Marcelo Rubens Paiva's Blog, page 58
October 8, 2015
Uma outra São Paulo
Pediram para eu blogar na íntegra minha coluna citada no New York Times: http://mobile.nytimes.com/2015/10/05/...
Ela foi publicada no Estadão sábado 26/09
Na adolescência, eu não entendia São Paulo. Não sei se alguém entendia. Era uma fria e enevoada cidade húngara encravada nos trópicos. Entediante e inexplicável. Hoje, ferve.
Vivi de uma infância e pré-adolescência praiana no Rio e em Santos. Vim morar aqui no ano em que se inaugurou a primeira linha de metrô (1974). Crianças do meu bairro não brincavam nas ruas, não faziam do asfalto a quadra de um futebol improvisado, camisas contra sem-camisas. Nas calçadas não se empinavam pipas, nem tinham campeonato de bola de gude.
Ninguém andava de bicicleta. Ninguém tinha bicicleta. Aos fins de semana e férias, as ruas ficavam desertas. Itanhaém, Praia Grande, Santos, Guarujá e Litoral Norte, lotados. Alguns iam para sítios e fazendas do interior. Ou para as montanhas de Campos do Jordão.
Quem morava na periferia mal convivia com quem morava na região central. As pessoas eram caseiras. As pessoas queriam andar de carro, não a pé. Tudo era para o carro. Era o desejo maior. O maior símbolo de ascensão social. As pessoas faziam de tudo para ter um carro e um telefone.
Adolescentes jogavam pingue-pongue no prédio, botão no prédio, fumavam escondidos nas escadarias. Alguns prédios começaram a ter espaços para não se saírem dos prédios, grades e guaritas para dificultarem a entrada. Alguns prédios viraram condomínios, miniclubes com quadras, piscinas, salões de festas, academias de ginástica, até saunas.
Era um ato de rebeldia ser skatista. Compensados de propaganda sobre placas de ruas que arrancávamos no meio da madrugada eram serradas, lixadas, ganhavam rodas de poliuretano, que se vendiam na Vila Mariana, e viravam skate. As pessoas tinham serrote em casa.
As ladeiras de Perdizes-Sumaré logo foram tomadas. Milhares de adolescentes invadiam as praças íngremes para descer ou observar outros moleques descerem as ruas num skate fabricação-própria. A polícia passou a reprimir, chamada pelos moradores. Invadíamos a rua vizinha. Os moradores chamavam a Prefeitura, que instalava lombadas.
Minha turma radicalizou e passou a descer as ruas íngremes dos Jardins. O ponto alto era a Ministro Rocha Azevedo, um abismo em formato de alameda. Sempre de madrugada. Porque não tinha ninguém de madrugada nas ruas da húngara capital. Nem carros. Só nós e eventualmente a polícia.
Os bairros não se comunicavam. Eram nítidas as diferenças de sotaque da zona norte e da leste, mais italianado. Na zona sul, como no ABC, falava-se como se fala no interior, puxando o erre. Na zona norte, o rock era o punk. A zona sul recebia influências da música negra americana. Leste era do samba do seu Nenê. Na zona oeste, o rock era progressivo, sob as asas dos Mutantes.
Se um sujeito entrasse numa máquina do tempo nos anos 1970, não reconheceria a cidade hoje. A desordem urbana é a mesma. Ainda se vive mais tempo dentro de carros do que nas calçadas. Mas agora eles são questionados.
Nos condomínios-clubes algo virou espaço gourmet. Pizza ainda é a paixão do domingo. A rivalidade entre os times aumentou, ficou mais violenta; não se assiste mais a jogos de times de amigos com amigos, para ver craques em ação. O Pacaembu perdeu o protagonismo (mas ganhou um baita museu). O MASP faliu. O Museu do Ipiranga está fechado. Deverá reabrir só em 2022, ano do bicentenário da Independência. Os restaurantes chineses sumiram.
São Paulo se internacionalizou. Milagre: turistas brasileiros e estrangeiros vêm conhecê-la, andam pelas ruas. Esbarra-se com gente falando em inglês, francês, espanhol pelas calçadas. Tem camelôs haitianos vendendo em francês nas esquinas. Tem muitos africanos passeando aos fins de semana pelo centro. Tem homens de negócio estrangeiros em almoços executivos. O Bom Retiro que já foi judeu virou coreano e agora boliviano.
São Paulo ainda lembra uma grande aldeia, que acolheu a cultura europeia, afro, árabe e oriental e se americanizou. Mas o que a transformou definitivamente numa outra cidade foi o metrô integrado a trens e corredores de ônibus, cujos tentáculos alcançam zonas profundas e socialmente díspares, a democratiza, rompe muros segregacionistas, penetra em guetos, une as classes que ocupam enfim as calçadas e praças, dia e noite.
Dê um rolê num fim de semana. Estações cheias. Gente, festa, cores, despojamento: caleidoscópio miscigenado. A Paulista virou um parque. Começa a ser fechada aos domingos, como cariocas fecham há décadas a orla e o Aterro aos domingos e feriados, como nova-iorquinos fecharam a Times Square.
Agora tem bicicleta em toda parte, alugadas ou próprias. Uma infinidade de ciclistas em toda a parte. Ciclovias tomam espaço de vias, como em todas as grandes cidades do mundo. Bicicleta agora se chama modal.
Tem menos livrarias, mas as que resistiram se tornaram maiores e vivem lotadas. Têm ônibus às madrugadas. Metrô fecha à 1h aos sábados. O Kilt demoliram. Mas ele reabriu do outro lado da rua. E mais sofisticado. O Riviera também voltou. Mais sofisticado. Abriram o mirante do túnel 9 de Julho. A Augusta está cheia de prédios, que agora são chamados de “torres”.
Skate agora é “SK8”, tem diversos tipos, de diversos tamanhos. Tem praças só para seus praticantes, “picos”. Já é um dos esportes mais praticados do mundo.
Fecham o Minhocão aos fins de semana, que vira um parque, como o High Line de Nova York. Até pensam em demoli-lo, como fizeram em San Francisco e no Rio (com a Perimetral). Querem fechar a Sumaré aos domingos. O que era impensável. Querem fechar também as avenidas Carlos Caldeira Filho, no Campo Limpo, a do Mar Paulista, na zona sul e a Rua Benedito Galvão, na leste.
Aliás não se diz fechar, mas abrir. Fechar para os carros, abrir para a população. Ainda falta muito. Faltam os rios. A gente chega lá.
October 7, 2015
Irã ameaça boicotar Feira de Frankfurt.

Khomeini
Irã ameaça boicotar Feira de Livro de Frankfurt, que começa semana que vem, na Alemanha.
O motivo: o convite para o autor Salman Rushdie falar na abertura.
Por causa do livro Versos Satânicos, Rushdie foi condenado a morte em 1989 pelo Ayatolá Khomeini, líder religioso do Irã, que morreu logo depois, sem abolir a pena.
Para o supremo líder da então nova república islâmica, o livro era uma blasfêmia contra o Islã.
O autor de ascendência indiana, com cidadania britânica, relaxou as medidas de segurança e acreditou estar livre da condenação incomum 26 anos depois.
Foi Seyed Abbas Salehi, Ministro da Cultura do Irã, e o guardião das leis islâmicas, quem protestou contra a palestra de Rushdie, agendada para o dia 13 de outubro.
Em torno de 282 editoras iranianas, que no ano passado representaram 1.200 títulos, podem ser prejudicadas pelo boicote.
Quem achava que a birra contra o autor tinha terminado, depois do Irã anunciar uma reaproximação com o Ocidente, se surpreendeu.
Salehi diz que as reflexões e ordens de Khomeini nunca foram abandonadas.
Curiosamente, Rushdie fora premiado pelo governo iraniano por sua novela Midnight’s Children, cuja tradução foi indicada a livro do ano.
Na feira, ele lançará Two Years, Eight Months and Twenty-Eight Nights.
Os organizadores da feira garantem que a agenda será mantida, e a liberdade de expressão garantida.
October 5, 2015
“Perdido em Marte” ignora parceria com russos
É o enésimo filme que retrata a exploração de astronautas americanos em Marte.
Diferentemente dos outros, como Planeta Vermelho, Perdido em Marte faz um sucesso estrondoso no mundo todo.
Porque é sensacional.
Mas os russos, aliados há décadas dos americanos na conquista espacial e donos dos foguetes e naves que ligam a Estação Espacial Internacional à Terra, sumiram da trama.
As tensões entre o regime de Putin e o aliado espacial e cliente se estendem pela Ucrânia e Síria.
Obama quer destituir o ditador Bashar al-Assad, aliado dos russos, e entrega armas a uma oposição contestável: “A estratégia da Rússia não faz diferenças entre o Estado Islâmico e a oposição sunita moderada que quer a saída de Assad. Da perspectiva deles, eles são todos terroristas. E isso é uma receita para o desastre.”
Putin responsabiliza os americanos pela guerra civil, quer entrar no país com tropas, onde tem uma base militar na região, começa a bombardear posições e mira seus ataques a bases do Estado islâmico, apesar de atingir indiretamente grupos rebeldes como Exército Livre Sírio (ELS) e Exército do Fatahs, que os americanos apoiam.
No filme, o resgate ao astronauta solitário em Marte só é possível com a ajuda dos… chineses.
Chineses?!
Dirigido por Ridley Scott [baseado no livro homônimo de Andy Weir, que já está em destaque nas livrarias], é diferente das tentativas anteriores de retratar uma possível rotina em Marte.
É bem-humorado. É sobre amizade. Sobre persistência.
O astronauta Mark Watney [Matt Damon], dado como morto e deixado para trás, depois da missão abortada por uma violenta tempestade de poeira, não se faz de vítima, não culpa ninguém.
Sua nova missão: sobreviver até o resgate em mais de um ano com o que sabe de ciência, botânica e com os apetrechos que ficaram para trás.
E na NASA todos se unem para trazer nosso “rapaz” para casa.
Só o chefe [Jeff Daniels], como todo chefe, é a voz da razão e cria resistências em nome do futuro do projeto.
Os russos ficam de foram dessa vez.
Seu foguete, Progress M27, que abastece a Estação Espacial, não sai da plataforma de lançamento em Baikonur, no Cazaquistão.
Os chineses quem dão uma mãozinha.
#putinmagoado
October 1, 2015
A revolução no futebol brasileiro
A Copa foi um fracasso para a Seleção Brasileira.
Aeroportos melhoraram. Alguns ainda estão incompletos.
Um legado foi o que mais decepcionou: trens, metrôs, trem-bala, ligações com aeroportos, VLTs, muito pouco foi entregue.
Mas o maior legado foram as Arenas.
Não todas. Como era esperado, a de Manaus, Cuiabá e Natal, cidades sem times nas principais competições, continuam no breu.
Dinheiro jogado fora, dirão alguns.
Porém, uma revolução chega aos campos.
Famílias, crianças, mulheres e idosos voltaram a ser vistos nas arquibancadas, festejando e torcendo.
Fruto de mais conforto, lugar numerado, estacionamento dentro, comida decente. E de um público protegido da chuva.
Campos com telões e sem alambrado, as grades que separam profissionais do público, não registraram UMA invasão, o que era o mais temido pela crônica esportiva.
Profissionais que, aliás, podem trabalhar enfim com segurança.
As brigas dentro das arenas são raras.
E, o mais importante: a média ($$$) de público pagante nos 380 jogos do Brasileirão aumenta a cada ano.
Em 2011: 4.075.878
Em 2012: 4.931.400
Em 2013: 5.681.355
Em 2014: 6.208.190, já com arenas novas
Faltam ainda 100 jogos para terminar o campeonato de 2015.
O público pagante total já está em 4.751.642.
Se continuar assim, pode-se projetar para um público total maior que 6.447.700.
60% a mais que em 2011.
Do Brasileirão.
Tem ainda os regionais, Libertadores, Copa do Brasil e outras competições.
A lembrar que duas dessas arenas inauguradas há pouco mais de um ano, a Alianz Parque, do Palmeiras, e a do Grêmio, nada têm a ver com a Copa.
Que ótimo investimento.
Se contar os impostos recolhidos, em anos começará a dar lucro para a União.
Precisamos de uma Copa do Mundo para entender como funcionam os princípios básicos do capitalismo: investe, que tem retorno.
Na média de público pagante, o FLAMENGO sai na frente
Média Total
1 Flamengo-RJ 33.689 471.647
2 Palmeiras-SP 32.244 451.421
3 Corinthians-SP 30.883 432.356
4 Grêmio-RS 26.050 364.705
5 Atlético-MG 24.861 348.057
Em renda líquida ganha o Palmeiras:
Média Total
1 Palmeiras-SP 1.532.985,44 21.461.796,14
2 Corinthians-SP 1.101.707,69 15.423.907,69
3 Grêmio-RS 785.633,27 10.998.865,74
4 Flamengo-RJ 453.651,82 6.351.125,49
Em renda bruta também:
Média Total
1 Palmeiras-SP 2.164.740,45 30.306.366,24
2 Corinthians-SP 1.788.672,45 25.041.414,33
3 Flamengo-RJ 1.495.661,79 20.939.265,00
4 Grêmio-RS 959.075,07 13.427.051,00
5 Atlético-MG 893.395,25 12.507.533,50
Então os dados mais interessantes. A média por jogo em estádios utilizados no campeonato, ou Arena.
Os novos então entre os oito primeiros.
Média Total Renda Bruta R$ Jogos
1 Allianz Parque-SP 33.090 430.164 29.334.891,24 13
2 Arena Corinthians-SP 32.478 422.212 24.539.915,33 13
3 Mané Garrincha-DF 31.594 94.781 5.875.771,00 3
4 Mineirão-MG 26.908 457.438 15.451.915,29 17
5 Arena do Grêmio-RS 26.050 364.705 13.427.051,00 14
6 Arena Pernambuco-PE 24.261 145.567 4.916.755,00 6
7 Maracanã-RJ 23.500 751.994 29.557.415,00 32
8 Arena das Dunas-RN 22.825 22.825 1.639.485,00 1
9 Morumbi-SP 22.082 309.150 8.517.334,00 14
10 Pacaembu-SP 21.257 21.257 971.475,00 1
11 Beira-Rio-RS 17.795 249.132 6.666.270,00 14
12 Arena da Baixada-PR 16.615 215.997 5.147.565,00 13
São dados publicados hoje, 1 de outubro, no site de estatísticas SrGoool.
September 28, 2015
Liberdade de expressão, vírgula
Na Constituinte do Brasil redemocratizado, que deu na nova Constituição de 1988, o mais esperado e comemorado artigo foi o 5º., que garante a liberdade de expressão.
Depois de anos de censura absurda, política ou de costumes, que atacava revistas e jornais, teatro, cinema e música, regime cujo departamento da Polícia Federal decidia o que os brasileiros podiam ou não ver, imaginávamos que a liberdade, essência de uma democracia, tinha enfim chegado.
A notícia de que A GLOBO resolveu adiar a próxima novela SAGRADA FAMÍLIA [título provisório], de MARIA ADELAIDE AMARAL, pareceu normal e até um alívio para a emissora.
Mas não é para o país.
Prova de que alguma coisa está errada nas nossas leis prioritárias.
Silvio de Abreu, o novo diretor de dramaturgia da casa, anunciou: “A novela da Maria Adelaide é muito boa e traz uma trama política que poderia ficar prejudicada por causa das eleições do ano que vem”.
Uma trama política que substituiria a trama atual, A REGRA DO JOGO, em 2016, não é bem-vinda justamente quando uma democracia vive o seu ápice, o processo eleitoral.
Não é a trama que é inconveniente, nem a emissora está errada.
É a democracia que está adulterada.
“Como o Brasil tem uma legislação eleitoral muito rígida, a partir do início de junho teríamos que eliminar essa trama da novela, porque entraríamos no período em que não se pode falar de política. Achei que seria um desperdício fazermos isso”, concluiu Abreu.
Justamente no ano em que um processo eleitoral festeja a democracia, não se deve falar de política.
Teme-se uma rígida Lei Eleitoral que então entra em conflito com o artigo 5º da Constituição.
Ora, muda-se a lei, para que a liberdade de expressão fique garantida.
No mais, caros: é apenas dramaturgia…
Claro que a GLOBO tem o direito de evitar prejuízos num país em que a legislação se contradiz.
Mas se compararmos à TV que se faz lá fora, conclui-se que estamos tolhidos.
Paradoxalmente, na época ditadura, fomos até mais ousado com SARAMANDAIA, BEM-AMADO, ROQUE SANTEIRO…
Enfrentava-se a censura.
September 23, 2015
O destempero de vossa excelência
Nas últimas semanas, assistimos ao destempero do ministro Gilmar Mendes, veterano do STF e vice-presidente do TSE, tribunal que pode pedir o afastamento da presidente Dilma.
Como se precisássemos tumultuar um ambiente já volátil, vossa excelência tretou com o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, com seu colega presidente da Corte, Ricardo Lewandowsk, e com a OAB, ao compará-la a um “aparelho de partido”.
Na tribuna do STF, em encontros com agropecuários, imprensa e na FIESP, sua ira se voltou conta o PT.
Acusou o partido de instaurar uma cleptocracia e o comparou ao Partido Nazista, que “roubava obras de arte e tinha dinheiro no exterior”.
Mendes demorou para decidir seu voto contra o financiamento privado em campanhas eleitorais, paralisando um processo em que estava fadado a perder.
Numa sessão tumultuada, bateu boca, discursou por quatro horas e, derrotado (a proposta ganhou por 8 a 2), pegou sua beca e se retirou.
Não se vê um comportamento excêntrico em outras Cortes.
Não se vê o debate judicial ser partidarizado.
Não publicamente.
Mendes pode até ter razão no que fala, mas sua ira põe em descrédito justamente a instituição que deveria ser a mais isenta [cega], e proteger as leis, a Constituição, a democracia.
Paradoxalmente, Mendes recebe investimento público através de seu instituto, o IDP (Instituto Brasiliense Direito Público), com sede em Brasília.
O governo goiano investiu R$ 8,791 milhões nos últimos 12 meses, em cursos para a capacitação de 2 mil servidores estaduais, segundo dados do Portal Transparência do Estado.
A informação está no site do SINJUFEGO [Sindicato dos Servidores do Judiciário Federal em Goiás]. Fonte O POPULAR, jornal de GO.
O IDP é um centro de estudos e de reflexão, e oferece cursos de especialização em Direito.
Capacita profissionais do setor público e privado para “desempenho técnico eficiente em todos os setores em que se desenvolve a experiência jurídica”.
Em 2012, a CARTA CAPITAL estampou na capa a manchete: “Fraude na escolinha do professor Gilmar”.
O instituto estava em situação de pré-falência, e o ex-procurador-geral da República, Inocêncio Mártires Coelho, outro fundador, responsabilizava as retiradas exageradas do ministro Gilmar Mendes.
Criado em 1998 na casa do próprio Inocêncio, o IDP chegou a faturar mais de R$ 2,4 milhões entre 2000 e 2008.
Inocêncio, que foi professor de pós-graduação de Mendes na UnB, o acusou na Justiça em 2010, processo que tramitou em segredo, a fazer retiradas ilegais, desfalcar o caixa e sonegar impostos.
A revista publicou trecho da acusação de Inocêncio: “Algumas vezes, quando alegava estar precisando de dinheiro para custear festas familiares cujas despesas excediam as forças do seu erário particular, o sócio Gilmar Mendes fazia retiradas mais significativas, na expectativa de acertos futuros, que, efetivamente, jamais ocorreram.”
O ministro e o terceiro sócio do instituto, Paulo Gustavo Gonet, compraram as cotas de Inocêncio por R$ 8 milhões, e o processo foi encerrado.
Na época, a Carta Capital procurou Gilmar Mendes. Não foi atendida.
A assessoria do IDP disse que irregularidades detectadas por uma auditoria foram devidamente sanadas, e que os R$ 8 milhões pagos foram levantados num empréstimo bancário.
A revista mencionou que o Banco do Brasil fizera já em 2005 um empréstimo de R$ 3 milhões para a construção do prédio do Instituto.
Em 2012, foi a vez do Conselho Nacional de Justiça denunciar um contrato entre o IDP e o Tribunal de Justiça da Bahia para cursos de capacitação para juízes e funcionários se adaptarem a resoluções do próprio Conselho.
Em 21 de abril, o TJ-BA contratou os serviços do IDP por R$ 10.520.754,54.
Em outubro, um aditivo elevou o valor para R$ 12.996.811,00.
Para o CNJ, servidores criticaram os cursos por terem pouca relevância com as necessidades reais dos tribunais.
Para a Carta Capital, os esqueletos no armário de Gilmar Mendes são inúmeros: anos antes, um dos assessores de Gilmar era o araponga Jairo Martins, que trabalhava para o bicheiro Carlinhos Cachoeira.
Resta saber se alguns esqueletos ameaçam sair do armário, exatamente quando vossa excelência ameaça destronar a Presidência.
Dar seu voto enfim numa ação que teoricamente beneficiaria o PT, depois de pedir vista por um ano e cinco meses e paralisar o processo, causa suspeitas.
Aí tem…
September 21, 2015
Latino is the new black
Um negro está na presidência.
Dominam a música há décadas.
Na premiação do EMMY ontem, muitos apresentaram prêmios, inclusive o mais importante, de melhor série dramática [para Game of Thrones], entregue por TRACY MORGAN.
A sensacional atriz VIOLA DAVIS ganhou como melhor atriz dramática e Uzo Aduba de ORANGE IS THE NEW BLACK, melhor atriz coadjuvante.
VIOLA desabafou: “A única coisa que separa mulheres de cor de outras pessoas é a falta de oportunidades. Não se pode ganhar um Emmy com papéis que simplesmente não existem.”
Se os negros sofrem, e são injustiçados há séculos. São maioria nos presídios e sofrem abordagens policiais que eventualmente dão em assassinato.
E os latinos [ou hispânicos]?
Não foram pendurados em cordas e enforcados.
Ultrapassaram já os afrodescendentes na composição demográfica dos EUA.
Representam mais de metade da população de 28 cidades americanas com mais de 100 mil habitantes, todas localizadas nos estados da Califórnia, Texas, Flórida e Nova Jersey
Sem contar os ilegais, ou, como se diz agora, INDOCUMENTADOS.
Estão na prioridade do debate para a corrida presidencial.
Não se discute a ida e vinda de negros. E nenhum candidato ousa verbalizar seu racismo contra eles. Não mais. Apesar de sofreram o diabo nas mãos dos brancos.
Já o candidato republicano na frente das pesquisas, DONALD TRUMP, chama latinos de drogados e estupradores, e quer aumentar as barreiras nas fronteiras.
Só UM latino esteve presente no palco do EMMY, a atriz-comediante SOFIA VERGARA.
AMERICA FERRERA, que apesar de ser californiana descendente de hondurenhos, é reconhecida como atriz negra [ou “de cor”, como diria Viola], passou por lá, mas não chamou muita atenção.
Atriz de UGLY BETTY liderou o protesto contra TRUMP numa carta com grande repercussão, agradecendo-o por unir os latinos contra ele.
Veremos ano que vem com NARCOS.
Apesar da goleada que NETFLIX levou da HBO em 2015.
September 18, 2015
Marco da revitalização do centro faz aniversário
Espaço Parlapatões, já um marco na revitalização do centro de São Paulo e da Praça Roosevelt, revitalização que começou com o teatro Satyros, faz aniversário e festa.
Surgiu há exatos 9 anos.
Calcula: com uma média de 5 espetáculos teatrais em cartaz por semana, quanta gente não passou por lá?
No teatro de 100 lugares, no bar, em que até stand-ups famosos já se apresentaram, pelos bancos nas calçadas…
Foi um presente para a cidade do grupo de palhaços-atores-dramaturgos-diretores PARLAPATÕES.
Numa região que tem hoje uma supervalorização imobiliária.
Alô incorporadoras e empreiteiras, cultura traz benefícios.
A comemoração começa às 14h com DJ Tuto Moraes [da festa-noite Santo Forte].
E no teatro o grupo esteia às 18h ATÉ QUE DEUS É UM VENTILADOR DE TETO.
Texto de Hugo Possolo, com direção de Pedro Granato.
No palco, Possolo e Raul Barreto imaginam a crise de um jornalista, que passa a creditar que um vendedor de balas no semáforo é Deus.
Vai ser uma tarde [e noite] e tanto…
Parabéns “Parlapas”.
September 17, 2015
Looke mistura Netflix com iTunes Store
Netflix já é gigante no Brasil.
De olho no mercado, chegou mais um concorrente, LOOKE.
É um serviço de streaming de vídeo semelhante ao Netflix, com elementos do iTunes Store e do Play Store do Google:
Assinatura de um pacote mensal a R$ 18,90- o primeiro mês é gratuito
Também oferece aluguel e compra de títulos, que variam entre R$ 2,90 a R$ 9,90 para locação, R$ 12,90 a R$ 45,90 para compra.
Looke chega com mais de 7.500 filmes [inclusive lançamentos], seriados [como Big Bang Theory e ER], documentários e shows.
Ainda é pouco.
Mas prova que a tendência não tem volta.
Dilma versus Jango

Brasil, Rio de Janeiro, RJ. 31/03/1964. Tanque do exército pára próximo à casa do presidente deposto, João Goulart, nas Laranjeiras. O Golpe de 64 submeteu o Brasil a uma ditadura militar que durou até 1985. – Crédito:ARQUIVO/ESTADÃO CONTEÚDO/AE/Codigo imagem:17897
Dilma não é Jango.
Ele foi deposto pela mira de canhões por um golpe de Estado.
Ela pode ser deposta por instituições democráticas que seu poder sustenta: ações do Tribunal Superior Eleitoral e do Tribunal de Contas da União, que justificariam um pedido de impeachment ao Congresso.
Tropas e tanques, dispensados.
Poder Legislativo e Judiciário, com a implosão do Executivo, a destronariam.
Sua baixa popularidade é uma aliada que cria rachas por todo lado.
Num infeliz (ou bem calculado) comentário, Michel Temer, vice-presidente, lembra Francis Underwood, protagonista de House of Card, que colabora para enfraquecer a presidência.
Dilma deve saber, porque até eu sei por conversas aqui e ali com fontes bem informadas e boêmias: Temer nega a intriga, mas passou agosto visitando empresas de comunicações e federações empresariais, apresentando suas credenciais; o PSDB já prometeu a primeira valsa; o segundo escalão do TCU, o técnico, ameaça um motim caso o primeiro escalão, o político, não condene as contas de Dilma, como manda a cartilha.
Gilmar Mendes, do STF e TSE, já partiu para a grosseria ao classificar o arquivamento do pedido de investigação da campanha de Dilma, do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, como “ridículo”, que “vai de infantil a pueril”.
Janot voltou atrás e aceitou a denúncia.
O racha no Brasil de Jango era parte de um complô da Guerra Fria.
A ameaça comunista, as Reformas de Base, que tocavam em pontos sensíveis do capitalismo, como reforma agrária e controle de remessa de lucros, a radicalização do discurso e motins de soldados e marinheiros uniram partidos da oposição, a Igreja, órgãos de imprensa, políticos populares e as Forças Armadas, que já tinham tentado um golpe anos antes, para impedir a posse de Juscelino.
Em pesquisa secreta do Ibope feita na véspera do movimento militar de 1964 em três cidades paulistas de diferentes portes (São Paulo, Araraquara e Avaí), encomendada pela Federação do Comércio do Estado de São Paulo, diferentemente de Dilma, Jango tinha apoio popular: 45% consideravam seu governo ótimo ou bom, 24% regular, e 16% mau ou péssimo.
Nutra pesquisa de eleitores de oito capitais, feita em março de 64 pelo Ibope e também engavetada, descoberta recentemente em arquivo da Unicamp, 49,8% admitiam votar em Jango se ele pudesse se candidatar à reeleição, o que não era permitido pela Constituição em vigor.
Márcia Cavallari, diretora do Ibope, disse que os critérios aplicados na pesquisa da década de 60 são semelhantes às recentes, como a encomendada pela CNI (Confederação Nacional da Indústria) e divulgada em julho, que apontou que a avaliação do governo Dilma é de apenas 9% como ótimo ou bom, 21% regular, e 68% ruim ou péssimo.
Se Jango tinha 45% de aprovação, Dilma tem 9%.
Mas a inflação de Jango era aterrorizante: chegou a 23% no primeiro trimestre de 1963, e a variação em 12 meses acelerou de 45,6% em dezembro de 1962 para 69,9% em março de 1963.
A crise política e com o mercado externo e FMI detonou o Plano Trienal de Jango. A inflação fechou em 1963 encostando em 80%, bem pior que a de Dilma. Mas a taxa de crescimento do PIB era um pouco melhor: caiu de 6,6% em 1962 para 0,6% em 1963.
Jango e seu PTB foram depostos em horas, com o racha de base aliada, o PSD. Dilma e o PT vêm a base aliada rachar, mas sem a ameaça de intervenção militar e a menor possibilidade de um golpe de Estado, já que as instituições democráticas estão preservadas, oposição envolvida nos mesmos escândalos de corrupção, que provam a falência do sistema partidária e das regras políticas em vigor.
Um paradoxo interessante explica o Golpe de 1964.
A popularidade de Jango teria sido decisiva para a sua deposição pela força, já que as frentes políticas adversárias não se sentiam encorajadas: em outra pesquisa engavetada pelo Ibope, 59% dos entrevistados eram a favor das medidas anunciadas em 13 de março de 64 no comício da Central do Brasil por Jango, as que desencadearam o golpe.
Porém, os movimentos sociais pouco fizeram para impedir o desmantelamento do governo. Uma Greve Geral convocada pelas Centrais Sindicais e pela UNE em 1 de abril atrapalhou mais do que ajudou.
Tropas marcharam sem encontrar resistência, o que surpreendeu o próprio governo deposto.
É impensável calcular como os movimentos sociais ligados ao PT e partidos de esquerda, movimentos sindicais, CUT, sem-teto e sem-terra, mercado externo, acionistas, EUA, FMI, ONU, OEA, Mercosul reagiriam no caso de um impeachment, sintoma da instabilidade da República Brasileira, que raramente vê um presidente cumprir o prazo designado pelo voto.
Deodoro da Fonseca ficou dois anos e foi forçado a renunciar na Revolta da Armada, depois de destituir o Legislativo. Floriano e Afonso Pena, que morreu antes de completar o mandato, ficaram só três anos. Rodrigo Alves, como Tancredo Neves, morreu antes de tomar posse.
Washington Luís foi deposto foi pela Revolução de 1930, e seu sucessor eleito, Júlio Prestes, não tomou posse. Dutra ficou cinco anos, como Sarney. Getúlio entrou para a história e deu um tiro no peito. Café Filho foi afastado por motivo de saúde e ficou um ano. Carlos Luz, seu sucessor, foi deposto, e JK assumiu antes.
Jânio Quadros viu forças ocultas e renunciou dois anos depois de ter sido eleito. Jango foi deposto, Collor, impeachado. FHC era para ficar quatro anos, ficou oito. E Dilma…
Cumpre a sina da maldição presidencial do nosso doente processo representativo. E já tentamos de tudo: mandato de quatro anos, de cinco, de quatro com reeleição, vice eleito de outra chapa, junta militar provisória, parlamentarismo (em dois plebiscitos rejeitados), até monarquia, ironicamente, o governo mais estável da nossa história.
Muita gente festejará a queda de Dilma, como uma vitória da democracia.
Mas deveria lamentar o nosso fracasso de projeto republicano.
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