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(...) Mas agora, em mim sobrava apenas o afeto, e todo pedido e espera de proteção desapareceram desse afeto, e pensava antes que, talvez, no futuro, era eu quem deveria protegê-la e defendê-la, pois minha mãe já estava muito velha, abatida e indefesa.

Recebi uma carta de minha mãe. Ela também estava assustada e não sabia como me ajudar. Então, pela primeira vez em minha vida pensei que não existia proteção possível para mim, que devia arranjar-me sozinha. Entendi que sempre trouxera comigo, no afeto que tinha por minha mãe, a sensação de que ela, nas desgraças, me protegeria e defenderia (...)

— Não vou lá. Não saberíamos mais o que dizer um ao outro.

Mas parecia ter-se tornado mais cauteloso em suas avaliações: ou, pelo menos, era mais cauteloso em suas simpatias, não
sujeito, como antigamente, a paixões repentinas.

...e as casas desabaram, as ruas se encheram de ruínas, de soldados e de fugitivos. E não havia mais ninguém que pudesse fingir que nada estava acontecendo, fechar os olhos e tapar os ouvidos, enfiar a cabeça embaixo do travesseiro, não havia. Na Itália, a guerra foi assim.

Nós achávamos que a guerra iria virar e revirar imediatamente a vida de todos. Durante anos, ao contrário, muita gente permaneceu sem ser incomodada em sua casa, continuando a fazer o que sempre fizera. De repente, quando cada um já achava que no fundo se livrara por pouco e não
haveria nenhum transtorno, nem casas destruídas, nem fugas ou perseguições, explodiram bombas e minas por toda parte...

e um pouco porque, tendo envelhecido, já tinha se conformado com o vazio que os filhos deixam quando se vão, e protegera e acolchoara sua vida de modo a não sentir tanto o choque dessa separação.

Jamais quis se casar porque jamais um homem pareceu-lhe coincidir com o ideal de homem que tinha e mantinha durante todo o tempo, um homem que não sabia descrever, mas cujos traços eram inconfundíveis em sua imaginação.

Daquela vida próxima, mas passada, ela guardava uma
lembrança ao mesmo tempo afetuosa e irônica, completamente desprovida de amargura ou de saudade. Tinha uma natureza indolente, confiante e serena.

Estava então com catorze anos: ou seja, uma idade em que a pessoa vai e vem, contínua e incessantemente, entre a maturidade e a infância.

A morte ficou, em meu pensamento, indissoluvelmente ligada àquela forma vestida de lã cinza, alegre, e que sempre, no verão, vinha nos visitar na montanha.

Eu também achava belíssimo o poema das pedras pretas; e morria de inveja por não o ter escrito. Era simples: prados verdes, pedras pretas, eu os tinha visto tantas vezes, na montanha. E não tivera a ideia de que se pudesse fazer alguma coisa com isso: eu os tinha olhado, e só. Então, os poemas eram assim: simples, feitos de nada; feitos das coisas que se olhavam.

- Saber eu sei, só não dá pra explicar.
- Adiantou nada.
- Assim, eu acho que é um negócio que a gente sabe quando vem, a força estranha chega e, pá!, a gente sente. Quando ela toma conta, a gente faz o que quer fazer por cima de pau e pedra, não tem cão que segure. Acho que vem de Deus.

- Tu sonha muito, Chico.
- Foi a morte que me ensinou. O tempo de sonhar é em cima da terra.

Nunca é como a lua, não pertence a ninguém.

Tratavam-se com um carinho natural, amor de gente simples, no olhar, no gesto, sem disfarces.

- Então antigamente é um tempo, avó?
- Antigamente é um lugar.
- Um lugar assim longe?
- Um lugar assim dentro.

mas sem tristeza, porque nem toda saudade é triste.

Pensava no oceano, nos desejos de antes, nos tempos de criança em que as esperanças eram vivas.

A música conseguia destrancar algum lugar no peito de Samuel, uma gaveta de sonhos antigos.

Nem Deus deve saber mais o que é pecado, homem, que dirá o padre.

Era tudo tão lindo que nem coube nos seus pequenos sonhos. Ela precisou aprender a sonhar mais.

Amava aquele homem, pelo que via e por tudo o que imaginava existir nele.

Riam das desgraças, suas e dos outros. Desgraça é tudo coisa de se rir.

Nutria apreço suficiente pela morte para não temê-la.

Essas frases são o nosso latim, o vocabulário de nossos tempos idos é como os hieróglifos dos egípcios ou dos assírio-babilônicos, o testemunho de um núcleo vital que deixou de existir, mas que sobrevive em seus textos, salvos da fúria das águas, da corrupção do tempo.

Acho que nestes meses temos rido do que éramos. Mas é falso. Continuamos sendo o que éramos. Agora entendemos tudo. Mas sabemos pouco. Sabemos menos que antes – isso é bom, disse eu, temeroso: é bom não saber, esperar apenas.

Não perguntávamos para saber, (...)
perguntávamos para preencher um vazio.

Não era minha. Sabia pouco, mas pelo menos sabia isto: que ninguém fala pelos outros. Que, mesmo que queiramos contar histórias alheias, terminamos sempre contando nossa própria história.

Porque já não podemos, já não sabemos falar sobre um filme ou sobre um livro; chegou o tempo em que não importam os filmes nem os romances e
sim o momento em que os vimos, os lemos: onde estávamos, o que fazíamos, quem éramos então.