Marcelo Rubens Paiva's Blog, page 53
March 20, 2016
Fla x Flu genérico deveria copiar o autêntico
Hoje foi dia de Fla x Flu no Pacaembu, pela Taça Guanabara.
O autêntico, o do futebol, que deveria inspirar o genérico, o da política.
O jogo foi fraco, devagar, sem lances decisivos, como as reuniões do Conselho de Ética e Decoro da Câmara.
Os dois times pareciam satisfeitos com o empate.
Mas a organização, que misturou as duas torcidas na arquibancada laranja, é um exemplo.
Inspirador.
Apesar de estarem em menor número, pois o mando de campo era do Flamengo, torcedores com a camisa do tricolor carioca circulavam numa boa entre torcedores com a rubro-negra.
Fora e dentro do estádio [o que dá guerra entre torcidas paulistas].
Na arquibancada laranja, misturaram-se.
Nada de hostilização.
Vi flamenguistas orientaram educadamente onde era a entrada do Tobogã para dois torcedores do Flu; onde se concentrou a massa tricolor.
Vi um flamenguista de dois metros de envergadura esbarrar sem querer num pó de arroz com dois e vinte. Pediram desculpas efusivamente um para o outro.
Vi namorado tricolor com namorada flamenguista, amigo tricolor empurrar cadeirante flamenguista.
Quem dera fosse assim também no Fla x Flu da política.
A nota estranha: a torcida do Flamengo quem puxou “ei, Dilma vai tomar no c*” e “fora PT!”, assim que tocou o hino nacional. Torcida de vermelho do time do povo.
A organização em parceria com a equipe de apoio do time São Paulo funcionou.
A cariocada se perdeu um pouco, levou muito bebê [no Pacaembu não é recomendável], queria se sentar no lugar marcado [o estádio não é padrão Fifa].
Mas logo se acostuma.
Trinta mil pagantes [tinha na verdade muito mais], mesmo com cambistas cariocas e renda de mais de R$ 1.374.375, devem servir para a Federação Carioca ouvir o clamor: queremos mais.
Podem vir!
March 17, 2016
Catta Preta polemizara com classe cinematográfica
O juiz Itagiba Catta Preta, que suspendeu a posse do Lula, tinha já se indisposto com a classe cinematográfica.
Ele é o mesmo que deu liminar para as Teles não pagarem a Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine).
Durante o Carnaval.
O juiz da 4a. Vara Federal de Brasília concedera liminar ao Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel de Celular e Pessoal (SindiTeleBrasil), que representa, entre outras, Claro, Oi, Telefonica/Vivo e Tim, contra a contribuição prevista na conhecida como Lei da TV Paga (lei 12.485, de 2011).
Suspendia assim o recolhimento de taxas da Condecini de seus afiliados.
Traduzindo: defendia que as teles e companhias telefônicas não tinham nada a ver com a indústria do audiovisual, pois seus clientes não veem filmes ou conteúdo de audiovisual pelo celular.
A decisão gerou um protesto da classe; nomes como Fernanda Montenegro, Andréa Beltrão, Bruna Lombardi, Marietta Severo, Paulo Gustavo, Alê Abreu, Guel Arraes e Hector Babenco.
Liminar que foi derrubada.
Polêmico…
March 16, 2016
Aflições de uma grávida no Brasil
A grávida e o burocrata
Na segunda-feira da semana passada, o presidente do Instituto Butantã, Jorge Kalil, das poucas instituições de pesquisa que têm reconhecimento internacional, reclamou ao correspondente Jamil Chade, que, apesar de anúncios e discursos, ações de propaganda e intervenção direta da presidente e ministérios, o governo federal não liberou “um só tostão” para o programa que desenvolve vacina contra o zika.
“Continua a burocracia enorme para a liberação de verbas.
Pedimos R$ 30 milhões para fazer o programa contra o zika.
O Ministério da Saúde autorizou R$ 8,5 milhões.
Não chegou nada”.
Para o Ministério da Saúde, ficou acordado que 30% dos valores prometidos estariam disponíveis em até 30 dias. Como o prazo ainda não venceu, está justificado o atraso.
E o mosquito pode trabalhar em paz.
Na quarta-feira, o Butantã anunciou que, diante do impasse, vai atrás de financiamento de agências internacionais.
O burocrata de Brasília continua com birra.
Reclamou em nota que o laboratório não entregou documento obrigatório para a liberação de recursos: “Mesmo estando dentro dos prazos previstos para início das transferências, o Ministério da Saúde fica impedido de destinar os valores diante desta pendência”. A vacina e o combate ao mosquito são secundários. Prioritário são “os documentos exigidos para a liberação de recursos”.
Minha mulher ficou grávida em outubro do nosso segundo filho. Festejamos até novembro, quando se anunciou o surto de zika. A comemoração virou aflição, que virou pânico. Porque afinal estamos no Brasil: estados do Nordeste esperavam há meses o larvicida piroxisen de combate o transmissor da dengue, chykungunya e, agora, zika, que deveria ter sido enviado pelo governo federal e colocado em reservatórios de água.
Em 17 de novembro, contabilizávamos 399 casos de microcefalia.
A burocracia da saúde se revelou o paraíso da doença: municípios são proibidos de comprar diretamente o larvicida; o Ministério da Saúde envia aos Estados, que repassam aos municípios.
Prefeituras como a de Ouro Branco (AL) decretaram emergência. O ministro da Saúde, o desconhecido Marcelo Castro, tranquilizou a população e disse que o Exército produzirá repelente a ser distribuído para gestantes: “Entramos em contato e vamos estabelecer uma parceria”. O Exército negou no dia seguinte que tivesse fábricas que produzissem a quantidade exigida de larvicida.
Numa semana, o número de notificações de microcefalia dobrou no Rio de Janeiro, onde passaríamos o fim de ano, com passagem comprada e festa garantida em Copacabana: foram registrados até 10 de dezembro 45 casos de microcefalia segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde; na semana anterior, eram 23.
Epidemia estava descontrolada na fuça de um ministro trapalhão, no cargo apenas porque é da ala do PMDB que não apoia o impeachment da presidente, partido dividido que chantageia e ameaça a governabilidade em troca de cargos e pastas. Dada a crise institucional, ganhou a da Saúde, a mais valiosa.
Descobriu-se rápido que o repelente mais eficaz é o Exposis, que oferece proteção contra o Aegypti, Albopictus e o Anófeles (malária), fabricado pelo Laboratório Osler para o Exército Francês, que voltava infectado de missões nas Guianas. Ele vem com “icaridina”, fabricado pela Saltigo, da Alemanha.
Em dias, o Exposis sumiu das prateleiras das farmácias brasileiras. Quem tinha amigo ou parente vindo da Europa, encomendou o repelente, não tablets ou smartphones. Quem não tinha, entrou numa fila de espera de meses.
As autoridades continuam a culpar os vasinhos das donas de casa imprudentes. Não se falou da falta de saneamento nem da expansão da fronteira agrícola, que eliminou os predadores e deu de bandeja um suculento, vasto, docinho alimento aos mosquitos. Onde estão os sapos, rãs, pererecas, lagartixas tão comuns nas nossas casas? A última vez que vi um sapo foi no desenho que meu filho vê.
Passamos o Réveillon na varanda do meu prédio em São Paulo, cercado de repelentes e com uma raquete que dá choque em mosquito, presente de Natal do sogro. Minha mulher parece uma Sharapova dopada, quando vê qualquer mancha escura voando pela casa. Claro que meu filho achou que os gatos da casa adorariam uns choquinhos.
São Paulo começou o ano com quatro casos. Estávamos tranquilos. Nosso secretário da Saúde é um infectologista renomado, David Uip. Anunciou no Natal que em janeiro uma grande força tarefa combateria as larvas. Porque não começou logo? Mosquitos não trabalham nas festividades de fim de ano? Então não ficamos mais tranquilos no Estado mais rico: a imprensa descobriu que o governo de SP escondia os números, manipulava dados.
Depois de dias estudando as particularidades de cada mosquito, descobri mais Aedes na casa de amigos em Pinheiros do que no Egito. Já os vi na Linha Amarela e na Verde do Metrô, no elevador do dentista e no do meu prédio, no carro, na piscina em que nado e até em casa. Aedes, sim, peludão, fortão, com as listas da camisa da torcida organizada do XV de Piracicaba.
Minha mulher não viaja, não sai do bairro, sai de casa toda coberta, com moletom, meia e bota em pleno versão.
Parece uma assustada refugiada do Oriente Médio.
A chefe da Vigilância Epidemiológica de Ribeirão Preto informou no dia 6 de fevereiro que, desde o início do ano, 800 casos suspeitos de zika foram notificados. Deste total, 140 eram de mulheres grávidas atendidas na rede municipal.
Nesta semana, cinco casos foram confirmados em Turiúba (SP), cidade de 2.009 habitantes. A proporção é de um doente em cada 400 habitantes. No meu bairro vizinho, Freguesia do Ó, tem um caso autóctone. No do meu sogro, em Americana, dois.
Uma grávida que teve manchas vermelhas e deseja fazer um exame de zika, tem que desembolsar entre R$ 900 e R$ 1.600. Laboratórios têm convênios com laboratórios alemães.
Planos de saúde não cobrem.
Terça-feira da semana passada, a OMS sugeriu que grávidas não viagem a países com zika. Mas e as grávidas que moram em países com zika? Quarta, o país contabiliza 745 casos confirmados de microcefalia; há uma semana, eram 641.
A catástrofe é viral e política. Antes de sanear as cidades e os vasinhos de planta, era preciso sanear os governos.
E descobrir pesticidas que combatam a incompetência e a burocracia.
March 13, 2016
Isto é democracia
Continuo um cara de esquerda.
Não sou comunista.
Me divirto quando me mandam ir pra Cuba.
Já fui e adorei, apesar de lamentar ver o socialismo fracassar numa ilha linda, com muita censura e perseguição política.
Rechaço os excessos da Justiça, do MP, a coerção, a imprensa monolítica e tendenciosa, a direita homofóbica, a violência contra o cidadão.
Mas parabéns ao povo brasileiro.
Coxa ou não, são brasileiros. Classe-média branca ou diversa, não interessa mais.
Numa data infeliz, 13 de março, que coincidiu com um comício radical que há 52 anos detonou o Golpe de 64, conseguiu-se uma manifestação enorme, histórica e, aplausos, pacífica.
Para encerrar uma semana tensa, com uma terrível rede de boatos nos afligindo dia a dia, post a post.
Não teve torcida organizada do Fla se encontrando com a do Flu no meio de avenidas e praças, deteriorando um cenário político já polarizado, numa batalha campal descontrolada.
Não teve bomba, como se chegou a noticiar.
Não teve tropa nas ruas.
Não teve provocação generalizada ou brigas.
Não teve conflito armado, como se sugeriu pelas redes sociais e de amigos.
Grupos pró-PT, que organizavam a manifestação Sem Medo de Ser Feliz na região da Praça Roosevelt, a cancelaram prudentemente e em tempo.
Podemos dormir em paz.
Uma guerra civil não começa no Brasil.
Uma batalha jurídica, sim.
A manifestação de hoje foi serena.
Quem é pró-Dilma é obrigado a admitir: a manifestação de hoje coloca combustível na luta constitucional pelo impeachment.
O Brasil amadureceu.
Não fui à manifestação. Não acho que a culpa seja apenas do PT.
Mas aplaudo a capacidade de organização dos opositores.
E me surpreendi, como todos os analistas, pelas vaias que Aécio e Alckmin (que aliás não tinha nada que estar lá) receberam na Paulista, e por barrarem João Dória, candidato a candidato do PSDB à Prefeitura
Fora PT não significa Viva PSDB!
Fora PT não é mais Viva Cunha, como foi no começo.
A prepotência do partido, a dificuldade em reconhecer seus erros, a arrogância de quem está há 14 anos na Presidência, a desastrosa administração Dilma, seu embate entre a necessidade de reformas e as escrituras partidárias da base, os rolos com o livro-caixa e as escrituras de Lula e sua família, a radicalização do seu discurso, a violência contra a imprensa, especialmente contra repórteres de TV, especialmente contra repórteres de uma TV que, sim, erra em ser tendenciosa, levou mais aliados às manifestações.
O cenário não é o mesmo de 1950, 1954, 1962, 1964, 1966 ou 1968, quando golpistas enfrentavam uma rebelião de militares, capitães faziam greve, soldados e sargentos se rebelavam, generais se colocavam contra marechais, e civis foram vencidos pela linha-dura, diante de uma desordem militar.
Temos instituições, Poderes, Constituição, imprensa livre, eleições diretas e controle civil dos militares.
Temos uma democracia.
March 9, 2016
Série explora vícios e compulsões
Da série COMPULSÃO de João Jardim & Copacabana Filmes, que estreou ontem no canal GNT, ficou a impressão de que finalmente um programa da TV brasileira resolveu desenvolver um tema sério, tocante, com coragem e sem sensacionalismo.
Sem se esquecer de um capricho visual incrível.
No primeiro programa, o grande escritor e jornalista RUY CASTRO contou em detalhes sua compulsão, a vodca, e o tratamento que fez para se livrar dela.
Num depoimento emocionante e didático, RUY lembra como começou a beber sem parar em 1983, quando veio trabalhar na Folha de S. Paulo.
Bebia duas doses de quatro em quatro horas no boteco de trás.
Depois, rebatia com cocaína.
Bem, eu trabalhava com o RUY nessa época. Era nosso ídolo.
Toda a redação se sentia estagiária diante daquela jovem lenda carioca.
Beber e cheirar era parte da rotina da classe jornalística.
Ele não era o primeiro nem o último colega a bater na porta do vício.
Mas do inferno que ele vivia, eu não sentia nem o calor.
Álcool e escrita é uma combinação como café e cigarro, goiabada e queijo.
É tolerada. Vira glamour.
Um escritor que não bebeu é um taxista sem GPS.
Um escritor sem uma doença é um computador sem teclado.
RUY se salvou no final dos anos 1980, parou de cheirar, beber e começou a publicar um livro atrás do outro.
Virou o maior (e autodidata) biografo brasileiro.
Seu relato nos remete às nossas compulsões.
Sofri o que ele sofreu com uma droga que dizem ser um mal menor, o cigarro. Para me livrar dele, foi uma luta de quase 30 anos.
COMPULSÃO trará outros depoimentos bombásticos: a modelo com anorexia (Fernanda Fahel), uma viciada em crack, em jogos e por aí vai.
Parabéns GNT.
March 8, 2016
No dia das mulheres a provação de Kardashian
“When you’re like I have nothing to wear LOL” (quando você tipo tem nada para vestir KKK).
Com esta legenda, Kim Kardashian começou o dia de ontem, 7 de março, nas redes sociais.
No de hoje, Dia Internacional da Luta das Mulheres, postou #LIBERATED, e a foto:
É a sua provação: ficar pelada, provocar, assumir, como gosta de dizer, a inspiração e idolatria do universo “bitch”.
Kim para mim foi sempre uma aberração midiática.
E merece mais do que uma coluna ou um post. Entendê-la não é fácil.
Tem 62,8 milhões de seguidores do Insta.
O New York Times tem 1,1.
Ela tem 41,4 milhões seguidores do Twitter.
A conta do The Guardian, @guardian, tem 5,2 milhões.
Kim é filha de Robert Kardashian, o maior advogado criminalista americano, que se notabilizou por defender (e livrar da cana) O. J. Simpson, num julgamento sensacional(ista) transmitido ao vivo pelas rádios e TV em 1995.
Kardashian pai fez das acusações e provas óbvias um caso de racismo. Morreu em 2003.
Não viu a filha, em 2007, que também quis a fama, começar um reality show com as irmãs.
Filha que não parou mais: apareceu em mais de dez filmes e num vídeo que vazou fazendo sexo com Ray J.
Adora postar que é rica: “sorry I’m late to the party guys I was busy cashing my 80 million video game check & transferring 53 million into our joint account” (se desculpa por não ter ido a uma festa por estar ocupada descontando um pagamento de 80 milhões de dólares).
Assume sua liderança no mundinho das “vadias”: “Yeah, I’m the one your bitch like…”
Mostra um modelito com a legenda: “Step up in this bitch like…”
Aparece no Oscar, na Paris Fashion Week, desfila, ensina maquiagem, dá palpite de moda…
Bem, existe a luta das mulheres e existe Kim Kardashian.
Tomara que a luta se sobreponha.
March 4, 2016
Lula deu motivos
JK já foi acusado de ter a sétima fortuna do mundo.
No exílio, vivia de favor, sustentado pelo dono da Manchete, Adolpho Bloch.
Que mandava Cony e outros para Paris, com envelope com dinheiro, onde o ex-presidente cultivou uma depressão comovente.
Então… Muita calma nessa hora.
Lula pisou na bola?
Muitos se sentiram traídos por suas alianças espúrias e estúpidas.
Adversários abomináveis e de uma linha ideológica antagônica tornaram-se aliado, amigos íntimos.
A governabilidade deu em aberrações históricas.
Sarney, Maluf, Collor, até Delfim Netto, filhotes da ditadura, como dizia Brizola, tornaram-se conselheiros e base política.
Companheiros e “cumpadres” passaram a frequentar um círculo antes restrito a idealistas como Antonio Candido, Florestan Fernandes, Sérgio Buarque de Holanda, Caio Graco…
Suas andanças com empreiteiros e pecuaristas em nada combina com sua origem militante de esquerda, de uma nova via do socialismo.
Ele andava com quem “companheiros e camaradas” da esquerda deveriam combater.
O Lula dos anos 2000 não era mais o dos anos 1980, da fundação do PT.
Trabalhou e ganhou dinheiro: como metalúrgico, presidente de sindicato, de partido, deputado federal e oito anos presidente da República, a um salário mensal médio de R$ 30 mil, excelente salário, e depois como palestrante.
Pode ter construído um bom e justificável patrimônio.
Trabalhou para ter um apartamento de 297 metros quadrados no Guarujá ou um sítio em Atibaia.
Tudo poderia estar dignamente regularizado em suas declarações na Receita.
Ter empreiteiros da OAS ou Odebrecht ou Andradre Gutierrez, que disputam licitações milionárias em todos os campos da economia, especialmente do petróleo, e batem na porta frequentemente do BNDES, frequentando sua casa, disputando a honra de bancar sua reforminha, somado a pedalinhos sem origem esclarecida…
É tudo muito estranho e indigno a um ex-presidente da República. Ele deveria ter recusado tais mimos.
Pecuaristas fazem seu churrasco. Executivos das telecomunicações ampliam o sinal do seu celular.
Precisava?
Especialmente ele deveria ter recusado tais mimos.
Não poderia ter nos poupado das desconfianças?
Como ex-presidente, não deveria ter se retirado de ambientes economicamente promíscuos, que colocassem em dúvida sua boa-fé, a honra de sua luta, de seu partido e aliados históricos?
Lula deu motivos.
Nada grave.
Bill Clinton já teve de prestar depoimentos enquanto era presidente. Pois mentiu, e um presidente em exercício não deve mentir.
Sem a truculência e o ódio que se vê hoje.
Esclareceu, cumpriu seu mandato e pode eleger a esposa a próxima presidente dos EUA.
Esperamos das autoridades respeito às leis e bom-senso.
O jornalismo rottweiler fará a festa, babando diante de uma opinião pública atordoada.
A vingança ideológica é para os pitbulls latirem.
E quem trata a política como um Fla-Flu barato vai bater panela e aplaudir adoidado hoje.
Basta Lula explicar enfim de onde vem seus bens.
E então, que se investigue a lisura deles.
Nada de mais.
O problema é se ele não conseguir explicar.
Todo brasileiro pode estar enrolado na Receita. Um ex-presidente, não. Um ex-presidente socialista que veio de um partido que nasceu para mudar a forma viciada de fazer política, super visado, menos ainda.
March 1, 2016
O Brasil não abaixa o freio de mão
Censura? Ora…
Existe algo mais ridículo?
Dos 15 aos 18 anos, entre 1974 e 77, eu fazia teatro amador num clube da elite no coração dos Jardins, em São Paulo, infantis peças que seriam exibidas aos associados e seus filhos, num auditório improvisado no salão de festas.
Peças como Romão e Julinha, A Bruxinha que Era Boa, Viagem ao Faz de Conta. Mesmo assim, precisávamos do selo de aprovação da Divisão de Censura de Diversões Públicas (DCDP). Agendávamos a visita da censura. Um dia antes da estreia, fazíamos o que a classe teatral chamava de “o espetáculo da censura”, geralmente antes do ensaio-geral, sem palavrões, duplos sentidos, metáforas políticas.
Uma senhora de coque se sentava sozinha no meio da plateia com uma prancheta no colo. Já estava tudo previamente combinado: suprimíamos qualquer frase ou cena que traria desconforto à velha e entediada senhora funcionária pública. Ele assistia sem sorrir, dava o atestado, não aparecia mais, e voltávamos ao texto as falas cortadas.
Quem eram essas figuras abomináveis?
Como aceitavam esta missão canalha? O documentário Estranhos da Noite, de Camilo Tavares, mostra a presença de censores no Estadão entre 1968 e 1975, a relação entre eles e a redação. Sofriam provocações. Soubemos que, além de proibido falar do surto de meningite na cidade, a palavra “Leonardo” estava vetada no jornal. Pois um censor, chamado Leonardo, achava que alguém ia aprontar com ele. O pintor renascentista virou então apenas Da Vinci.
A censura instituída com o AI-5 em 13 de dezembro de 1968, que criou a DCDP, por onde deveriam previamente passar todas as obras artísticas, filmes, peças de teatro, músicas, discos, antes de executados nos meios públicos, deveria ter sido abolida em 1979 com a revogação do AI-5, já que o projeto de abertura política estava em andamento. Mas não. Acabou a DCDP e criaram o Conselho Superior de Censura.
A censura, como um verme em coma, resistia a todos os antibióticos. Raul Seixas até fez uma música para ela, Anos 1980: “Hey, anos 80, charrete que perdeu o condutor. Hey, anos 80, melancolia e promessas de amor. É o juiz das 12 varas de caniço e samburá dando atestado que o compositor errou, gente afirmando não querendo afirmar nada, que o cantor cantou errado, e que a censura concordou.”
Se a música em voga era o rock brasileiro, sobre o rock brasileiro ou o estilete da censura. Em 1980, censuraram Conexão Amazônia e Veraneio Vascaína, de Renato Russo, ainda na fase da banda Aborto Elétrico, referência ao carro da Chevrolet, Veraneio, o preferido da polícia. “Toda pintada de preto, branco, cinza e vermelho, com números do lado, e dentro dois ou três tarados assassinos armados uniformizados”.
Nem a banda Blitz, pejorativamente chamada em São Paulo de “rock de bermudas”, por ser mais praiana e relaxadona, se safou. Em 1982, Cruel Cruel Esquizofrenético Blues e Ela Quer Morar Comigo na Lua foram censuradas. Ambas do álbum As Aventuras da Blitz, de Você Não Soube Me Amar. Como o LP já estava prensado, a saída foi inutilizarem no depósito da gravadora as duas faixas vetadas com riscos. A agulha do vinil passava reto pelas músicas proibidas. Brasileiros ficaram livres de ouvir “ela diz que eu ando bundando” e o duplo sentido da palavra “peru”.
Os Inocentes decidiram gravar um LP independente em 1983. A Polícia Federal censurou TODAS das 13 músicas. Mudavam a letra e mandavam de volta para a censura. Na frase final de Miséria e Fome, que fala de reforma agrária, incluíram: “Não estou culpando ninguém, não estou acusando ninguém, apenas conto o que eu vi, apenas conto o que eu vivi…” Enfim, só três músicas foram liberadas. O que era para ser o primeiro LP da banda virou um compacto de 12 polegadas que só tocava em 45 rotações.
Em 1983, Sônia, do Leo Jaime, foi censurada. Sônia era Sunny, clássico dançante dos anos 1960 de Bobby Hebb, que ganhou uma versão sacana: “Sônia, vamos nessa festa fazer um trenzinho, você na frente e eu atrás, e atrás de mim um outro rapaz….”. A Censura exigiu que o disco viesse com o selo “proibido para menores de 18 anos” e fosse vendido lacrado. Leo Jaime voltaria a ser censurado de novo em Cobra Venenosa: “Eu sou uma cobra venenosa, que pica, que pica…” Em desforra, ele fez Solange (sobre as bases da música do Police, So Lonely), em homenagem a Solange Maria Teixeira Hernandes, chefe da censura brasileira entre 1981 e 1984, patética figura conhecida como Dona Solange, dessas cretinas fundamentais que existem numa ditadura: “Eu tinha tanto pra dizer, metade eu tive que esquecer, e quando eu tento escrever, seu nome vem me interromper, eu tento me esparramar, e você quer me esconder, eu já não posso nem cantar, meus dentes rangem por você. Solange, Solange…”
Em 1984, foi a vez de Lobão, em Teoria da Relatividade. Falava de um triângulo amoroso: “Livros na minha cabeceira, ela na cama com outro rapaz”. Em 1985, Roger, do Ultraje, com as músicas Prisioneiro e a divertida Marylou, galinha que bota “ovo pelo sul” e foi barrada pela censura. Em 1986, Titãs. Se as rádios, por conta do refrão “vão se foder”, tocassem Bichos Escrotos, de Cabeça de Dinossauro, seriam multadas. Em 1986, foi a vez de Música Urbana, Capital Inicial, receber o veto.
A ditadura acabou em 1985. Mas a censura seguiu, dessa vez sob o comando do superintendente e depois diretor-geral da Polícia Federal, o “xerife” Romeu Tuma, que virou senador pelo voto por SP anos depois. O democrata governo Sarney ainda censuraria o filme Je Vous Salue Marie, de Godard, por pressão da Igreja Católica.
Ela só foi “abolida” em 1988, com a promulgação da nova Constituição. Entre aspas.
O Brasil não abaixa o freio de mão.
February 28, 2016
Spielberg e Obama se juntam para gozar Hollywood
Não tem negros no Oscar?
Ninguém melhor que Spielberg e o presidente Obama para, juntos, dar uma ironizada e envergonhar toda a classe.
Num falso promo [vídeo promocional], de um falso filme por vir, Spielberg diz que, depois do sucesso de Lincoln, fará um filme sobre Obama, e que o melhor ator para isso é Daniel Day-Lewis, “alguém que pode mergulhar no papel e ser Obama”, que já foi índio, açougueiro, Lincoln.
Basta maquiá-lo apropriadamente.
O próprio Obama, o mais carismático de todos, aparece dizendo, como se fosse Daniel, que o problema será ter o mesmo formato de orelha que o presidente americano.
Para continuar o casting, diz Spielberg, ele escolherá o comediante negro Tracy Morgan para fazer o vice-presidente, Joe Biden.
A ironia não termina. Ao final, Daniel-Obama diz que tem que descobrir o que motiva o personagem: por que da sua obsessão pela reforma na saúde, por que fica tão bravo eventualmente?
Hoje, será a noite de Hollywood repensar sua trajetória e replanejar o futuro.
Hoje, se fará história.
February 23, 2016
O cansaço da esquerda
É o projeto da esquerda que está decadente, ou falta alternância e renovação?
Evo Morales começou o primeiro mandato em 2006.
Elegeu-se para um segundo.
Em 2014, conseguiu que a Suprema Corte permitisse concorrer para o terceiro.
Pela manobra, a primeira gestão foi anterior à Constituição promulgada em 2009. Portanto, não contrariaria o artigo 168, que diz que presidentes só têm direito a uma reeleição, mudando as regras do jogo- o que é comum em democracias-palafitas apoiadas em áreas de riscos como as da América Latina (inclusive na nossa).
No fim do terceiro, decidiu que queria se candidatar a um quarto mandato, para governar o país de 2020 a 2025. Ficaria se reeleito 19 anos no poder.
Num referendo, a população dessa vez ao que tudo indica disse “basta, muchacho”.
É a primeira grande derrota do primeiro presidente indígena indisposto à alternância no poder desde 2006.
Só ele não percebeu que não faz sentido quatro mandatos contra a beleza do revezamento de ideias.
A recomendação é que Morales ceda à vontade popular.
Sempre comparado à figura de um ditador populista, regente de um regime que ninguém entende direito, mas respinga até no debate da política brasileira, o “bolivarianismo”, elegeu um culpado pela derrota: as redes sociais.
Redes sociais somos nós, o povo. Nós a alimentamos.
Depois da Argentina e Venezuela, a pseudo-esquerda encerra um ciclo na Bolívia.
No Peru, a filha de Fujimori lidera as intenções de voto para as eleições presidenciais do ano que vem com mais de 30 por cento.
E aqui, segundo o Ibope, 61% não votariam em Lula para presidente (contra 52% que não votariam em Serra, 42% em Marina, 44% em Aécio e 47% em Alckmin)
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