Joel Neto's Blog, page 89
June 29, 2012
Os lugares de "Os Sítios Sem Resposta", em São Bartolomeu dos Regatos
June 28, 2012
Tempo de mudar
© JOEL NETO
Diário Insular/Açoriano Oriental
29 de Junho de 2012
Não foi por Ricardo Rodrigues ter metido ao bolso dois gravadores alheios com perguntas incómodas que eu mudei de opinião. Nem por Carlos César ter tentado instalar em Sant’Ana (e, até certo ponto, prevalecido no seu intento) uma dinastia republicana. Nem sequer por vários membros do actual executivo regional – mais a esposa do presidente, garante o Tribunal de Contas – terem andado a gastar, sem critério aparente, o dinheiro do erário público em hotéis de luxo e viagens de fausto. Na verdade, eu não mudei de opinião. Como escrevi aqui há uns anos num pequeno ensaio comparativo entre as classes políticas açoriana e madeirense, continuo a acreditar que temos tido sorte com os nossos políticos. Ou, mais provavelmente ainda, que temos tido lucidez na sua selecção.
Mas a sucessão de “casos” e maus hábitos em torno (e da parte) dos mais destacados membros do actual status quo regional tem necessariamente um significado. E esse significado não é difícil de decifrar. O Governo do Partido Socialista fez um bom primeiro mandato, negociando com elevação a sua viabilidade parlamentar em situação de maioria relativa e, aliás, promovendo reformas importantes sem as descriminar com base na respectiva proveniência, mesmo quando essa proveniência era a oposição. Infelizmente, o poder não apenas corrompe, mas corrompe-se. A maioria absoluta do ano 2000 deu início a um declínio de qualidade nos processos e nas agendas que não parou de acentuar-se até hoje. E agora, doze anos passados sobre esse desvio original, a mudança já não é apenas necessária: é urgente.
Vale a pena olhar para os números. Dezasseis anos de poder ininterrupto, incluindo três maiorias absolutas e uma década de prosperidade nacional sem paralelo em vários séculos de História, não foram suficientes para tirar os Açores da cauda do ranking do desenvolvimento regional português. Hoje, a Região lidera ou disputa a liderança em quase todos os piores índices nacionais, incluindo os do consumo de álcool, da violência doméstica, da gravidez precoce, do analfabetismo e, claro, do usufruto do Rendimento Social de Inserção. Só não lidera no rendimento médio, índice no qual, em vez do comando, disputa a lanterna vermelha.
E, se a situação das famílias é trágica, nem por isso nos chegam melhores sinais da parte da gestão das contas públicas, nem da produção dos instrumentos legislativos necessários à resolução de problemas sectoriais, nem da defesa e reforço do nosso património cultural, nem do que quer que não garanta votos suficientes – e suficientemente imediatos – para justificar o esforço.
Extraordinariamente, o fracasso do transporte marítimo inter-ilhas permanece por resolver. Extraordinariamente, a SATA e a TAP continuam a brincar aos oligopólios, forjando para o arquipélago um code-share que funciona em benefício de toda a gente, menos dos açorianos. Extraordinariamente, o arrendamento rural e o emparcelamento ainda esperam solução. Extraordinariamente, o dinheiro com que o Serviço Regional de Saúde deveria pagar as dívidas aos fornecedores acabou aplicado na construção de SCUT, deixando por esta altura uma série de laboratórios, farmácias e demais parceiros à beira da falência. Extraordinariamente, insiste-se agora no dito “cluster do mar” como a solução óbvia e milagrosa, quando durante década e meia se deixou o sector das pescas ao abandono.
Não sou eu que o digo, é novamente o Tribunal de Contas, que até é liderado por um socialista: os orçamentos regionais não expressam “a totalidade dos compromissos assumidos”, nem apresentam “o mapa das responsabilidades contratuais plurianuais dos serviços integrados e dos serviços de fundos autónomos.” Em suma, são desonestos na relação com o eleitor. Pelo menos nessa: são desonestos na relação com os açorianos.
São desonestos porque tentam explorar, sem o admitir, um princípio eleito há já alguns anos pela própria maioria socialista, e muito acarinhado desde então: o princípio de que os açorianos pretendem despedir-se em definitivo da sua relação com o bem comum, com a coisa pública, com a origem e o destino daquilo que é de todos nós, incluindo as infra-estruturas e a identidade, a economia e a cultura. É daí que vêm estes números verdadeiramente escandalosos segundo os quais existem na Região, por esta altura, mais de vinte mil beneficiários do RSI. Tendo em conta a dimensão média das famílias da Região, bastante superior à do País, e mesmo aplicando um generoso desconto por via da eventual atribuição de vários subsídios num mesmo agregado familiar, qualquer coisa como – os cálculos são meus, não há cálculos oficiais – vinte por cento dos açorianos (um quinto, meu Deus) sobrevive agora deste expediente, em muitos casos arrastando-se ao longo do dia pelos cafés e pelos botequins, siderados por anos e anos de um paternalismo cruel e paralisante, que os esvaziou por completo de massa crítica a troco apenas de votos e de silêncio.
Pois o plano pode ter sido aplicado na perfeição, que o princípio continua errado. Continua errado e no próximo Outono, estou convencido, ficará claro que continua errado. Porque estes homens e mulheres que Carlos César e a maioria socialista votaram ao esquecimento, pagando-lhes para que nos desaparecessem da vista, são os mesmos que ao longo dos anos, das décadas e dos séculos lutaram contra tempestades e terramotos, resistiram aos invasores, combateram as pragas agrícolas, garantiram a consolidação de uma identidade comum e permitiram a concretização de uma autonomia política. E estes homens e mulheres querem um Estado decente, que saiba ajudá-los quando é preciso, mas querem também que essa ajuda, em todos os casos em que isso ainda for possível, represente um recomeço, uma revalorização do seu papel na sociedade e uma oportunidade de voltarem a tomar o seu destino nas mãos.
As pessoas nunca foram o problema deste arquipélago. E é inadmissível que continuem a ser tratadas como o problema deste arquipélago.
O momento que vivemos é, pois, histórico. O que está em causa este Outono, aquando da eleição da X Legislatura da Assembleia Legislativa Regional, já é mais do que a política, e é seguramente muito mais do que os partidos: é o resgate dos Açores a uma espiral populista que se agudiza de dia para dia e que não olha a meios para garantir a sua própria sobrevivência. Julgo ser tempo de dizer “Basta.” Julgo ser tempo de dizer “Acabou.” E julgo ser tempo de dizê-lo apesar da chantagem que se anuncia para os próximos meses, com recurso à situação económica do país; apesar da profusão de inaugurações em que continuaremos mergulhados até Outubro, tantas delas aliás de obras parciais; e apesar de todos os restantes recursos de que qualquer folia eleitoralista sempre se socorre quando uma reeleição está garantida, quanto mais quando, como é o caso, ela está virtualmente perdida.
O meu apoio à candidatura da Dra. Berta Cabral vem daí: da convicção de que há esperança para os Açores. De que a História ainda não acabou. De que a Região tem direito a renovar-se. De que os açorianos merecem, enfim, uma segunda oportunidade. E de que o momento de exigi-la não é outro senão este.
O momento em que perdemos é para mim muito claro
Imagino que os jornais de hoje estejam cheios de manifestações de enfado. “Que chato foi o Portugal-Espanha…”, sugerirão. Totalmente em desacordo. A bola pode não chegar uma só vez à baliza e, ainda assim, tratar-se de um grande jogo. Pois foi isso, precisamente, o que a meia-final de ontem foi. Arriscámos menos do que poderíamos ter arriscado? Talvez. Poderíamos ter tido outro movimento no ataque se, perante a ausência de Postiga, tivesse jogado Nelson Oliveira (ou pelo menos entrado mais cedo)? É provável. Facto: a Espanha temeu Portugal. Corrijo: Portugal fez-se temer perante o campeão europeu e mundial. O jogo foi entre iguais, sem uma equipa por cima da outra (para usar uma expressão da moda). Teria de ser decidido num instante, ou num pormenor (para usar outra). E foi: foi decidido no instante em que a moeda caiu no chão e ficou definido que a Espanha seria a primeira a marcar no desempate dos penáltis. Pois perdemos. O que até pode fazer quase toda a diferença, sim. Mas não toda. E o espaço entre uma coisa e outra é o espaço onde reside o meu orgulho. Viva Portugal./O JOGO
Assim a coisa ficou como simples laxismo

É pena que a Federação tenha garantido novo contrato com Paulo Bento ainda antes do Europeu, atropelando toda e qualquer a lógica. O selecionador nacional merecia receber agora o prémio público da renovação. Que extraordinária campanha a sua equipa fez. Há doze anos, chegar aqui era conquistar o mundo. E, entretanto, este rectangulozinho não cresceu, pois não?/O JOGO
Assume a posição
Que absurdo deve ser estar na pele de Ronaldo. Todos os dias, nos treinos e nos jogos, no campeonato e na Taça, na Liga dos Campeões e nos jogos da seleção – sempre a levar pancada quando se insinua no ataque, sempre a sofrer cargas ofensivas quando vem buscar a bola atrás. É precisa uma resiliência sobre-humana. E uma coragem quase comovente. Uma vida a levar porrada – eis a sua biografia resumida numa frase./O JOGO
Tudo isto só para gozar com Merkel?
Diz um estudo que as alemãs mais depressa dispensariam o sexo do que a televisão. Suponho que a divulgação da notícia em Portugal também inclua algum gosto de desmascarar Angela Merkel e as verdadeiras razões porque é tão má. Na verdade, porém, não foram apenas as alemãs que se desinteressaram do sexo: fomos todos os cidadãos ocidentais, homens e mulheres. Está doente, esta civilização. Preguiçosa e deprimida. Fala imenso de sexo, mas sobretudo para mostrar que está viva. Aliás, Michel Houllebecq escreveu sobre isso um extraordinário romance: Plataforma. E, naturalmente, a TV, aqui, é só um termo de comparação. As pessoas não preferem ver televisão. As pessoas só querem alguma coisa que lhes permita vencer a noite. Se possível, sem fazer nada. E é isso ainda, infelizmente, uma boa parte da TV que se produz hoje: uma oportunidade para não fazer nada, nem sequer sentir./DN
A imprensa a desfazer a desvantagem em relação à televisão

A condenação de Ricardo Rodrigues tornou-se no facto político mais relevante deste início de silly season. Ainda bem que houve condenação e que ela teve visibilidade. Mas não nos enganemos: o caso apenas ganhou a exposição que ganhou porque a revista Sábado, no dia do roubo dos gravadores, tinha uma câmara de vídeo. É esta a grande vantagem da TV sobre a imprensa. É este o caminho que a imprensa tem de empreender para desfazer a assimetria. E é esse o esforço a que a TV também já tem de começar a estar atenta. A criatividade continua a jogar no clube adversário. Se este conseguir juntar-lhe meios técnicos, o paradigma do que é sucesso e de quem o tem vai mudar. É uma questão de tempo./DN
June 27, 2012
TERRA CHÃ, 27 DE JUNHO DE 2012
Acabamos por perder a meia-final do Europeu de futebol com Espanha, campeã europeia e mundial. Tinha de escrever a crónica de "O Jogo" durante a própria partida, porque o prazo de fecho era apertado (e superapertado no caso de haver prolongamento e penáltis) – e, confesso, escrevi-a logo com inclinação para a derrota. É um facto: houve momentos, durante a noite, em que dei por mim a congeminar sobre como lhe daria a volta, visto que o mais provável, então, parecia-me a vitória de Portugal. Não foi preciso. No momento em que a moeda do árbitro caiu no chão e Iker Casillas pôde escolher que seria a Espanha a começar a marcação das grandes penalidades do desempate, tive a certeza de que tombaríamos. Inclusive depois de Rui Patrício defender a primeira grande penalidade. E, efectivamente, tombámos. Mas em glória. No limite das forças, no limite do tempo, no limite da sorte. Mesmo como nós gostamos, naturalmente. E assim fomos mais pai e filho, eu e o meu pai – ali os dois, entre as mulheres, trocando monossílabos só nossos, num lamento feliz. Ganhasse Portugal o Europeu e nem saberíamos como festejá-lo.





