Cristina Torrão's Blog, page 81
February 17, 2015
Quem é o mais medroso?
Imagem Daqui
O Carnaval alemão (sim, aqui também há Carnaval) destaca-se, não pelas suas sambistas, que não as há (coitaditas, não teriam a mínima hipótese, no meio da neve e de temperaturas negativas ou a rondar os zero graus), mas pelas piadas socio-políticas, muitas vezes, verdadeiramente satíricas. As línguas afiadas fazem-se notar, não só nos desfiles de carros alegóricos, mas também em festejos e eventos dentro de portas, em que humoristas têm a oportunidade de mostrar o que valem, perante assistências, por vezes, de alto nível, quando delas faz parte a nata política da nação, que aliás aceita as críticas com excelente desportivismo.
Este ano, como não podia deixar de ser, os humoristas dividiram-se entre aqueles que cederam ao terrorismo islâmico, argumentando que há um limite para a liberdade de imprensa, e aqueles que não se deixam intimidar.
A propósito disto, achei este cartoon muito significativo. Os desfiles do Carnaval de Colónia, os mais famosos, pautam-se, este ano, pelo cuidado. E, na pequena cidade de Braunschweig, houve um contratempo, no fim-de-semana, quando o desfile foi cancelado, à última da hora, por uma ameaça terrorista, que provou ser falsa.
No cartoon, alusivo ao Carnaval de Colónia, retrata-se uma disputa entre os medrosos. Vê-se alguém que segura o dístico Je suis vorsichtig - a palavra vorsichtig significa cuidadoso, ou cauteloso -, enquanto alguém reclama o título de mais medroso, afirmando: nós somos os mais cagarolas! Os de Braunschweig só cancelaram o seu cortejo para que soubéssemos da existência do dito.
Published on February 17, 2015 04:30
February 16, 2015
A Citação da Semana (48)
«De quem mais precisamos na vida é de alguém que nos leva a fazer aquilo de que somos capazes».
Ralph Waldo Emerson
Ralph Waldo Emerson
Published on February 16, 2015 02:04
February 13, 2015
Uma Outra Voz
Este foi o terceiro Prémio LeYa que li e, de longe, do qual
eu gostei mais. Lembrei-me muito de Alice Munro e é interessante constatar que
o anúncio da vencedora do Nobel se deu poucos dias antes deste LeYa.
Estou a comparar as duas escritoras, não tanto pelo estilo,
mas pela sua maneira de dar conta de um quotidiano que, muitas vezes, só à
superfície é inofensivo, ou não passível de ser contado. Na minha opinião,
qualquer vida é digna de ser contada, depende da maneira como se conta. Nesta
nossa ânsia de vivências e sentimentos cada vez mais sofisticados,
esquecemo-nos das pequenas coisas do dia-a-dia, cheias de significância. O
mérito de Gabriela Ruivo Trindade e de Alice Munro é, a meu ver, pegar nesses pormenores
e trazê-los à luz.
Não resisto a repetir o que escrevi na opinião a A
Vista de Castle Rock : «romancear as tragédias
da Humanidade, como o Holocausto, as guerras, as ditaduras, etc. é muito
importante (contra o esquecimento) e dá livros espetaculares. Mas não menos
importante é trazer para a luz os escombros do dia-a-dia: vitórias e derrotas,
ilusões e desilusões, surpresas e rotinas, conversas e silêncios, esperanças e
medos, etc». Compreendo que esta não seja a preferência de muita gente, mas
Gabriela Ruivo Trindade tocou, no meu caso, no ponto certo. Apaixonei-me por
este livro e largava-o sempre contrariada, quando me via obrigada a fazer uma
pausa na leitura.
A ação centra-se em Estremoz, contando a vida de uma família
(ou episódios dela) entre os fins do século XIX e 1978. Gabriela Ruivo Trindade
revela especial sensibilidade e capacidade de se colocar na pele de várias
pessoas. Aprecio muito esta qualidade num(a) escritor(a), pois cada um vê o
mundo com os seus próprios olhos. Particularmente interessante, achei as diferentes
perspetivas no relato do quotidiano de uma família, conforme se trate do filho,
ou da mãe. A autora é licenciada em psicologia, o que penso ter contribuído para essa
sua capacidade.
Gostei igualmente da transcrição das páginas de um diário
real, no fim.
Nota: a quem esteja interessado, a minha opinião sobre os
outros dois Prémios LeYa aqui
e aqui.
Published on February 13, 2015 03:47
February 12, 2015
Apresentação
Sessão de apresentação da obra Princípios do Socialismo à volta de Antero, de Francisco Castro Rego, em Coimbra.
E porque nesse dia se assinala o 50º aniversário do assassinato pela PIDE do General Humberto Delgado, será feita uma evocação a propósito.
Published on February 12, 2015 03:45
February 11, 2015
Os Segredos de Jacinta - Excertos (11)
Quando se soube que D. Mafalda tencionava
assistir à missa na Sé, foi grande a romaria que para lá se dirigiu. Em dias
desses, organizava-se uma ponte de barcas sobre o Douro, a fim de permitir o
acesso ao povo vindo de Gaia e dos povoados adjacentes, uma travessia perigosa,
sobretudo para velhos
e crianças, havendo
sempre vítimas a lamentar.
Naquele domingo cinzento de novembro, o grupo
do jogral Francisco Lopes de Braga foi autorizado a atravessar o Douro na
barcaça do alcaide Paio Guterres. Jacinta entrava, enfim, no burgo de que tanto
ouvira falar desde que nascera. Juntaram-se ao
povo que subia a longa escadaria incrustada na colina de granito e que, do
cais, dava acesso à Porta das Mentiras.
O burgo, em si, não era grande. As muralhas,
construídas em função da catedral e da paróquia que a rodeava, não chegavam a
ter uma milha de perímetro, devendo-se a riqueza e a fama do Porto à atividade
mercantil que se desenrolava nos cais das duas margens e que envolvia os
habitantes de uma vasta região.
Embrenharam-se no labirinto de ruelas e
vielas, com os seus cheiros a dejetos. Da Terra de Paiva, Jacinta conhecia os
odores da agricultura e dos animais, mas na fetidez própria dos aglomerados
urbanos imperavam os excrementos humanos e as águas inquinadas deitadas pelas janelas, ao grito de «água vai». Os detritos
acumulavam-se nas vielas, que só secavam completamente no estio. O povo não
tinha outro remédio senão enfiar os sapatos e os socos, ou mesmo os pés
descalços, na lama malcheirosa.
Não havia dificuldade em encontrar o caminho,
já que todos se dirigiam para o Largo da Sé, ansiosos por pousar os olhos na
donzela, vinda de uma distância que nenhum deles estava em condições de
calcular, a fim de contrair matrimónio com el-rei D. Afonso, tornando-se,
assim, na primeira rainha de Portugal, reino de cujas dimensões, aliás, também
ninguém fazia ideia.
Published on February 11, 2015 03:13
February 9, 2015
A Citação da Semana (47)
Published on February 09, 2015 02:01
February 8, 2015
Da nossa relação com os animais VII
Os animais domésticos são obrigados a viver num mundo que
criámos à nossa medida. Exigimos-lhes que se adaptem e, não contente com isso, muita
gente ainda os trata mal, ou sem dignidade e amor. Logo há quem lembre que a
vida é igualmente cruel, na Natureza. É verdade. Mas a Natureza rege-se pelas
suas próprias leis, sem que possamos intervir. Na nossa civilização é
diferente, porque se rege pelas nossas leis e está nas nossas mãos intervir. Os
animais de estimação transmitem-nos a sua confiança cega, um amor e uma
fidelidade puros, porque estão conscientes de que dependemos uns dos outros
para sobreviver. É, por isso, de uma grande crueldade trair essa confiança.
Published on February 08, 2015 03:36
February 6, 2015
Criminosos sem arrependimento
O comportamento criminoso é inato, ou aprende-se? Pode
qualquer pessoa transformar-se num assassino? Pode-se ver o “Mal” numa tomografia
do crânio de um criminoso? Foi a perguntas como estas que um documentário
do canal alemão 3Sat tentou responder, no passado dia 29 de janeiro.
O neurobiólogo Gerhard Roth, do Instituto de Pesquisa do
Cérebro de Bremen, compara tomografias dos crânios de assassinos com o de
pessoas “normais”. No cérebro em si, ele não constata qualquer diferença.
Porém, se são apresentadas aos examinandos imagens de pessoas a serem atacadas
ou molestadas, constata-se que, no caso dos criminosos, praticamente não se
regista atividade na parte cerebral responsável pela empatia, pela piedade ou
pela dor; nos cidadãos comuns, essas partes revelam-se então muito ativas.
Gerhard Roth afirma convictamente que vivências terríveis, na infância, são
responsáveis pelo comportamento criminoso, já que existem duas maneiras humanas
de reagir: ou se fica extremamente sensível a determinadas violências, ou se “desliga”
pura e simplesmente a região do cérebro responsável por certos sentimentos.
O neuropsicólogo Thomas Elbert, da Universidade de Constança,
envereda por um caminho semelhante, ao dizer que qualquer pessoa pode aprender
a ser um assassino. Há vários anos que ele trabalha, no Congo Leste, com jovens
que foram crianças-soldados, recolhidos em centros onde se tenta a sua
recuperação. Esses jovens não só assistiram a atrocidades, também as cometeram,
em idades ainda muito tenras. Confessam o prazer que sentiram, a vontade de
fazer mais e mais. Não são jovens particularmente escolhidos pelos seus maus instintos,
qualquer um pode ser transformado numa máquina assassina.
Uma outra psicóloga, cujo trabalho é traçar o retrato
psicológico de presos por violação, com ou sem assassínio, a fim de decidir
sobre a sua capacidade de culpa, lembra que, quando falamos de criminosos desse
tipo, os distanciamos de nós, como se eles fossem aliens. Não são aliens,
diz ela, são seres humanos, como qualquer um de nós. E é isso que assusta, digo eu.
A psicologia é uma ciência recente, com pouco mais de cem
anos de existência. As dúvidas ainda são muitas. Porém, à medida que se avança, os
especialistas parecem inclinar-se cada vez mais para a hipótese de o
comportamento criminoso ser «aprendido», com ou sem intenção. No caso das
crianças-soldados, é adquirido através de lavagens ao cérebro. Na nossa
sociedade, ele parece ter a ver com vivências da infância,
sofrimentos insuportáveis, que nem sempre são resultado de violência física, ou
traumas identificáveis. Também se pode exercer muita crueldade a uma criança,
desleixando-a, humilhando-a, depreciando-a ou subjugando-a para lá de todos os limites. O favorecimento exagerado de um irmão em relação a outro é também uma fonte de ódios e pode ter consequências trágicas. Que ninguém se
iluda: atos desses nunca ficam sem consequências!
Isto não é desculpa, não pode servir de desculpa, para
comportamentos inadmissíveis! A meu ver, porém, é motivo de esperança, na
medida em que será realmente evitável que alguém se transforme num assassino
sem piedade. Tenhamos fé na consciencialização de adultos com crianças a seu cargo!
Published on February 06, 2015 03:33
February 4, 2015
Os Segredos de Jacinta - Excertos (10)
No dia seguinte, no seu ócio, tornou a
recordar a bruxa e, num impulso, dirigiu-se ao local do casebre. Era um dia
cinzento, de fim de outubro, com vento e chuva miudinha. Jacinta aconchegava-se na capa escura, que a envolvia da
cabeça aos pés.
Chegada ao pequeno socalco, deu com o casebre
meio destruído. Do jardim, poucos vestígios havia,
por entre o matagal que tomara conta do recinto. Que diferença daquela tarde soalheira,
em que ela aspirara o aroma das flores e das ervas, ouvindo o zumbido das
abelhas…
Na esperança de recuperar um pouco
da felicidade que ali sentira, foi sentar-se sobre o banco corrido, que ainda lá estava, encostado ao que restava da parede. Fechou os olhos,
tentando sentir o conforto que lhe proporcionara a velha de corpo seco e face
cheia de rugas, onde brilhava um olhar compreensivo e inteligente.
Surpreendeu-se ao constatar como aquele
momento da sua vida possuía tanta importância. Sempre pensara que o passado
estivesse morto e enterrado e que não havia mister de o ressuscitar. Mas,
sabia-o agora, o que se vive jamais desaparece. É pura ilusão crer que se podem
olvidar os piores momentos, ou, pelo menos, ignorá-los, fazendo de conta que
não existiram.
«Somos o nosso passado», murmurou, para si
própria, como numa prece. «Só o passado nos pertence. Quiçá nem exista aquilo a
que chamamos presente, apenas passado… E devir. Mas o devir ainda não somos».
Recordou como fora feliz no mosteiro. Os
enfermos olhavam-na com carinho e gratidão, alguns até chegavam a apelidá-la de
santa… Como o atributo da santidade e o cair em desgraça andavam lado a lado…
Pensou na gémea e desatou a chorar,
encolhida, naquele banco encostado ao casebre abandonado, embrulhada na sua
capa escura, debaixo da chuva miudinha, tão leve, que vagueava pelo ar, mudando
constantemente de direção. Como a sua vida. Sentiu-se uma daquelas gotículas,
sujeita aos caprichos do ar que a envolvia…
Hoje, uma santa. Amanhã, uma meretriz…
«Somos aquilo que os outros pensam de nós. Será
mesmo Deus que nos traça o destino, ao mais ínfimo pormenor? Ou tudo não
passará dos acasos da vida, da fortuna, dos azares?»
Gotas de chuva, a vaguear, ao sabor do vento…
Published on February 04, 2015 04:27
February 2, 2015
A Citação da Semana (46)
Published on February 02, 2015 02:58


