Marcelo Rubens Paiva's Blog, page 28
December 3, 2017
Aqui é Corinthians! – Fé Alvinegra
Se todos diziam ser impossível, a gente sabia, a gente avisava: “É nada, aqui é Corinthians”.
Não existe o impraticável, existe o Corinthians.
E a fé que empurra, fé que dá forças, fé que defende, fé que exige “sai, zica!”, fé que faz cantar o jogo todo, torcer sem parar, fé que acredita no difícil, que tem fé no improvável, que acredita no desacreditado, que manda a bola pro gol.
Corinthians não é apenas um time, é uma torcida, é uma Nação. Começou assim. E assim sempre será.
Corinthians não é a quarta, terceira, segunda força, é uma nacionalidade, um espírito, um jeito de ser, uma alma alvinegra que pulsa num coração sofredor.
Ser corintiano é eterno, infinito, horizontal e vertical, plano e redondo, ser corintiano é ser completo. Ser corintiano é a minha identidade, é o que me define: “Aqui é Corinthians!”
É minha família, meu planeta, meu país, um adjetivo.
Ser corintiano é ser reconhecido com um “Vai Corinthians!”, é encontrar aliados, gritar na rua para um amigo “Aqui é Corinthians!”, é ouvir te chamarem “E aí, Corinthians?”, é se despedir com o slogan “Vai Corinthians!”.
Corinthians não tem torcedores, tem seguidores.
É uma Nação e uma religião, uma ética, uma fé.
Tem corintiano em toda parte, no lugar mais inusitado, do outro lado do mundo.
É o time do povo. É de sofredor. Sou corintiano, graças a Deus.
Corintiano não viaja para torcer, invade, torce o jogo todo, incentiva sem parar, prometendo: “Eu nunca vou te abandonar!” Corintiano não para, não para, não para. Vibra. Abençoa. Vira apóstolo. A fé não apenas nos move, nos faz invadir.
São Jorge me ensinou, a nunca desistir, a lutar até o fim. Que Deus me perdoe, minha fé tem mais outro dono. E se deixarem, no meu casamento toca o hino do Corinthians.
E quando perco as esperanças, alguém me grita “Vai Corinthians!”, e volto a acreditar no sonho mais irrealizável.
Se me desafiam, consigo o que quero, grito batendo na veia: “Aqui é Corinthians!” Quando um místico dá um passe, um padre reza, um cantor termina seu solo, e o silencio se faz, é quando me seguro para não gritar: “Vai Corinthians!”
Se foram seis dias da Criação, veio a luz, o verbo e o homem, pode contar, Deus não descansou no sétimo, criou o Corinthians: a paixão completa, a devoção inexplicável, a fé absoluta, a idolatria divina, o amor supremo.
Dizem que o Corinthians não é um time que tem uma torcida, é uma torcida que tem um time.
O time existe e vive para a sua torcida, para fazê-la feliz.
Ser corintiano é ser preto e ser branco, ser preto no branco, branco no preto, ser tudo ao mesmo tempo, é vibrar com o gol e com o chutão, não faz questão de seu time jogar bonito, e ainda se orgulha do sofrimento que ele te traz.
Ser Corinthians é fazer de onde o Corinthians joga a sua casa. Onde tiver uma arquibancada, a gente lota vestindo preto e branco. Seja no nobre bairro do Pacaembu, seja no meio do povão de Itaquera. É pegar a Dutra como se fosse a Radial, é fazer de Tóquio uma grande favela.
Ser Corinthians é um movimento social, é unir na arquibancada o doutor e o empregado, é sair do estádio e ir lutar por democracia no Anhangabaú, é mostrar e brigar para que o futebol seja para sempre do povo.
Não sei quando me tornei corintiano, não sei se nasci corintiano, ou se o Corinthians nasceu em mim.
Antes de ser corintiano eu não existia.
November 30, 2017
Livro de graça
Sexta-feira, o bar barra livraria barra mercearia, ponto de encontro de escritores do Brasil todo, Mercearia São Pedro, irá distribuir mais de mil livro gratuitamente a seus fregueses.
A Merça, como chama a freguesia que o frequenta antes da virada do milênio, ou o Merça, como chamam os mais jovens, vende livros, serve de noites de autógrafo de muitos livros e também de saideira de noites de autógrafo em muitas livrarias que fecham às 22h.
E reúne, sim “escritores e artistas”, como se diz por aí. Eventualmente.
O evento começa amanhã, sexta-feira, 20h.
São livros doados pelo editor Joca Terron.
Aproveite porque o boteco agora tem cervejas artesanais.
Rua Rodesia, 34 – Vila Madalena, São Paulo
Horário: Aberto até 0h00
Telefone: (11) 3815-7200
November 27, 2017
A maldição da Miss Universo
A miss brasileira, a belíssima Monalysa Alcântara, ficou entre as dez.
Garota do Piauí era magnética, cativante, simpática e incrivelmente bela.
Junto com a americana, era das favoritas.
Não levou.
Vi gente acusando vestido de gala da brasileiríssima Glória Coelho, poderosamente vermelho, enquanto a maioria era branca e bege; tirando a jamaicana, com um amarelo mostarda inglesa de ferir os olhos.
Outros acharam que, por não dominar o inglês, não pôde engatar um papo mais elaborado com o apresentador americano.
“Acho que a brasileira foi derrotada pelo vestido e pelo desfile. Aquele vestido tapava tudo, ela parecia estar escondida no vestido e no cabelo. E soltar beijos no desfile de gala não dá! Ela é linda, mas…”, tuitou @PatSalRocha.
Ao responder a uma pergunta idiota do apresentador, se era verdade que já fora careca, respondeu com um oco discurso “o que vale é a beleza interior”.
Sua luta poderia ser mais pontual e explícita: fim do racismo, que é no fundo que que queria dizer.
Miss Brasil era exatamente como o Brasil, um país pobre, simpático, lindíssimo, carismático, sorridente e que exala alegria.
Num concurso de miss, só simpatia, carisma e, especialmente, a beleza, comovem.
Mas não é o bastante.
A torcida, minha inclusive, era enorme.
As redes sociais ficaram em polvorosas.
A apresentadora brasileira da TNT chegou a murmurar o cântico “Bra-sil! Bra-sil! Bra-sil!”.
Por que perdeu?
Seu queixo deveria estar mais erguido, sua postura mais confiante?
Se luta para melhorar a autoestima de crianças negras, faltou dizer “Black is beautiful!, “Power to the people!”?
Seu ar era inseguro, passivo?
Faltou postura?
Faltou posicionamento?
Não deveria ter mandado um beijinho para as câmeras?
O trauma de 1954, em que Marta Rocha ficou em segundo lugar no Miss Universo, por conta de duas polegadas no quadril, e o de agora, pareciam colocar o Brasil no estado de maldição.
Monalysa foi eliminada no filtro final.
Mas logo alguém lembrou: temos a verdadeira Miss Universo, Gisele Bündchen.
November 26, 2017
Mobilização pelo Parque do Bixiga
Depois do Parque Augusta, o foco de quem quer uma cidade mais humanizana se volta no entorno do Teatro Oficina.
Em terrenos de como proprietário o Grupo Silvio Santos.
Especialmente depois do Condephaat, em 23 de outubro, se pronunciar favorável ao projeto do grupo, para construir torres empreendidas pela Construtora Sisan e até um shopping,
A mobilização ganha a página: https://www.facebook.com/events/32026...
Hoje, 26 de novembro, a partir da 14h, uma ManiFESTAção começa em frente ao Teatro Oficina Uzyna Uzona.
O bairro todo, Bixiga, de muita história, tradição, samba, muito teatro, poucas árvores e nenhum parque, é convocado para protagonizar o Carnaval Cosmopolitano.
Está na programação:
CONCENTRAÇÃO A PARTIR DAS 14H
em frente ao Teat(r)o Oficina
rua Jaceguai, 520
VEM #PARQUEDOBIXIGA
1º MOVIMENTO
ATO ECUMÊNICO – início 15H
feitiço da política da multidão
em rito de abertura transecumênico
pros corpos, pro cosmos, pra sol
2º MOVIMENTO
INÍCIO DO CORTEJO
abraçaço do quarteirão do PARQUE DO BIXIGA
banho de cheiro com carro pipa! cantar, regar e irradiar a PRIMAVERA CULTURAL
3º MOVIMENTO
MANIFESTA DA MULTIDÃO
coro de blocos, transbandas, todos os fógos, todos os póvos maniçobas em festa !
Diz o chamado:
DOMINGO NO PARQUE
faça chuva ou faça sol
#vemproBixiga
maniFESTAção COSMPOLÍTICA de carnaval da multidão
26 de novembro, domingo, lua crescente
desejamos a força de todas as presenças num ATO PÚBLICO
para evocar o PARQUE DO BIXIGA
no fogo de carnaval
CONVOCAMOS os corpos livres, vivos, políticos, despertos!
para uma grande maniFESTAção PÚBLICA
uma acupuntura urbana
no território do PARQUE DO BIXIGA
para que seja uma terra pública, de cultura, de todas as artes
LIVRES
em contracenação com a especulação da vida
pelo capital
a alegria é a prova dos 9
PRESENÇAS CONFIRMADAS:
#SalvaroTBC
11a Bienal de arquitetura de são paulo
Aldeia Guarani tenondé porã
Arselino Tatto
Bloco Fluvial Peixe Seco
Bloco Fuá
Bloco Pagu
Carmen da Silva
Casa1
Celso Frateschi
Celso sim
Coral da USP – Casa de Dona Yáyá
Creative Comes
Denise fraga
Dj Thiago
Eduardo Suplicy
Eternos Suspeitos (Slam da Resistência)
FLM (frente de luta por moradia)
Gilberto Natalini
Greenpeace
Guarani mbyas
Guarani Tenondé Porã
Guilherme Boulos
Grupo Pandega
João Paulo Rilo
Leci Brandão
Marcelo Tas
Motin (movimento dos teatros independentes de São Paulo)
MSTC (movimento sem teto do centro)
MTST (movimento dos trabalhadores sem teto)
Nabil Bonduki
Padre Antônio Sagrado Bogaz, pároco da igreja da Achiropita
Parque Augusta
Sâmia Bonfim
Sérgio Mambert
Terreyro Coreográfico
Toninho Véspoli
Tutu Moraes (Santo Forte)
November 23, 2017
Começo do Fim do Mundo recomeça

ROLANDO DE FREITAS/ESTADÃO CONTEÚDO
A primeira edição rolou em 1982.
Não se sabia que faria história.
O Começo do Fim do Mundo foi um festival punk para selar a paz entre as gangues punks espalhadas pela Grande São Paulo.
Punks lotavam shows em toda parte.
Mas eram completamente desconhecidos pela imprensa, gravadoras e cadernos culturais.
Suas bandas (cada gangue tinha uma banda) se revezaram no palco no final do corredor do recém-inaugurado Sesc Pompéia.
Usavam o mesmo equipamento, emprestado pela banda Inocentes.
Deu tudo certo no sábado. Antônio Bivar lançou o que se tornaria um clássico da época, O que é Punk?, da popular coleção Primeiros Passos, da Brasiliense.
Discos eram vendidos e trocados.
Pôsteres, camisetas, expostos.
Mas no domingo, não teve jeito. O pau comeu.
Gangues se perseguiram pelo bairro. A Tropa de Choque foi chamada. O Sesc invadido.
Saiu em toda a imprensa e em fanzines internacionais.
Quanto as bandas, muitas delas foram contratadas pelas grandes gravadoras ou lançaram discos independentes.
Algumas, como Cólera, faziam mais sucesso na Alemanha do que no Brasil.
Um vinil duplo será relançado neste final de semana para celebrar os 35 anos do evento com músicas inéditas gravadas naquele mesmo show.
Acompanha um livreto de 36 páginas com fotos do americano Paul Constantinides, cópia do pôster original e texto do Bivar, organizado pela NADA NADA DISCO
O disco será lançado sábado, no dia 26 de Novembro.
Um show da primeira banda punk do Brasil, Restos de Nada, está prometido.
Reeditando amanhã, sexta, o primeiro show punk que rolou no Brasil, organizado por Kid Vini há 40 anos na zona norte, num porão abandonado.
A filosofia do NO FUTURE volta com tudo.
Aqui vai trecho do Livro Meninos em Fúria que escrevi com Clemente:
A ideia de mais paz e menos tretas entre os punks saiu da loja do Fábio, com incentivo do Bivar. Vamos fazer um grande festival. Callegari e Meire foram de trem ao ABC e Clemente, para as quebradas mais obscuras e temerosas de São Bernardo. Foram aliciar bandas punks para o grande festival que juntaria todas as bandas em atividade e rolaria nos dias 27 e 28 de novembro de 1982, no recém-inaugurado Sesc Pompeia: o primeiro festival punk, nomeado de O Começo do Fim do Mundo. Dessa vez, a cobertura da imprensa seria ampla. Ampla até demais. O objetivo era um pacto de paz entre as facções rivais de punks da capital e do ABC, que se envolviam em brigas cada vez mais sangrentas. Vamos nos unir, o punk precisa viver, o punk está vivo, o punk é maior do que desavenças bairristas.
Patrocinado pela Fotoptica, que também promovia festivais de vídeo, os shows rolariam sábado e domingo, entre 14h e 18h, no fundo da antiga fábrica. Nos primeiros salões, exposições. Era a oportunidade de Bivar lançar o então já pronto O que é o punk?. Deu tudo certo no sábado. Bivar lançou o livro, que trazia o manifesto. Fabião expôs produtos da Punk Rock, vendeu camisetas, discos, coisa e tal. Tinha banda que não tinha instrumento; tocavam com o baixo do Clemente e o equipamento dos Inocentes.
TVs, rádios, jornais… A imprensa deu uma tremenda cobertura ao evento. Especialmente a Folha, cujo caderno cultural era editado por Matinas Suzuki, velho simpatizante da Libelu, cara antenado que se dizia adepto mais da liberdade que da luta. Matinas participou das manifestações estudantis contra a ditadura de 1976, 1977, 1978, e deve ter se perguntado, surpreso, como todos que leram suas reportagens na Ilustrada: mas tem punk no Brasil?
Lá fomos nós, todos interessados em música, cultura, em revolução, ao Sesc Pompeia.
No sábado: Dose Brutal, Psykóze, Ulster, Cólera, Neuróticos, M-19, Juízo Final, Fogo Cruzado, Desertores e Inocentes.
No domingo: Suburbanos, Passeatas, Decadência Social, Olho Seco, Extermínio, Ratos de Porão, Hino Mortal, Estado de Coma, Lixomania e Negligentes.
Bandas de São Paulo e do ABC. A garotada gritava pelos corredores: “Foda-se o capitalismo!”. Bandas abriam e gritavam palavras de ordem. Inocentes gritou no microfone: “Viva o proletariado brasileiro!”. Todos se diziam contra o sistema. E, a qualquer momento, uma pancadaria entre gangues punks podia rolar a rampa de paralelepípedo abaixo. Muitos estavam armados. Clemente lembra, orgulhoso:
— Todo mundo, todas as gangues, todas as bandas. Foram dançar as músicas. Umas dez bandas tocaram com meu baixo, umas dez outras com a guitarra do Callegari. Os caras não tinham instrumento. Amplificador era nosso, equipamento era tudo dos Inocentes. Puta clima legal.
No domingo, quando a coisa estava para acabar em paz, Indião subiu num poste, lá na rua, não dentro do Sesc, e fez um discurso bélico:
— Vocês não se odeiam? Por que não resolvem agora as tretas?
Já estavam entre eles os Carecas do Subúrbio, gangue nova, não fascista, que tinha um movimento próprio, de esquerda, o movimento dos skins, o Punk dos Skins; curtiam ska, reggae, o street punk, diferentemente do punk original, mais cantado, com mais harmonia. Os Carecas tinham treta com os Punks da Morte, que andavam com os da Carolina. E aí começou.
— Por uma época, morei na mesma rua que o Sé e o Tikão, que eram da gangue Punk da Morte. Anos depois, os dois morreram. O Sé de aids, acho que de injetar. Ele tomou várias facadas dos Carecas, ficou em coma, era um puta cara gente boa. Saiu do hospital, era todo magrinho, mas andava com um .38. Ele virou o diabo. A gente andava tudo meio junto, punks da Morte e da Carolina. E aí, quando saiu essa treta, tinha uns trezentos punks brigando. Já era uma guerra campal. Briga de torcida de futebol.
A vizinhança reclamou. Polícia chegou às 16h10 do domingo. Entrou no Sesc. Levaram som e câmeras, enquanto o pau comia na rua Clélia. Punks cobravam broncas. Pancadaria. A imprensa lá. O tumulto se generalizou pelo bairro. A turma dos punks do ABC, acuada, correu para a igreja evangélica em frente, pediu abrigo ao pastor, que fazia um culto. A nuvem de bomba de gás lacrimogênio começou a entrar na igreja. Fecharam as portas. Fiéis e punks lá dentro. Chegou a Tropa de Choque. De dentro, os punks fecharam o portão vermelho de entrada do Sesc, uns subiram no muro, mas a polícia entrou. Aquele momento foi o ápice e o começo da queda. A Folha noticiou: “Festa dos punks termina com prisão”. “Prisões, pancadarias e protestos — assim terminou o festival punk, com presença de jovens que ‘tumultuaram o ambiente’, segundo os moradores que chamaram a PM.”
O Sesc estava sob comando de José Papa Júnior, e seu nome aparecia nos cartazes oficiais do Festival O Começo do Fim do Mundo. Logo José Papa Júnior, conhecido como Zizinho, que comandou a Federação de Comércio de São Paulo de 1969 a 1984, tentou ser senador pelo PDS, herdeiro da Arena, antigo partido governista na ditadura. Foi cotado para vice-presidente de Collor. Sua família era dona do banco Lavra, concessionárias de veículos, de imóveis, fazendas e uma distribuidora de ferro e aço, a Cibraço. Em abril de 2000, o Banco Central decretou a liquidação extrajudicial no Lavra: identificou um rombo de 30 milhões de reais. O grupo ruiu. Os Papa foram acusados de lançar títulos podres no mercado internacional e de depositar em contas na Suíça dinheiro de caixa 2. Zizinho se afastou do banco.
Se Papa enfrentava problemas na justiça, seu Sesc bombava. Entre 1983 e 1984, o Sesc Pompeia abrigou o programa de TV Fábrica do Som, apresentado pelo poeta, videomaker e artista multimídia Tadeu Jungle. Exibido aos sábados à tarde na TV Cultura, o Fábrica deu o tom do que estava por vir: uma geração que saiu do coma no Trate-me leão e engrenou no punk, saudava o novo rock. Foi a primeira vez que bandas como Capital Inicial, Ultraje a Rigor, Paralamas do Sucesso e Titãs apareceram na TV. Jungle se lembra:
— No Fábrica do Som podia tudo, tínhamos liberdade total. Foi uma loucura aquele programa, nunca mais se fez algo igual. Poetas concretistas com Caetano, o pessoal do Asdrúbal, bandas de rock, punks, estudantes… Durou dois anos. Tinha um quadro em que as pessoas podiam subir e falar o que quisessem. Era redemocratização, queríamos dar voz à juventude. No último programa, convoquei uma menina para subir no palco e disse: “Pode fazer o que quiser”. Ela tirou a roupa. Acabou o programa ali.
Foi muito para a TV Cultura e para o Sesc. E, em novembro de 1982, mal sabia Papa Júnior que em suas instalações ocorria um dos eventos mais divulgados pela mídia underground do mundo. Tinha correspondente até do Washington Post. Maximum Rock’n’Roll, principal jornal underground americano, deu páginas e páginas sobre o festival.
Clemente conta:
— Tinha muita gente. Porque foram os punks e o pessoal ver os punks. Foi a descoberta. Ninguém achava que tinha disso no Brasil. A gente era tudo moleque. Era uma urgência, saca? Eu preciso fazer alguma coisa, eu quero tocar, pra botar pra fora uma coisa que estava reprimida. Eu mesmo acreditava que o movimento punk era a vanguarda do movimento revolucionário.
November 21, 2017
Repensando a televisão
No passado, o sonho de todo grupo de comunicação era um espaço no satélite e um sinal de televisão.
Grupo Abril, JB, igrejas, lutaram por concessões de rádio e TV controladas com mão de ferro pelo regime Figueiredo. Dóceis ao governo, conseguiam o sinal.
Nos anos 1990, a concessão passou para o Congresso. E apenas a estatal Embratel controlava o satélite.
A luta da TV Cultura, onde eu trabalhava, era o sinal de satélite, para transmitir sua programação para todo Brasil.
Veio a Tecnologia da Informação e mudou tudo: a indústria musical, o cinema, a literatura, a rádio e, claro, não podia ficar de fora, o formato de grade da TV brasileira.
Meu filho de 4 anos diz: “Não quero ver canal hoje.”
Canal é aquela imposição de um diretor de programação que estabelece o dia e horário que os programas serão exibidos, entrecortados por comerciais.
A TV como conhecemos.
Televisão, hoje, é também streaming, vê-se o que quer a hora que quer.
Está na TV, no tablet, no computador, no celular.
Ganha a competição de vídeos curtos postados em redes sociais, especialmente no Facebook e Youtube.
Ter um canal aberto de televisão ou um espaço no satélite não é mais prioridade.
O Grupo Sesc dedica a programação apenas à internet.
O jornalista e diretor Paulo Markun, que já chefiou a TV Cultura, fez uma série de documentários para o SESCTV, Habitar Habitat, que estreia agora dia 29 de novembro. Na intetnet.
“A TV do SESC está hoje circunscrita à internet, por conta de uma interpretação estrita do que deve ser um canal brasileiro. Como não tem CNPJ próprio, o canal ficou de fora da regra que obriga os operadores a carregarem um determinado número de canais brasileiros de conteúdo qualificado.”
Sua nova série vai tratar de tipos de moradia incomuns: Farol, Sem Terra, Sem Teto, Asilo, Motor Home, Veleiro, Ciganos, Comunidades, Cortiço, Circo, Internato, Refugiados e Quilombolas.
“Este último programa [Quilombolas), me parece uma fotografia em movimento do drama brasileiro: os quilombolas que conquistaram afinal sua terra, acabam sendo atraídos pelo progresso como mariposas pela luz e, resultado, onde o progresso chega, a vida piora.”
Outros grupos, como a Fundação Roberto Marinho, repensam o formato de seus empreendimentos, como o Canal Futura, para se encaixarem nas novas exigências do novo público.
Tom Hamburger dirigiu e produziu uma série com o pai, o cineasta Cao Hamburguer.
A série sobre História do Brasil se chama Canal da História e passa no Canal Futura, “o cana”, como diria meu filho, toda segunda as 21h30.
E está aberta ao público do Futura Play e do YouTube.
Link para a série no Futura Play:
http://www.futuraplay.org/serie/canal...
Link para a série no YouTube:
O historiador-comunicador Eduardo “Peninha” Bueno entrou com tudo no mercado e dá aulas de história ao seu estilo neste formato.
History Channel contrata youtubers.
O futuro chegou.
November 16, 2017
Crime de ódio aumenta nos EUA
Para a Wired, revista bíblia da Tecnologia da Informação, 47% dos americanos já sofreram algum tipo de abuso pela internet.
Para o FBI, teve no país 6.121 incidentes criminais envolvendo preconceitos contra raça, etnia, ancestralidade, religião, orientação sexual, deficiência e gênero.
57,5% foi motivado por religião, etnia, ancestralidade
21% foi por religião
17,7% foi por orientação sexual.
O restante pelos outros incidentes.
Foram 5.800 no ano anterior, 2015.
A maioria dos incidentes são domésticos e acontecem nas residências (27,3%).
Nas ruas e estradas, 18,4%.
O resto em locais de trabalho, escolas e prédios do governo, restaurantes e boates, garagens, playgrounds, estacionamentos e em até hospitais.
Crime de ódio é uma epidemia sem cura.
Judeus e muçulmanos são os maiores alvos (55%).
Escolas judias são rotineiramente atacadas.
Muçulmanos, mesmo nascidos nos EUA, costumam ser agredidos.
“Volte para seu país”, se dizia em boca pequena. Agora, publicamente.
Grave…
Desde 1992 o FBI cataloga os crimes de ódio.
E os números aumentam.
Anuncia que seu combate é uma das prioridade
November 14, 2017
‘Vazante’ é sobre o Brasil
O filme que causou polêmica, levanta debates, levou a diretora Daniela Thomas a se arrepender de ter feito, confissão feita durante a estreia no Festival de Brasília, em que ouviu de um crítico o conselho de não lançar, foi lançado.
Ainda bem.
Vazante é espetacular.
Não é um filme conformista sobre escravidão sob o ponto de vista branco, como se acusou.
É um filme sobre o Brasil.
É um filme que narra a nossa miscigenação, feita por uma cineasta de família miscigenada, 1/3 branca, 1/3 índia, 1/3 negra.
É um filme sobre a sociedade patriarcal que sufoca e reprime as mulheres.
É um filme sobre o domínio europeu, do grande proprietário, sobre nossas riquezas.
É um filme sobre o sistema que suga da terra todo o provento, para abastecer uma classe dominante e predatória, que sufocava no passado com ferro e fogo o escravo, e que sufocava com ferro e fogo no presente, seus aparelhos repressivos, os mais pobres, os sem-terra, os negros, as mulheres.
É um filme que atravessa os ciclos de riqueza do País, do minério (diamante), ao grão (café, cana, milho), terminando pela carne (o boi).
E que, apesar dos ciclos, o sistema de dominação se mantém intacto.
Sistema que é até aprimorado: não se precisa mais do fogo, que, insano, perde para o exercício do trabalho explorado.
Me desculpe aqueles que se incomodaram com Vazante.
Ele é muito mais do que um filme que adotou um ponto de vista branco e conformista diante da situação racial brasileira.
Ele é sobre o condomínio rachado, que não se livra do seu passado, e por isso não avança, em que moramos.
Pelo ponto de vista de uma artista completa.
Sob o ponto de vista de uma mulher brasileira.
Que retrata a construção de uma identidade de um país dividido e conservador pelas diferenças.
November 8, 2017
Brasil sofre crise política ou psicológica?

FOTO TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO
Cenas de ontem, da queima de um boneco representando uma filósofa, diante de um espaço em que se realizava um debate acadêmico, em que se discutia o sionismo e a relação israelenses-palestinos aos gritos de “o brasileiro não aceita a depravação da nossa cultura”, em que se destacava o cartaz “em defesa das princesas do Brasil” e pedia um buzinaço a favor do “casamento como Deus fez: 1 homem + 1 mulher”, organizado por skinheads, membros da TFP, ativistas independentes, defensores da intervenção militar, cuja militante se vangloriava de ter conseguido “eliminar o ensino de gênero em 91% dos municípios”, levanta a dúvida de que o Brasil sofre uma crise política ou psicológica.
Como escrevi há três semanas no Caderno 2:
Um jovem zen que abandonou a faculdade de economia no primeiro ano, por se sentir mais inteligente que seus professores que, mais tarde, revelaram que o aluno não teve contato com nenhum professor de economia, mais um jovem afrodescendente que é contra cotas raciais, Dia da Consciência Negra, ensino crítico nas escolas e lidera, com um ator famoso, galã que foi casado com uma estrela do teatro e da TV e, na geladeira, partiu para uma carreira ousada na indústria de filmes de sexo explícito homossexual, sentou-se com um Ministro da Educação e se diz aluno de sociologia de uma universidade que não tem curso de sociologia, resolveram para o bem da moral e bons costumes protestar contra a exposição de arte de um espaço cultural de um banco, que debatia o preconceito, valores morais e éticos que a arte, filosofia, sociologia sempre buscam contextualizar, juntaram-se na porta de um museu para protestar e acusar de pedofilia a performance de um bailarino.
Um carismático humorista de stand-up comedy, cuja banda é comandada por um roqueiro sarcástico ícone do combate à ditadura, como outro roqueiro talentosíssimo e fã da vida bandida, bad boy que fez sucesso com a fama de rebelde, seguem e dialogam com um filósofo de direita que mora fora do Brasil, ex-militante comunista de carteirinha, membro do PCB, astrólogo, antigo membro de uma ordem muçulmana, que dá aulas pelo Youtube, Facebook e publica livros de sucesso, tem uma legião fiel de seguidores, atua nas redes sociais xingando quem o contesta, como estudantes no recreio de uma escola, inclusive o grupo de ativistas dos jovens zen e afrodescendente, com quem rompeu.
O grupo também foi criticado por um jornalista ex-trotskista, que se tornou ícone do pensamento da direita e alçou a fama atacando a esquerda, inspirando outros jornalistas, com uma algazarra barulhenta que transformou o debate político numa briga de torcida, jornalista processado pelo filósofo astrólogo e que também rompeu com o grupo do jovem zen e do afrodescendente defensores da proposta de uma professora de Direito da USP, última colocada no concurso para titularidade, mais um jurista de prestígio e um ex-promotor ex-ativista dos direitos humanos, então aposentado, fundador do partido que já foi considerado de esquerda, mas que, para governar, aliou-se àqueles que o perseguiram durante a ditadura, quando era de fato de esquerda, a adversários políticos históricos, ruralistas contrários à reforma agrária, item do programa do partido, forças conservadoras evangélicas, que pressionaram para excluir o ensino obrigatório de sociologia, filosofia e arte nas escolas, e indicaram o ensinamento religioso, no país de muita mitologia indígena e religiões, inclusive afros.
O país, atrasado por séculos de escravidão, agora não só afrouxa e dificulta penas de empresas que submetem trabalhadores a condições degradantes e análogas à escravidão, como questiona o direito à terra de nações indígenas e quilombolas e cede foro privilegiado a militares acusados de crime, logo depois de um general ensandecido pela crise institucional defender sem ser punido uma intervenção armada, rebelião contra um governo civil e democrático que impichou dois dos seus quatro presidentes eleitos, a última por manobras fiscais que quebraram o país que descobriu uma rede bilionária de corrupção na maior empresa nacional, da qual ela presidiu o Conselho de Administração, enquanto uma gangue raspava os cofres da petrolífera, do fundo de pensão dos funcionários e de outros fundos de pensão, que, derrubada numa sessão em que um deputado eleito pelo voto homenageou um torturador notório da ditadura, abriu vaga para seu vice acusado de dar um golpe aliado ao grupo do ativista zen e do afrodescendente, acusado junto com outros ministros de corrupção, organização criminosa e obstrução da Justiça, mas que conseguiu se livrar de processo de impeachment, o que não aconteceu com a antecessora, cujo assessor foi flagrado correndo da pizzaria mais tradicional da cidade com uma mala com R$ 500 mil, vice do mesmo partido de um ex-ministro do Estado, em cujo apartamento vazio chamado de bunker foram encontradas oito malas e cinco caixas, totalizando R$ 51 milhões.
O país, cuja corte suprema não tem conseguido unanimidade na aplicabilidade da lei, constantemente em horário nobre da televisão vestidos com capa de Batman, numa linguagem jurídica barroca, presidida por uma ministra que, num encontro com a nata do jornalismo, confessou que se os brasileiros soubessem de tudo o que ela sabe, teriam dificuldades para dormir, cujo presidente empossado que detém o pior índice de aprovação da história afirma ser vítima de torpezas e vilezas, e que há um golpe em andamento, que por um golpe de sorte foi grampeado por um dos homens mais ricos do país que não sabe operar um gravador de quinta categoria, preso por corrupção com o irmão e que se casou com uma linda estrela da TV numa cerimônia nababesca para 1.500 convidados, em que quase todos acima compareceram e viram o deslumbrante vestido de Karl Lagerfeld que a noiva, que não sabia quem era, em viagens de jatinho com as amigas a Paris, selecionou com cuidado, cujo noivo foi flagrado negociando propina de milhões com um senador da República perdoado por seus pares, indica: vivemos num hospício.
November 7, 2017
Guimarães Rosa e Clarice ocupam Cento Cultural SP
Quando tomou posse do timão do Centro Cultural São Paulo, o centro mais agitado, dinâmico, amplo e democrático da cidade, Cadão Volpato, escritor, jornalista, músico e artista plástico, notou que poderia agitar mais a enorme e sempre cheia biblioteca.
Com uma arma eficaz: os escritores.
Faria do CCSP também um espaço de debate literário. Disse e cumpriu.
Debates, conferências, filmes e leituras dramáticas em novembro e dezembro ocuparão salas e corredores do espaço da Rua Vergueiro, 1000.
Para homenagear dois autores que têm pouco em comum, apesar de contemporâneos.
O Nome do Rosa e Que Mistérios tem Clarice? são os eventos que lembram as efemérides de 2017.
Guimarães Rosa morreu há 50 anos.
Clarice, há 40.
Começa hoje com Rosa.
Todos eventos são gratuitos. Classificação: livre.
Conferência de abertura:
Hoje, terça, 20h, dia 7/11
Com a professora da USP, Yudith Rosenbaum (Manuel Bandeira: Uma Poesia da Ausência e Metamorfoses do Mal: Uma leitura de Clarice Lispector).
CINEMA
dia 8/11
16h – Mutum (de Sandra Kogut, com Thiago da Silva Mariz, Wallison Felipe Leal Barroso, João Miguel)
Mutum é um local isolado do sertão de Minas Gerais, onde vivem Thiago e sua família. Thiago tem apenas 10 anos e, juntamente com seu irmão e único amigo Felipe, é obrigado a enxergar o nebuloso mundo dos adultos, que contém um bando de vizinhos primitivos e o seu grosseiro e bruto pai.
18h – Aboio (documentário de Marília Rocha)
Filmado em Pernambuco, Bahia e Minas Gerais, o documentário relata um costume dos sertões brasileiros: o aboio. Percorrendo o interior do País, o longa acompanha a jornada dos últimos cultores fiéis ao canto de trabalho.
19h30 – A Hora e a Vez de Augusto Matraga (clássico de Roberto Santos, com Leonardo Villar, Joffre Soares, Maria Ribeiro)
Augusto Matraga é um fazendeiro violento. Traído pela esposa e emboscado por seus inimigos, acaba massacrado e é dado como morto. Salvo por um casal, volta-se para a religiosidade. Quando conhece Joãozinho Bem Bem, um jagunço famoso, Matraga vive o conflito entre o desejo de vingança e sua penitência pelos erros cometidos.
TEATRO
dia 8/11
A hora e vez (de Antonio Januzelli, Cia. do Sopro)
Baseado em Augusto Matraga, Rui Ricardo Diaz fará uma pequena performance do monólogo A hora e vez como ilustração da palestra. No conto de Rosa, após cair na emboscada de Major Consilva, Nhô Augusto é dado como morto, mas sobrevive após ajuda de um casal. Recuperado, decide dedicar sua vida ao trabalho, à penitência e à oração. Depois de anos de reclusão, decide partir e encontra o amigo e poderoso cangaceiro Seu Joãozinho Bem-Bem. Isso será decisivo para o desfecho de sua história.
Rosa (dramaturgia: BoadaPeste Cia. de Teatro – direção: Jéssica Nascimento – direção musical: Alexandre Guilherme – com Ailton Barros, Gira de Oliveira e John Halles)
Experimento cênico da BoadaPeste Cia. de Teatro baseado no famoso e deslumbrante conto, A Terceira Margem do Rio. Narrado em primeira pessoa, o texto fala sobre a história de um homem (nosso pai) que, sem nenhuma razão aparente, abandona sua vida cotidiana para viver numa canoa no leito do rio, deixando aos que ficam questionamentos de toda ordem.
DEBATE
dia 9/11
Traduzir Rosa
Abordará as difíceis e notórias traduções do escritor.
Com Alison Entrekin, tradutora literária australiana radicada no Brasil, que atualmente tem o desafio de fazer uma nova tradução para o inglês de Grande Sertão: Veredas.
Luiz Carlos Vasconcelos, ator e encenador responsável pela lendária peça Vau de Sarapalha, e Odilon Moraes, ilustrador há mais de 25 anos, acaba de publicar Rosa, Uma Homenagem ao Escritor, mediados por Ronaldo Bressane, falarão da tradução a outros meios.
Clarice virá em seguida.
(Baixe o catálogo em pdf dos eventos)
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