Marcelo Rubens Paiva's Blog, page 61

July 22, 2015

Pelo fim da lei de impedimento

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Costuma-se fazer piada de quem é torcedor eventual, desses só de Copa do Mundo, e não entende a regra do impedimento.


Na verdade, eles, os torcedores eventuais, que deveriam rir de nós.


A regra do impedimento é das coisas mais idiotas já criadas pelo homem.


Tão enraizada na nossa cultura que, ao invés de questionarmos, aperfeiçoamos o método de flagrar quem está impedido e qual bandeirinha errou ao marcar ou demarcar um impedimento.


Não “desinventamos” a lei do impedimento, inventamos o tira-teima, colocamos câmeras na linha da intermediária e comunicadores entre juízes e assistentes.


Se o objetivo do esporte é o gol, o impedimento o impede.


Como se, na Fórmula 1, um rebanho atravessasse a pista, no meio da corrida, para atrapalhar os corredores.


A regra do impedimento é tão estúpida que, se a bola veio da cobrança de um lateral, ela deixa de valer.


Por quê?


Quais privilégios obtiveram um lançamento com as mãos das linhas laterais do campo?


Também deixa de valer se a bola bater na trave.


Isto é inconstitucional, discriminatório, antidemocrático.


Já extinguiram a lei do sobre-passo, a paradinha no pênalti, o recuo de bola para o goleiro [que só pode seguir jogando com os pés].


Se discutimos hoje uma mudança geral no comando do futebol, que tal aproveitarmos o barco à deriva e extinguirmos a lei do impedimento, presente na Lei 11 do livro de Regras do Futebol?


Porém o direito não seria retroativo: não precisaríamos rever a Libertadores de 2013, em que o Corinthians foi assaltado pelo juiz paraguaio Carlos Amarilla [gol anulado de Romarinho contra o Boca] e milhares de outros jogos e campeonatos.


 


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A lei do impedimento foi regulamentada em 1863.


Dizia que um atacante teria que ter, pelo menos, quatro jogadores na sua frente, para impedir que ficasse na banheira esperando lançamentos.


Mas não é para impedi-lo que inventamos os zagueiros?


Em 1869, a quantidade de jogadores à frente do atacante passou de quatro para três.


Em 1925, como é hoje: a necessidade de jogadores em frente do atacante diminuiu de três para dois.


Em 1991, uma pequena modificação, na regra da “mesma linha”.


O atacante que estivesse na mesma distância da linha de fundo adversária que seu penúltimo adversário oponente estava impedido. Agora ele só estaria em posição irregular se estivesse mais próximo da linha.


Mas a polêmica está longe de acabar.


Lobby das emissoras e mesas-redondas, que, sem a lei do impedimento, e os erros dos juízes, teriam debates menos acalorados.

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Published on July 22, 2015 07:25

July 20, 2015

A vida – uma grande brincadeira

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A vida


Quando nasceu meu filho, alguém disse: “É o filé-mignon da vida.”


Mas ela fica cada dia mais caótica. Dizem que só “melhora”.


O que será “melhorar”?


Talvez nos acostumemos. Tomara. Minha mãe teve cinco! Passei a perdoá-la no que classifico como baixa participação na aflição afetiva dos filhos.


Amanhece.


Passo a viver com meu duplo: o eu e um outro, o eu e o papai. Ele não acordou. Nem dou a descarga. Não escovo os dentes. Ando pela casa lentamente em silêncio. Dizem que audição é o sentido mais aprimorado de um bebê. Me acostumei a andar como um gato, sem esbarrar em nada. Telefones no mudo. Computadores com alto-falantes em 0%.


Pressa. É a chance de tomarmos o café da manhã sem precisarmos reparti-lo com o pequeno e curioso sujeitinho que vive conosco há um ano e meio e, se dermos sorte, lermos o jornal de cabo a rabo. Artigos longos ficam para “quem sabe…”


Não demora. O pequeno cidadão sente o deslocamento de ar da casa. Acorda. Não posso reclamar. O filho que dorme antes dos pais e acorda depois começa a falar sozinho no berço, a cantar. E torço para ele continuar se entretendo. Dizem que melhora a concentração.


Então escuto: “Pá?” Depois vem a primeira palavra que aprendeu, por culpa minha, que sussurrava direto no seu ouvido, torcendo para ser a primeira palavra a aprender (e não deu outra): “Papá?” Interessante como a forma de me chamar é uma pergunta: “Pá pá?”. Por que quer saber se estou pela redondeza. E se sofisticou: “Pai?” E virou: “Papaiiii?”


Eu deveria ter ensinado: “Mamã”. Calma, um segundo. Corro pela casa. Xícaras, pratos, talheres, copos, telefones, mouses e teclados nos fundos das mesas. Celular fora do campo de visão. Controles remotos na gaveta. Portas da cozinha e banheiros fechadas. Eu não sabia que bebês curtiam molhar a mão em privadas. Todas elas agora têm lacre. Todas as gavetas têm lacre. Checar se todas estão lacradas.


“Papaiii!?” Já vai. Checar protetores nas tomadas, carregadores, espuma nas portas. Guardar pilhas e moedas. A paciência dele se esgota. Então tá… Abro a porta: bom-dia.


O quarto escurinho tem aquele cheiro de leite com pomada e sabonete neutro. Ele está em pé no berço e fica felicíssimo. Me mostra seu brinquedo, um boneco Piu-Piu gigante, quem tenho que cumprimentar, com quem ele dorme, que na verdade foi da minha mulher.


Abro a cortina blecaute. A luz o cega. Sinto aquele bafo matinal. Como uma pequena criatura pode ter já um bafo tão potente? Tem remela, cabelos amassados, olhos inchados. Acorda como qualquer adulto. A diferença é que acorda sempre num colossal bom-humor, como se a vida fosse a melhor coisa do mundo, uma eterna brincadeira, a descoberta constante, que ele adora.


Acender, apagar a luz e ligar um ventilador dão a sensação de êxtase pelo poder e controle de forças invisíveis. Mamadeira, ele aponta. Comer é crucial. Ele anda pela casa sugando. Estou lendo jornal. Ele aparece ao meu lado, arranca-o numa velocidade incrível e volta à mamadeira. Peço meu jornal de volta. É uma negociação educada. Ele devolve e some.


Estar quieto demais não é salvação, é problema. Alguém vai logo checar. O que ele está aprontando? Estar quieto é aprontar. Está bebendo shampoo, desenrolando papel higiênico, tirando livros da estante ou esvaziando a lixeira. “Não pode!” Chora.  


Estou no teclado, ele reaparece, aperta o enter, some meu texto da tela. Ele volta a mamar e some. Toca o telefone. Atendo. Ele reaparecer, puxa o telefone, que cai no chão. “Não pode!” Caiu a linha.


Ele cai no chão. Bateu a cabeça. Chora. É uma média de quatro tombos por dia. Fala pela casa: “Bru bur u”. “Tá pê-pê-pê”. Faz variações da palavra “meme”. Então vem: “Papai te? Papa i Uh, dei ber ti… Umaba tuiu”


“Sei”, repondo, enquanto trabalho. “Ti tá… ti tá… ti tá…”, começa a série de repetições. Respondo: “Jura?” “Sério?” “Nossa…” Gargalha. E passa a empurrar coisas pela casa. Me bloqueia com móveis: uma barricada. Tento tomar um café. Ninguém se lembra onde está a bandeja com as cápsulas, várias vezes derrubada por ele.


Meu celular, bobeei, sumiu. Estava carregando. Ele descobre a minha carteira, desmonta e espalha os cartões de crédito pela casa. Como ele descobriu que aquilo é tão importante para mim? Claro. Viu papaiiii sacá-la várias vezes e comprar coisas com aqueles cartões. Se é importante para o papaiii, é para ele.


E bacana é brincar com as coisas importantes do papai. Sumiu com meu mouse. Bobeei. Fico sem trabalhar até encontra-lo. Outro dia, o encontraram na cesta de roupa suja. Com tudo que é importante para o papai, ele some.


Vai para a escola, e sinto saudades. Esbarro em brinquedos que começam a tocar sozinhos. Tem um que faz “uiii!”. Tomo um baita susto e vejo um troço amarelo piscando no formato de um mini andador que ri de mim. Sem querer atropelo um ursinho que diz “barriga”, “você é meu amigo”, e pede “me dá um abraço”. Na pia, tem uma zebra, uma girava e um leão, todos de plástico do mesmo tamanho e vesgos.


O moleque volta animado: “Êeeeeeeee”. E cai no chão. Bate a cabeça. Chora. Vem a jornada de caça aos gatos. O mais velho, paciente, aceita a aproximação. O mais novo, adotado, cuja infância não sabemos por qual inferno passou, não quer saber.


Momento do cadê, “achô”, cadê, “achô”, que dura uns 20 minutos. Pelo corredor, costuma correr e gritar: “Êeeeeeeee”. Às vezes vou junto gritando o “Ê”. Quando vão banhá-lo, ele vem peladinho se mostrar. Faz xixi no chão. Só eu e ele achamos graça. Ele dança sobre o xixi. Só eu e ele rimos. Mostramos o umbigo um para o outro, o barrigão, batemos no barrigão. Ele escorrega no xixi, cai e chora.


Anoitece. Tentamos ver os telejornais. Ele desliga a TV, ligamos, desliga, ligamos, ele a tira da tomada, desistimos. Há meses não vemos telejornais.


Começa a coçar os olhinhos. Vamos nanar? Ele faz não com a cabeça. Levo para o berço. Fico ao seu lado no escuro. Ele sussurra: “Pá-pá… pá-pá…” Deita, fala um pouquinho, canta baixinho e sussurra: “Pá-pá…” Amanhã tem mais. Não é apenas o filé-mignon.


É o rebanho todo.


Passo à noite com saudades.


Na manhã seguinte, fico esperando ele acordar, para recomeçarmos a viver. Para acha-la uma grande brincadeira.


 

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Published on July 20, 2015 17:16

July 15, 2015

O amor sem metáforas

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Mulheres procuram homens, que procuram mulheres, que procuram outras mulheres.


Tantos se procuram.


Muitos, pela vida toda.


Alguns, em bares, festas e afins.


Agora, pelos aplicativos.


No passado recente, anunciavam em classificados de revistas e jornais.


O amor ideal podia estar escondido em anúncios que continham perfil resumido e exigências.


E clichês.


Procura-se a cara metade. A alma gêmea. A face da outra moeda. Procuro alguém sem vícios. Existe alguém sem vícios?


Alguns tinham as especificações de um consumidor exigente: “Procuro homem, entre 37 e 43 anos, moreno, 80 quilos, altura 1,80 m, olhos castanhos claros, que não beba, fume, que goste de viajar, saiba inglês, espanhol, tenha estabilidade financeira, more perto do metrô, prefira vinho tinto ao branco, sem filhos, para viver um grande amor”.


Os anúncios tinham códigos.


Não diziam “nada de negros ou mulatos”, mas “quero alguém de ascendência europeia”.


Não diziam “quero uma transa casual”, mas “estou aberta a aventuras”.


Ninguém era um canhão, por isso encalhei, mas “loira, olhos verdes, boca carnuda, seios grandes, bumbum avantajado”.


Ninguém era “gordinho, fora de forma, desculpe aí, exagerei neste inverno”, mas “meus amigos vivem dizendo que sou gostoso”.


Hoje, Tinder e outros aplicativos acabaram com as metáforas, as entrelinhas, a ilusão.


As fotos mostram logo: sou assim, like or not?


Match?


Bora lá?


Quer saber mais: são 5 fotos ao todo, mais acesso ao meu perfil do Face, com currículo, descrições, desejos, sonhos, gostos e até minha agenda de amigos.


Tem que mostrar o corpo todo, para evitar mal-entendidos.


Foto em praia é bem-vinda.


O relógio corre, as opções são milhares, que podem aumentar, se o usuário aumentar seu raio de ação.


O amor não necessita mais de metáforas, nem de serenatas ou poesia.


O sexo então…


 

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Published on July 15, 2015 08:43

July 13, 2015

Mais consideração por Plutão

 


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Daqui a algumas horas, a nave mais rápida já construída pelo homem passará a 58 mil km/h a míseros 7.800 milhas de Plutão (12.500 km).


Raspará pelo planeta que tem 5 luas já descobertas e mesmo assim foi rebaixado à categoria de planeta anão por astrônomos insensíveis e rigorosos, numa votação contestada.


A nave New Horizonts, do tamanho de um piano, levou 9 anos para chegar até lá.


Foi embalada por uma engenhosa rota que se utilizara da gravidade de planetas maiores, para acelerar.


O planeta descoberto em 1930 na verdade tem manchas vermelhas, descobriu a nave.


Manchas escuras e brilhantes estão lado a lado.


Na assembleia de agosto de 2006, meses depois da partida da nave, cientistas da International Astronomical Union em Praga votaram pelo rebaixamento do planeta vizinho ao cinturão de asteroides e pedregulhos e gelo, Kuiper Belt, que giram ao redor do Sistema Solar.


Tem até asteroide maior quer Plutão.


Segundo eles, para ser um planeta é preciso:


1. Ser redondo (ter gravidade)


2. Girar em torno do Sol


3. Não ter a rota modificada ou alterada se esbarrar ou passar perto de algo no seu caminho.


Plutão, 2/3 do tamanho da nossa Lua, perdeu no terceiro quesito.


E Netuno influencia a sua rota.


Acontece que, se colocarem a Terra na rota de Mercúrio, o pequeno planeta não passa.


E mesmo assim ele não foi rebaixado.


Se nos demos ao trabalho de ir até ele, numa viagem de US$ 400 milhões, não está na hora de recolocarmos no trono do nono planeta do Sistema Solar?

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Published on July 13, 2015 07:11

July 8, 2015

Uber x Táxi

Um serviço de rede bomba quando há carência dele- ou quando o que existe não atende exigências de um consumidor conectado.


Assim como o Facebook destronou o Orkut, e o Google o Yahoo, o Uber surgiu quando o serviço de táxi convencional não conseguiu suprir a demanda.


Especialmente em cidades onde o táxi deixa a desejar, como San Francisco e Paris.


No Brasil, a classe dos taxistas, que tem inúmeros privilégios [como não pagar IPVA, IPI, ser liberado do rodízio, andar em faixas de ônibus] e cria redes de monopólio de pontos em aeroportos, shoppings, chia com o aumento da carona compartilhada e paga.


Diz que recebe treinamento, o que motoristas do Uber não recebe.


Mentira.


Primeiro que muitas vezes quem está dirigindo não é o dono da licença.


E o treinamento é tosco.


Taxistas ingleses ficam 2 anos se preparando antes de irem para as ruas,


Precisam saber de cor o nome de milhares de ruas londrinas.


Aqui, muitos não conhecem as ruas, e a maioria se recusa a usar Wase, aplicativo para se desviar do trânsito, pois não quer aumento na conta do celular.


Uber não pode agir sem nenhuma regulamentação pública.


Mas, na conta do lápis, veja realmente quem paga impostos e decida:


 


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Published on July 08, 2015 08:07

July 7, 2015

Deputados chilenos aprovam uso e plantio maconha

Deputados chilenos aprovaram hoje em minutos a proposta que permite o uso da maconha e autoriza que cada chileno possa plantar até seis pés da erva para uso pessoal.


O placar pela descriminalização foi de 68 votos a favor, 39 contra (com cinco abstenções).


A matéria vai agora para análise da comissão de saúde do Senado.


O Chile entra na rota do Uruguai, que legalizou a maconha em 2013?


A matéria não contou com a aprovação do Executivo.

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Published on July 07, 2015 16:14

Passeando na Lua

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Não é plágio quando se dá o devido crédito.


É plágio quando se passa para a história como o inventor ou precursor de algo que já existia.


Michael Jackson surpreendeu o mundo na festa de 25 anos da MOTOWN (1983), gravadora que encabeçou a blackmusic americana,  transmitida ao vivo pela TV [inclusive para o Brasil].


A surpresa, sua dança, seus passos revolucionários e o moonwalk em Billy Jean levaram o público à catarse.


A pequena criança da banda Jackson 5 deixara o casulo, com a ajuda do “monstro” Quincy Jones, seu produtor.


O rei no pop era coroado.


Sempre se disse que Fred Astaire e James Brown era a inspiração.


Mas, espera lá.


Moowalk é passo de sapateado.


 



 


Bill Bailey encerrava suas performances com ele desde 1955.


 



 


Já a dança e o figurino…


Prepare-se. Veja de onde surgiram.


Aqui vai um trecho de Pequeno Príncipe, filme de 1974, baseado no best seller de Exúpery.


É do grande Bob Fosse, dos musicais Chicago, Cabare, All The Jazz, e a cena da música The Snake.


 



 


O moleque [Michael Jackson] era bom.


Mas, antes dele, muitos talentos romperam barreiras e saltaram por aí, como se caminhassem na lua.

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Published on July 07, 2015 07:55

July 6, 2015

O Estado que achaca


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O Estado que achaca:


Um Estado existe para servir aos que o compõem. O cidadão é o seu começo, meio e fim.


Quando o Estado começa a atormentar rotineiramente a vida da sua matéria-prima, é porque seu sistema de alternância autolimpante não tem efeito.


O voto, obrigatório, vira mera formalidade.


O Poder, atolado, renova-se sem sair do lugar. É escravo da máquina burocrática que se instalou há séculos, alimentada pela corrupção. O cidadão iludido por um sistema político ineficaz desconfia de ações de um governo que assaca, acua.


Não sabe mais se está sendo acolhido ou achacado.


E é incapaz de reverter os motores.


Em 1 de janeiro de 1999, tivemos que ir às pressas atrás de um kit de primeiros-socorros, valor médio de R$ 10, estojo fajuto com dois rolos de atadura, tesoura com ponta arredondada, dois pares de luvas de procedimento, esparadrapo, dois pacotes de gaze e bandagem de algodão, que pelo artigo 122 se tornara obrigatório na aprovação do Código de Trânsito Brasileiro. Multa de R$ 115 e mais cinco pontos no prontuário do motorista flagrado sem o kit.


Meses depois, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei prevendo o fim da sua obrigatoriedade, que podia causar sérios prejuízos se usado inadequadamente. Tarde demais: ela movimentara um comércio de cerca de R$ 270 milhões.


“A única razão da existência do kit é fomentar o lucro dos fabricantes dos materiais e equipamentos e dos revendedores. Os motoristas e a população nada têm a ganhar com a exigência dele”, afirmou o deputado Padre Roque (PT-PR), autor da revogação.


E janeiro de 2000, passei com toda família o Réveillon da virada do milênio em Angra, num inédito reencontro de irmãos, sobrinhos e cunhados que moram aqui e na Europa, brasileiros e estrangeiros, planejado com antecedência.


A foto com todos de branco foi tirada. A data merecia o encontro histórico. Deu tudo certo. Mas quase terminou em tragédia.


Eu, minha irmã mais velha e meu cunhado voltávamos juntos na minha van adaptada. É um carro feito em 1995 sob medida, com plataforma móvel, porta automática, que um tetraplégico não-completo, como eu, consegue dirigir.


Tínhamos três opções de caminho: Barra Mansa, Taubaté-Ubatuba e Tamoios.


Meu cunhado a dirigia, enquanto eu papeava com a irmã atrás. Decidimos pela Taubaté-Ubatuba. No pé da Serra, enchemos o tanque de 70 litros e começamos a subi-la, com aroma de gasolina ainda entre nós. É das estradas mais lindas e íngremes que cruzam a Serra do Mar, com poucos pontos de ultrapassagem, que exige perícia e potência do motor. O câmbio automático trabalhava. O seis cilindros rangiam. Até uma fumaça branca começar a entrar pelos dutos de ar. A van parou de funcionar num trecho sem acostamento. Meu cunhado disse: “Não anda mais.” Uma fila de carros se formou atrás.


Um carro nos ultrapassou velozmente, parou numa distância prudente à nossa frente. O passageiro saltou e nos acenou com os braços. Ele está tentando nos dizer algo. Meu cunhado abriu a janela calmamente. “Pulem! Está pegando fogo embaixo do carro!”, gritava.


Consegui orientar didaticamente o meu cunhado: “Coloque o câmbio do PARK, desligue o motor. Pegue o extintor aí na porta, apague o fogo, enquanto opero a plataforma elétrica.”


Ele desceu do carro. Era uma operação cheia de botões, comandos e relês: abrir a porta, estender a plataforma, me encaixar nela e descer. Com o motor ligado, não desceria. Sem bateria, não funcionaria. Consegui. Me afastei do carro seguido pela minha irmã. Vi meu cunhado sob ele. Vi as labaredas. Ele mirava o jato de espuma no fogo. Uma mancha de óleo fluía no asfalto. Estourara a caixa de câmbio. O óleo escorreu pelo cano de escapamento fumegante e pegou fogo. Ele conseguiu apagar antes do fogo chegar no tanque de combustível. Seria uma explosão pra lá de Bagdá.


Graças a um equipamento do tamanho de uma berinjela, que se compra em qualquer posto de gasolina por R$ 50, estamos vivos. E mais. Meu carro, que não existe similar nacional, e importei quando o dólar valia R$ 0,80, está comigo até hoje.


Então eu soube que meu anjo da guarda agora é considerado obsoleto. Todos os veículos em circulação no país devem possuir a partir deste mês um novo tipo de extintor, o ABC, capaz de apagar incêndios de uma variedade maior de materiais (em madeira e tecidos, materiais comuns em carros). A medida faz parte da resolução 333 do Conselho Nacional de Trânsito. Chegou a ser derrubada por uma liminar e voltou a vigorar.


Até então, os extintores do tipo BC, como o meu, eram recomendados apenas para materiais como líquidos inflamáveis e equipamentos elétricos. Quem rodar com o extintor fora das especificações está sujeito a multa de R$ 127,69 e a inclusão de cinco pontos na carteira. Os teóricos da conspiração têm todo o direito de dizer: “Aí tem…”


Tais normas não aparecem da noite pro dia. Técnicos de agências oficiais garantem estudos e pesquisas.


Mas sua implantação nos pega sempre de surpresa.


No Governo Lula, em duas canetadas, duas normas mudaram regras antigas e devem ter dado muito lucro a alguém ou alguns: a da tomada de três pinos (nada universal) e a reforma ortográfica, que tirou uns hifens de um lugar e colocou em outros, extinguiu uns acentos precisos, como de “pára”, mas deixou outros, obrigando a indústria editorial a se reformular.


Alguns pensaram em quem faturaria com novos adaptadores, que tornaram todas as instalações elétricas obsoletas, e no faturamento de parques gráficos e vendedores de papel.


Anos atrás, fomos obrigados a regular os motores para a inspeção veicular anual, medida ambientalmente justa, mas que está suspensa pela própria Prefeitura.


Nesta semana, outra novidade: toda empresa (exceto as cadastradas no Simples) é obrigada a ter certificado digital, o e-CNPJ, que custa em torno de R$ 500, para emitir notas fiscais. Não existe opção de quem não quer ser digital.


É obrigatório, a obrigatoriedade, a partir de tal data, a regra, a norma, tem quê!


Um Estado que viveu quase 400 sob regras monárquicas, custa a debater seus problemas e conflitos republicanamente com seus cidadãos.


Somos todos tutelados que precisamos de!

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Published on July 06, 2015 08:34

July 2, 2015

O sensacional desabafo de Zeca Camargo

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Zeca Camargo é um jornalista cultural de primeira linha.


Passou por grandes órgãos, foi editor da Capricho, Ilustrada, passou pela TV Cultura, esteve no começo da MTV e foi para a Rede Globo.


Entende de músicas como poucos. Seu blog no G1 é referência, denso, robusto e preciso.


Sua presença no Fantástico, como no quadro Medida Certa, era um desperdício. Merecia mais.


Não emplacou como apresentador do Vídeo Show.


Mas emplacou uma “coluna” sensacional no JORNAL DAS DEZ, da Globo News, que deu no que falar e foi insanamente atacada dentro e fora da emissora.


O lide era a morte do cantor sertanejo Cristiano “Ronaldo” Araújo e sua espantosa repercussão, cantor conhecido pelo “grande público” e desconhecido pela “elite cultural”.


Na sua vídeo-crônica, Zeca não desqualificou o cantor ou seu público, muito menos desdenhou a tragédia. Mas virou o vilão da semana, num debate regido pela emoção, intolerância, preconceito e leitura torta.


E teve que vir a público se desculpar na emissora, retratação em que cometeu deslizes, gaguejou e “talvez” se explicou que “talvez” tenha sido mal-entendido.


Foi nada. O que ele disse na crônica faz todo o sentido.


Falou da surpresa da comoção nacional, do “evento triste”, e citou a enormidade do País, a diversidade cultural e o “talento” natural para a música.


O “abraço coletivo” em torno da dor simbolizaria uma catarse coletiva, como se todos nós estivéssemos atrás de uma união pela emoção, para expurgar nossas dores.


Como se o choro tivesse uma capacidade purificadora.


Então veio o que incomodou fãs, mercado, a TV aberta, a indústria e seu empregador.


Como nos deixamos seduzir pela morte de um artista relativamente desconhecido?


“A resposta está nos livros de colorir”, atestou Zeca.


Segundo ele, a nova moda “literária”, acusada de representar a pobreza da atual alma brasileira, é a vilã do cenário pop e mostra um vazio cultural no país de Machado, Lima Barreto, Modernistas, Guimarães Rosa, Graciliano Ramos, Nelson Rodrigues e Noel Rosa, Tom Jobim, Tropicália, Jovem Guarda, Clube da Esquina, Renato Russo, Cazuza, Mangue Beat e Chico Sciense.


A comoção pela morte do cantor estaria ligada à ausência de “fortes referências culturais que experimentamos”.


A “INSANA” cobertura de sua despedida vestiu a carapuça do vazio de figuras esperando a tinta e significado, “só esperando a tinta da emoção”.


Como “robôs coloristas”, preenchemos desenhos na ilusão de estarmos criando alguma coisa, afirmou.


Para quem começou a trabalhar quando Legião Urbana, Titãs, Cazuza e Plebe Rude dividiam o palco de programas de auditório da TV aberta com Raul Seixas, Gil e Caetano, Mutantes, Milton Nascimento e Elis Regina, a monotonia da nossa música, que já dura algumas décadas, esvazia o mercado, dá poucas oportunidades a outros estilos e à renovação.


Zeca disse o que está entalado na garganta dos fãs da boa música:


“Nossa canção popular é dominada por uma música só. O nosso pop não precisa ser assim… Não precisa ser assim, precisamos de novos heróis, mas está todo mundo ocupado pintando Jardins Secretos [obra que começou a onda de livros para colorir]”.


Alguém discorda?


Não sei se Zeca será retaliado ou irá para a geladeira. Seria uma burrice da emissora encostá-lo, não apoiá-lo. Deveria sim ter mais colunas na Globo News.


Afinal, o vazio não está só na música.


Veja a crônica aqui:


http://globotv.globo.com/globo-news/j...

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Published on July 02, 2015 08:22

June 29, 2015

Depois de ontem, São Paulo não será mais a mesma

Parque D. Pedro II - década de 50 panorama de SP visto do parque dom pedro


 


Marca na agenda: 28 de junho de 2015 é um marco na história de São Paulo.


São Paulo já foi linda, arborizada, com muitos rios, riachos, matas e praças. Foi.


Tinha uma árvore gigantesca numa rotatória no começo da Eusébio Matoso. Ela ocupava toda uma pequena praça. Quem chegava do sul do país, pela antiga BR-3, recebia dela as boas-vindas.


Passaram o trator: foi arrancada, e nem a pracinha resistiu ao alargamento da avenida.


A Praça da Árvore na Vila Mariana virou uma praça de concreto, armação de um duto do metrô construído em meados dos anos 1970.


A Praça Marechal Teodoro no centro virou apoio das pilastras do Minhocão. Como a Praça 14 Bis na Bela Vista, em que no passado tinha uma réplica o avião do Santos Dumont.


O Anhangabaú era lindo. O Parque Dom Pedro sumiu sob pilastras da Radial Leste. O Ibirapuera foi desmembrado e fatiado: parte foi para o Exército, parte para o Detran, parte para a Assembleia Legislativa. Rios foram aterrados.


Ontem, na inauguração da ciclovia da Paulista, provou-se que uma tendência se inverteu: São Paulo não aguenta mais dar seu espaço público e sua natureza para os carros.


 


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Queremos a cidade de volta. Queremos reocupa-la. Queremos voltar para as ruas. Queremos lazer. Queremos andar e respirar livremente.


As bicicletas começam a ocupar a vista da cidade. Ciclovias tão criticadas começam a ser frequentadas e a servir de via de locomoção.


Aos fins de semana, a população toma as ruas com bicicletas e skates.


Muita gente questiona o modo de vida, passa a deixar o carro na garagem e a experimentar o metrô, corredores de ônibus, ônibus com wi-fi e bicicleta.


Agora, começar a ocupar o que foi destinado aos carros. É apenas o começo. Uma revolução começa. São Paulo não será mais a mesma.


Neste ano, dirigi meu carro duas vezes.


Não marco encontros e reuniões fora do alcance do metrô (moro a duas quadras de uma estação) ou das linhas de ônibus do bairro.


Minha irmã, vizinha, uma pesquisadora de caminhos, descobriu enfim que o jeito mais rápido de se chegar ao aeroporto é de busão.


E infinitamente mais barato.


Já é!

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Published on June 29, 2015 07:02

Marcelo Rubens Paiva's Blog

Marcelo Rubens Paiva
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