André Benjamim's Blog, page 42
March 19, 2014
Leituras.
Ainda não chegaram os livros que "ganhei" n'
A Grande Aventura dos Livros Grátis
. Embora tenha recebido um e-mail a dizer que haviam sido enviados, e que chegariam cá ao destino num prazo de dois a quatro dias. Vou fazer uma espera ao carteiro. Ontem fui comprar o jornal i para ler a entrevista a José Rentes de Carvalho. Confirmo uma vez mais que o jornal não vale a ponta de um corno. O António Nogueira Leite tem direito a quatro ou cinco páginas de entrevista - para o Rentes de Carvalho sobram apenas duas - e uma é ocupada com uma fotografia. As perguntas são sempre as mesmas - chega-me a parecer que reciclaram entrevistas anteriores. Já li quase tudo o que há para ler em
Génio - os 100 autores mais criativos da história da Literatura
, de Harold Bloom. Confirma-se: nunca tinha lido o nome Shakespeare tantas vezes em tão poucas páginas. Não fosse dar-se o caso de eu gostar do William - não fosse dar-se o caso de já ter lido cerca de metade da sua obra - não fosse dar-se o caso de já estar vacinado (e imune) aos críticos literários - e juro que deitava fora tudo que tivesse o nome William Shakespeare escrito. O Bloom é mesmo o Harry Potter da crítica literária - mas ele tem-se em grande consideração. E eu gosto do Harry Potter. «Génio» é ainda pior que «O Cânone Ocidental»... Mas porque é que eu caio sempre na esparrela? Safam-se, talvez, os frontispícios de o/a Javista e São Paulo - confirmo que uma lista de 100 génios (por mais desculpas de subjectividade e relatividade que se dêem) que não tenha os nomes de Laurence Sterne e Henry Fielding nem vale a pena ler. E se mete lá à papo-seco a Bíblia, não percebo como é que podem ficar de fora As Mil e Uma Noites... Por fim, o subtítulo porque é que estes 99 autores não são melhores que William Shakespeare seria muito mais adequado...
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March 17, 2014
Escritores e Gatos
O Vilto Reis escreveu um artigo sobre Escritores e Gatos, duas Criaturas de que eu gosto muito. Não seleccionou o poema de Fernando Pessoa, que eu deixo abaixo, mas vale porém a vossa visita: 10 Escritores que se inspiraram em gatos para escrever . Acima, fotografia do meu gato preferido - o Norueguês da Floresta. Também gosto muito do Gato de Cheshire, do Crookshanks, do Garfield, do Gato Persa, do Gato Félix (do Monteiro Lobato), do Tom, do British Shorthair, e do British Longhair...
Gato que brincas na ruaComo se fosse na cama,Invejo a sorte que é tuaPorque nem sorte se chama.
Bom servo das leis fataisQue regem pedras e gentes,Que tens instintos geraisE sentes só o que sentes.
És feliz porque és assim,Todo o nada que és é teu.Eu vejo-me e estou sem mim,Conheço-me e não sou eu.
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March 16, 2014
Primeiras páginas de "Portugal, a Flor e a Foice" de José Rentes de Carvalho
Portugal a Flor e a Foice Rentes de Carvalho
O texto acima é disponibilizado pela Bertrand (aqui) - mas para conseguir colocá-lo aqui no blog tive que fazer upload do mesmo no Scribd (aproveitei para lhe juntar a capa e a contracapa). Espero que gostem - e que tenham 13,95€ para o ir logo comprar no dia 21 de Março de 2014. Arrisco-me a prometer que não se vão arrepender. Antes, amanhã, dia 18 de Março de 2014, às 18 horas, podem ver o documentário de António-Pedro Vasconcelos e Leandro Ferreira, J. Rentes de Carvalho - Tempo Contado, Universidade Nova de Lisboa (auditório 1, Torre B). O livro Portugal, a Flor e a Foice , será apresentado dia 22 de Março de 2014, por Henrique Monteiro, na Fnac Chiado, às 17h, numa sessão que contará com a presença do autor.
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March 14, 2014
Génio - os 100 autores mais criativos da história da literatura, de Harold Bloom
Apenas algumas considerações muito rápidas, antes de ir ler os capítulos dedicados a Joaquim Maria Machado de Assis, e a Fernando Pessoa (também há um capítulo dedicado a Luiz Vaz de Camões, e outro a José Maria Eça de Queiroz): o livro é bonito, e aí está, 11 anos depois de ter saído o original em Inglês. Seleccionar 100 génios não é tarefa fácil, porém, dois pontos: primeiro) a literatura anglo-saxónica está sobremaneira sobrevalorizada; segundo) apesar do ponto anterior, deixar de fora Henry Fielding e Laurence Sterne é um crime de lesa-majestade. Imperdoável. William Shakespeare foi provavelmente o melhor escritor de sempre, mas às vezes parece que Harold Bloom quer fazer-nos acreditar que influenciou não só os que se lhe seguiram, os seus contemporâneos que provavelmente o conheceram e os seus contemporâneos que nunca ouviram falar dele, mas também aqueles que o antecederam - talvez Laurence Sterne seja da mesma opinião: esses malandros agarraram em ideias que não lhes eram destinadas. Não, o universo não gira à volta de William Shakespeare. Depois lerei os capítulos dedicados a William Shakespeare, Miguel de Cervantes, Geoffrey Chaucer, O Javista, Sócrates e Platão, Samuel Johnson, James Boswell, Sigmund Freud, Thomas Mann, Franz Kafka, Anton Tchékhov, Oscar Wilde, Luigi Pirandello, Jonathan Swift, Charles Baudelaire, Arthur Rimbaud, Paul Valéry, James Joyce, Alejo Carpentier, Mark Twain, Walt Whitman, Jorge Luis Borges, Italo Calvino, Lewis Carroll, Charles Dickens, e Fiódor Dostoiévski. Lidos estes, voltarei atrás para ler os capítulos sobre Luiz Vaz de Camões, e José Maria Eça de Queiroz. E só depois voltarei novamente atrás para ler os restantes. Um tipo como eu tem preferências, e não tem pachorra para ler o resto antes de ler o que lhe interessa.
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E depois querem convencer-me que não são cornos mansos...
Se os Portugueses não são cornos mansos - digam-me que mais traições têm que sofrer às mãos de PS, PSD, e CDS/PP*, para deixarem (os Portugueses) de irem às urnas com o rabinho entre as pernas enfiar o voto nesta trupe de energúmenos? Ah, e tal, mas matarem reis e presidentes e rainhas e outros trastes (de encomenda, diria a minha avó) - coisas do Arco da Velha que - de-facto - não lembrariam a ninguém: é que a maioria das vezes - não vou afirmar que seja sempre - só recorre ao assassinato quem não teve tomates para acabar, antes, com a coisa por outras vias...
*Refiro apenas estes porque são quem tem estado no governo...
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March 13, 2014
A Petição "exigindo" a publicação de Portugal, a Flor e a Foice, de J. Rentes de Carvalho
Escrevo ainda sobre Portugal. A Flor e a Foice, de J. Rentes de Carvalho (n. 1930). Destinado ao público holandês, o livro foi publicado em 1975, em Amesterdão. Vem a talhe de foice lembrar que no ano passado circulou uma petição “exigindo” a sua publicação no nosso país [AQUI]. Voltando ao que interessa. Trata-se de uma obra didáctica, onde não falta sequer uma tábua cronológica da História de Portugal. Com a desenvoltura de um livre pensador, Rentes de Carvalho faz uma radiografia azeda do período que decorreu entre Abril de 1974 e Outubro de 1975, terminando antes do golpe de 25 de Novembro. Um factor de interesse suplementar reside na forma como o autor desmonta as relações de casta que moldaram o PREC. O retrato sociológico tem momentos devera certeiros, como quando recorda a presença em dois governos de Vasco Gonçalves de uma secretária de Estado que «era também [...] Madre Superiora das Escravas do Patriarcado.» Certas revelações serão novidade para muitos. Um exemplo: nas semanas que antecederam o 25 de Abril, «quinze milhões de contos» (o equivalente a setenta e cinco milhões de euros, importância astronómica para a época) saíram do país. O tom sarcástico não contamina a frieza analítica e o futuro deu razão às premonições do autor. Editou a Quetzal. Nas livrarias a partir do próximo dia 21.
Eduardo Pitta, em Da Literatura.
De todas as magníficas capas da obra de Rentes de Carvalho, editada ou reeditada agora pela Quetzal, esta de Portugal, a Flor e a Foice , é a menos boa delas todas - é verdade que tem ali a foice, mas falta-lhe a flor, embora tenha o punho. Também tem a boina - e os óculos - mas é francamente fraquinha - especialmente quando comparada com as outras. A de Os Lindos Braços da Júlia da Farmácia , Mazagran - Recordações e outras fantasias , ou O Rebate , são simplesmente fantásticas. Como sabem(?) gosto muito de devanear sobre a capa, o papel, o tamanho e o tipo de letra, as badanas, a contracapa, e outros elementos do Livro que (demasiadas vezes) nada têm que ver, directamente, com o conteúdo - a Obra. Quanto à petição - só tenho conhecimento DESTA - não sei se é a ela que Eduardo Pitta se refere - valeu-me uma série de valentes altercações com grandessíssimos idiotas. Não teve muitas assinaturas - não sei se seria de esperar outra coisa neste país(!?) -, nem sequer chegou a ser, por isso, entregue ao destinatário, a Quetzal, mas também deixou de fazer sentido, uma vez que a obra - finalmente! - vai estar por aí à venda, dia 21 de Março de 2014 - quase um anos após a petição...
Post-Scriptum : no blog Tempo Contado , de J. Rentes de Carvalho, três excertos de três obras ainda à espera de edição (ou reedição) em Portugal: Montedor (a primeira obra publicada por Rentes de Carvalho, no longínquo ano de 1968); A Sétima Onda (publicado em 1984 em Portugal - em 1983 na Holanda); e A Ira de Deus sobre os Holanda (apenas com edição Holandesa, em 2008).
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March 11, 2014
O Mito da Mansidão dos Portugueses
s.f. Característica ou condição do que é manso. Que possui o gênio brando; que é suave e pacífico; de temperamento fácil; meiguice. Falta de agitação; sem pressa; desprovido de inquietação; tranquilidade ou brandura. (via)
Este post é apenas para dizer que é um mito que os portugueses sejam mansos - na verdade são cornos mansos!
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March 6, 2014
ansiedade, de Joaquim Paço d'Arcos
O tempo decorreu. Carlos obteve de-facto os lugares; é director dos Cimentos, da fábrica de Conservas, e já está no Conselho Fiscal do Banco. Êle é que viu longe. Quando casou vivia da mesada paterna. Não era pequena, seis contos, mas a-pesar-disso, viver sempre na subordinação do pai... A independência actual trouxe-lhe plena ventura. Tem consciência do lugar que ocupa na sociedade, e a dignidade das funções que exerce.- Eu é que quis sempre que nós nos déssemos com o Costa Vidal. Eu é que tive de teimar contigo.Pequenu sorri, quási com ironia. Despreza-o profundamente. E até anda a ver se lhe arranja uma amiga para que êle a deixe sossegada. Tem vontade de perguntar ao marido se sabe que ela o atraiçôa, que o atraiçoou sempre, desde os primeiros meses de casada, primeiro com o Rui, que o marido tomava por modêlo de elegância de aitudes, de frases, de tudo, agora com êste, que podia ser pai dela, que lhe dá as gorgetas, a êle, e perante quem êle vive curvado, numa subserviência reles. Tem vontade de lho perguntar, pois que antes o preferia cínico do que parvo, mas não quere quebrar o equilíbrio que estabeleceram, recalca a raiva, o desprêzo, e mantém indefinidamente a comédia em que assentou a vida, porque, para poder guardar o lugar principesco que ocupa na sociedade tão ciosa das aparências, tudo à sua volta exige que ela a mantenha. (pp. 67-68)Fuma cigarros sôbre cigarros; tenta a leitura, não consegue fixar a atenção e põe-se a assobiar, para incutir a si próprio a serenidade que não possui. O peor ainda é o chiqueiro feito à volta duma coisa tão simples! Que tropa esta, que bairro, que gentinha! Imbecis, por cuja condição miserável êle luta e que ainda quási o apedrejam! Escravos, cujo destino é serem eternamente escravos e que só acorrentados se sentem felizes! Que nojo, que tédio! (p. 115)
O tio não a escuta; avança para o quarto, investido daquela autoridade militar que os galões de major lhe concedem e que Pedro Pinto não costuma acatar devidamente. Intima o sobrinho a abrir a porta; abranda em pouco por se sentir ràpidamente obedecido.– Sei que se incomodou por minha causa. Não valia a pena, mas muito agradecido.- Foi a primeira e a última vez. Lá gente metida com a polícia, na minha casa, não. Ficas desde já prevenido. Trata de arranjar trabalho e, se não arranjares por cá, vai para as colónias. Por aqui já me convenci de que não arranjas nada. Ninguém quere bolchevistas. Mas ficas avisado: outra história com a polícia e escusas de voltar a casa. Não, que eu também tenho a minha carreira a defender.Pedro Pinto ia replicar ao tio, mas conteve-se; a mãi, do outro lado da porte, olhava-o numa súplica muda e angustiosa. Do embate entre o poder civil e o poder militar saíu o último, aparentemente, triunfante.Tem medo que por minha causa lhe vão ao sôldo, pensa o sobrinho com sumo e sarcástico desprêzo. - Esteja descansado que por minha culpa não perde o bago, foi tudo que, todavia, se limitou a responder. E começou a enfiar com lentidão o casaco que atirara, ao deitar-se, para as costas da cama.- Deixa-te de insolências e trata de ganhar a vida.Nada podia ferir mais Pedro Pinto do que aquelas alusões constantes à sua ociosidade. Era sua a culpa de estar sem trabalho? Sua, ou desta sociedade desequilibrada que forma técnicos em série para logo a seguir os atirar para os Comissariados do Desemprêgo? Sua, ou desta sociedade capitalista que mantém nos países chamados civilizados trinta milhões de desempregados e queima as colheitas para manter os preços, enquanto na China, e na Índia e em África morre gente com fome? O enxovalho doeu-lhe como ferro em braza; mas a luta moral com os investigadores quebrara-lhe os nervos. Achou inútil reagir. E depois, sempre era o tio que lhe dava o pão que comia. (pp. 116-117)
Laurentino Guedes deu conta a Costa Vidal do reaparecimento da agitação revolucionária. Costa Vidal era um espírito profundamente céptico; das revoluções só aproveitara, até aí, a parte mais lucrativa: o jôgo da bôlsa. Informado a tempo, por diversas vezes, do próximo eclodir das revoltas, ajudara, por intermédio de seus agentes e emprêsas comerciais, a estabelecer a atmosfera de receios e de pânicos propícia às especulações de bôlsa. Tombadas as cotações, adquiria por baixo preço grandes lotes dos papeis que considerava mais seguros. Dava com isso público e patriótico testemunho de que o pânico o não contagiava, pois que amealhava os valores nacionais quando todos acorriam a desfazer-se dêles... Passada a borrasca reclamava com energia o regresso a condições de estabilidade e de confiança necessárias para o prosseguimento das actividades económicas. À sua voz serena e optimista a bôlsa refazia-se; a confiança, tìmidamente, regressava; as cotações subiam. E Costa Vidal não queria para si o papel de açambarcador dos títulos que na bôlsa tinham incessante procura; cedia-os a preços módicos... E ganhava fortuna. (pp. 199-200)
Joaquim Paço d'Arcos, em ansiedade (2.ª edição). Lisboa: Parceria A. M. Pereira, 1941.
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March 5, 2014
Pedro Passos Coelho: «não tenho rigorosamente mais nada a esconder...»
«Muito obrigado sra. presidente. Eu julgo que a sra. deputada deve reconhecer o direito à indignação. Eu não tenho nesta altura - não é por uma questão de birra sra. deputada - é por uma questão de respeito por esta câmara, e por mim próprio - não tenho rigorosamente mais nada a esconder* à sra. deputada.»
Pedro Passos Coelho (03m52-04m12)
Artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa (via 365 forte):
Constituem poderes dos Deputados:
(...)
d) Fazer perguntas ao Governo sobre quaisquer actos deste ou da Administração Pública e obter resposta em prazo razoável, salvo o disposto na lei em matéria de segredo de Estado;
(...)
*É mesmo «esconder» que Pedro Passos Coelho diz?!
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March 4, 2014
100.º Aniversário do início do "Dia Triunfal" de Fernando Pessoa - primeiros rascunhos de «O Guardador de Rebanhos»
Primeiro rascunho de «O Guardador de Rebanhos»datado de 4-III-1914 (via O Meu Pessoa). Sobre a génese dos heterónimos *
Ano e meio, ou dois anos, depois lembrei-me um dia de fazer uma partida ao Sá-Carneiro – de inventar um poeta bucólico, de espécie complicada, e apresentar-lho, já me não lembro como, em qualquer espécie de realidade. Levei uns dias a elaborar o poeta, mas nada consegui. Num dia em que finalmente desistira – foi em 8 de Março de 1914 –, acerquei-me de uma cómoda alta e, tomando um papel, comecei a escrever, de pé, como escrevo sempre que posso. E escrevi trinta e tantos poemas a fio, numa espécie de êxtase cuja natureza não conseguirei definir. Foi o dia triunfal da minha vida, e nunca poderei ter outro assim. Abri com um título, “O Guardador de Rebanhos”. E o que se seguiu foi o aparecimento de alguém em mim, a quem dei desde logo o nome de Alberto Caeiro. Desculpe-me o absurdo da frase: aparecera em mim o meu mestre. Foi essa a sensação imediata que tive. E tanto assim que, escritos que foram esses trinta e tantos poemas, imediatamente peguei noutro papel e escrevi, a fio também, os seis poemas que constituem a “Chuva Oblíqua”, de Fernando Pessoa. Imediatamente e totalmente… Foi o regresso de Fernando Pessoa Alberto Caeiro a Fernando Pessoa ele só. Ou melhor, foi a reacção de Fernando Pessoa contra a sua inexistência como Alberto Caeiro.Aparecido Alberto Caeiro, tratei logo de lhe descobrir – instintiva e subconscientemente – uns discípulos. Arranquei do seu falso paganismo o Ricardo Reis latente, descobri-lhe o nome, e ajustei-o a si mesmo, porque nessa altura já o via. E, de repente, e em derivação oposta à de Ricardo Reis, surgiu-me impetuosamente um novo indivíduo. Num jacto, e à máquina de escrever, sem interrupção nem emenda, surgiu a “Ode Triunfal” de Álvaro de Campos – a Ode com esse nome e o homem com o nome que tem.
*Fernando Pessoa, Excerto de Carta a Adolfo Casais Monteiro (13 de Janeiro de 1935). In Correspondência: 1923-1935. Lisboa: Assírio & Alvim, 1999. p. 342-346.
De 06 a 08 de Março de 2014 realiza-se na Fundação Calouste Gulbenkian o Colóquio Internacional "O Dia Triunfal de Fernando Pessoa". O site oficial do colóquio pode ser consultado AQUI.
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