Cristina Torrão's Blog, page 70

October 6, 2015

Estudem História!


Resultados Eleitorais 2015





E agora, atentemos ao início da obra Identificação de um País - Ensaio sobre as origens de Portugal, do Professor José Mattoso (5ª edição, 1995, editorial Estampa):



«A população portuguesa que olha com curiosidade os mapas publicados pelos jornais depois de cada acto eleitoral já se habituou a verificar, sem surpresa, a repartição dos votantes em dois grandes blocos, cujas fronteiras coincidem, "grosso modo", com a divisória estabelecida pelas montanhas que prolongam o Sistema Central. De tal modo se considerou esta repartição um dado adquirido que as perdas e ganhos dos partidos ganham relevo especial conforme se situam a norte ou a sul daquela fronteira.

Este facto vem projectar na vida quotidiana dos Portugueses uma das manifestações mais salientes da permanência de estruturas seculares, cuja longa duração a História permite descobrir nas suas inúmeras manifestações e modalidades. O estudo das suas formas no passado ajuda, sem dúvida, a compreender o funcionamento da complexa realidade em que estamos inseridos...».



Nota: a obra foi reeditada este ano, pela Temas e Debates. Aproveitem!










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Published on October 06, 2015 11:39

October 5, 2015

A Citação da Semana (81)

«O sossego não se encontra no cimo da montanha, o ruído não se encontra nos mercados citadinos, ambos se encontram no coração de cada um».



Da Índia




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Published on October 05, 2015 03:22

October 1, 2015

A propósito de eleições...







Daqui




           

            Para
a Verónica, o primeiro acontecimento relacionado com a revolução digno de nota foram
as eleições para a Assembleia Constituinte, as primeiras totalmente livres em
Portugal, onde puderam votar todos os cidadãos maiores de idade, homens e
mulheres. Oportunamente marcadas para 25 de abril de 1975, foram intensamente
vividas, a abstenção não chegou a atingir os 10%.

A Verónica acompanhou a mãe à assembleia de voto. A primeira
coisa que viu foi uma enorme fila, pela rua fora. Pessoas que já haviam
exercido o seu direito de voto, mas que ainda por ali se quedavam, conversavam
animadamente.

A mãe da Verónica colocou-se no fim da fila, a filha a seu
lado. À medida que se iam aproximando do edifício, ouviam conversas ainda mais
excitadas. Começaram a ter a sensação de que, lá dentro, ralhavam uns com os
outros. Quando entraram, constataram que ninguém se entendia!

Os cadernos eleitorais eram folheados de trás para a frente e
da frente para trás, em grande azáfama. Pelos vistos, revelava-se difícil
encontrar os nomes dos eleitores que se apresentavam. Por vezes, desesperados
pela procura infrutífera, os voluntários de serviço sentiam-se tentados a
entregar o boletim de voto ao eleitor, sem terem dado baixa do nome. Eram
travados pelo presidente da mesa, que gesticulava e berrava: «isto não pode ser
assim». Eleitores que já tinham votado surgiam com o boletim ainda aberto,
querendo metê-lo na urna, pelo que o homem alertava: «tem de o dobrar! Então? O
voto é secreto». Outros, vendo as cabines de voto ocupadas, tencionavam fazer a
sua cruz logo ali, em cima da mesa, e o homem via-se aflito para os pôr na
ordem. Ainda outros, indignados com os seus berros, berravam-lhe de volta. E havia
ainda quem lhe solicitasse: «Ó senhor, diga-me lá onde ponho a cruz para votar
na mãozinha dos socialistas!»









 O homem suava as estopinhas. E era um velho conhecido da
Verónica: o pai da morenita, o senhor magrinho, que tinha estado preso naquele
sítio onde lhe batiam e não lhe davam os óculos e que a Verónica sabia agora
ter-se tratado de um calabouço da PIDE.



Os ânimos estavam tão exaltados, que ela ficou com receio de que
aquilo desse para o torto, enquanto a mãe se via aflita para que lhe prestassem
atenção. Quando finalmente lhe passaram o boletim para as mãos, o pai da
morenita não deixou a filha ir para a cabine de voto com ela. A Verónica ficou
à espera que ela exercesse o seu direito cívico, impressionada com a aflição do
senhor, que não sabia para onde se virar. Estivera preso por pertencer ao
Partido Comunista, mas a democracia e a liberdade, naquele momento, também se
lhe revelavam complicadas. Pelo menos, ninguém lhe roubava os óculos, apesar de
a Verónica ter a impressão de que havia gente com vontade de lhe bater.

Eram as eleições à portuguesa. Premiaram o «socialismo à
portuguesa».











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Published on October 01, 2015 07:16

September 30, 2015

Portugal - a Flor e a Foice

















«Infelizmente, o mito imperial estava nos livros, ilustrado
com as caras barbudas e façanhudas de todos os descobridores, de todos os
heróis. E tão arreigado que, ao contrário do que se pode pensar, desde o início
até ao fim das hostilidades, a generalidade do povo português não foi contra a
guerra: foi a favor, iludida pela propaganda, pela própria ignorância,
traumatizada pelo receio de que, uma vez perdidas as colónias, ainda ficaria
mais pobre. O pré-mensal que os soldados recebiam, uns dez mil escudos, e que
em parte remetiam às famílias, parecia-lhes um passo largo a caminho da
abundância. Por isso nas igrejas se rezava e se pedia o que só aos santos se
pode pedir, o impossível, a saber: que a guerra continuasse e que os filhos não
morressem nem fossem feridos».

(Página 97)




Lúcido. Provocador. Divertido. Imprescindível.



Evito usar adjetivos em excesso, mas, neste caso, são estas
as quatro palavras que me ocorrem para caracterizar este livro.




É lúcido como só um livro escrito por alguém que mora no
estrangeiro pode ser. Só com a distância devida se consegue olhar com tanta
objetividade para os seus compatriotas e o seu país, desprovido de
"rodriguinhos". Portugal – A
Flor e a Foice
foi escrito em 1975, publicado, na altura, apenas na
Holanda, país onde vive José Rentes de Carvalho. A versão
portuguesa demorou quase quarenta anos a surgir: em 2014, por ocasião do 40º
aniversário da Revolução! Incompreensível.




É provocador e, por vezes, exagerado. Mas é um exagero
perfeitamente justificado, aquele tipo de exagero que nos ajuda a abrir os
olhos. Calculo, porém, que a crueza e a objetividade do escritor dificultem a leitura
a muitos portugueses. A mim, não. Adorei! Por igualmente viver no estrangeiro e
ter aprendido a olhar para o meu país sem as lentes afetivas que distorcem a
realidade?




É divertido, raramente me diverti tanto a ler um livro.
Podem chamar-lhe humor negro. Eu prefiro chamar-lhe ironia fina.




É imprescindível. Todos os portugueses deviam ler esta obra,
por muito que lhes custasse. Seria uma espécie de lavagem interior, um banho de
lucidez. Vêm-me à memória palavras do Ega, essa fascinante personagem de Eça,
n' Os Maias: «Sinto-me como se a
alma me tivesse caído a uma latrina! Preciso de um banho por dentro!»




Pois leiam este livro e purifiquem as vossas almas!




Aqui no blogue, não costumo dar estrelas aos livros que leio, ao contrário do que faço no Goodreads . Desta vez, abro uma exceção para dizer que este me merece cinco!




E aqui vai mais um cheirinho delicioso:








«Para eles [escritores] o povo era folclórico, estúpido,
pobre por culpa da sua própria ignorância. Quando se lêem os romances em que,
supostamente, o povo está presente, constata-se na generalidade este fenómeno
curioso: aquele povo não existe, é a imagem deformada obtida pelos escritores
que vão à província ver os camponeses como os curiosos vão a um jardim
zoológico ver os animais. A prova: na maioria, na grande maioria dos romances
portugueses, os personagens populares são postos a falar com empolamento
académico, ou então com a ênfase pesada dos maus dramas de teatro. Mais: aquela
linguagem não é a sua, autêntica e rude. Nada disso. É uma linguagem que o
escritor inventa, pedante, a mentir nos sentimentos e na sintaxe. A ponto que
com os romances portugueses sucede o seguinte: não parecem ter sido escritos
para serem lidos, ou com a intenção profunda de, ao agitar um problema da
sociedade, causarem uma mudança, ou corrigirem uma injustiça, mas simplesmente
para que o autor possa dar entrada naquele grupo de eleitos que se julga
diferente, e daí melhor».



(Página 134)





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Published on September 30, 2015 02:58

September 28, 2015

A Citação da Semana (80)

É o medo que nos torna agressivos. Quem nada teme, não acusa.



© C. Torrão
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Published on September 28, 2015 02:24

September 21, 2015

A Citação da Semana (79)

Corajoso não é aquele que ignora as suas fraquezas, escondendo-as sob uma capa de agressividade ou arrogância. Corajoso é aquele que não se envergonha das suas fraquezas e aprende a viver com elas.



© C. Torrão


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Published on September 21, 2015 02:21

September 16, 2015

Vida Canina







Observo-a
da varanda das traseiras. É de raça indefinida e não sei o nome dela. Nem
sequer sei se tem um nome. Pertence a uns vizinhos, mas não pode entrar no
apartamento deles, hábitos antigos, que não concebem um cão dentro de casa.
Vive e anda pelas hortas e terrenos que pertencem a essas mesmas pessoas, é
alimentada e tem um lugar abrigado para dormir.












Os
donos são idosos, reformados, e tratam frequentemente das suas hortas. Quando
aparecem, ela não cabe em si de alegria: corre, salta, dança. Por vezes,
fazem-lhe festas, principalmente, a dona. E é acarinhada pelos outros vizinhos
que têm igualmente um pedaço de horta.











No
mesmo prédio, vive um filho dos donos, com família. Outro dia, reparei que ela
corria ainda com mais alegria. Cedo descobri a razão: a neta da dona, de oito
ou nove anos, acompanhou a avó à horta e fez-lhe muitas festas. Ela não se
fartava delas, sempre pronta, sempre a abanar a cauda, cheia de expectativa, quando
a pequena se distraía com outra coisa, como que a dizer: «estou aqui, não me
esqueças! Quero mais, gosto tanto»!

Por
vezes, vagueia sozinha pelos campos, mais tristonha, o passo mais vagaroso,
mais pesado. À espera que venha alguém...














Tem
sentimentos, não há dúvida. E, no cômputo geral, fico com a sensação de que é
feliz. Porque tem liberdade e sabe onde pertence. Estes dois fatores são
essenciais a um cão. Sozinhos, ou presos, não têm hipótese de serem felizes. E
escusado será dizer que a combinação destas duas situações é o pior que pode
acontecer a estes seres, que nos idolatram, como se fôssemos deuses. Era tão bom
que ninguém abusasse dessa característica canina!





















 
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Published on September 16, 2015 02:48

September 14, 2015

A Citação da Semana (78)

«Solidão, recolhimento, sossego à minha volta e ocupação interior - é este o único estado em que eu ainda frutifico».



Friedrich Schiller




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Published on September 14, 2015 02:19

September 11, 2015

Pagar ou não pagar, eis a questão (a que nem eles sabem responder)



Os
portugueses não são preguiçosos, nem piegas, são até muito esforçados, e
possuem grande vontade de agradar. Aos de fora. Em relação aos seus
compatriotas, mostram pouca solidariedade. Além disso, ocupam grande parte do
seu tempo com coisas evitáveis. Esse é, no fundo, o grande problema do nosso
país: produtividade baixa devido à concentração de forças nas coisas erradas.
Senti-o na pele, num assunto que se arrastou durante ano e meio, consumindo esforços
e dinheiro desnecessários.





Em Abril
de 2014, recebi, da Segurança Social, uma Certidão de Dívida, já em processo de
execução, de quase seis mil euros, dizendo respeito a contribuições que não
teria pago, desde Janeiro de 2011. Ora, eu tinha, de facto, atividade
profissional aberta nas Finanças. No que respeitava ao período considerado,
porém, os meus ganhos tinham sido de 0,00 €. A editora em questão não avançou
com os pagamentos, eu nem sequer tenho qualquer informação sobre o número de
exemplares de minha autoria vendidos. Entreguei, todos os anos, pontualmente, a
minha declaração de IRS. Sem ganhos a declarar, nada a pagar, nada a receber.
Pensei que o assunto estava resolvido.



Enganei-me!
Quando recebi a Certidão de Dívida, reclamei, explicando a minha situação.
Recebi uma resposta que não me satisfez e tornei a reclamar, depois de
consultado o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de
Segurança Social em vigor, que diz expressamente ter a Segurança Social o dever
de contactar o cidadão contribuinte, depois de este ter declarado atividade
profissional nas Finanças, a fim de esclarecer a situação.





Andei
cerca de dois meses sem notícias. Quando as recebi, em fins de Agosto de 2014,
foram as piores possíveis: a dívida, diziam-me, persistia e davam-me um prazo
de dez dias para a pagar, ao fim do qual o processo seguiria «os ulteriores
termos de penhora». Foi grande a aflição. A dívida pagou-se, fez-se um pedido
para travar o processo de penhora. Apesar de achar me ter sido feito grande injustiça, não pude deixar de sentir alívio, pensando que o assunto estivesse resolvido.



Mais
uma vez me enganei! Recebi, em meados de Fevereiro de 2015, um despacho de um
Diretor (fico-me por aqui, no título), a deferir o pedido de isenção de
pagamentos da minha parte no período em questão, por baixo rendimento! Isto, em
resposta à minha reclamação de Junho de 2014. E cinco meses depois de eu ter
pago a “dívida”.



Tomei
providências no sentido de me ser devolvido o dinheiro. Ao fim de sete meses, ele
chegou enfim à minha conta! Apesar de demorada, a justiça acabou por se fazer (excluindo juros de mora, claro). Mas não queria
deixar de assinalar que vários funcionários da Segurança Social (só Deus sabe
quantos) estiveram ocupados, durante ano e meio, com um falso problema. Assim
se gastam recursos e tempo no nosso país.



 
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Published on September 11, 2015 12:47

September 7, 2015

A Citação da Semana (77)

Somos tão lestos a julgar, cada um convencido ser dono da moral absoluta, sem notar que, se assim fosse, este mundo seria o Paraíso e ninguém teria de morrer para o alcançar.










© 2015 C. Torrão





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Published on September 07, 2015 02:46