Marcelo Rubens Paiva's Blog, page 35
June 25, 2017
Batman versus marxismo
Batman, como eu, viu seus pais na mira de armas.
Que foram mortos.
Ficou órfão, como eu. Batman quis vingar essa grande violência cometida diante uma criança inocente. Batman nunca usou armas, como eu. Não as mesmas dos criminosos.
Encontrou formas de voar sobre a cidade.
Como eu, não acreditava no sistema que a organizava, não acreditava na polícia da sua cidade, não acreditava que justiça prevaleceria através da História, sem a ação dos seus punhos.
Batman se tornou um justiceiro solitário que sabia que, para consertar o mundo, ele precisava agir e combater o crime.
Com sua capa e força física.
E tecnologia, um supercomputador, um supercarro, um baita mordomo e um cinto de mil e uma utilidades.
Foi meu grande ídolo por anos. Existe uma sordidez em Batman que existiu em toda minha infância, que só percebi e a assumi quando cheguei na maturidade. A adolescência de um adolescente é a época em que a ingenuidade, a inocência e o desconhecimento resultam num ser perdido no espanto e passividade. Ou, quando rebelde, inconsequente.
Minha escola indiretamente só “piorava” na adoção de livros existenciais, como Carta ao Meu Pai e O Processo (Kafka), Os Irmãos Karamazov (Dostoievski), e de existencialistas, Sartre e Camus. Mais velho, percebi quem era meu inimigo, o que estava errado na minha vida, o porquê me transformei num prisioneiro de uma existência sem nenhum sentido.
O Batman da TV era divertido, irônico, psicodélico.
Explica-se: houve uma onda conservadora no macarthismo contra as HQs de super-heróis nos EUA, que acreditavam agentes públicos causavam má influência nas crianças.
A TV não só tornou o depressivo personagem num cômico como lhe deu um assistente adolescente, Robin. Nos anos 1980, Batman voltou a ser o que era: o Cavaleiro das Trevas. Voltou à sua luta individual.
A história não é estática, ela se transforma, ela vem a ser. A realidade é criada pela consciência dos homens, portanto, se a realidade surgiu das ideias dos homens, novas ideias podem fazer com que a realidade se transforme.
Marx, Hegel, Kant deram numa teoria em que a história estava determinada a mudar. Seus pensamentos se tornaram a ideologia de uma sociedade, se tornaram palavra de ordem, luta.
Poucos ou quase nenhum filósofo conseguiram tamanha façanha de mobilizar a humanidade em torno de um manifesto e mudar o mundo.
Hegel viu através da dialética que as ideias se movem, mudam, se negam, se contradizem, e que o presente se faz com a síntese das contradições passadas, portanto a história pode ser previsível, Weltgeist, seguir um caminho, uma direção.
A liberdade humana fez com que Marx criasse a teoria do materialismo dialético, que afirma que não é a consciência dos homens que determina seu ser, mas é seu ser social que determina suas consciências. Quando se toma consciência da dialética de forças conflitantes, a luta pelo poder surge, e os indivíduos podem se libertar e mudar a ordem social que os oprime.
Marx defendia que filósofos não devem apenas interpretar o mundo, mas mudá-lo. A única função da filosofia seria transformá-la em ação revolucionária. Mas a realidade não reside nas ideias, nem na consciência dos homens, e sim na ação concreta.
Surgiu o conceito de utopia, um tempo em que haveria uma completa harmonia social. Se Hegel dizia que da realidade se faz filosofia, Marx dizia que a filosofia precisa intervir na realidade.
Toda revolução é necessariamente violenta, já que o Estado faz de tudo para preservar a ordem que oprime o homem. A luta de Batman é violenta, porém não muda o sistema por dentro, não acaba com o crime e injustiças, é apenas uma luta de vingança.
Para Batman, a luta não era de uma classe, era exclusiva, egoísta, desagregadora, cada vez mais estava identificada com apenas um sentimento: vingança! Seus vilões não queriam manter privilégios. Queriam ser mais ricos que o próprio Batman. Batman era o capitalismo tentando organizar o capitalismo.
Batman sofria por ser só ele a pessoa que conseguia entender a sociedade, por ser só ele o rebelde que arregaçou as mãos e foi à luta, como diz o clichê, fazer justiça com as próprias mãos.
Seguia um princípio bíblico: olho por olho, dente por dente.
Sabia também que não adiantava nada existir apenas um Batman contra uma sociedade corrompida e injusta.
No entanto, ele não parava.
De esquina em esquina, do topo dos prédios, nos becos escuros, nos imóveis abandonados, nas fábricas abandonadas em que gotejavam água de encanamentos enferrujados ou em que sempre havia um galão com ácido para destruir seu inimigo, Batman exercia o seu desejo e a sua missão de eliminar o mal, de um em um, sem eliminar o mal por completo.
Passei a adolescência como ele dividido entre dois ideais, o da luta por vingança e o da luta por transformação.
Uma ação revolucionária definiria qual verdade prevaleceria.
Uma ação qualquer.
Foi quando comecei a escrever.
No jornal da escola que me ensinou a refletir, em que filosofia era matéria obrigatória.
June 22, 2017
A decadência do bom teatro comercial
Triste fim da cena teatral brasileira. Digo, do chamado “teatrão”, o bom teatro comercial.
O circuito undeground ainda pulsa. Já o tradicional…
Eles andam às moscas.
Se nas grandes capitais, como Paris, Nova York, Londres, Berlim, eles lotam e abrem sessões à noite e até às 14h, no Brasil o tradicional e bem localizado Teatro do Leblon, com três salas (Fernanda Montenegro, Marília Pera e Tônia Carreiro), suspende as atividades.
Os bares na Rua Conde Bernadotte, na galeria do teatro, continuam lotando; o carioca continua prestigiando a comida de boteco da Academia da Cachaça e o chope.
Já a cultura ficou para trás.
A temporada da peça O Garoto da Última Fila, a estrear no fim do mês, foi cancelada.
O proprietário do complexo, Wilson Rodriguez, afirmou para a Veja Rio que não tem mais público, e só reabrirá se alguma peça tiver “relevância e consiga dar algum lucro”.
O produtor teatral, Eduardo Barata, comentou na sua página do Facebook:
“Triste, muito triste… Inacessível pagar mínimos dos teatros do Shopping da Gávea, R$ 17 mil reais semanais. Falta de público pagante. Apenas um jornal de grande repercussão na cidade sem gestão pública no Estado e uma cidade caótica”.
“Mais do que nunca, nós profissionais da cultura temos que nos unir, discutir e cobrar a manutenção de políticas públicas para o nosso setor, em todas as instâncias”, conclui.
Era a ambição de qualquer agente cultural ter uma peça em cartaz numa daquelas salas bem localizadas e com bom maquinário.
Hoje, o proprietário recebe propostas da Igreja Universal, para desespero da classe teatral.
Pode-se passar horas listando as causas: as leis de fomento, que ciaram uma dependência da arte com patrocinadores, derrubaram a qualidade dos espetáculos e inflacionaram o aluguel de salas; a decadência econômica da cidade; a violência urbana; Netflix e outros canais de vídeo e filmes; o monopólio de musicais; a epidemia das carteirinhas de estudante falsificadas…
O fato é que as grandes filas e disputas por ingressos para assistir aos grandes artistas se dissiparam.
June 21, 2017
Google homenageia Machado de Assis
Cada país ou língua tem o autor em que toda a cultura se baseiam e suas semântica vira regra.
Na Itália, Dante. Na Alemanha, Goethe. Os ingleses tiveram Shakespeare. No Brasil, é o carioca filho de ex-escravo, Machado de Assis.
O Google em doodle relembra seu aniversário, 21 de junho.
O fundador da Academia Brasileira de Letras, homem cultíssimo, poliglota, apesar de nunca ter saído do Brasil (e quase nunca do Rio de Janeiro) nasceu num berço pobre em 1839, órfão ainda criança, escrevia em revistas e jornais, em que publicou grande parte da sua obra no formato folhetim (a telenovela da época).
Aprendeu quase tudo sozinho (inclusive francês, trabalhando numa padaria).
Conseguiu um emprego de revisor de jornais, depois colunista credenciado pelo Senado.
Ao todo, deixou de herança aos brasileiros (não teve filhos) romances, peças teatrais, 200 contos, poemas e sonetos e crônicas.
Começou associado ao romantismo.
Mas, ao se aposentar no serviço público, teve tempo para inovar e revolucionar a literatura brasileira, influenciado por Flaubert, Stendhal, Alexandre Dumas, Bslzac e Eça de Queirós, com a “trilogia” Memórias Póstumas de Brás Cubas, Quincas Borba e Dom Casmuro.
Em que procura a identidade de um Brasil que saía da Monarquia, em que emergia uma burguesia entediada, fútil, consumista e hedonista.
Já havia utilizado o conto, em Contos Fluminenses e Histórias da Meia-Noite, como laboratório da experimentação.
E, depois, em Papéis Avulsos, publicou o irreverente e pertubador O Alienista.
Hoje, o Velho Bruxo do Cosme Velho é reconhecido no mundo todo como um dos grandes da literatura e angaria fãs como Martin Scorsese.
Bem lembrado, Google.
June 19, 2017
A delação de Putin
Putin vira minissérie.
Oliver Stone pensou em fazer um documentário de duas horas sobre o mais volúvel de todos os líderes mundiais, o ex-agente da KGB, Vladimir Putin.
Que não se sabe se é amigo ou inimigo dos americanos (dos europeus é inimigo com certeza).
Mas o cineasta, especialista em retratar líderes mundiais, como JFK, Nixon, Bush, Chaves, tinha material para quatro horas de documentário.
Não conseguiu editá-lo e ficou em quatro horas, exibido em capítulos pela Showtime, aos domingos.
Ontem, foi exibido um episódio que trouxe sem querer revelações bombásticas sobre a política americana.
Como numa delação, Stone o fez abrir o jogo sobre as eleições de 2016, se Putin gostava ou não do candidato de “esquerda” à presidência, o democrata Bernie Sanders.
Putin acabou dando uma aula de macropolítica americana.
Disse que Sanders poderia, se eleito, fazer algumas mudanças, mas não muitas, engessado pela burocracia que cerca a Casa Branca.
Explicou que a pessoa que encabeça o Estado manda menos que centenária força da burocracia que cerca a presidência.
Lembrou a incapacidade de Obama de se retirar dos conflitos do Oriente Médio e fechar a prisão em Guantanamo, promessas de campanha.
O que se deduz que, não, Putin não trabalhou pela vitória de Trump.
Será?
Stone é um tremendo cineasta e não toma partido. Não é um cientista político afiado.
Para o jornal russo Rossiyskaya, o cineasta disse que Putin tem comprometimento com a ordem mundial e com a soberania dos países.
“Ele é um advogado por treinamento. Sem sua interferência, os Estados Unidos continuarão a operar num mundo unilateral. Putin quer a volta de um equilíbrio. Ele não procura expandir a Rússia. Nunca o ouvi falar sobre isso. Ele redesenhou a nova fronteira russa, embora os 25 milhões de russos tenham ficado do outro lado”.
Stone fala da Criméia e do conflito na Ucrânia. Esqueceu-se da Chechênia, Geórgia e outros países que tiveram intervenção russa pesada.
Não é um especialista. O crítico da Vox, Todd VanDerWerff, até lamenta que Stone deixou de fazer as perguntas certas e não é um bom entrevistador.
Os americanos terão que ler nas entrelinhas para entender o que tem por trás da misteriosa mente do segundo homem mais poderoso do mundo.
No Show de Putin no Showtime.
June 14, 2017
Custo de campanha para presidente subiu 661%

FILIPE ARAUJO/ESTADÃO
Não é baixa a inflação do voto no Brasil.
E, a cada eleição, ele tem uma valorização preocupante, que pode alimentar uma corrupção bilionária.
O custo do voto para presidente, por exemplo, subiu em quatro eleições, de 2002 a 2014, 661%. De Caixa 1 (dados oficiais).
É o que indica pesquisa inédita do Centro de Pesquisa e Economia do Setor Público (Cepesp), que descreve os valores médios gastos por voto dos eleitos em eleições entre 2002, ano em que os gastos de campanha começaram a ser publicados pelo TSE, e 2014.
A tabela mede a evolução do gasto declarado por voto pelos eleitos a cada cargo.
O custo do voto para presidente aumentou sete vezes de 2002 para 2016.
Pesquisadores do Cepesp, centro interescolar da FGV-SP, comparam o fenômeno à corrida armamentista da Guerra Fria.
Apesar de terem arsenais para destruírem um ao outro diversas vezes e levarem o planeta junto, o bloco americano e o soviético não paravam de investir.
Porque, se um parasse, ficaria desatualizado ou se sentiria inferiorizado.
Os gastos poderiam servir a outros propósitos. Mas a racionalidade individual foi substituída pela irracionalidade coletiva.
Faltou cooperação política: todos ficariam melhores se houvesse limite de armas, mas cada país acreditava que precisava investir o mesmo que seu adversário, para manter forças balanceadas (teoria do economista prêmio Nobel, Thomas Schelling).
O mesmo se aplica às eleições brasileiras.
A média de gastos declarados dos eleitos (Lula 2002, Lula 2006, Dilma 2010 e Dilma 2014) é a mesma dos derrotados (Serra 2002, Alckmin 2006, Serra 2010 e Aécio 2014).
Duas coligações gastam cada vez mais, criando uma rede de promiscuidade bilionária entre partidos e empresas.
E vê-se pelas delações recentes da Odebrecht e JBS: os que corrompem um bloco são os mesmos que corrompem seus adversários.
Para a Cepesp, “o esvaziamento da cooperação entre os atores políticos, cooperação sobre a qual se apoia a negociação dos conflitos em sociedades democráticas, levou os candidatos a uma corrida irracional por mais recursos de campanha”.
Os pesquisadores propõem uma reforma política cuja prioridade seria a redução do custo de campanhas, e não a mudança do sistema eleitoral, além de uma regulamentação sobre o financiamento das campanhas.
“Como a efetividade dos gastos de campanha depende do investimento relativo de seus adversários, se um partido aumenta seus gastos não há outra alternativa para o partido competidor que não seja aumentar também o investimento em gastos de campanha. Este processo se revelou insustentável e, diferentemente da corrida armamentista que terminou com a derrocada da União Soviética, o resultado da corrida eleitoral brasileira foi a destruição dos envolvidos refletida na generalização dos escândalos políticos que assolam o país”.
Leia os dados colhidos e a proposta dos pesquisadores Ciro Biderman, George Avelino e Arthur Fisch no site:
A corrida armamentista nas eleições brasileiras
June 13, 2017
Paris celebra 50 anos de tropicalismo
Poucos daqui lembraram da data. Os franceses, não.
Os 50 anos do tropicalismo serão celebrados no Festival de Cinema Brasileiro de Paris.
Sim, faz 50 anos que no Terceiro Festival de Música Popular, da TV Record, em 1967 em São Paulo, Gil, com Mutantes, e Caetano lançaram as músicas que deram no tropicalismo (e no disco Tropicália de 1968).
A mostra será entre 20 a 27 de junho no cine Arlequin (em Saint Germain de Près, que já foi celeiro da boemia, literatura e arte francesa).
Realizada pela Associação Jangada, da carioca Katia Adler, a programação conta com 20 filmes:
Oito documentários
Oito longas
Mostra 50 Anos de Tropicalismo
E debate com o jornalista Sergio Rizzo
Curiosamente, o filme Elis, de Hugo Prata, que revela os conflitos na época e a ciumeira entre bossa nova, tropicalistas e MPB, e a competição entre Nara Leão e Elis, abre a mostra
Curiosamente, foi em Paris que desembarcaram os expulsos do país exilados pela ditadura militar Caetano e Gil em 1969, que depois se mudaram para Londres.
Chico, Artista Brasileiro, de Miguel Faria Jr, encerrará.
Além deles, serão exibidos na mostra Tropikaolista, de José Walter Lima, e claro o fabuloso Tropicália, de Marcelo Machado.
Os filmes em competição do festival de cinema brasileiro serão Não Devore Meu Coração, de Felipe Bragança, Beatriz, de Alberto Graça, Como Nossos Pais, de Laís Bodanzky, Gabriel e a Montanha, de Fellipe Barbosa, Era o Hotel Cambridge, de Eliane Caffé, Para Ter Aonde Ir, de Jorane Castro, Rio Mumbai, de Pedro Sodré e Gabriel Mellin, e Redemoinho, de José Luiz Villamarim
Entre os documentários fora da competição está o aguardadíssimo No Intenso Agora, de João Moreira Salles, que resgatou filmes em Super 8 de uma viagem da família à China, durante a Revolução Cultural, em que aparece sua mãe, ainda viva.
Veja a programação completa:
June 12, 2017
Temer: fiapo preso no dente
Temos traumas de um vice, Jango, e boas lembranças de outro, Itamar.
Queríamos que Temer fosse um novo Itamar: agregador, líder discreto e ideal para uma transição.
Meses atrás, Temer era a solução.
É histriônico e barroco como foi o mineiro, só não é Itamar, é Temer.
Não se cercou de notáveis, mas de notáveis figuras contaminadas, seu clã, pelas mesmas fontes que contaminaram a quem substituiu.
Temer está sujo, Temer mentiu, Temer passa ridículo.
Alguém precisa estar no comando, alguém precisa tocar as reformas, porém até aliados, como Roberto Freire, e cabelos sem tintura ou aloirados do tucanato, liderados por Alberto Goldman, querem o PSDB fora dessa roubada (literal).
Agora, quase ninguém mais quer Temer, e não sabe como se livrar dele, ou realizar o grito Fora Temer!
A saída TSE, a última esperança, decepcionou ao não julgar, mas cumprir missão.
A saída Congresso é a mais difícil: apenas 170 deputados impediriam sua cassação.
A saída renúncia é improvável.
Citado em delações, pego no flagra e fugindo até de um interrogatório policial, sua única salvação é o cargo, o qual alcançou de carona.
Se Lula (PT) já foi o sapo barbudo que Brizola (PDT), FHC e Covas (PSDB), Ulisses Guimarães (PMDB) teriam que engolir, numa união inédita na política brasileira contra Collor, Temer se tornou intragável até para a Rede Globo, sempre a última a aderir a movimentos de ruptura radicais; mas que quando adere…
Temer ficará. Não será digerido. Será um fiapo preso no dente. Até a sua extração em 2018.
Temer virou um calendário.
June 8, 2017
Twin Peaks decola?
Twin Peaks teve duas temporadas no começo de 1990.
Ambas passaram no horário nobre, TV aberta, depois do Fantástico, domingo, quando o show da vida acabava pontualmente às 22h, colado nos gols da rodada.
Não havia internet, TV a cabo, celulares, e a grande novidade tecnologia, que nos deixava de boca aberta, era o fax.
Me lembro de que estreou num inverno gelado.
Restavam os livros, as fitas de filmes alugadas, e os seis canais de TV aberta.
A audiência era estrondosa.
Na semana, só se falava dela.
Apesar de toques de realismo fantástico, uma marca do seu criador, David Lynch, que lançou uma lista infindável de personagens até então estranhos na TV, como o protagonista, o anti-herói agente Cooper, a trama “quem matou Laura Palmer”, a linda estudante popular da escola, seduzia a grande audiência.
Estranhos, vírgula.
Vivíamos, especialmente no Brasil, a era dos personagens bizarros, influenciados, claro, pela literatura latino-americana de Garcia Márquez, e pela teledramaturgia de Dias Gomes e Bráulio Pedrosa: o padre que voa; a mulher que explode de tanto comer; o coveiro que expele formigas pelo nariz…
Saramandaia, O Bofe, Bem Amado foram algumas das novelas que desenharam uma dramaturgia sem heróis, surrealista, marca de Dias Gomes [que explodiu na dramaturgia com a peça O Berço do Herói, que a ditadura censurou e deu numa mutilada novela Roque Santeiro].
Primeira temporada de Twin Peaks foi comandada por Lynch.
Na segunda, ele brigou com seu co-autor, Mark Frost, que, erroneamente, queria revelar o assassinato de Laura Palmer, trama contestada por Lynch.
Sem Lynch e com executivos da TV nos comandos, a série perdeu no encanto e flopou.
É revista agora, na era do streaming, com a dupla ressuscitando personagens das primeiras temporadas em novas tramas e locações, como Nova York, Las Vegas.
Mas é um Frost intimidado pela certeza de ter errado 25 anos atrás.
E um Lynch cada vez mais experimental, incompreensível, simbólico, amado ainda, mas sem encantar o grande público, com suas tramas de muitos planos alternados, delírio e realidade, vida e morte, consciente e inconsciente, em que não se sabe se personagens estão eternamente mergulhados num sonho labiríntico, ou se a realidade pode ser vista como obra do surreal.
Estamos já no quinto episódio de Twin Peaks 2017.
Ainda não dá para entender o que se passa.
Na era nas opções (Netflix, HBO, Play, TVs pagas, Apple TV, Amazon, Youtube, em que as séries são os carros chefes da programação), até onde vai a paciência e a boa vontade do disperso e exigente espectador do milênio?
Twin Peaks 2017 ainda parece um hidroavião experimental taxiando pelas águas da cidadezinha fria americana, fronteira com o Canadá.
Decola?
Tem gente desembarcando.
ps> O New York Times, da montagem acima, traz um guia para retomar o que aconteceu nas primeiras temporadas, que ajuda a entender a de agora: https://www.nytimes.com/2017/04/27/wa...
June 6, 2017
Mostra do novo cinema indiano em SP
Você conhece o novo cinema indiano?
O bom do cinema mundial nem sempre entra em cartaz.
Numa cidade como São Paulo, é preciso ficar atento à programação do circuito que engloba centros culturais, clubes e festivais.
O CCBB na semana do dia 14 de junho a 3 de julho abre suas salas à cultura indiana.
Nele, uma mostra do que se tem feito em cinema nos últimos quatro anos na Índia, país que mantém uma indústria vibrante, popular, em que cinemas de mais de mil pessoas, com espaço reservado para dança, lotam (são 13 mil no país).
A curadoria de Carina Bini e Shankar Mohan selecionou filmes de uma nova geração de realizadores.
A diversidade está traduzida na quantidade de idiomas falados (nove): Hindi, Bengali, Marata, Bodo, Malaiala, Concani, Tâmil, Canará e Inglês. Incluindo uma produção de Assam, no nordeste do país, onde se fala a língua Bodo, e uma de Goa, falada em Concani e Inglês.
Uma mesa de debates discutirá Cinema Paralelo versus Comercial.
Em 14 de junho, às 18h30, o evento abre com o filme Armadilha, de Jayraj Rajasekharan Nair, vencedor do Urso de Cristal de Berlim em 2016.
Serão também exibidos:
Ilha de Munroe (de Manu), falado em malaialo.
Que Assim Seja (de SumitraBhave e SunilSukhtankar). Idioma: Marata
Água (de GirishMalik. Da região de Mumbai. Idioma: Hindi
Navio de Teseu (de Anand Gandhi), da região: Mumbai. Idioma: Hindi e Inglês
Além deles, O Ovo do Corvo, Margarita Com um Canudo, A Menina e a Coruja, O Fabricante de Caixão e mais.
Pink, de Aniruddha Roy Chowdhury, da região de Mumbai, é um drama indiano sobre uma mulher agredida sexualmente que acaba sendo julgada por tentativa de homicídio do estuprador.
O filme foi utilizado pela polícia do Rajastão, para treinar policiais a lidar melhor com os direitos das mulheres.
Na programação, está incluído um debate sobre a situação das mulheres na Índia.
Terá também comemorações no Dia Mundial da Yoga, com aulas de Asthanga, Vinyasa, e shows de música clássica indiana.
Ingresso do cinema custará R$ 10 (R$ 5 meia). Debates, apresentações de música e dança e aula de yoga será grátis.
CCBB fica na Rua Álvares Penteado, 112, Centro; aberto de quarta a segunda-feira, das 9h às 21h.
Checa a programação nos sites:
ccbbsp@bb.com.br
June 5, 2017
Capa mais copiada faz 50 anos
Não é só o conteúdo musical de Sgt Pepper’s, o disco mais importante da história da música contemporânea, que influenciou tudo o que veio depois.
Sua capa foi a mais copiada da história. Ou melhor, parodiada.
De legos a Frank Zappa e Kiss.
De rappers a fotos de formatura ou casamentos.
Até os moradores-personagens da Vila Sesamo e de Springfield, cidadela em moram Os Simpsons, já se posicionaram como o quarteto de Liverpool na capa do disco que uniu referências musicais de todos os continentes e casou o rock com o erudito.
Nosso Zé Ramalho a copiou.
O fim da lista é de perder de vista:
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