M. Barreto Condado's Blog, page 4
December 20, 2019
NOITE DE NATAL, de MBarreto Condado
Era uma vez numa qualquer cidade de um qualquer país o dia de Natal, neste local era celebrado das mais diversas maneiras pelos seus habitantes, com mais ou menos família, com e sem o pinheiro enfeitado, com ou sem luzes a piscar, com ou sem presépio, com mais ou menos comida, com mais ou menos presentes, com e sem…
Era uma cidade como tantas outras onde ao final do dia as pessoas se reuniam, muitas sem entenderem o motivo para festejarem, não era o frio ou o calor que as aproximava, não eram guiadas pelas suas acções, tivessem sido melhores ou piores, mas como em todas as outras cidades de um qualquer país nesse dia era um frenesim de compras, encontrões, engarrafamentos e pior que tudo má disposição. Naquele dia as pessoas daquela cidade tentavam redimir-se de todo o mal que pudessem ter feito durante o ano irradiando uma falsa luz de felicidade e prosperidade transformando-se no que não eram pelos motivos menos correctos.
Não sabiam o que os unia naquela noite, alguns tinham a leve noção de que celebravam o nascimento de uma criança num curral e que por esse motivo deviam ser mais humildes. Outros pensavam que era um absurdo afinal no séc. XXI a criança só podia nascer num resort rodeado de amas, com um SPA para a mãe descontrair com as amigas e um campo de golfe onde o pai pudesse descansar com os amigos do stressante choro.
Seja qual fosse o motivo que levava os habitantes daquela cidade a celebrar o Natal sentiam que particularmente naquela noite deviam faze-lo com alegria rodeados daqueles que amavam relembrando com saudade as almas que já tinham partido deixando saudades.
A verdade é que naquela cidade como em tantas outras em qualquer país, existia na maioria das casas uma árvore enfeitada com luzes de várias cores a tremeluzir, inúmeros presentes, uma lareira acesa com meias penduradas, azevinho espalhado pela casa, uma mesa cheia de iguarias, memórias, brincadeiras, gargalhadas, uma história, uma fotografia e até mesmo nos raros momentos de silêncio os corações unidos aqueciam a noite.
E ao final daquele longo dia em muitas das casas daquela cidade num qualquer país do mundo, onde podia nevar ou fazer sol, onde era de dia ou de noite, onde o homem das barbas brancas e fato encarnado conduzindo um trenó puxado por renas podia ou não aparecer a única certeza que tinham é que mais um ano passara e estavam vivos e com saúde.
E se esse dia é especial porque as almas de quem já partiu nos observam e celebram connosco através dos véus que se abrem, acredito ser possível um Feliz Natal para todos numa qualquer cidade de um qualquer país.
Era uma cidade como tantas outras onde ao final do dia as pessoas se reuniam, muitas sem entenderem o motivo para festejarem, não era o frio ou o calor que as aproximava, não eram guiadas pelas suas acções, tivessem sido melhores ou piores, mas como em todas as outras cidades de um qualquer país nesse dia era um frenesim de compras, encontrões, engarrafamentos e pior que tudo má disposição. Naquele dia as pessoas daquela cidade tentavam redimir-se de todo o mal que pudessem ter feito durante o ano irradiando uma falsa luz de felicidade e prosperidade transformando-se no que não eram pelos motivos menos correctos.
Não sabiam o que os unia naquela noite, alguns tinham a leve noção de que celebravam o nascimento de uma criança num curral e que por esse motivo deviam ser mais humildes. Outros pensavam que era um absurdo afinal no séc. XXI a criança só podia nascer num resort rodeado de amas, com um SPA para a mãe descontrair com as amigas e um campo de golfe onde o pai pudesse descansar com os amigos do stressante choro.
Seja qual fosse o motivo que levava os habitantes daquela cidade a celebrar o Natal sentiam que particularmente naquela noite deviam faze-lo com alegria rodeados daqueles que amavam relembrando com saudade as almas que já tinham partido deixando saudades.
A verdade é que naquela cidade como em tantas outras em qualquer país, existia na maioria das casas uma árvore enfeitada com luzes de várias cores a tremeluzir, inúmeros presentes, uma lareira acesa com meias penduradas, azevinho espalhado pela casa, uma mesa cheia de iguarias, memórias, brincadeiras, gargalhadas, uma história, uma fotografia e até mesmo nos raros momentos de silêncio os corações unidos aqueciam a noite.
E ao final daquele longo dia em muitas das casas daquela cidade num qualquer país do mundo, onde podia nevar ou fazer sol, onde era de dia ou de noite, onde o homem das barbas brancas e fato encarnado conduzindo um trenó puxado por renas podia ou não aparecer a única certeza que tinham é que mais um ano passara e estavam vivos e com saúde.
E se esse dia é especial porque as almas de quem já partiu nos observam e celebram connosco através dos véus que se abrem, acredito ser possível um Feliz Natal para todos numa qualquer cidade de um qualquer país.
Published on December 20, 2019 06:00
December 13, 2019
PAI NATAL, de MBarreto Condado
Pai NatalCasa do Pai Natal (fácil de identificar mesmo no meio do nevoeiro pelo nariz vermelho do Rudolfo, a Corredora, Dançarina, Empinadora, Raposa, Cometa, Cupido, Trovão e Relâmpago) Rovaniemi Lapónia
Yggdrasil, 13 de Dezembro de 2019(a casa é fácil de encontrar, fica no meio do nada recomendo viagem nocturna)
Pai Natal,
Espero que a minha carta ainda chegue a tempo pois tem sido um ano complicado, mas posso garantir-te que não sou boazinha, tenho sangue quente e fervo em pouca água.
Se estiveres muito ocupado para leres esta mensagem por favor passa a um dos teus ajudantes (preferia os mais altos, com abdominais trabalhados e costas largas onde gostaria de descansar por umas horas, ando estafada).
Como nunca te pedi nada este ano resolvi abrir uma excepção, fica descansado que não te vou pedir por cada ano passado (em que tristemente falhaste, avisei-te que tenho sangue quente).
Gostaria de ter MUITA saúde, dinheiro e amor (e não penses enviar-me o CD do argentino Irusta);
Voltar à Irlanda em boa companhia (agradeço que não me envies os meus próprios livros da Profecia ou sangue correrá…e não será o meu);
Um potente Jipe (se me envias Playmobil eu envio-te uma das Caldas);
Que os meus dedos consigam escrever à velocidade com que as ideias surgem (não me envies um gravador ou vou devolver-to pessoalmente);
Quero publicar todos os livros das duas sagas e mais três que já iniciei. (não digas que é impossível, se respeitares o meu anterior pedido e fizeres com que as horas passem mais devagar “…a obra acontece…” “.
Deixo-te dois avisos: dia 25 é feriado e os caçadores andam por aí e como não andamos nas graças um do outro preferia que enviasses um dos ajudantes acima referenciado, ele que venha uns dias antes, que entre pela porta da sala (a lareira estará a aquecer o ambiente) onde encontrará bolachinhas, um copo de Borba e o sofá aberto para que me possa castigar (envio foto do ajudante e sugestão do castigo a aplicar).
Obrigada e até para o anoMadalena
Yggdrasil, 13 de Dezembro de 2019(a casa é fácil de encontrar, fica no meio do nada recomendo viagem nocturna)
Pai Natal,
Espero que a minha carta ainda chegue a tempo pois tem sido um ano complicado, mas posso garantir-te que não sou boazinha, tenho sangue quente e fervo em pouca água.
Se estiveres muito ocupado para leres esta mensagem por favor passa a um dos teus ajudantes (preferia os mais altos, com abdominais trabalhados e costas largas onde gostaria de descansar por umas horas, ando estafada).
Como nunca te pedi nada este ano resolvi abrir uma excepção, fica descansado que não te vou pedir por cada ano passado (em que tristemente falhaste, avisei-te que tenho sangue quente).
Gostaria de ter MUITA saúde, dinheiro e amor (e não penses enviar-me o CD do argentino Irusta);
Voltar à Irlanda em boa companhia (agradeço que não me envies os meus próprios livros da Profecia ou sangue correrá…e não será o meu);
Um potente Jipe (se me envias Playmobil eu envio-te uma das Caldas);
Que os meus dedos consigam escrever à velocidade com que as ideias surgem (não me envies um gravador ou vou devolver-to pessoalmente);
Quero publicar todos os livros das duas sagas e mais três que já iniciei. (não digas que é impossível, se respeitares o meu anterior pedido e fizeres com que as horas passem mais devagar “…a obra acontece…” “.
Deixo-te dois avisos: dia 25 é feriado e os caçadores andam por aí e como não andamos nas graças um do outro preferia que enviasses um dos ajudantes acima referenciado, ele que venha uns dias antes, que entre pela porta da sala (a lareira estará a aquecer o ambiente) onde encontrará bolachinhas, um copo de Borba e o sofá aberto para que me possa castigar (envio foto do ajudante e sugestão do castigo a aplicar).
Obrigada e até para o anoMadalena
Published on December 13, 2019 06:00
November 1, 2019
TODOS (OS) SANTOS
- Um, dó, li, tá, tu és bruxa, tu és santa, tu és finada.
- Finada? Eu não quero ser finada!
- Ora isso não é algo que possas escolher. És finada e ponto final.
- Já te disse que não quero ser finada.
- Escuta lá os mortos não reclamam, aliás nem se ouvem por isso vê lá se fazes o mesmo.
- Os mortos também recebem mais flores do que os vivos e eu não te vejo com nenhum bouquet de flores.
- Isso é porque o remorso é mais forte do que a gratidão, por isso agradece e cala-te.
- Agradecer? O quê? Não sou nenhuma santa.
- Pois não és finada. (suspiro)
- Mas hoje não é o dia de todos os Santos?
- Santa paciência. Hoje é o dia das Bruxas.
- Então quero ser uma.
- Já te disse que não podes.
- E um sapo, posso ser?
- Não!
- Então já não quero brincar.
- Olha porque não fazes o que Victor Hugo disse.
- E ele era um bruxo.
- Não!
- E era um santo?
- Também não. Mas é um finado.
- Ahhhh. Então e o que foi que ele disse?
- Disse que podes brincar porque segundo ele: “os mortos são uns invisíveis e não uns ausentes”.
- Está bem, mas amanhã quero ser outra coisa.
- Amanhã logo se vê. Agora como tua primeira tarefa vais aquele cemitério bater nos túmulos e perguntar se querem ressuscitar.
- Maldita tarefa.
- Se forem como o meu primo Schopenhauer: “…sacudirão a cabeça num movimento de recusa”.
- Começo a pensar que devia ter sido Santa.
Published on November 01, 2019 04:00
October 31, 2019
ALL HALLOWS EVE
Cai o véu que separa os mundos.
Nesta noite é permitido às almas circularem livremente pelos locais que em vida conheceram. Uns mais afortunados poderão vê-las, outros senti-las, mas a verdade é que nesta noite elas estão aqui para nos agraciar com a sua presença. Voltam para nos fazer companhia, para nos sentir, para nos lembrar que não estamos sós.
Não necessitamos fechar os olhos para senti-las ao nosso lado.
Fazem-nos companhia enquanto cozinhamos, sentam-se à nossa mesa para nos ouvir conversar e antes de voltarem a partir ajeitam-nos os lençóis da cama como faziam em vida beijam-nos nas faces sussurrando-nos as tão ansiadas palavras de amor.
Nesses momentos se fecharmos bem os olhos quase que as conseguimos ouvir dizer:
“Não chores não morri! Já não sou o meu corpo, mas o meu espírito permanece em ti.Não tenhas saudades minhas!Pois nunca te deixarei, não o conseguiria mesmo que tentasse.Não te sintas só!Estarei sempre aqui até ao dia em que nos reencontremos.E até que esse dia chegue novamente ansiarei pela tua presença.Mas voltarei. Porque enquanto viver na tua memória, Vivo!Agora descansa com a certeza que estarei sempre por perto.E quando o véu se voltar a erguer e sentires o vazio da minha ausência pensa que teremos sempre este dia para nos voltarmos a reencontrar. E no próximo ano aqui estarei só para te ver.”
Ergue-se o véu que separa os mundos.
Published on October 31, 2019 04:00
October 30, 2019
CRUZ DAS ALMAS (PARTE 3), de MBarreto Condado
- Não tenhas medo. Nós protegemos-te.
Queria falar, mas as palavras não saiam. Era evidente que não ia confiar em estranhos além de que gostava pouco que a agarrassem daquela maneira.
- Vem comigo, levo-te para casa. – o estranho pareceu perceber a sua ansiedade largando-a, esticando-lhe a mão para que a tomasse.
Perante o absurdo do que se passava, seguiu o seu instinto agarrando com firmeza na mão que lhe esticava. O estranho começou a puxá-la atrás dele até saírem da escuridão do pinhal, não sabia quanto tempo ali estivera, não lhe parecera muito, mas já anoitecera. Reparou que não seguiam sozinhos, com eles caminhava um grupo de homens e mulheres perscrutando atentamente no escuro. Para trás ficava um grupo compacto de homens, mulheres e lobos formando uma barreira, impedindo que os vultos negros passassem e os seguissem.
Aproximavam-se da estrada principal quando arranjou coragem para falar.
- Vamos ter que abrandar, as minhas pernas já não me obedecem.
- Queres que te leve?
- Ao colo? – aquela conversa parecia cada vez mais surreal – É evidente que não. Mas tenho mesmo que parar uns minutos.
- Não podemos. – sem lhe dar tempo, pegou-lhe ao colo continuando a caminhar.
Não resistiu, afinal aquele homem parecia ter dez vezes mais força do que ela.
- Sabes que a casa onde vives está marcada? – falava sem a olhar com os olhos sempre fixos no caminho em frente.
- Marcada? Não percebo.
- Os sugadores de almas escolheram-te.
- O que está a dizer? Devia saber quem são?
- Os seguidores de Oinómed, o demónio da encruzilhada. Os sugadores de almas bebem o sangue de quem marcam, queimam os seus corpos e finalmente entregam as pobres almas em troca de vida eterna.
Não queria acreditar no que ouvia, ainda devia estar a dormir.
- Aqueles que me seguem são as pessoas de que fala?
- Os sugadores não são pessoas, são mortos vivos.
- Como me escolheram?
- Deves ter visto a luz deles durante a noite, enquanto procuravam uma nova vítima.
Assentiu com a cabeça, a luz que vira tinham sido eles.
- Quem são vocês?
- Os únicos que te podem proteger neste momento.
- Conseguem tirar-me a marca?
- Não!
Olhou para baixo reparando nuns estranhos sinais no chão que nunca vira de todas as vezes que ali passara.
- O que é isto? – apontou para o chão.
- Cruzes! Cada uma representa uma alma que se salvou, representa um de nós.
- Disse que me podem proteger, como?
- Após seres marcada, só te salvas se te tornares uma de nós. – mantinha o olhar fixo no caminho.
Estava definitivamente a viver numa realidade paralela, ou pior, continuava a dormir. Já só queria acordar daquele pesadelo. Fechou os olhos com força voltando a abri-los para constatar que ainda ali estava e que tudo aquilo era real.
- E quem são vocês?
- Criaturas da noite.
- Vampiros? – tremeu ao pensar que naquele momento escapara de uns sugadores para cair nos braços de outros.
O estranho soltou uma gargalha.
Ainda bem que conseguia achar graça ao pior dia da sua vida.
- Não. Nós vivemos.
Aproximavam-se da estrada. Pararam. Olhavam para ela e posteriormente para a encruzilhada dos quatro caminhos. Virou o olhar para onde todos olhavam no momento de ver aparecer no meio do cruzamento uma bola de fogo e dela sair um vulto sem cara.
Olhou para o estranho que a transportava agarrando-se a ele com força.
- Não quero morrer.
- Não queremos que morras, nem deixaremos que tal aconteça se for essa a tua decisão.
- O que devo fazer?
- Juntar-te a nós. Viverás o dobro dos anos protegendo todos os que necessitem da tua ajuda contra as trevas, mas para que isso aconteça, necessito que me confirmes que é esse realmente o teu desejo.
Olhou na direcção do estranho vulto, também parecia aguardar a sua decisão.
- Sim! Quero juntar-me a vocês.
Os olhos daquele estranho e de todos que ali se encontravam ficaram amarelos. Afastou-lhe delicadamente a camisola que lhe cobria o ombro esquerdo mordendo-a.
Oinómed desaparecia numa chama intensa. As marcas desenhadas nos muros da sua casa desapareciam. Os homens, mulheres e lobos que tinham ficado para trás juntavam-se-lhes e perante o seu olhar atónito os lobos transformavam-se perante os seus olhos em fortes homens e mulheres a quem Oinómed não conseguira roubar a alma.
Enquanto debaixo dos seus pés no local onde fora mordida aparecia uma nova cruz, a sua, uma confirmação de mais uma alma que escapara às trevas.
- Bem-vinda. – o estranho sorria-lhe pousando-a gentilmente.
Quando o voltou a encarar também os seus olhos brilhavam amarelos como a Lua que surgia no céu.
Published on October 30, 2019 07:00
October 29, 2019
CRUZ DAS ALMAS (PARTE 2), de MBarreto Condado
(...)
Acordou com uma valente dor de cabeça, estava deitada na cama e já não sentia aquele estranho frio que lhe toldara os movimentos, abriu os olhos a custo, lembrava-se vivamente do que acontecera, felizmente não passara de um horrível pesadelo.
Abriu as janelas, o sol começava a desaparecer, custava-lhe acreditar que dormira todo o dia. Tomou um banho rápido, vestindo uma roupa quente, precisava de caminhar um pouco para desanuviar a cabeça.
O percurso que apreciava fazer pelo monte, sempre rodeada por árvores, animais e ar puro era tudo do que necessitava naquele momento, mas tinha que se despachar se ainda queria regressar com alguma luz. Felizmente os seus pés conheciam o caminho. Atravessou campos de cultivo, vinhas, parando antes de atravessar o cerrado pinhal, algo no seu subconsciente lhe dizia que devia regressar, veio-lhe à memória que fora ali que vira a estranha luz na noite anterior. Voltou-se deparando-se com vários vultos negros espalhados pelo monte tapando-lhe a passagem, era assustador pensar como não os ouvira aproximarem-se. Caminhavam na sua direcção de mãos dadas, a liderar o grupo as mesmas mulheres com quem sonhara, sorriam-lhe mostrando os afiados caninos, os olhos negros brilhando na expectativa. Começava a acreditar que não sonhara. Regressar e passar por aquelas pessoas deixara de ser uma opção, voltou-lhes as costas começando a caminhar na direcção do pinhal, preferia enfrentar os seus medos atravessando aquele local do que ficar à mercê dos estranhos que a seguiam, acelerou o passo evitando correr, tinha medo que se o fizesse a perseguissem e sabia não ter nem a resistência nem a velocidade necessária para conseguir correr até casa sem que a apanhassem.
Penetrou na falsa protecção daquelas copas, parando momentaneamente para olhar para trás, às três mulheres tinham-se aproximado todos aqueles que vira espalhados pelo monte, envergando a mesma sinistra indumentária. Notou com curiosidade que tinham parado de a seguir tendo começado a gritar na sua direcção, num coro de lamentos e ódio. Estava na hora de sair dali e regressar ao amparo da sua casa, voltou-se de repente chocando com um enorme homem que se encontrava parado atrás de si. Gritou. À sua volta conseguia ver uma barreira de corpos tapando a saída, olhos amarelos brilhavam no escuro. O estranho agarrou-a por um braço segurando-a de encontro a si, enquanto os que se encontravam atrás dele passavam para a sua frente fazendo uma nova barreira de corpos que os separavam de quem a seguia. Os olhos amarelos que vira brilhar no escuro aproximaram-se, colocando-se ao lado daqueles homens e mulheres. Podia jurar que eram lobos.
(,,,)
Acordou com uma valente dor de cabeça, estava deitada na cama e já não sentia aquele estranho frio que lhe toldara os movimentos, abriu os olhos a custo, lembrava-se vivamente do que acontecera, felizmente não passara de um horrível pesadelo.
Abriu as janelas, o sol começava a desaparecer, custava-lhe acreditar que dormira todo o dia. Tomou um banho rápido, vestindo uma roupa quente, precisava de caminhar um pouco para desanuviar a cabeça.
O percurso que apreciava fazer pelo monte, sempre rodeada por árvores, animais e ar puro era tudo do que necessitava naquele momento, mas tinha que se despachar se ainda queria regressar com alguma luz. Felizmente os seus pés conheciam o caminho. Atravessou campos de cultivo, vinhas, parando antes de atravessar o cerrado pinhal, algo no seu subconsciente lhe dizia que devia regressar, veio-lhe à memória que fora ali que vira a estranha luz na noite anterior. Voltou-se deparando-se com vários vultos negros espalhados pelo monte tapando-lhe a passagem, era assustador pensar como não os ouvira aproximarem-se. Caminhavam na sua direcção de mãos dadas, a liderar o grupo as mesmas mulheres com quem sonhara, sorriam-lhe mostrando os afiados caninos, os olhos negros brilhando na expectativa. Começava a acreditar que não sonhara. Regressar e passar por aquelas pessoas deixara de ser uma opção, voltou-lhes as costas começando a caminhar na direcção do pinhal, preferia enfrentar os seus medos atravessando aquele local do que ficar à mercê dos estranhos que a seguiam, acelerou o passo evitando correr, tinha medo que se o fizesse a perseguissem e sabia não ter nem a resistência nem a velocidade necessária para conseguir correr até casa sem que a apanhassem.
Penetrou na falsa protecção daquelas copas, parando momentaneamente para olhar para trás, às três mulheres tinham-se aproximado todos aqueles que vira espalhados pelo monte, envergando a mesma sinistra indumentária. Notou com curiosidade que tinham parado de a seguir tendo começado a gritar na sua direcção, num coro de lamentos e ódio. Estava na hora de sair dali e regressar ao amparo da sua casa, voltou-se de repente chocando com um enorme homem que se encontrava parado atrás de si. Gritou. À sua volta conseguia ver uma barreira de corpos tapando a saída, olhos amarelos brilhavam no escuro. O estranho agarrou-a por um braço segurando-a de encontro a si, enquanto os que se encontravam atrás dele passavam para a sua frente fazendo uma nova barreira de corpos que os separavam de quem a seguia. Os olhos amarelos que vira brilhar no escuro aproximaram-se, colocando-se ao lado daqueles homens e mulheres. Podia jurar que eram lobos.
(,,,)
Published on October 29, 2019 07:00
October 28, 2019
CRUZ DAS ALMAS (PARTE 1), de MBarreto Condado
O vento uivava assustadoramente, as portadas da sala batiam com fúria contra o batente, os ramos do velho pinheiro manso raspavam irritantemente nas janelas da sala obrigando-a a levantar-se.
Afastou contrariada os lençóis, calçou os chinelos enrolando-se na manta da cama, tremia de frio, a casa estava gelada. Parecia que o vento encontrara caminho através das frestas da porta e da chaminé determinado a ocupar um lugar que não lhe pertencia. Olhou para a cama quente que abandonava caminhando às escuras pelo corredor, tinham passado somente dois meses desde que se mudara para a velha casa perdida no meio do monte.
Abriu a janela da sala puxando as portadas para as trancar, quando os olhos se focaram numa fraca luz no fundo do vale. Deixou-se ficar parada com o olhar fixo até uma forte rajada de vento a retirar daquele torpor obrigando-a a fechar a janela. Correu para o quarto atirando-se para a cama ainda embrulhada na manta, puxou as cobertas por cima da cabeça, o sono tomou-a. Já não conseguia ouvir os ramos do velho pinheiro a roçar nas portadas, nem o uivo do vento que aumentava, só o silêncio.
A luz movimentando-se em círculos parou.
Baixaram os capuzes olhando para a velha quinta, sabiam que tinham sido vistos. Voltaram os olhos para a lua começando a caminhar na direcção da casa, detendo-se do lado de fora do frondoso portão observando cuidadosamente o local. A um sinal começaram a dispersar-se colocando-se à volta do terreno murado desenhando estranhos símbolos enquanto entoavam uma imperceptível ladainha.
Ouviam os uivos ao longe, sabiam que vinham por eles, aproximando-se rapidamente. Não queriam ali estar quando chegassem. Não conseguiram acabar de desenhar os símbolos começando a dispersar-se, apagando as lanternas desapareceram silenciosamente na escuridão.
O chão trepidava com o barulho de patas a bater no chão molhado.
Os animais dividiram-se enquanto farejavam o local onde antes tinham estado os vultos negros, certificando-se de que nenhum ficara para trás. O Alfa entrava sozinho no jardim pelo único local que lhe era permitido, o mesmo que ainda não fora marcado, rondou a casa parando debaixo de uma janela cheirando o ar, esticou a longa mão com garras pousando-a na portada de madeira. Sabia que tinham que agir rapidamente, estava quase a amanhecer, não podia ficar ali mais tempo, regressaria nessa noite.
Acordou irritada. Por duas vezes despertara com a estranha sensação de que alguém caminhava no jardim, que escutara vozes e cães, muitos cães, a correrem e a uivar.
Sentou-se no alpendre decidida a não fazer nada naquele dia, iria descontrair com um bom livro e um chá. Não sabia que horas eram quando ouviu vozes ao portão, levantou-se contrariada contornando a casa para se deparar com três idosas no lado de fora, vestidas de negro com lenços na cabeça, a tez demasiado clara para serem gentes nascidas e criadas no campo.
- Bom dia!
Olhavam-na com olhos negros, frios, algo na sua fisionomia perturbava-a.
- Bom dia! – cumprimentou. Não conseguia explicar, mas sentia medo.
- Convide-nos a entrar, temos sede. - uma das mulheres falou aumentando os seus receios, sabia que não era o portão da quinta que a protegeria se quisessem entrar, mas esperava que não o fizessem.
Levantara-se um forte vento. Reparou que as mulheres conservavam as mãos dentro dos bolsos, os lenços colocados tapando-lhes a cara, tinham um aspecto tão assustador que naquele momento estava satisfeita por manter o portão trancado. Falavam todas ao mesmo tempo, porém ao olhar reparou que não mexiam os lábios. As vozes, escutava-as dentro da sua cabeça. Começou a suar, sentiu a pele arrepiar-se, quando as viu sorrirem-lhe com ódio, maldade, os seus olhos eram negros como uma noite sem luar, os caninos tão afiados que uma delas sangrava do lábio. Começou a temer pela sua vida.
As vozes continuavam a sobrepor-se dentro da sua cabeça: “és nossa…a tua alma pertence-lhe…vou secar-te a vida…sentir o sabor do teu sangue…derradeiramente entregar-te a Ele…”
Mãos ossudas avançavam como se não fizessem parte daqueles corpos, os dedos finos entrançando-se no ferrolho sacudindo-o, torcendo-o. As dobradiças cediam. Queria fugir, mas as pernas não lhe obedeciam, um frio intenso apoderara-se dela, sentia-se estranhamente sonolenta. Ainda lhe pareceu ouvir um carro travar, vozes, gritos, mas já não viu nada. Desmaiou.
(...)
Published on October 28, 2019 07:00
October 27, 2019
ERA UMA VEZ..., de MBarreto Condado
Quem nunca se apaixonou perdidamente por um livro e pelo seu criador?
Desde o momento em que o tiramos de uma qualquer prateleira, o folheamos, o cheiramos, apercebemo-nos que têm um cheiro distinto.
Quando começamos a ler deixamos de existir e passamos a fazer parte de um novo mundo que se abre delicadamente para nos receber.
Cada parágrafo é um novo momento de uma nova existência, passamos a aceitar os vilões como nossos inimigos mortais. Identificamo-nos quase sempre com os seus heróis, que têm tanto de nós ou de que gostaríamos de ser.
Transformamo-nos num simples virar de páginas, com novas promessas, desejos. Passamos a fazer parte de um novo mundo.
Damos por nós sem conseguir dormir. Só mais um capítulo! Só mais um capítulo!
Parar, é como deixarmos esta nossa nova existência num limbo, sabendo que temos que completar a nossa jornada. A mesma que nos reserva segredos nas páginas que vamos folheando lentamente e onde alguém tal como nós se deixou perder nos cantos mais distantes dos mundos, que até então só viviam na imaginação do seu criador.
Ler, é como uma viagem sem fim, um local para onde podemos sempre partir e só regressar se quisermos. Pois a seguir a uma viagem vem sempre outra, e outra, dando-nos a possibilidade de nos recriar quantas vezes quisermos.
Por esse motivo quando me perguntam porque escrevo? O que me motiva?
A minha resposta só possa ser uma: Porque estou viva e vivo através das palavras.
Sou um produto de tudo o que já li, de tudo o que vivi, das pessoas com quem me cruzei. E esta é a altura de levar comigo através dos meus mundos quem me queira seguir. E tal como em tantos contos que ouvimos desde crianças, esta minha viagem também começará com o “Era uma vez…”.
“Era uma vez uma mulher de seu nome Madalena, que desde cedo influenciada pela sua avó materna de quem herdara o nome, decidiu tomar as rédeas do seu destino e deixar que esse a levasse até onde então, só a sua imaginação conseguia alcançar. Apesar de todas as contrariedades que encontrou, promessas, invejas, arranjou a força que lhe faltava e corajosamente superou todos os obstáculos.”
Viajei para Dublin e na minha imaginação estive em Yggdrasil, conheci os MacCumhaill e com a sua permissão escrevi a sua história.
Aprendi a confiar na magia, pois esta apresenta-se nas formas mais simples que nos rodeiam.
Regressei a Lisboa lembrando-me saudosamente dos meus tempos de aluna num Colégio Católico. Das amigas que se tornaram irmãs. Mas, acima de tudo recordei o maior ensinamento de todos, que: “A verdadeira Irmandade não une pelo sangue, mas pelo amor e respeito mútuo”.
E, assim, aos poucos, fui escrevendo sobre pessoas, locais, situações. Nunca mais parei de o fazer, porque para mim parar nunca será uma opção.
Esta história nunca terá “Fim”, porque nunca acabará e a imortalidade de que tanto gosto de falar, acabará por se tornar realidade em tudo o que escrevo.
Desejo, que leiam muito. Que sintam, folheiem, cheirem. Porque cada livro tem algo diferente para nos contar, tem a alma do seu escritor impresso em cada página e os meus têm a minha.
Desde o momento em que o tiramos de uma qualquer prateleira, o folheamos, o cheiramos, apercebemo-nos que têm um cheiro distinto.
Quando começamos a ler deixamos de existir e passamos a fazer parte de um novo mundo que se abre delicadamente para nos receber.
Cada parágrafo é um novo momento de uma nova existência, passamos a aceitar os vilões como nossos inimigos mortais. Identificamo-nos quase sempre com os seus heróis, que têm tanto de nós ou de que gostaríamos de ser.
Transformamo-nos num simples virar de páginas, com novas promessas, desejos. Passamos a fazer parte de um novo mundo.
Damos por nós sem conseguir dormir. Só mais um capítulo! Só mais um capítulo!
Parar, é como deixarmos esta nossa nova existência num limbo, sabendo que temos que completar a nossa jornada. A mesma que nos reserva segredos nas páginas que vamos folheando lentamente e onde alguém tal como nós se deixou perder nos cantos mais distantes dos mundos, que até então só viviam na imaginação do seu criador.
Ler, é como uma viagem sem fim, um local para onde podemos sempre partir e só regressar se quisermos. Pois a seguir a uma viagem vem sempre outra, e outra, dando-nos a possibilidade de nos recriar quantas vezes quisermos.
Por esse motivo quando me perguntam porque escrevo? O que me motiva?
A minha resposta só possa ser uma: Porque estou viva e vivo através das palavras.
Sou um produto de tudo o que já li, de tudo o que vivi, das pessoas com quem me cruzei. E esta é a altura de levar comigo através dos meus mundos quem me queira seguir. E tal como em tantos contos que ouvimos desde crianças, esta minha viagem também começará com o “Era uma vez…”.
“Era uma vez uma mulher de seu nome Madalena, que desde cedo influenciada pela sua avó materna de quem herdara o nome, decidiu tomar as rédeas do seu destino e deixar que esse a levasse até onde então, só a sua imaginação conseguia alcançar. Apesar de todas as contrariedades que encontrou, promessas, invejas, arranjou a força que lhe faltava e corajosamente superou todos os obstáculos.”
Viajei para Dublin e na minha imaginação estive em Yggdrasil, conheci os MacCumhaill e com a sua permissão escrevi a sua história.
Aprendi a confiar na magia, pois esta apresenta-se nas formas mais simples que nos rodeiam.
Regressei a Lisboa lembrando-me saudosamente dos meus tempos de aluna num Colégio Católico. Das amigas que se tornaram irmãs. Mas, acima de tudo recordei o maior ensinamento de todos, que: “A verdadeira Irmandade não une pelo sangue, mas pelo amor e respeito mútuo”.
E, assim, aos poucos, fui escrevendo sobre pessoas, locais, situações. Nunca mais parei de o fazer, porque para mim parar nunca será uma opção.
Esta história nunca terá “Fim”, porque nunca acabará e a imortalidade de que tanto gosto de falar, acabará por se tornar realidade em tudo o que escrevo.
Desejo, que leiam muito. Que sintam, folheiem, cheirem. Porque cada livro tem algo diferente para nos contar, tem a alma do seu escritor impresso em cada página e os meus têm a minha.
Published on October 27, 2019 07:00
October 26, 2019
À MODA DO PORTO, de MBarreto Condado
Tanto já foi escrito sobre o Porto, mas nunca o suficiente para descrever a magia que esta cidade carrega na sua história. Não serei eu que a completarei, mas deixarei o meu testemunho sobre os sentimentos dispares que sinto sempre que chego.
Tudo nos transporta para tempos mágicos, carregados de mistérios e desafios, o simples facto de atravessar o rio faz-me sentir que é debaixo da protecção dos Deuses, saudada pelo quente esvoaçar das asas dos Dragões que a protegem.
A quente neblina que me abraça e transporta através de tempos perdidos.
Se fechar os olhos e respirar fundo consigo ouvir o barulho dos barcos Rabelo aportando na ribeira carregados de pipas de vinho do Porto, as vozes das varinas que me chamam gritando “meu amor, minha querida”, consigo ouvir o resfolegar dos cavalos transportando os seus nobres cavaleiros, vozes de crianças brincando despreocupadas correndo descalças por qualquer beco ou ruela.
Foi aqui que Portugal foi buscar o seu nome, mas foi também aqui que nasceu o Infante, aquele que nos conduziria à descoberta de novos mundos.
Não quero abrir os olhos com medo que a magia desapareça. Porém, quando o faço percebo que toda a alegria, a vida, a simpatia, a esperança e o caloroso recebimento das gentes do Norte estão sempre presentes.
Sinto-me bafejada pela sorte, e independentemente desta vez a minha visita ser muito curta, não deixo de apreciar o rebuliço de pessoas que sobem e descem a Avenida dos Aliados, nem tão pouco dos inúmeros turistas que se sentam nas esplanadas bebericando o seu copo de vinho do Douro.
Alguns pedem Francesinhas, Bacalhau à Gomes de Sá, os mais ousados a medo pedem Tripas, um pouco relutantes quando percebem do que são feitas, contudo o sabor acaba por levar a melhor, muitos utilizam o pão para limpar os pratos.
Antes de partir, ainda tenho tempo de beber um cimbalino, trocar alguns bitaites, e como não há espiga, e eu sou fina como um alho prometi voltar.
Mas desta feita ficarei instalada no Palácio das Cardosas e comerei uma francesinha vegetariana (que a meu ver se deveria chamar uma Portosinha).
E na hora da minha despedida, olhei para a Lua e percebi o que com o seu quarto crescente me tentava dizer.
A neblina voltava a cobrir a cidade e enquanto atravessava a ponte sob a protecção dos Deuses e o suave esvoaçar dos seus dragões, pude sentir o cheiro do Douro e o grito das gaivotas que de mim se despediam.
Tudo nos transporta para tempos mágicos, carregados de mistérios e desafios, o simples facto de atravessar o rio faz-me sentir que é debaixo da protecção dos Deuses, saudada pelo quente esvoaçar das asas dos Dragões que a protegem.
A quente neblina que me abraça e transporta através de tempos perdidos.
Se fechar os olhos e respirar fundo consigo ouvir o barulho dos barcos Rabelo aportando na ribeira carregados de pipas de vinho do Porto, as vozes das varinas que me chamam gritando “meu amor, minha querida”, consigo ouvir o resfolegar dos cavalos transportando os seus nobres cavaleiros, vozes de crianças brincando despreocupadas correndo descalças por qualquer beco ou ruela.
Foi aqui que Portugal foi buscar o seu nome, mas foi também aqui que nasceu o Infante, aquele que nos conduziria à descoberta de novos mundos.
Não quero abrir os olhos com medo que a magia desapareça. Porém, quando o faço percebo que toda a alegria, a vida, a simpatia, a esperança e o caloroso recebimento das gentes do Norte estão sempre presentes.
Sinto-me bafejada pela sorte, e independentemente desta vez a minha visita ser muito curta, não deixo de apreciar o rebuliço de pessoas que sobem e descem a Avenida dos Aliados, nem tão pouco dos inúmeros turistas que se sentam nas esplanadas bebericando o seu copo de vinho do Douro.
Alguns pedem Francesinhas, Bacalhau à Gomes de Sá, os mais ousados a medo pedem Tripas, um pouco relutantes quando percebem do que são feitas, contudo o sabor acaba por levar a melhor, muitos utilizam o pão para limpar os pratos.
Antes de partir, ainda tenho tempo de beber um cimbalino, trocar alguns bitaites, e como não há espiga, e eu sou fina como um alho prometi voltar.
Mas desta feita ficarei instalada no Palácio das Cardosas e comerei uma francesinha vegetariana (que a meu ver se deveria chamar uma Portosinha).
E na hora da minha despedida, olhei para a Lua e percebi o que com o seu quarto crescente me tentava dizer.
A neblina voltava a cobrir a cidade e enquanto atravessava a ponte sob a protecção dos Deuses e o suave esvoaçar dos seus dragões, pude sentir o cheiro do Douro e o grito das gaivotas que de mim se despediam.
Published on October 26, 2019 06:00
October 25, 2019
ÀS VEZES, GOSTAVA DE SER UM POLVO, PARA PODER ESBOFETEAR OITO PESSOAS AO MESMO TEMPO, de MBarreto Condado
Não sei quem escreveu esta máxima, mas estava inconscientemente a pensar em mim.A minha lambada tentacular fica-se mesmo pela rua onde vivi em Lisboa.
Vou tentar levar-vos numa breve visita guiada ao Parque do qual não irei pronunciar o nome, mas que ultimamente não nos faz nada “Bem à Saúde”. Da porta da minha antiga casa à entrada do dito Parque são uns meros vinte metros.
Este pequeno pedaço de paraíso nos últimos anos passou a ser uma viagem sem cinto de segurança na mais alta montanha russa do mundo.
Refiro-me aos donos dos canídeos frequentadores esporádicos do parque (sendo eu uma mãe humana de alguns deles e utilizadora do mesmo, sinto que posso falar com razão de causa). Gostava por isso de lhes repetir como uma mantra algumas regras básicas de viver em comunidade e limpeza, que parecem AINDA não ter apreendido.
Primeiro, e atenção, que isto pode soar como uma novidade para muitos (neste momento deviam ressoar trompetas) “Os dejectos dos vossos cães ainda não levitam na direcção dos caixotes, e por muito inteligentes que eles sejam ainda não conseguem fazê-lo por si”.Aproveito para sugerir que estendam a mão envolta num plástico e apanhem a dita cáca (uso o termo carinhoso para não ferir susceptibilidades).
E que no final de mais um dia tentei evitar os campos minados por eles plantados. Com sorte acabam por levar a vossa própria merda (a sensibilidade foi-se assim que pisei uma destas minas) agarrada à sola dos vossos sapatos (os dois de preferência).
Mas alarguemos o raio de desagrados.
O grupo de jardineiros que mantinha o espaço impecável (podíamos comer directamente do chão, não é que alguém tenha tentado) foi substituído por uma nova trupe de modernos malabaristas. O lixo passou a ser recolhido somente uma vez por semana ou quando alguém consegue reclamar sem se tornar persona non grata.
O lago que já tinha o seu próprio ecossistema foi por insistência superior “limpo” e neste momento parece uma papa de blandiblub (quem teve a felicidade de viver nos anos oitenta sabe do que falo).
O varrer foi substituído pelo soprador de folhas. Escusado será dizer que com a nuvem de pó que se levanta, é aconselhado marcar o caminho com migalhas qual Hansel e Gretel, se quiser regressar a casa.
O sistema de rega passou a aplicar-se somente a um canteiro, já avisei os jardineiros que aquelas não são plantas aquáticas, mas penso que a mensagem não chegou ao receptor. Mas mais importante ainda não me podia esquecer das obras que tiveram início no primeiro dia da abertura do Parque e que se estendem até aos dias de hoje, já lá vão mais de dez anos.Assisti com tristeza ao destruir de muros centenários da antiga quinta, da estufa fria, mas o que mais me custou foi presenciar o corte de árvores centenárias.
A minha única esperança para este espaço é que quando o senhor lá de cima acordar (aquele a quem chamam Pedro) nos envie o tão desejado pequeno dilúvio para nos limpar dos pecados, da porcaria, das novas paredes em betão. E se possível que as mesmas sejam levadas com a corrente.
Agora que já esbofeteei quem merecia com os meus modestos tentáculos acabo com as sábias palavras da Dory (que a estas horas ainda deve andar à procura do Nemo):“To vendoo, to vendo uma luz! Ó consciência, eu morri?”
Vou tentar levar-vos numa breve visita guiada ao Parque do qual não irei pronunciar o nome, mas que ultimamente não nos faz nada “Bem à Saúde”. Da porta da minha antiga casa à entrada do dito Parque são uns meros vinte metros.
Este pequeno pedaço de paraíso nos últimos anos passou a ser uma viagem sem cinto de segurança na mais alta montanha russa do mundo.
Refiro-me aos donos dos canídeos frequentadores esporádicos do parque (sendo eu uma mãe humana de alguns deles e utilizadora do mesmo, sinto que posso falar com razão de causa). Gostava por isso de lhes repetir como uma mantra algumas regras básicas de viver em comunidade e limpeza, que parecem AINDA não ter apreendido.
Primeiro, e atenção, que isto pode soar como uma novidade para muitos (neste momento deviam ressoar trompetas) “Os dejectos dos vossos cães ainda não levitam na direcção dos caixotes, e por muito inteligentes que eles sejam ainda não conseguem fazê-lo por si”.Aproveito para sugerir que estendam a mão envolta num plástico e apanhem a dita cáca (uso o termo carinhoso para não ferir susceptibilidades).
E que no final de mais um dia tentei evitar os campos minados por eles plantados. Com sorte acabam por levar a vossa própria merda (a sensibilidade foi-se assim que pisei uma destas minas) agarrada à sola dos vossos sapatos (os dois de preferência).
Mas alarguemos o raio de desagrados.
O grupo de jardineiros que mantinha o espaço impecável (podíamos comer directamente do chão, não é que alguém tenha tentado) foi substituído por uma nova trupe de modernos malabaristas. O lixo passou a ser recolhido somente uma vez por semana ou quando alguém consegue reclamar sem se tornar persona non grata.
O lago que já tinha o seu próprio ecossistema foi por insistência superior “limpo” e neste momento parece uma papa de blandiblub (quem teve a felicidade de viver nos anos oitenta sabe do que falo).
O varrer foi substituído pelo soprador de folhas. Escusado será dizer que com a nuvem de pó que se levanta, é aconselhado marcar o caminho com migalhas qual Hansel e Gretel, se quiser regressar a casa.
O sistema de rega passou a aplicar-se somente a um canteiro, já avisei os jardineiros que aquelas não são plantas aquáticas, mas penso que a mensagem não chegou ao receptor. Mas mais importante ainda não me podia esquecer das obras que tiveram início no primeiro dia da abertura do Parque e que se estendem até aos dias de hoje, já lá vão mais de dez anos.Assisti com tristeza ao destruir de muros centenários da antiga quinta, da estufa fria, mas o que mais me custou foi presenciar o corte de árvores centenárias.
A minha única esperança para este espaço é que quando o senhor lá de cima acordar (aquele a quem chamam Pedro) nos envie o tão desejado pequeno dilúvio para nos limpar dos pecados, da porcaria, das novas paredes em betão. E se possível que as mesmas sejam levadas com a corrente.
Agora que já esbofeteei quem merecia com os meus modestos tentáculos acabo com as sábias palavras da Dory (que a estas horas ainda deve andar à procura do Nemo):“To vendoo, to vendo uma luz! Ó consciência, eu morri?”
Published on October 25, 2019 06:00


