe o MENOS interessante no mundo do cinema/música/TV.
Eu admito que tenho mil interesses que muitas pessoas consideram idiotas, se isso te faz sentir melhor (gastei centenas de dólares montando uma coleção de Game Boys, por exemplo). Além do fato de que eu admiti abertamente lá em cima que sou burro pra caralho, o que por um lado, talvez signifique que estes items citados aqui são na real legais pra caramba e eu apenas não tenho a autonomia intelectual pra curti-los.
Então nem fique puto não! Em vez disso, se abra pra mim sobre sua própria estranheza e me conte que coisas todo mundo curte e você odeia.
(Que fique claro: eu definitivamente não me acho superior que alguém por não gostar dessas coisas)

September 3, 2014
Por que Star Wars não é ficção científica?
Como prometido aqui, somado ao fato de que sou um homem honrado de palavra irreversível, aqui está meu artigo sobre por que Star Wars, frequentemente chamado de ficção científica, não o é.
Existem diversos fatores pra analisar, mas em prol da concisão vou direto ao ponto principal — não há praticamente nada científico em Star Wars. Sério.

“Porra Izzy, como não?! E isso aqui?”
Calma. Vamos rebobinar um pouco a fita (e usar uma metáfora da época em que “rebobinar a fita” fazia sentido).
Ficção científica, em seu âmago, é baseada em plausibilidade. E pra estabelecer essa plausibilidade, são oferecidos argumentos (pseudo) científicos pra explicar como os personagens ou o maquinário na história está fazendo o que faz.
Star Trek é um excelente exemplo disso. Quem assistia as séries e/ou qualquer um dos filmes deve lembrar que uma boa parte da trama se dava a explicar como exatamente os cristais de dilítio ou o alumínio transparente ou amortecedores de inércia afetavam o decorrer da história. Eles eram explicações necessárias pra justificar as peripécias da USS Enterprise. Contraste isso com a Millenium Falcon, que entra e sai de viagens acima da velocidade da luz porque sim e pronto.
E isso acontece pelo fato de que a Millenium Falcon voa acima da velocidade da luz é completamente irrelevante pra história. Num exercício que serve como teste pra categorização, você poderia substituir a Millenium Falcon por um navio, e os Star Destroyers por navios maiores, comandados pelos vilões, com a história inteira se passando durante o período colonial, e a trama permaneceria praticamente a mesma.
De fato, praticamente todos os elementos de Star Wars podem ser submetidos à mesma metodologia. Obi Wan Kenobi é senão um mago espacial. A Força, uma religião/magia sem qualquer fundamento científico. Luke Skywalker, o herói profético. Darth Vader é o arquétipo do Cavaleiro Negro. Leia, a princesa indefesa. A Estrela da Morte é o castelo sombrio do vilão. O sabre de luz é simplesmente uma espada.
Todos esses elementos parecem vir de outro gênero (fantasia/conto de fadas), e isso não é coincidência. Isso acontece porque Star War é fantasia. As pitadinhas de ficção científica — naves espaciais, robôs — são apenas pano de fundo, completamente marginais ao âmago da história: um garoto, aliado a um grupo de subversivos, derrotando um império maligno que tem em seu centro um feiticeiro comandando um cavaleiro negro.
Star Wars é tão incompatível com o gênero de ficção científica, de fato, que uma das MAIORES tosquices do cânon da série foi justamente tentar explicar a Força. Lembra dos lamentáveis midichlorians? Essas bactérias espaciais foram introduzidas no Episódio I como um esforço de fundamentar um dos principais elementos da série em algum tipo de metodologia científica; de explicar e quantificar o que antes era simplesmente mágica.
Lembra que foi deduzido que o Anakin seria muito poderoso basicamente porque “tem mais midichlorians que o Mestre Yoda!”?
Bem parecido com o que Star Trek faz pra explicar, por exemplo, que “reverter a polaridade da repimboca da parafuseta” fará a Enterprise voltar a funcionar — com a diferença que, em um seriado de ficção científica, tais explicações são necessárias. Às vezes, o episódio INTEIRO é justamente sobre essas tais explicações.
Pra comparação, veja esses monólogos de Star Trek que se ocupam justamente com as explicações científicas do que acontece na tela:
BASHIR: I was running a neural scan and noticed some anomalous protein readings. I thought there must be some mistake, so I ran an at the Journal and amino acid sequence to be sure. But there it was again, the prion mutation rate had spiked. I couldn’t believe it. It meant the anomalous proteins had to have a strong quantum resonance.
O’BRIEN: The temporal surge we detected was caused by an explosion of a microscopic singularity passing through this solar system. Somehow, the energy emitted by the singularity shifted the chroniton particles in our hull into a high state of temporal polarisation.
DATA: It appears to be a highly focused aperture in the space-time continuum. Its energy signature matches that of the temporal fragments we observed earlier. However, it is approximately one point two million times as intense. I believe this may be the origin of the temporal fragmentation.
Compare isso com…
OBI WAN: Use the Force, Luke
Tá vendo a diferença…?
E não é só isso, não. Ficção científica, em sua origem, era quase sempre um cautionary tale, ou trazia algum tipo de lição de moral. Os livros do meu autor favorito de ficção científica, Michael Crichton, eram quase sempre algum tipo de alerta de que a ciência humana estava fora de controle. O Dia Em Que A Terra Parou, de 1951, era um aviso de que a proliferação nuclear da Guerra Fria poderia dar um fim na nossa espécie de uma forma diferente da nuvem de cogumelo que se esperava. Star Trek e Battlestar Galactica se ocupam com temas sociais, como racismo, aborto, direitos femininos, escravidão, e por aí vai.
Qual a lição de moral ou alerta de Star War, por outro lado? Não tem. É uma historinha de fantasia que, por total acaso, se passa no espaço, com robôs e armas laser. Como já expliquei, os principais elementos de Star Wars continuariam fazendo sentido se o pano de fundo fosse a Terramédia, e ainda por cima ele carece de um dos mais icônicos fatores da ficção científica.
Não pense que estou desmerecendo a icônica série do George Lucas. Eu amei Star Wars desde a primeira vez que assisti O Retorno de Jedi (que foi aliás o primeiro filme da série que vi). Um dos meus jogos favoritos do SNES era justamente a (excelentíssima) adaptação Super Star Wars Return of the Jedi.

Eis um jogo que tá bom até hoje
Talvez justamente por esse apreço pela série é que eu faço questão de corrigir a categorização errônea que frequentemente dão a ela. Star Wars é um conto de fadas, é uma história de fantasia — o que não significa desmerecimento, é só o gênero correto em que ele se encaixa.
Explicando de outra forma: Star Wars não é ficção científica só porque tem nave e lasers no background, da mesma forma que Forrest Gump não é um filme sobre ping pong só porque ele aparece jogando na China.
Ou ainda: Star Wars é ficção científica porque tem nave espacial da mesma forma que True Lies é um filme sobre biologia equestre porque tem uma cena com um cavalo.

Lembra?
Alguns talvez argumentem que Star Wars é descrito na wikipédia como “Space Opera”, que é um subgênero de ficção científica. A estes eu digo que ofereci aqui um texto de mais de mil palavras justificando por que NÃO É ficção científica; pra me convencer você terá que fazer mais do que ir numa enciclopédia pública que qualquer um pode editar e dizer que lá diz o contrário “porque sim e pronto”.

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