Denise Bottmann's Blog, page 91

November 22, 2011

nietzsche traduzido no brasil I

pesquisando um pouco a fortuna bibliográfica das traduções de nietzsche no brasil, é bem interessante observar como e por meio de quem sua obra chegou a nós. apresento aqui uma cronologia, tal como consegui reconstituir a partir de acervos de bibliotecas e sebos. sairá em duas ou três partes, esta primeira abrangendo os vinte anos iniciais, de 1939 a 1959.



nietzsche estreou sua chegada entre nós, até onde descobri, com o viandante e a sua sombra, em tradução de heraldo barbuy (da linha da chamada filosofia tradicionalista), em 1939, pela edições brasil:



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em 1940, a livraria martins lança o pensamento vivo de nietzsche, de heinrich mann, com excertos ordenados em seções temáticas de várias obras de nietzsche (a origem da tragédia, pensamentos extemporâneos, aurora, a gaia ciência, assim falou zaratustra, além do bem e do mal, a genealogia da moral, o caso wagner, nietzsche contra wagner, o crepúsculo dos ídolos, o anticristo, ecce homo e vontade de potência), em tradução de sérgio milliet::





em 1945, pela editora globo, sai vontade de potência, na tradução do polemista mário d. ferreira santos:





em 1947, saem mais duas traduções de mário d. ferreira santos, aurora e além do bem e do mal, ambas pela sagitário:





em 1949, o germanista erwin theodor rosenthal lança sua tradução de a origem da tragédia, proveniente do espírito da música, pela cupolo:

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também em 1949, a josé olympio, em sua coleção rubaiyat, lança nietzschiana, uma coleção de excertos de assim falou zaratustra, selecionados e traduzidos por alberto ramos:



em 1950, pela edições e publicações brasil, sai assim falava zaratustra, um livro para toda a gente e para ninguém, em tradução feita ou revista por josé mendes de souza (ver a este respeito aqui), abaixo na capa de sua sexta edição em 1965:



Clique para ampliar a capa

em 1953, sai a genealogia da moral pela organização simões, do rio de janeiro. como a simões costumava reeditar as publicações da portuguesa guimarães, imagino que seja a mesma tradução de carlos josé de menezes. não localizei imagem de capa.

em 1954, mário d. ferreira santos, tendo fundado editora própria, a logos, lança sua tradução anotada e comentada de assim falava zaratustra, um livro para todos e para ninguém:



em 1957, a carioca simões lança a tradução portuguesa de josé marinho (guimarães) de ecce homo, como se chega a ser o que se é:



em 1959, a edições e publicações brasil lança ecce homo, como cheguei a ser o que sou, na tradução de lourival de queiroz henkel:





em suma, as obras traduzidas e publicadas na íntegra foram, em ordem cronológica de publicação: o viandante e a sua sombra
vontade de potência 
aurora
além do bem e do mal
a origem da tragédia
assim falava zaratustra
ecce homo
destaca-se a presença de mário ferreira santos, na tradução de quatro obras de nietzsche. intelectual prolífico e veemente, mário ferreira santos pode ser associado à linhagem agonística, digamos assim, hoje encarnada, por exemplo, num olavo de carvalho. não sei até que ponto esse fato terá moldado de início as vias de recepção de nietzsche entre nós, mas certamente terá de ser levado em conta em qualquer história da cultura filosófica no brasil.



numa linha menos "militante", mais propriamente acadêmica, chama a atenção a presença de erwin theodor rosenthal entre os primeiros tradutores de nietzsche no brasil. comentou-me o germanista certa vez que esta foi a primeira tradução de sua carreira de estudioso.

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Published on November 22, 2011 19:36

November 21, 2011

capitas

muitíssimo simpático: vinte capas de primeiras edições aqui, indicação do blog casmurros. algumas:





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Published on November 21, 2011 19:26

November 20, 2011

centaur

comentei em post anterior que havia encontrado uma aurora de nietzsche por uma editora chamada "centaur", na amazon, em tradução absolutamente idêntica à de antônio carlos braga, pela editora escala. até aventei a hipótese de ser a centauro paulista, mas não. hoje fui ver o catálogo da "centaur" em kindle na amazon: tem vários títulos em castelhano, alguns em inglês e vários em português, como as obras completas de freud, os diversos volumes do em busca do tempo perdido, alguns nietzsches etc..







parece ser mais uma dessas picaretagens para faturar em cima dos outros. aqui o catálogo da centaur na amazon.





imagem: aqui
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Published on November 20, 2011 19:05

November 19, 2011

entrevistas

duas entrevistas de rubens figueiredo sobre sua tradução de guerra e paz: uma aqui, no caderno sabático do estadão, e outra aqui, no prosa&verso do globo: muito legais!



no blog da cosac, aqui, mais material bem legal.

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Published on November 19, 2011 18:24

as auroras de nietzsche

mantenho um blog chamado lendo walden , que se concentra basicamente na obra de thoreau. alguns meses atrás, publiquei lá um post que reproduzo abaixo:

Outro tema comum a Thoreau e a Nietzsche é a aurora, como grande metáfora da vida em sua plenitude e renovação. O deslindamento é um pouco mais complicado, e na verdade poderia render até um bom artigo. Por ora fica aqui a vinheta.
 
As pistas partem do Rig Veda, leitura caríssima a ambos, com sua passagem do livro I, hino 113, variadamente traduzida como "Muitas auroras ainda estão por amanhecer", "Há muitas auroras que ainda não despontaram", "São muitas as auroras" e assim por diante.



Thoreau, como se sabe e já comentei em vários posts, toma a aurora como símbolo máximo da vida plena e desperta, com inúmeras passagens do começo ao fim de Walden. E a obra se encerra com três frases soberbas: Only that day dawns to which we are awake. There is more day to dawn. The sun is but a morning star. Destaco em particular There is more day to dawn - belíssima, e de difícil tradução (alguma hora farei um post sobre o denso parágrafo final).





Nietzsche, em sua obra Aurora,* traz em epígrafe justamente a frase do Rig Veda: "Há tantas Auroras que ainda não nasceram" (Es giebt so viele Morgenröthen, die noch nicht geleuchtet haben). 
Aliás, ele ia dar ao livro o título de A Aurora. Como achou que seria meio pretensioso demais anunciar "a" aurora, parecendo a definitiva, eliminou o artigo. 

imagens: wikicommons




lembrei-me deste post porque hoje encontrei uma coisa engraçada, ligada mais diretamente às bizarrices editoriais que costumo apresentar no nãogostodeplágio. e a história é a seguinte:

até onde sei, aurora é (ou era, até data recente, como se verá) uma das obras de nietzsche menos divulgadas entre nós. foi lançada em 1947 pela extinta editora sagitário, em tradução de mário d. ferreira santos, levou uma vida discreta e não teve nenhuma reedição. será apenas em 2008 que irá ressurgir, pela editora vozes.



aliás, achei até uma pena: pelo menos outra tradução de nietzsche, feita, anotada e comentada por mário ferreira santos, assim falava zaratustra, que citei aqui, continua em viçosa circulação, em inúmeras reedições ao longo dos anos, pela própria vozes. bom, que seja; continuemos. 

depois dessa edição da sagitário, terão de se passar quase sessenta anos para termos uma nova aurora entre nós, na tradução anotada de outro germanista e conhecedor de nietzsche, paulo césar de souza, para a companhia das letras (2004):

Livro: Aurora - Reflexões sobre os preconceitos morais

três anos depois, em 2007, a editora escala lança aurora em tradução de antônio carlos braga. não conheço suas qualificações germânico-filosóficas, mas não se pode dizer que seja uma edição anotada, pois suas notas são do gênero "Alexander Pope (1688-1744), poeta inglês (NT)" ou "Platão (427-347 a.C), filósofo grego; dentre suas obras, A república já foi publicada nesta coleção da Editora Escala (NT)". a tradução de antônio carlos braga está disponível para download em vários sites, por exemplo aqui



como disse acima, apenas em 2008 a vozes retomará a tradução de mário d. ferreira santos e lançará sua edição:



hoje, por mero acaso, encontro no site da amazon, aqui, uma aurora publicada em 2011 por uma editora chamada "centaur". não consegui localizar o isbn e nenhum dado sobre a editora. se for "centauro", é velha conhecida aqui no nãogostodeplágio, grande apreciadora de irregularidades editoriais, como documentei fartamente aqui. bom, seja como for, "centaur" ou "centauro", dei uma olhada no texto (sem crédito de tradução):

link aqui

bom, é a mesma de antônio carlos braga pela escala, idêntica, sem tirar nem pôr. não sei se a escala cedeu os direitos à "centaur", se é pura e simples contrafação da "centaur" ou o quê. o que sei é que parece brincadeira: de 1948 a 2003, nada; de 2004 a 2011, quatro auroras?! . [image error] em tempo: esses 55 anos de estiagem tiveram um pequeno alívio a partir de 1977, quando a rés de portugal lançou a tradução de aurora feita por rui magalhães, que teve razoável circulação entre nós.
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Published on November 19, 2011 17:50

documentando



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Continuando a documentar o caso de The Last Bow na tradução de Álvaro Pinto de Aguiar (1955) e a cópia mal disfarçada publicada pela editora Martin Claret em nome de Alex Marins (2006), que iniciei aqui, veja-se agora um parágrafo de "O círculo vermelho".



O Círculo Vermelho Aliás, a Ediouro relançou a coletânea em tradução de Álvaro Pinto de Aguiar, mas com um título que apenas confunde as pessoas: O círculo vermelho e outras histórias de Sherlock Holmes. Na verdade, trata-se do próprio The Last Bow, que saíra na mesma tradução pela Melhoramentos em 1955, com o título mais pertinente de O último adeus de Sherlock Holmes.





Aqui, a tradução de Álvaro Pinto de Aguiar:

— Sem dúvida, a linha de investigação a seguir apresenta-se bastante clara — disse meu amigo, retirando da estante um grosso álbum, no qual colava, diariamente, a seção dos principais jornais londrinos reservada a avisos de pessoas desaparecidas.

    "Deus meu!", exclamou, folheando-lhe as páginas. "Que coro de gemidos, choros e lamentações! Que amontoado de acontecimentos estranhos! Todavia, este é sem dúvida o campo mais precioso que jamais houve para quem se dedica ao estudo dos fatos extraordinários! A pessoa que nos interessa encontra-se só, e não pode receber cartas sem quebra do absoluto sigilo que as circunstâncias lhe impõem. Como pode chegar até ela uma notícia ou qualquer recado do mundo exterior? Ao certo, por meio de anúncios publicados num jornal. Não parece haver outra solução, e felizmente já sabemos qual é esse jornal. Aqui estão os recortes do Daily Gazette dos últimos quinze dias: 'Senhora com uma estola preta no Prince's Skating Club...', podemos passar adiante. 'Certamente Jimmy não quererá despedaçar o coração de sua mãe. . .', isso parece não ter importância. 'Se a dama que desfaleceu no ônibus de Brixton. . .', não me interessa. 'Todo dia meu coração anseia. . .' Lamentações, Watson, lamentações infindáveis. Ah!, eis algo mais provável. Ouça isto: 'Tenha paciência. Encontrarei qualquer meio seguro de comunicação. Por enquanto, esta coluna. — G.' Este anúncio foi publicado dois dias depois da chegada do inquilino da sra. Warren. Não parece plausível? O nosso ente misterioso podia entender inglês, apesar de só saber escrever em letra de forma. Vamos ver se encontramos mais alguma coisa. Sim, aqui está... três dias mais tarde: 'Estou tomando providências. Paciência e cautela. As nuvens passarão. — G.' Uma semana em branco depois desse aviso. Vem em seguida algo mais definido: 'O caminho está se tornando mais claro. Se me for possível escrever em código, lembre-se do combinado: um, a; dois, B; e assim por diante. Terá notícias em breve. — G.' Isso veio no jornal de ontem; o de hoje não traz nada. Parece-me muito apropriado ao pensionista da sra. Warren. Se esperarmos um pouco, Watson, creio que o caso se tornará mais inteligível."
Aqui a pretensa tradução em nome de Alex Marins:

— Sem dúvida, a linha de investigação a seguir apresenta-se-nos bastante clara — disse meu amigo, apanhando da estante um grosso álbum, no qual colava, diariamente, a seção dos principais jornais londrinos reservada a avisos de pessoas desaparecidas. Deus meu!, exclamou, folheando-lhe as páginas. Que coro de gemidos, choros e lamentações! Que amontoado de acontecimentos estranhos! Todavia, é sem dúvida o campo mais precioso que jamais houve para quem se dedica ao estudo dos fatos extraordinários! A pessoa que nos interessa encontra-se só, e não pode receber cartas sem quebra do absoluto sigilo que as circunstâncias lhe impõem. Como pode chegar até ela uma notícia ou qualquer recado do mundo exterior? Ao certo, por meio de um aviso publicado em jornal. Não parece haver outra solução e, felizmente, já sabemos qual é esse jornal. Aqui estão os recortes do Daily Gazette dos últimos quinze dias: "Senhora com um boá preto no Prince's Skating Club..." — podemos passar adiante. "Certamente Jimmy não quererá despedaçar o coração de sua mãe. . ." — isso parece não ter importância. "Se a dama que desfaleceu no ônibus de Brixton. . ." — não me interessa. "Todo dia meu coração anseia,. . ." Lamentações, Watson, lamentações infindáveis. Ah! Eis algo mais provável. Ouça isto: "Tenha paciência. Encontrarei algum meio seguro de comunicação. Por enquanto, esta coluna. — G." Este anúncio foi publicado dois dias após a chegada do inquilino da sra. Warren. Não parece plausível? O nosso ente misterioso poderia entender inglês, apesar de não sabê-lo escrever senão em letra de forma. Vamos ver se encontramos mais alguma coisa. Sim, aqui está... três dias mais tarde: "Estou tomando providências. Paciência e cautela. As nuvens passarão. — G." Uma semana em branco depois deste aviso. Vem em seguida algo mais definido: "O caminho está se tornando mais claro. Se me for possível escrever em código, lembre-se do combinado: um, A; dois, B; e assim por diante. Terá notícias em breve. — G." Isto veio no jornal de ontem; o de hoje não traz nada. Tudo isso me parece muito apropriado ao pensionista da sra. Warren. Se esperarmos um pouco, Watson, creio que o caso se tornará mais claro.
Apenas a rápida ilustração de algumas coincidências desde as primeiras linhas, as quais seriam impossíveis se se tratasse de duas traduções independentes:

Well, Mrs. Warren: Com franqueza, sra.Warren (A.P.A); Com franqueza, sra. Warren ("A.M.").
But the landlady had the pertinacity and also the cunning of her sex. She held her ground firmly: Mas a senhoria tinha a pertinácia e também a astúcia característica de seu sexo e não se deu por vencida (A.P.A); Mas a hospedeira tinha a pertinácia e também a astúcia característica de seu sexo e não se deu por vencida ("A.M.").
The scared look faded from her eyes, and her agitated features smoothed into their usual commonplace: Toda a expressão de temor desapareceu dos olhos dela, e as feições agitadas tranquilizaram-se e readquiriram a aparência normal (A.P.A.); Toda a expressão de temor desapareceu dos olhos dela e as feições agitadas tranquilizaram-se e readquiriram a aparência normal ("A.M.").
There seems no other way, and fortunately we need concern ourselves with the one paper only: Não parece haver outra solução, e felizmente já sabemos qual é esse jornal (A.P.A); Não parece haver outra solução e, felizmente, já sabemos qual é esse jornal ("A.M.").
Tradução de Álvaro Pinto de Aguiar aqui; original aqui.

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Published on November 19, 2011 06:04

November 18, 2011

quem dera fosse outro último adeus

Em 1955, como oitavo volume de sua série Sherlock Holmes, a Melhoramentos publicou O último adeus de Sherlock Holmes, na tradução de Álvaro Pinto de Aguiar.



  

Eis aqui um trecho da primeira história, "Vila Glicínia", parte 1, "A estranha aventura do sr. John Scott Eccles":
     O inspetor londrino acenou afirmativamente com a cabeça.

     — O bilhete está escrito em papel pautado comum, sem filigrana. É a quarta parte de uma folha, e foi cortado em dois sentidos com uma tesoura de lâmina curta. Foi dobrado três vezes e selado com lacre vermelho, colocado às pressas e comprimido com um objeto chato e oval. Está endereçado ao sr. Garcia, Vila Glicínia, e diz: "Nossas cores, verde e branco. Verde aberto, branco fechado. Escada principal, primeiro corredor, sétima à direita, estofo verde. Boa sorte. D." A letra é de mulher, e foi escrita com pena de ponta fina, mas o endereço foi feito com outra pena ou por outra pessoa. Como pode ver, trata-se de uma caligrafia mais grossa e firme.

     — O bilhete é deveras extraordinário — comentou Holmes, examinando o papel. — Devo cumprimentá-lo, sr. Baynes, pela atenção que dispensou aos pormenores na análise feita. Poderíamos talvez acrescentar algumas minudências sem importância. O sinete oval é, sem dúvida, uma abotoadura de punho; que outro objeto pode ter tal formato? A tesoura usada deve ter sido uma tesourinha de unha, de ponta recurva, pois, apesar de os cortes serem curtos, nota-se distintamente em cada um deles a mesma ligeira curvatura.

     O detetive deu uma risadinha.

     — Julguei ter espremido todo o suco desse bilhete, mas vejo que ainda sobrou alguma coisa — disse. — Confesso que não compreendo nada dele, a não ser que nos encontramos diante de um caso grave, cuja figura central, como de costume, é uma mulher.

     Durante essa conversa, Scott Eccles estivera em contínua agitação em sua cadeira.

     — Alegra-me que tenha encontrado o bilhete, pois ele vem corroborar meu depoimento — disse. — Tomo, porém, a liberdade de observar que ainda não me contaram o que aconteceu ao sr. Garcia e a seus criados.

     — Quanto a Garcia — disse Gregson —, é fácil responder. Foi encontrado morto esta manhã em Oxshott Common, a cerca de um quilômetro e meio de distância de sua casa. Reduziram-lhe a cabeça a um amontoado informe de carne sangrenta, mediante golpes violentíssimos desferidos com um saco de areia ou outro objeto semelhante, que, mais do que feri-lo, esmigalhou literalmente seu crânio. 
É uma tolice os "revisores" da Martin Claret tentarem maquiar esse texto, a fim de batizá-lo como uma nova tradução, agora em nome de "Alex Marins".

     O inspetor londrino balançou afirmativamente a cabeça.

     — O bilhete está escrito em papel pautado comum, sem filigrana. É a quarta parte de uma folha e foi cortada em dois com uma tesoura de lâmina curta. Foi dobrada três vezes e selada com lacre vermelho, colocado às pressas e comprimido com um objeto chato e oval. Está endereçado ao sr. Garcia, Vila Glicínia, e diz: "Nossas cores, verde e branco. Verde aberto, branco fechado. Escada principal, primeiro corredor, sétima à direita, estofo verde. Boa sorte. D." A letra é de mulher, e foi escrita com pena de ponta fina, mas o endereço ou foi feito com outra pena ou foi escrito por outra pessoa. Como pode ver, trata-se de caligrafia mais grossa e firme.

     — O bilhete é extraordinário, comentou Holmes, examinando o papel. Devo cumprimentá-lo, sr. Baynes, pela atenção que dispensou aos pormenores na análise feita. Poderíamos talvez acrescentar alguns detalhes sem importância. O sinete oval é, sem dúvida, uma abotoadura de punho; que outro objeto pode ter tal formato? A tesoura usada deve ter sido uma tesourinha de unhas, de ponta recurva, pois, apesar de os cortes serem bem curtos, nota-se distintamente em cada um deles a mesma ligeira curvatura.

     O detetive deu uma risadinha.

     — Julguei ter espremido todo o suco desse bilhete, mas vejo que ainda sobrou alguma coisa, disse. Confesso não compreender nada do seu conteúdo, a não ser que nos encontramos diante de um caso grave, cuja figura central, como de costume, é uma mulher.

     Durante essa conversa, Scott Eccles estivera em contínua agitação em sua cadeira.

     — Alegro-me de que tenha encontrado o bilhete, pois ele vem confirmar meu depoimento, disse. Tomo, porém, a liberdade de lhes fazer notar não me haverem ainda contado o que aconteceu ao sr. Garcia e aos seus criados.

     — Quanto a Garcia, falou Gregson, é fácil responder. Foi encontrado morto esta manhã em Oxshott Common, a cerca de uma milha de distância de sua casa. Reduziram-lhe a cabeça a um amontoado informe de carne sangrenta, mediante golpes violentíssimos desferidos com um saco de areia ou outro objeto semelhante, que, mais do que feri-lo, esmigalhou-lhe o crânio. 
Digo que é uma tolice tentar maquiar, pois a quem se pretende enganar quando se troca, por exemplo:



"O inspetor londrino acenou afirmativamente com a cabeça" por "O inspetor londrino balançou afirmativamente a cabeça", sendo que o original é um simples "The Londoner nodded"?
"Como pode ver, trata-se de uma caligrafia mais grossa e firme" por "Como pode ver, trata-se de caligrafia mais grossa e firme", sendo o original "It is thicker and bolder, as you see"?
Ou, fantasticamente, "Reduziram-lhe a cabeça a um amontoado informe de carne sangrenta, mediante golpes violentíssimos desferidos com um saco de areia ou outro objeto semelhante", absolutamente iguais, quando o original traz "His head had been smashed to pulp by heavy blows of a sandbag or some such instrument"?!! Em que, por um passe de mágica, "Alex Marins" reproduz letra por letra o "amontoado informe de carne sangrenta" que Álvaro Pinto de Aguiar usou  para um sintético pulp
Por fim, um exemplo de incompreensão ou forte alteração do original: para "there was something on hand, and that a woman, as usual was at the bottom of it", a solução de Álvaro Pinto de Aguiar, "nos encontramos diante de um caso grave, cuja figura central, como de costume, é uma mulher", é fielmente replicada na edição claretiana.


Os exemplos da vã tentativa de ocultar o surripio se contam às centenas. A tradução de Álvaro Pinto de Aguiar se encontra disponível aqui e o original aqui. A capa dessa edição da Martin Claret (2006), com pretensa tradução em nome de Alex Marins, é:



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Published on November 18, 2011 17:15

November 15, 2011

ismael

@casmurros, do blog casmurros, mencionou no twitter o começo de moby dick. adote-se a versão que se queira, "trate-me por ishmael", "chamem-me ismael", "chamai-me ismael", "meu nome é ismael"... call me ishmael é um dos inícios mais fabulosos e inesquecíveis da história da literatura!





imagem, aqui

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Published on November 15, 2011 18:49

ainda moby

sobre melville no brasil, indispensável o artigo da saudosa irene hirsch (docente, pesquisadora da história da tradução literária no brasil, autora da tradução de moby dick publicada pela cosac naify): "translations of herman melville in brazil", que saiu na revista crop, 6, 2001. disponível aqui.



algumas imagens gloriosas do moby dick de john huston, de 1956.

gregory peck no papel do capitão ahab

Video thumbnail. Click to playorson welles como padre mapple

Still shot from the movie: Moby Dick.

Moby Dick artwork

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Published on November 15, 2011 16:06

aniversário de moby dick

File:Moby-Dick FE title page.jpg

ontem moby dick, de herman melville, completou 160 anos de existência. vi a matéria de josélia aguiar com várias capas aqui e, seguindo sua ideia, fui atrás das capas das traduções publicadas no brasil.



a rigor, dispomos de três traduções integrais de moby dick entre nós: berenice xavier (1950), péricles eugênio da silva ramos (1972) e irene hirsch com alexandre barbosa de souza (2008). as demais são adaptações, e aí podem ser:

adaptações na própria hora de traduzir, caso de adalberto rochsteiner e monteiro lobato; 
adaptações usando alguma tradução já existente, caso de werner zotz ou carlos heitor cony, imagino; 
traduções de adaptações estrangeiras, caso de luísa baêta. 
seguem algumas capas, que cobrem todas as versões de moby dick que consegui localizar:



adapt. adalberto rochsteiner e monteiro lobato,cia. editora nacional, 1935 (aqui na coleção para todos)

trad. berenice xavier,josé olympio, 1950 (capa 1956)

[image error]trad. josé maria machado,clube do livro, vol. I, 1957*

idem, vol. II, 1957*

* sobre o caso das traduções de josé maria machado para o clube do livro, veja aqui



adapt. adalberto rochsteiner e monteiro lobato,cia. editora nacional, 4a. ed., 1957(aqui com gregory peck como o capitão ahab)

em gibi, ebal, 1958

adapt. difícil saber,gráfica record, 1962

adapt. difícil saber,melhoramentos, 1962

adapt. maria thereza cunha de giacomo,melhoramentos, 1964

adapt. carlos heitor cony,ediouro, 1970

trad. péricles eugênio da silva ramos,abril cultural, volume único, 1971

adapt. francisco manuel da rocha filho,abril cultural, 1972

trad. péricles eugênio da silva ramos,abril cultural, reed. em 2 vols., 1980

trad. berenice xavier,francisco alves, 1982

adapt. werner zotz,scipione, 1985

adapt. yone quartim,tempo cultural, 1989

adapt. difícil saber,abril jovem, gibi, 1990

adapt. carlos moraes,globo, 1995

adapt. luiz antonio aguiar,melhoramentos, 1997

trad. berenice xavier,biblioteca folha, 1998

trad. péricles eugênio da silva ramos,nova cultural, 2002

adapt. leonardo chianca,scipione, 2003

adapt. ana carolina v. rodriguez,rideel, 2004

adapt. adriana de oliveira e paola morsello,larousse, 2005

Clique para ampliar a capaadapt. fernando nuno,difusão cultural do livro, 2005

idem, em outra capa,pela coleção correndo mundo

adapt. monteiro lobato,cia. editora nacional, 2005

adapt. g. mccaughrean, trad. luísa baêta,ática, 2006

adapt. carlos heitor cony,ediouro, 2006

[image error]adapt. núria ochoa stevenson,altea, 2008

trad. irene hirsch e alexandre souza,cosac naify, 2008

Clique para ampliar a capaquadrinhos, cia. editora nacional, 2009

quadrinhos de sam ita,publifolha 2009

trad. berenice xavier,abril coleções, 2 vols., 2010



hors-concours:

sobre a edição espúria da martin claret, 2004,em nome de "alex marins", veja aqui.

sobre a edição espúria da cedic e germape, 2005,em nome de "leonor de medeiros", veja aqui.





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Published on November 15, 2011 12:18

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Denise Bottmann
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