Denise Bottmann's Blog, page 70

July 15, 2012

o "orfanato das letras"

uma vez eu conversava com um rapaz muito simpático, advogado do departamento jurídico da ediouro, sobre umas dúvidas que eu tinha sobre a titularidade dos direitos de algumas obras publicadas pela editora. foram devidamente esclarecidas, e aí a conversa passou para o drama das obras ditas órfãs, abandonadas ou negligenciadas.



meu ponto é, e sempre foi, que se utilizasse amplamente o que faculta a lei, a saber: que essas obras recebam efetivamente o estatuto de "órfãs" e ingressem em nosso patrimônio de domínio público, para acesso social livre. isso significaria não só o resgate de uma gigantesca produção bibliográfica que vem se perdendo irremediavelmente e em ritmo acelerado, como também a possibilidade de criação de bibliotecas digitais riquíssimas, de livre circulação.



já o advogado da ediouro argumentava que, pelo contrário, a guarda dos direitos patrimoniais dessas obras é que permitia a efetiva proteção delas. achei o argumento um tanto self-serving, como dizem, trocamos mais alguns pontos de vista, apresentamos mais algumas mútuas divergências e nos despedimos afavelmente.



essa conversa se deu alguns meses atrás, não recordo a data exata. ela me tem voltado à lembrança nas últimas semanas, diante de alguns casos que ando analisando, e sou obrigada a reconhecer que, em certo sentido, o rapaz tinha razão. se de um lado obra órfã vive em meio ao completo descaso social, por outro lado ela parece exalar algum tipo de feromônio editorial irresistível, que atrai iniciativas bucaneiras desenfreadas. estivessem ativas em algum catálogo, sem dúvida muitos saqueadores dessas obras abandonadas se sentiriam coibidos.



hoje até pensei em criar um "orfanato das letras", na melhor forma da lei, blindado contra os surtos persecutórios das abdrs da vida, um vasto repositório de acesso público composto exclusivamente de milhares dessas obras que, quando não estão largadas às traças, estão virando papa requentada em caldeirões editoriais embruxados de oportunismo.



imagem: aqui


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Published on July 15, 2012 20:00

que pouca vergonha






este caso é escandaloso: a apropriação e adulteração do poema uivo, a célebre tradução de claudio willer para howl, de allen ginsberg.



como diz willer: "Adulteração, portanto, além de plágio e contrafação. Um triplo desrespeito, a meus direitos, à obra que é título e tema do filme e ao espectador." tomo a liberdade de transcrever sua matéria:







« Allen Ginsberg, direitos autorais, profissionalismo e pirataria






15JUL

Allen Ginsberg, direitos autorais, profissionalismo e pirataria 2

Posted 15/07/2012 by claudiowiller in Notícias, Novidades e Agitações. Etiquetado:Allen GinsbergDireitos autorais.Deixe um comentário


Assisti, ontem à noite, sábado dia 14 no horário das 22 h, à exibição do filme Uivo (Howl) de Robert Epstein, com James Franco e Jon Hamm, pelo Max, canal 79 da Net. Assim como havia acontecido na Mostra de Cinema de São Paulo no final de 2010, é utilizada toda a minha tradução do extenso poema Uivo, de Allen Ginsberg – sem autorização, sem nunca haverem falado comigo e sem os créditos ou qualquer indicação de autoria da tradução. Há mais seis exibições programadas para este mês: próxima quarta-feira às 23 h, sexta-feira dia 20 às 23:55, e outras.

Comprova-se, portanto, o que eu havia denunciado neste blog, emhttp://claudiowiller.wordpress.com/2012/07/13/allen-ginsberg-direitos-autorais-profissionalismo-e-pirataria/ .

Há mais, porém. As legendas reproduzem inequivocamente a tradução publicada em Uivo e outros poemas, L&PM, adotando soluções que são pessoais, criação minha, desde a primeira frase, onde para I saw the best minds of my generation eu preferi Eu vi os expoentes da minha geração, e não “as melhores cabeças” ou “as melhores mentes”. No entanto, com algumas mudanças: um “caralho” da minha tradução tornou-se um “pênis”; “adoçaram as trepadas” virou “adoçaram as vaginas”; “deixaram-se enrabar” agora é “ofertaram seu ânus”.

Adulteração, portanto, além de plágio e contrafação. Um triplo desrespeito, a meus direitos, à obra que é título e tema do filme e ao espectador.

Legendar desse modo trai a intenção do filme. Uivo (Howl) de Robert Epstein é sobre o processo em 1956 contra a publicação de Howl and other poems, pela City Lights de Lawrence Ferlinghetti. Seu resultado foi, justamente, garantir a circulação de textos em linguagem direta, explícita. As legendas restauram os eufemismos, que Ginsberg critica expressamente na entrevista reproduzida no filme. Esse exibidor promove o culto à hipocrisia.

Normalmente, após a exibição na TV a cabo, vem o crédito da versão brasileira, algo como “Legendas Videolar” ou coisa parecida. Desta vez, nada. Nenhuma referência ou crédito. Fica-se sem saber a qual submundo da legendagem o exibidor/distribuidor recorreu. A julgar pelo modo como traduziram o restante, se não me houvessem pirateado, então o telespectador receberia uma versão do poema cheia de erros.

Isso acontece sempre. Há profusão de erros de tradução nas legendas de filmes que passam na TV. É desrespeito ao assinante, a quem paga – e paga caro – por tal serviço. Aliás, uma concessão pública.

Podia ser pior: o filme passar dublado, e não legendado. É como procedem outras emissoras, para atender, ao que parece, a uma crescente legião de analfabetos monoglotas, em detrimento da informação. Não haveria, então, como conferir.

Enfim, são múltiplas as razões para promover escândalo, além das demais providências que for possível tomar. Não se trata apenas dos meus direitos morais, mas de um desrespeito ao assinante da TV , que paga (bem mais que em outros países) por um serviço precário em sua infraestrutura (falhas na transmissão, confusões na programação, isso acontece a toda hora) e no conteúdo, sistematicamente adulterado.

http://claudiowiller.wordpress.com/2012/07/15/allen-ginsberg-direitos-autorais-profissionalismo-e-pirataria-2/





agradeço a vera helena pelo toque, deixado em comentário aqui.



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Published on July 15, 2012 11:39

July 12, 2012

a situação da classe trabalhadora na inglaterra

na longa conversa que mantive com a editora-adjunta da boitempo, na semana passada, manifestei minha curiosidade sobre o nome de bernhardt a. schumann, que consta nos créditos de tradução de sua edição d'a situação da classe trabalhadora na inglaterra, de engels.







Título: A situação da classe trabalhadora na Inglaterra
Título Original: Die Lage der Arbeitenden Klasse in England
Subtítulo: segundo as observações do autor e fontes autênticas
Autor(a): Friedrich Engels
Prefácio: José Paulo Netto
Tradutor(a): B. A. Schumann
Páginas: 384
Ano de publicação: 2008
ISBN: 978-85-7559-104-8











ISBN: 978-85-7559-197-0
TÍTULO: A situação da classe trabalhadora na Inglaterra: Segundo as observações do autor e fontes autênticas
SÉRIE: Marx e Engels
AUTOR: Friedrich Engels
ORGANIZADOR: José Paulo Netto (supervisão)
TRADUTOR: Bernhardt A. Schumann
EDIÇÃO: 1
ANO DE EDIÇÃO: 2011
LOCAL DE EDIÇÃO: SÃO PAULO
TIPO DE SUPORTE: E-BOOK
PÁGINAS: NÃO INFORMADO
EDITORA: BOITEMPO EDITORIAL








o esclarecimento da editora foi o seguinte:


A situação da classe trabalhadora na Inglaterra: a tradução da Global era de José Paulo Netto, e foi com base nessa tradução que publicamos a nossa. Porém, como a tradução de José Paulo não tinha sido feita diretamente do alemão, ele pediu ajuda a um aluno que conhecia bem o idioma para fazer a nova edição, para a Boitempo. Como esse aluno fez o trabalho sob a orientação do professor José Paulo, ele próprio optou por ter seu nome nos créditos na forma de um pseudônimo, pois acredita que não teria feito a tradução sozinho e porque o texto final, revisado, é do próprio José Paulo. Enfim, uma escolha pessoal, passada à editora pelo professor José Paulo. Se há semelhanças entre a primeira tradução, do José Paulo, e a segunda, coordenada pelo José Paulo, não é de se estranhar.

na verdade, eu comentara apenas minha curiosidade sobre "bernhardt a. schumann" - afinal, um pseudônimo -, mas a editora considerou por bem já adiantar explicações sobre eventuais semelhanças que se poderiam encontrar em algum eventual cotejo que se fizesse entre as duas edições, a da global de 1985 e a da boitempo de 2008.



no entanto, o esclarecimento da boitempo me deixou um tanto confusa, visto que a situação da classe trabalhadora pela global, pelo que eu sempre soube, tinha sido traduzida não por josé paulo netto, o qual assinava apenas o prólogo, e sim por rosa camargo artigas (filha de vilanova artigas) e reginaldo forti.




foi uma edição que ficou bastante famosa na época, e tinha um trabalho muito bonito e meticuloso também na parte das notas. como se explicava logo no início: "As notas da presente edição quando seguidas de (F.E.) são de Friedrich Engels. As que vêm seguidas de (N.T.) são dos tradutores desta edição, Rosa Camargo Artigas e Reginaldo Forti; e, finalmente, as demais foram extraídas da edição francesa - Editions Sociales, Paris, 1973 -, cuja tradução é de Gilbert Badia e Jean Fréderic, assim como a Lista de fontes citadas por Engels e o Índice onomástico" (p. 5).



Clique para ampliar a capa





bom, seja como for, tal foi a explicação da boitempo para aquele "b. a. schumann" de sua edição.


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Published on July 12, 2012 06:09

July 11, 2012

TRAÇAS S/A: Blogs

TRAÇAS S/A



TRAÇAS S/A: Blogs: Os blogs da tradutora Denise Bottmann são muito inspiradores. São bem feitos. Dá vontade de replicar (claro, do meu jeito). Ela tem um blog f...



nada como um afago assim num dilúvio de quarenta e oito horas de chuvas torrenciais.
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Published on July 11, 2012 18:36

July 10, 2012

o pós-tradução







depois de terminar sua tradução, o tradutor envia o material à editora. então se inicia o processo pós-tradutório, com várias etapas, desde o cotejo da tradução com o original até a "caça aos sacis" (errinhos que ficam pulando e aparecendo onde menos se espera, muitas vezes escapando a todas as fases de edição e indo assustar o leitor), passando por ajustes de estilo e linguagem. os copidesques, preparadores, revisores, formam o batalhão praticamente invisível e absolutamente indispensável que dá a forma final ao texto que será publicado. 


muito divertido e realista é o artigo que a assistente editorial cindy leopoldo publicou certa vez sobre o nobre e inglório copidesque. transcrevo os trechos onde a articulista define as funções do chamado "copidesque":


- A preparação, frequentemente utilizada para livros nacionais, pode consistir em “deixar o texto com cara de livro” (por exemplo, dividir em capítulos, retirar ou criar notas, colocar o texto com vocabulário e estrutura mais próximos do jornal do que do texto acadêmico ou do post de blogue etc.);

- A revisão de tradução costuma ser “uma melhorada na tradução” (por exemplo, cotejar linha por linha o texto em português com o original, traduzir novamente os trechos sem sentido ou distantes da estrutura do português, traduzir o que o tradutor não traduziu etc.);

- A edição de texto pode ser para “focalizar o texto” (por exemplo, definir uma ou mais gramáticas e acordar o texto a elas, esclarecer ambiguidades etc.);

- A revisão geralmente significa “não mexer muito no texto, dar uma olhada geral pra ver se passou algum erro de digitação” (por exemplo, buscar pastéis, padronizar disposição do texto, conferir peso dos títulos, rever cabeços etc.). Dentro deste item, surgiu recentemente a “revisão de reforma”, que é “exclusivamente” para adequar o texto à reforma ortográfica atual.

a íntegra do artigo de cindy leopoldo está aqui.





voltando a meu tema anterior, por mais que eu me solidarize com os copidesques (ofício que exerci com muito orgulho durante algum tempo) e por maior que seja a importância dessa atividade, não se deve confundi-la com um trabalho autoral: ela se aplica a um texto já dado, não à criação de um novo texto. 




imagem: aqui


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Published on July 10, 2012 17:45

tradução como obra protegida

a referência para a definição jurídica da tradução como obra portadora de direitos autorais é a lei 9610/98. em que pesem vários problemas seus, está em vigência no país desde 1998. abaixo destaco alguns itens que me parecem mais relevantes para se entender no que consiste a proteção legal da obra de tradução.




Título I

Art. 3º Os direitos autorais reputam-se, para os efeitos legais, bens móveis.




Título II

Das Obras Intelectuais

Capítulo I

Das Obras Protegidas

Art. 7º São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como:

XI - as adaptações, traduções e outras transformações de obras originais, apresentadas como criação intelectual nova;

Capítulo II

Da Autoria das Obras Intelectuais

Art. 11. Autor é a pessoa física criadora de obra literária, artística ou científica.

Art. 15. § 1º Não se considera co-autor quem simplesmente auxiliou o autor na produção da obra literária, artística ou científica, revendo-a, atualizando-a, bem como fiscalizando ou dirigindo sua edição ou apresentação por qualquer meio.




Título III

Dos Direitos do Autor

Capítulo I

Disposições Preliminares

Art. 22. Pertencem ao autor os direitos morais e patrimoniais sobre a obra que criou.

Capítulo II

Dos Direitos Morais do Autor

Art. 24. São direitos morais do autor:

I - o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra;

IV - o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra;

V - o de modificar a obra, antes ou depois de utilizada;

VI - o de retirar de circulação a obra ou de suspender qualquer forma de utilização já autorizada, quando a circulação ou utilização implicarem afronta à sua reputação e imagem

Art. 27. Os direitos morais do autor são inalienáveis e irrenunciáveis.

Capítulo III

Dos Direitos Patrimoniais do Autor e de sua Duração

Art. 28. Cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica.

Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como:

I - a reprodução parcial ou integral;

II - a edição;

III - a adaptação, o arranjo musical e quaisquer outras transformações;

VIII - a utilização, direta ou indireta, da obra literária, artística ou científica, mediante:

IX - a inclusão em base de dados, o armazenamento em computador, a microfilmagem e as demais formas de arquivamento do gênero;

X - quaisquer outras modalidades de utilização existentes ou que venham a ser inventadas.

Art. 33. Ninguém pode reproduzir obra que não pertença ao domínio público, a pretexto de anotá-la, comentá-la ou melhorá-la, sem permissão do autor.




a íntegra da lei 9610/98 se encontra aqui



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Published on July 10, 2012 16:58

July 9, 2012

domínios de linguagem, réplica







clique aqui para ler.


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Published on July 09, 2012 16:13

July 4, 2012

inéditos e retraduções

em vista da boa vontade da boitempo em corrigir eventuais lapsos de informação aos leitores sobre suas edições, indiquei à sua editora-adjunta bibiana leme alguns pontos que mereceriam correção: ao contrário do que afirmava a boitempo em seu site, napoleão, de stendhal, o tacão de ferro, de jack london, e os deuses têm sede, de anatole france, não eram inéditos no brasil antes de sua publicação pela referida editora. o lapso já foi devidamente corrigido nas respectivas apresentações dos títulos, restando apenas uma matéria de terciane alves, reproduzida no site da editora, aqui.



é precisamente esta uma das principais preocupações deste meu trabalho de pesquisa sobre a história da tradução no brasil. temos uma bibliografia traduzida riquíssima; no entanto, devido a uma série de fatores - entre eles, nossa deficiente legislação sobre obras órfãs e abandonadas, que dificulta a liberação dessas obras para amplo acesso social -, é espantosa, confrangedora a quantidade de obras que se perdem nos desvãos da memória lítero-tradutória.



assim, por exemplo, desde 1945 dispomos da obra de anatole france, os deuses têm sede, em tradução de marina guaspari, com reedição em 1954, pela extinta editora vecchi:




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que bom, ótimo mesmo, que a boitempo lance uma tradução de les dieux ont soif, agora de daniela jinkings e cristina murachco:








só não dá para dizer que é a primeira. a propósito, na agência brasileira do isbn os créditos de tradução constam como:






PESQUISA NO CADASTRO DO ISBN





RESULTADO





Palavra Pesquisada:OS DEUSES TEM SEDE





ISBN: 85-7559-011-1
TÍTULO: OS DEUSES TEM SEDE
VOLUME DA COLEÇÃO: 000
AUTOR: FRANCE, ANOTOLE
TRADUTOR: CUPERTINO, MARIA CRISTINA
PÁGINAS: NÃO INFORMADO
EDITORA: BOITEMPO EDITORIAL





quanto a napoleão, de stendhal, tenho notícias de pelo menos uma tradução pela gráfica record, em 1969. encomendei o exemplar e darei maiores referências quando chegar.



quanto a o tacão de ferro,* ele contava com duas traduções entre nós antes do lançamento da boitempo. saiu inicialmente em 1947, pelas edições do povo, em tradução de sylvia león chalreo:








e em 1967 pela livraria exposição do livro, em tradução de guaraci edu:



Clique para ampliar a capa




saúdo, naturalmente, a nova tradução de afonso teixeira filho, apenas lembrando que não se tratava de obra inédita entre nós:








de qualquer forma, fico feliz que a editora tenha prontamente retificado essas falhas de informação.



* para as obras de jack london traduzidas no brasil, encontra-se um levantamento aqui.


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Published on July 04, 2012 13:01

refazendo traduções II

com autorização de bibiana leme, editora-adjunta da boitempo editorial, reproduzo abaixo seu email sobre a nova tradução de insurgent mexico, de john reed:


Cara Denise,



Em primeiro lugar, muito prazer. Sou leitora do seu blog e admiro sua batalha pela qualidade das traduções no Brasil e pelo respeito aos tradutores. Aqui na Boitempo a gente prima pelas boas traduções, tomamos o maior cuidado para trabalhar com profissionais gabaritados e temos o maior respeito pelo trabalho de cada um dos nossos colaboradores.



Hoje, porém, levamos todos um susto aqui ao ler o post sobre traduções “requentadas”. Explico como funcionou a tradução do México insurgente: quando pensamos em fazer nossa edição (por sugestão do Luiz Bernardo Pericás, que é especialista no assunto), fomos atrás em primeiro lugar da tradução da Mary Amazonas. Mas descobrimos que a tradução dela tinha por base a edição em espanhol, e em nossas traduções sempre tomamos por base o idioma original (que nesse caso era o inglês). Sendo assim, consultamos o Pericás sobre a possibilidade de ele fazer uma nova tradução, o que ele aceitou, mas não sem enfatizar que, apesar de ter por base no espanhol, a tradução da Mary era benfeita e merecia continuar “na ativa”. Concordamos e fomos atrás da Mary para perguntar se ela toparia que fosse feito um trabalho de retradução, mas mantendo como base a tradução dela. E ela topou, ficou inclusive emocionada, porque disse que essa tinha sido sua primeira tradução: “Foi bom rever esse livro, que foi o meu primeiro trabalho e que eu tinha perdido de vista. A primeira tradução a gente não esquece, como o soutien. Fica um laço afetivo. Na época, eu tinha vinte e três anos, veja só!  Estava entrando no curso de Letras na USP da Maria Antônia, pois, depois de cursar 2 anos de Filosofia, achei que meu interesse era por Literatura e Línguas. Então fiz vestibular e troquei de curso. Agradeço terem me procurado para essa tarefa, que foi um prazer.”.



Então, primeiro o Pericás retraduziu com base em dois textos, o dela e a edição original, em inglês. Pode parecer estranho dizer que ele retraduziu com base na tradução já existente, e você tem razão ao questionar se isso não seria uma “revisão da tradução”. Mas não achamos que seja o caso, pois de fato o Pericás mergulhou a fundo numa tradução, porém mantendo o respeito por determinadas escolhas da Mary. Quando você for ler a nossa edição, tenho certeza de que vai entender o que estou falando. Espero. Pode ser também que a gente não concorde e você continue achando que foi uma revisão da tradução, mas pra gente vai continuar sendo uma tradução a quatro mãos. Questões de interpretação... Voltando à dinâmica do trabalho, depois de terminada a parte do Pericás, a Mary recebeu todos os arquivos e fez as alterações e sugestões dela. Foi algo bem coparticipativo, portanto, e ao final o Pericás fez uma introdução, que a Mary também leu e aprovou. A relação com os dois tradutores foi ótima e guardo recordações excelentes desse trabalho.



Porém, você tem toda a razão ao dizer que no nosso site e na Biblioteca Nacional a informação está confusa. No nosso site já arrumamos, tinha sido erro/esquecimento mesmo. E para a Biblioteca Nacional já solicitamos hoje mesmo a alteração do cadastro. Enfim, erros acontecem e agradecemos muito a você pelo toque. Mas reforço mais uma vez que em todo o processo de edição desse livro ficou claro para todos os envolvidos que a tradução era a quatro mãos.

[...]



Obrigada mais uma vez pelas suas observações, que sempre são construtivas, e parabéns pelo trabalho.



Estou à disposição para continuarmos essa troca de ideias.



Um abraço.

http://img856.imageshack.us/img856/9830/logo16a.jpgBibiana Leme

Editora-adjunta











agradeço à boitempo pela presteza e boa vontade em comentar minhas observações, expostas aqui.


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Published on July 04, 2012 11:07

July 3, 2012

refazendo traduções

insurgent mexico, de john reed (1910), saiu no brasil com o título de méxico rebelde em 1959, numa tradução de mary amazonas leite de barros, pela editora zumbi.








em 1968, a civilização brasileira relançou a tradução de mary amazonas (que, aliás, foi uma das minhas primeiras chefes editoriais, lá na perspectiva, em 1971 ou 1972):



Clique para ampliar a capa




essa tradução teve algumas reedições e foi licenciada também para o círculo do livro (1981, 1982 e 1984):








quando eu li que a boitempo lançou, "com nova tradução, o depoimento mais importante sobre este momento decisivo da história latino-americana", achei interessante e aí vi que luiz bernardo pericás é "um dos tradutores desta versão, juntamente com mary amazonas barros" (aqui).





































confesso que, de início, o informativo me deixou confusa: afinal, o que significava? que a mary refez sua tradução cinquenta anos depois, agora a quatro mãos? que pericás fez uma tradução nova e juntou com a antiga da mary? mas como? e aí nem seria nova: seria, sei lá, mezzo a mezzo? ou que pericás tomou como base o texto da mary, cotejou, copidescou, corrigiu alguma coisa? mas aí muito menos seria uma "nova tradução": seria um licenciamento de uma tradução antiga, e pericás nem poderia aparecer como tradutor; seria no máximo algo como "tradução de fulano, revista [ou atualizada] por beltrano". 



o que também me confundiu um pouco foi que, na chamada principal do site da boitempo, os créditos de tradução vinham apenas em nome de luiz bernardo pericás. o nome de mary amazonas de barros aparecia no texto de apresentação e na ficha técnica ao final.



uma pesquisa nos cadastros do isbn não me esclareceu muito:




PESQUISA NO CADASTRO DO ISBN





RESULTADO





Palavra Pesquisada:México insurgente





ISBN: 978-85-7559-154-3
TÍTULO: México insurgente
AUTOR: John Reed
AUTOR: Luíz Bernardo Pericás
EDIÇÃO: 1
ANO DE EDIÇÃO: 2010
LOCAL DE EDIÇÃO: SÃO PAULO
TIPO DE SUPORTE: PAPEL
PÁGINAS: 380
EDITORA: BOITEMPO EDITORIAL



de qualquer forma, o blog da editora reiterava: "Desta vez, ganha nova edição e tradução o primeiro livro do jornalista John Reed: México Insurgente. Publicado pela primeira vez em português em 1959, sob título de México Rebelde [...]" (aqui); e sérgio augusto saudou no estadão: "A editora Boitempo [lançou] há dias uma nova e caprichada tradução de México Insurgente" (aqui). 




bom, ao fim e ao cabo, concluí com meus botões que não seria tradução requentada, como dizem, e que uma editora como a boitempo não teria por que "dar um trato" numa tradução antiga e apresentá-la como se nova fosse, com duplos créditos numa espécie de anacrônica parceria. 



conto tudo isso porque acho extremamente instrutivo quando um tradutor refaz um trabalho anterior seu: boris schnaiderman, por exemplo, ou josé roberto o'shea, que refundiu e refez seu dublinenses de vinte anos atrás - a gente tem ocasião de acompanhar o amadurecimento trazido pela experiência e vale por uma bela aula. assim, no caso desta  nova tradução, vai ser muito legal comparar os dois textos da mary com meio século de distância entre eles - e com o detalhe adicional de ser agora a quatro mãos!


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Published on July 03, 2012 18:43

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Denise Bottmann
Denise Bottmann isn't a Goodreads Author (yet), but they do have a blog, so here are some recent posts imported from their feed.
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