Rodrigo Constantino's Blog, page 376
May 1, 2012
Nova oportunidade
Paulo Guedes, O GLOBO
Nossos escândalos políticos têm sólidos fundamentos. Refletem uma transição inacabada do Antigo Regime para a Grande Sociedade Aberta. Suas raízes penetraram fundo nos três poderes. Foram ampliadas a hipertrofia do Estado e sua excessiva centralização administrativa, herdadas do regime militar. As práticas políticas degeneradas, funcionais para a tomada e a manutenção do poder, são também atribuíveis à omissão do Legislativo.
É inaceitável que a única forma de conduzir as atividades políticas, desde o financiamento de campanhas até a obtenção de maiorias parlamentares, seja uma prática sistemática de escândalos a céu aberto. Os políticos brasileiros nos devem a iniciativa de uma reforma para o exercício adequado de suas atividades que os tornem novamente nossos representantes. E a reincidência dos malfeitos reflete também a impunidade prevalente, filha bastarda do corporativismo no Congresso e da omissão do Poder Judiciário em suas diversas instâncias.
Serão temas recorrentes na mídia nos próximos meses a CPI do Cachoeira e o julgamento do Mensalão. Poucas vezes a degradação moral do Estado brasileiro esteve tão exposta. Tráfico de influência, desvio de recursos públicos, compra de votos de parlamentares. Mas, em vez de alimentar uma sensação derrotista diante de novos episódios de corrupção, prefiro destacar mais uma oportunidade para a reconstrução do Estado brasileiro.
O aperfeiçoamento do regime democrático à luz de uma mídia atuante exige que tanto o Legislativo (Cachoeira) quanto o Judiciário (Mensalão) façam a sua parte. A corrupção e a impunidade são sintomas de um quadro institucional de baixa qualidade. Além desse imprescindível aperfeiçoamento institucional, há outros temas importantes a serem debatidos neste ano eleitoral.
O novo pacto federativo, com a redistribuição de recursos e atribuições hoje concentrados na União. A Constituição de 1988 exige a redefinição dos parâmetros para a distribuição de recursos orçamentários, sob pena de extinção dos Fundos de Participação dos Estados e dos Municípios. Outro tema associado será a distribuição dos royalties do petróleo. A presidente teria maciço apoio parlamentar para a descentralização operacional do Estado brasileiro. Apoio também para uma reforma administrativa que reduza o número de ministérios. O dinheiro tem de ir aonde o povo está. Longe de Brasília.
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Nossos escândalos políticos têm sólidos fundamentos. Refletem uma transição inacabada do Antigo Regime para a Grande Sociedade Aberta. Suas raízes penetraram fundo nos três poderes. Foram ampliadas a hipertrofia do Estado e sua excessiva centralização administrativa, herdadas do regime militar. As práticas políticas degeneradas, funcionais para a tomada e a manutenção do poder, são também atribuíveis à omissão do Legislativo.
É inaceitável que a única forma de conduzir as atividades políticas, desde o financiamento de campanhas até a obtenção de maiorias parlamentares, seja uma prática sistemática de escândalos a céu aberto. Os políticos brasileiros nos devem a iniciativa de uma reforma para o exercício adequado de suas atividades que os tornem novamente nossos representantes. E a reincidência dos malfeitos reflete também a impunidade prevalente, filha bastarda do corporativismo no Congresso e da omissão do Poder Judiciário em suas diversas instâncias.
Serão temas recorrentes na mídia nos próximos meses a CPI do Cachoeira e o julgamento do Mensalão. Poucas vezes a degradação moral do Estado brasileiro esteve tão exposta. Tráfico de influência, desvio de recursos públicos, compra de votos de parlamentares. Mas, em vez de alimentar uma sensação derrotista diante de novos episódios de corrupção, prefiro destacar mais uma oportunidade para a reconstrução do Estado brasileiro.
O aperfeiçoamento do regime democrático à luz de uma mídia atuante exige que tanto o Legislativo (Cachoeira) quanto o Judiciário (Mensalão) façam a sua parte. A corrupção e a impunidade são sintomas de um quadro institucional de baixa qualidade. Além desse imprescindível aperfeiçoamento institucional, há outros temas importantes a serem debatidos neste ano eleitoral.
O novo pacto federativo, com a redistribuição de recursos e atribuições hoje concentrados na União. A Constituição de 1988 exige a redefinição dos parâmetros para a distribuição de recursos orçamentários, sob pena de extinção dos Fundos de Participação dos Estados e dos Municípios. Outro tema associado será a distribuição dos royalties do petróleo. A presidente teria maciço apoio parlamentar para a descentralização operacional do Estado brasileiro. Apoio também para uma reforma administrativa que reduza o número de ministérios. O dinheiro tem de ir aonde o povo está. Longe de Brasília.
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Published on May 01, 2012 12:19
Notícias do hospício
João Pereira Coutinho, Folha de SP
1. NOVA York deu-nos a música de Stephen Sondheim, os combates de Rocky Marciano e os filmes de Woody Allen. Mas também nos deu Michael Bloomberg, um caso de fanatismo antitabagista que diverte e comove ao mesmo tempo.Agora, depois de todas as restrições antitabagistas conhecidas (em restaurantes, escritórios, parques, praias etc.), parece que o "mayor" não exclui a proibição de fumo nas calçadas da cidade -e até, quem sabe, no interior dos lares.Ponto prévio: não sei como será possível fiscalizar o cumprimento da lei na casa de cada cidadão. Detectores de fumaça obrigatórios? Câmeras idem? Gratificação para delatores da família, como na saudosa União Soviética? Mistério.Uma coisa, no entanto, parece certa: o que começou como preocupação razoável sobre liberdade e saúde alheias converteu-se no pretexto ideal para que o poder político faça o que melhor sabe: eleger um inimigo da sociedade, despersonalizá-lo até a humilhação total e arregimentar legiões de talibãs contra ele, que desatam a tossir ante a ameaça do cigarro -quando, anteriormente, nem pensavam nisso.Chegará o dia em que o fumante será o perfeito pária social -sem espaço para existir na civilização e sem uma toca onde possa refugiar-se da intolerância viscosa das massas. Já estivemos mais longe.2. No mundo do desporto acontece de tudo: doping, rivalidades mortais, sacrifícios desumanos em nome da excelência. Mas que dizer de quem finge deficiências para concorrer nos jogos paraolímpicos?A reportaggem é da revista alemã "Der Spiegel", e minha incredulidade é total: cresce o número de deficientes falsos que inventam cegueira, paralisia, até amputação -tudo em nome do desporto, da fama e, claro, do vil metal.Exemplos? São incontáveis.Monique van der Vost era uma celebridade na Holanda, uma das melhores ciclistas paraolímpicas do país. Só havia um pormenor: as pernas da sra. Monique funcionavam à perfeição. Os próprios vizinhos, temendo estar na presença de um gêmea, já a tinham visto a dançar pela casa. Não pretendo levantar falsos testemunhos, mas suspeito de que a dança era só forma de relaxamento antes das provas oficiais.Monique não é caso único. Yvonne Hopft, cinco vezes medalha de ouro em provas paraolímpicas de natação para cegos, afinal não o era: hoje, afastada das competições, resolveu mudar de vida e até já tirou a permissão para dirigir.Mas o melhor exemplo de fraude vem da equipe espanhola de basquete, que se apresentou em 2000, nos Jogos Paraolímpicos de Sidney, para disputar a medalha de ouro de deficientes mentais profundos.A equipe conquistou a medalha de ouro, sem dúvida, mas parece que dez atletas tinham um Q.I. perfeitamente normal. A revista, infelizmente, não esclarece se o Q.I. era normal para qualquer ser humano ou apenas para um espanhol.Seja como for, o Comitê Paraolímpico Internacional promete vigilância e penas duras aos farsantes. Aplaudo, comovido. Mas o que será pena dura para quem finge ser deficiente e ganha a vida com isso?Nos meus momentos de delírio, penso que a única forma de punir seriamente os farsantes era infligir-lhes, temporariamente que fosse, a exata deficiência de que eles fingem ser portadores para enganar meio mundo. Tenho certeza de que o desporto paraolímpico ficaria mais respirável da noite para o dia.3. E, por falar em deficiências, leio na imprensa brasileira que os gagos de Manaus poderão ter desconto de 50% nas contas do celular.A intenção não é nova: Mato Grosso do Sul já tem legislação a respeito, informa o jornal "O Globo", o que significa que o cliente gago só tem que pedir uma avaliação médica a um fonoaudiólogo e entregar o documento da sua deficiência no operador telefônico respectivo.Depois, não importa se ele demora mais tempo para falar o que tem a falar: a mão paternalista do governo ampara a sua gagueira com mais uma política de "discriminação positiva".Um absurdo? Honestamente, creio que a notícia se comenta a ela própria. Uma consequência da medida, porém, parece-me inevitável a curto prazo: vai aumentar o número de gagos em Manaus.[image error]
1. NOVA York deu-nos a música de Stephen Sondheim, os combates de Rocky Marciano e os filmes de Woody Allen. Mas também nos deu Michael Bloomberg, um caso de fanatismo antitabagista que diverte e comove ao mesmo tempo.Agora, depois de todas as restrições antitabagistas conhecidas (em restaurantes, escritórios, parques, praias etc.), parece que o "mayor" não exclui a proibição de fumo nas calçadas da cidade -e até, quem sabe, no interior dos lares.Ponto prévio: não sei como será possível fiscalizar o cumprimento da lei na casa de cada cidadão. Detectores de fumaça obrigatórios? Câmeras idem? Gratificação para delatores da família, como na saudosa União Soviética? Mistério.Uma coisa, no entanto, parece certa: o que começou como preocupação razoável sobre liberdade e saúde alheias converteu-se no pretexto ideal para que o poder político faça o que melhor sabe: eleger um inimigo da sociedade, despersonalizá-lo até a humilhação total e arregimentar legiões de talibãs contra ele, que desatam a tossir ante a ameaça do cigarro -quando, anteriormente, nem pensavam nisso.Chegará o dia em que o fumante será o perfeito pária social -sem espaço para existir na civilização e sem uma toca onde possa refugiar-se da intolerância viscosa das massas. Já estivemos mais longe.2. No mundo do desporto acontece de tudo: doping, rivalidades mortais, sacrifícios desumanos em nome da excelência. Mas que dizer de quem finge deficiências para concorrer nos jogos paraolímpicos?A reportaggem é da revista alemã "Der Spiegel", e minha incredulidade é total: cresce o número de deficientes falsos que inventam cegueira, paralisia, até amputação -tudo em nome do desporto, da fama e, claro, do vil metal.Exemplos? São incontáveis.Monique van der Vost era uma celebridade na Holanda, uma das melhores ciclistas paraolímpicas do país. Só havia um pormenor: as pernas da sra. Monique funcionavam à perfeição. Os próprios vizinhos, temendo estar na presença de um gêmea, já a tinham visto a dançar pela casa. Não pretendo levantar falsos testemunhos, mas suspeito de que a dança era só forma de relaxamento antes das provas oficiais.Monique não é caso único. Yvonne Hopft, cinco vezes medalha de ouro em provas paraolímpicas de natação para cegos, afinal não o era: hoje, afastada das competições, resolveu mudar de vida e até já tirou a permissão para dirigir.Mas o melhor exemplo de fraude vem da equipe espanhola de basquete, que se apresentou em 2000, nos Jogos Paraolímpicos de Sidney, para disputar a medalha de ouro de deficientes mentais profundos.A equipe conquistou a medalha de ouro, sem dúvida, mas parece que dez atletas tinham um Q.I. perfeitamente normal. A revista, infelizmente, não esclarece se o Q.I. era normal para qualquer ser humano ou apenas para um espanhol.Seja como for, o Comitê Paraolímpico Internacional promete vigilância e penas duras aos farsantes. Aplaudo, comovido. Mas o que será pena dura para quem finge ser deficiente e ganha a vida com isso?Nos meus momentos de delírio, penso que a única forma de punir seriamente os farsantes era infligir-lhes, temporariamente que fosse, a exata deficiência de que eles fingem ser portadores para enganar meio mundo. Tenho certeza de que o desporto paraolímpico ficaria mais respirável da noite para o dia.3. E, por falar em deficiências, leio na imprensa brasileira que os gagos de Manaus poderão ter desconto de 50% nas contas do celular.A intenção não é nova: Mato Grosso do Sul já tem legislação a respeito, informa o jornal "O Globo", o que significa que o cliente gago só tem que pedir uma avaliação médica a um fonoaudiólogo e entregar o documento da sua deficiência no operador telefônico respectivo.Depois, não importa se ele demora mais tempo para falar o que tem a falar: a mão paternalista do governo ampara a sua gagueira com mais uma política de "discriminação positiva".Um absurdo? Honestamente, creio que a notícia se comenta a ela própria. Uma consequência da medida, porém, parece-me inevitável a curto prazo: vai aumentar o número de gagos em Manaus.[image error]
Published on May 01, 2012 10:25
A ética do trabalho
Rodrigo Constantino, O GLOBO
Vários países celebram hoje o Dia do Trabalho. A data tem origem em uma manifestação grevista ocorrida em Chicago no final do século 19, que acabou em tragédia. Desde então, os socialistas utilizam o 1o de maio para manifestações de cunho ideológico contra o capitalismo. Mas faz sentido isso? Quem fez mais pelos trabalhadores: o capitalismo ou o socialismo? Quem permitiu crescentes salários e melhores condições de trabalho: a concorrência de empresas em busca do lucro ou os sindicatos? Os trabalhadores que desfrutam dos maiores salários são justamente aqueles dos países mais capitalistas. Via de regra, há menos intervenção estatal na economia desses países, assim como no próprio mercado de trabalho. Vários desses países ricos sequer contam com salário mínimo, férias remuneradas, 13o salário ou outras “conquistas” celebradas por aqui. Entretanto, isso não é impeditivo para rendimentos melhores. Qual o segredo? Não há mágica. Esses trabalhadores recebem mais porque são mais produtivos, em boa parte pela melhor qualificação, e também porque há maior concorrência entre as empresas. Quando muitos empregadores disputam a mão de obra escassa, seu valor tende a aumentar. Faz sentido: se uma empresa pagar um salário baixo para alguém eficiente, então outra empresa poderá contratá-lo pagando mais e ainda assim lucrar com isso. É o capitalismo liberal o maior aliado dos trabalhadores. Sim, é verdade que nos primeiros anos da revolução industrial a vida dos trabalhadores não era nada fácil. Mas é preciso comparar isso com a alternativa da época. Se na Inglaterra a vida era árdua, com longas jornadas e baixos salários, na Polônia, distante do advento capitalista, a situação era infinitamente pior. O que hoje vemos na China ilustra bem isso. As condições de trabalho ainda são péssimas na média. Mas representam um enorme avanço frente ao passado socialista. E se engana quem pensa que para melhorar bastam decretos do governo e sindicatos fortes. Não se cria riqueza e produtividade com canetadas estatais. O que a China precisa é justamente de mais liberdade, de mais concorrência.O país em melhor situação na Europa é a Alemanha, com desemprego muito inferior aos demais. Curiosamente, foi um governo de esquerda, de Gerhard Schroder, que fez as reformas liberalizantes no mercado de trabalho. As mudanças reduziram as restrições às demissões (o que facilita as contratações) e cortaram os benefícios para desempregados que recusavam ofertas de emprego ou participar de programas de treinamento. Os sindicatos, sob pressão, aceitaram moderar suas demandas salariais.A Alemanha se tornou o país mais competitivo da região, enquanto vizinhos bem mais camaradas nas leis trabalhistas enfrentam enorme desemprego, especialmente entre os mais jovens. Na Itália, as máfias sindicais impedem qualquer reforma que torne seu mercado mais competitivo, e até assassinato já fez parte do rol de intimidação aos reformadores.O Brasil, infelizmente, parece com os países periféricos da Europa nesse sentido. Para começo de conversa, o trabalho aqui nunca foi valorizado como deveria. A Corte portuguesa considerava trabalho coisa de escravo. Segundo conta Jorge Caldeira em seu livro sobre o Barão de Mauá, o Imperador D. Pedro II jamais perdoou o empresário por tê-lo feito se curvar com uma pá de prata em um gesto simbólico na cerimônia de inauguração de uma estrada de ferro em 1852.Nossa língua fala em “ganhar” dinheiro para designar o salário, como se ele fosse um presente, enquanto em inglês se fala “fazer” dinheiro, denotando a necessidade de esforço e mérito. Muitos jovens sonham com um bom “emprego”, de preferência estável em alguma repartição pública, mas poucos enaltecem o trabalho meritocrático. Isso precisa mudar. Não é necessário ser calvinista para reconhecer a importância de uma ética do trabalho para o progresso de um povo.Mas existem ainda inúmeros obstáculos, além do cultural, que dificultam a vida dos trabalhadores brasileiros. Eles são criados justamente pela ausência de um modelo de maior liberdade econômica. Os encargos são absurdos, a educação é precária e os sindicatos concentram muito poder. O imposto sindical representa uma afronta aos trabalhadores. Qualquer associação deveria ser facultativa. Somente assim os sindicatos terão incentivos para representar efetivamente os interesses dos trabalhadores.Portanto, trabalhadores brasileiros, uni-vos! Não temos nada a perder além dos grilhões impostos pelo governo em conluio com as máfias sindicais. [image error]
Published on May 01, 2012 06:49
A "minoria" de 75%
Rodrigo Constantino
Muitos gostam de falar em nome das "minorias", incluindo aí mulheres, negros, índios e gays. A colunista de O Globo, Miriam Leitão, costuma escrever em favor das cotas para "negros" e com frequência apela para a cartada sexual, tratando as mulheres como vítimas de preconceito no mercado de trabalho (eu nunca a vi questionando se os salários médios das mulheres não são menores pelo simples fato de que elas engravidam e, portanto, buscam trabalhos mais flexíveis e com remuneração média inferior).
Mas o problema com tanta minoria é que a conta não fecha! Para começo de conversa, homens e mulheres já compõem aproximadamente meio a meio da população. Logo na largada, portanto, estaríamos falando de uma "minoria" de 50%, conceito um tanto estranho. Só que ainda resta adicionar as demais minorias, evitando a dupla contagem.
Como temos cerca de 40% da população que se diz negra ou parda, vamos assumir que a proporção de homens e mulheres segue o padrão geral. Assim, temos mais 20% do total da população representada por homens "negros", leia-se pardos (o suficiente para se obter privilégios neste novo Brasil com leis de segregação racial).
Só que não acabou! Ainda temos os índios, os gays, os deficientes e todos os demais grupos que a esquerda seleciona como mascotes para seu "altruísmo" espalhafatoso. Vamos admitir que 10% dos homens (para evitar a dupla contagem novamente) são compostos por estes grupos (aqui no Rio eu diria que só de homossexual deve ser mais que isso, mas sejamos conservadores). Temos então outros 5% do total da população feitos de "minorias" que são os alvos da bondade (com recursos alheios) dos esquerdistas em geral.
Se o leitor ou leitora acompanhou minhas contas, percebeu que já temos 75% de minorias no Brasil (50% de mulheres, 20% de homens "negros" e 5% de homens índios, gays ou deficientes). Haja poder concentrado nesta "maioria" de 25% para explorar o restante como é alegado pelos defensores das "minorias"! Como se vê, a vida do homem branco heterossexual saudável será cada vez mais dura para sustentar as vantagens criadas para as "minorias".
Como escreveu o filósofo Luiz Felipe Pondé em seu novo livro, Guia Politicamente Incorreto da Filosofia, "A diferença entre a velha esquerda e a nova esquerda é que, para a velha, a classe que salvaria o mundo seria o proletariado (os pobres), enquanto, para a nova, é todo tipo de grupo de 'excluídos': mulheres, negros, gays, aborígines, índios, marcianos..."
Ayn Rand estava absolutamente certa quando disse que a menor minoria de todas é o indivíduo, e que aqueles que negam direitos individuais não podem alegar ser defensores das minorias. Que minoria é essa que perfaz 75% da população, esquerdistas? Podem agredir nossos direitos e nossos bolsos, mas preservem ao menos a aritmética![image error]
Muitos gostam de falar em nome das "minorias", incluindo aí mulheres, negros, índios e gays. A colunista de O Globo, Miriam Leitão, costuma escrever em favor das cotas para "negros" e com frequência apela para a cartada sexual, tratando as mulheres como vítimas de preconceito no mercado de trabalho (eu nunca a vi questionando se os salários médios das mulheres não são menores pelo simples fato de que elas engravidam e, portanto, buscam trabalhos mais flexíveis e com remuneração média inferior).
Mas o problema com tanta minoria é que a conta não fecha! Para começo de conversa, homens e mulheres já compõem aproximadamente meio a meio da população. Logo na largada, portanto, estaríamos falando de uma "minoria" de 50%, conceito um tanto estranho. Só que ainda resta adicionar as demais minorias, evitando a dupla contagem.
Como temos cerca de 40% da população que se diz negra ou parda, vamos assumir que a proporção de homens e mulheres segue o padrão geral. Assim, temos mais 20% do total da população representada por homens "negros", leia-se pardos (o suficiente para se obter privilégios neste novo Brasil com leis de segregação racial).
Só que não acabou! Ainda temos os índios, os gays, os deficientes e todos os demais grupos que a esquerda seleciona como mascotes para seu "altruísmo" espalhafatoso. Vamos admitir que 10% dos homens (para evitar a dupla contagem novamente) são compostos por estes grupos (aqui no Rio eu diria que só de homossexual deve ser mais que isso, mas sejamos conservadores). Temos então outros 5% do total da população feitos de "minorias" que são os alvos da bondade (com recursos alheios) dos esquerdistas em geral.
Se o leitor ou leitora acompanhou minhas contas, percebeu que já temos 75% de minorias no Brasil (50% de mulheres, 20% de homens "negros" e 5% de homens índios, gays ou deficientes). Haja poder concentrado nesta "maioria" de 25% para explorar o restante como é alegado pelos defensores das "minorias"! Como se vê, a vida do homem branco heterossexual saudável será cada vez mais dura para sustentar as vantagens criadas para as "minorias".
Como escreveu o filósofo Luiz Felipe Pondé em seu novo livro, Guia Politicamente Incorreto da Filosofia, "A diferença entre a velha esquerda e a nova esquerda é que, para a velha, a classe que salvaria o mundo seria o proletariado (os pobres), enquanto, para a nova, é todo tipo de grupo de 'excluídos': mulheres, negros, gays, aborígines, índios, marcianos..."
Ayn Rand estava absolutamente certa quando disse que a menor minoria de todas é o indivíduo, e que aqueles que negam direitos individuais não podem alegar ser defensores das minorias. Que minoria é essa que perfaz 75% da população, esquerdistas? Podem agredir nossos direitos e nossos bolsos, mas preservem ao menos a aritmética![image error]
Published on May 01, 2012 05:33
April 30, 2012
Dilma e o fantasma da Delta
Guilherme Fiuza, Revista ÉPOCA
Dilma Rousseff pediu a sua assessoria um pente-fino nos contratos da construtora Delta com o governo federal. A presidente da República quer saber se há irregularidade em alguma dessas obras. O Brasil assiste embevecido a mais uma cartada moralizadora da gerente. Mas o ideal seria ela pedir a sua assessoria, antes do pente-fino, uns óculos de grau. Se Dilma não enxergou o que a Delta andou fazendo com seu governo, está correndo perigo: pode tropeçar a qualquer momento num desses sacos de dinheiro que atravessam seu caminho, rumo às obras superfaturadas do PAC.
Como todos sabem, até porque Lula cansou de avisar, Dilma é a mãe do PAC. Por uma dessas coincidências da vida, a Delta é a empreiteira campeã do PAC. Segundo a Controladoria-Geral da União (CGU), as irregularidades nas obras tocadas pela Delta vêm desde 2007. A mãe do PAC teve pelo menos cinco anos para enxergar com quem seu filho estava se metendo. E a Delta era a principal companhia do menino, andando com ele Brasil afora num variado roteiro de traquinagens. Mas as mães de hoje em dia são muito ocupadas, não têm tempo para as crianças.
Felizmente, sempre tem uma babá, uma vizinha, uma amiga atenta para abrir os olhos dessas mães distraídas. Dilma teve essa sorte, em setembro de 2010. A CGU, que vive controlando a vida alheia – uma espécie de bisbilhoteira do bem –, deu o serviço completo: contou a Dilma e Lula (a mãe e o padrasto) que o PAC vinha sendo desencaminhado pela Delta. Superfaturamento, fraudes em licitações, pagamento de propinas e variadas modalidades de desvio de dinheiro público – inclusive com criminosa adulteração de materiais em obras de infraestrutura – estavam entre as molecagens da empreiteira com o filho prodígio da então candidata a presidente.
De posse do relatório da CGU, expondo a farra da Delta nas obras do PAC, o que fez Dilma Rousseff? Eleita presidente, assinou mais 31 contratos com a Delta.
Talvez seja bom explicar de novo, para os leitores distraídos como a mãe do PAC: depois da comunicação à administração federal sobre as irregularidades da Delta, a empreiteira recebeu quase R$ 1 bilhão do governo Dilma. Agora, a presidente anuncia publicamente que passará um pente-fino nesses contratos, e a plateia aplaude a faxina. Não só aplaude, como dá novo recorde de aprovação a esse mesmo governo Dilma (64% no Datafolha), destacando o quesito moralização. Infelizmente, pente-fino não pega conto do vigário. A presidente corre o risco de tropeçar de repente num saco de dinheiro que atravessa o governo rumo ao PAC.
Mas o show tem de continuar. E, já que o público está gostando, a presidente se espalha no picadeiro. Depois da farra da Delta, que teve seu filé-mignon no famigerado Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), Dilma diz que quer saber se a faxina no órgão favoreceu Carlinhos Cachoeira. Tradução: depois de ter de demitir apadrinhados de seus aliados porque a imprensa revelou suas negociatas, Dilma quer ver se ainda dá para convencer a plateia de que o escândalo foi plantado pelo bicheiro. É claro que dá: se Lula repete por aí que o mensalão não existiu (e não foi internado por causa disso), por que não buzinar a versão de que o caso Dnit foi uma criação de Cachoeira?
Pelo que revelam as escutas telefônicas da Polícia Federal, o bicheiro operava com a Delta na corrupção de agentes públicos. Dilma e o PT são candidatos a vítimas desse esquema – daí Lula ter forçado a CPI do Cachoeira. O problema na montagem dessa literatura é que a Delta, mesmo depois da revelação do esquema e da prisão do bicheiro, continua recebendo dinheiro do governo Dilma – R$ 133 milhões só em 2012, e através do Dnit...
A atribulada mãe do PAC não notou a Delta, não percebeu Cachoeira, engordou o milionário esquema deles no Dnit durante anos por pura distração – e agora vai moralizar tudo isso com seu pente-fino mágico. Na próxima rodada das pesquisas de opinião, o vigilante povo brasileiro saberá reconhecer mais essa faxina da mulher destemida, dando-lhe novo recorde de aprovação.
Nesse ritmo, a CPI do Cachoeira acabará concluindo que até o escândalo do mensalão foi provocado pelo bicheiro (essa tese já existe). E Dilma conquistará para o PT o monopólio da inocência.
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Dilma Rousseff pediu a sua assessoria um pente-fino nos contratos da construtora Delta com o governo federal. A presidente da República quer saber se há irregularidade em alguma dessas obras. O Brasil assiste embevecido a mais uma cartada moralizadora da gerente. Mas o ideal seria ela pedir a sua assessoria, antes do pente-fino, uns óculos de grau. Se Dilma não enxergou o que a Delta andou fazendo com seu governo, está correndo perigo: pode tropeçar a qualquer momento num desses sacos de dinheiro que atravessam seu caminho, rumo às obras superfaturadas do PAC.
Como todos sabem, até porque Lula cansou de avisar, Dilma é a mãe do PAC. Por uma dessas coincidências da vida, a Delta é a empreiteira campeã do PAC. Segundo a Controladoria-Geral da União (CGU), as irregularidades nas obras tocadas pela Delta vêm desde 2007. A mãe do PAC teve pelo menos cinco anos para enxergar com quem seu filho estava se metendo. E a Delta era a principal companhia do menino, andando com ele Brasil afora num variado roteiro de traquinagens. Mas as mães de hoje em dia são muito ocupadas, não têm tempo para as crianças.
Felizmente, sempre tem uma babá, uma vizinha, uma amiga atenta para abrir os olhos dessas mães distraídas. Dilma teve essa sorte, em setembro de 2010. A CGU, que vive controlando a vida alheia – uma espécie de bisbilhoteira do bem –, deu o serviço completo: contou a Dilma e Lula (a mãe e o padrasto) que o PAC vinha sendo desencaminhado pela Delta. Superfaturamento, fraudes em licitações, pagamento de propinas e variadas modalidades de desvio de dinheiro público – inclusive com criminosa adulteração de materiais em obras de infraestrutura – estavam entre as molecagens da empreiteira com o filho prodígio da então candidata a presidente.
De posse do relatório da CGU, expondo a farra da Delta nas obras do PAC, o que fez Dilma Rousseff? Eleita presidente, assinou mais 31 contratos com a Delta.
Talvez seja bom explicar de novo, para os leitores distraídos como a mãe do PAC: depois da comunicação à administração federal sobre as irregularidades da Delta, a empreiteira recebeu quase R$ 1 bilhão do governo Dilma. Agora, a presidente anuncia publicamente que passará um pente-fino nesses contratos, e a plateia aplaude a faxina. Não só aplaude, como dá novo recorde de aprovação a esse mesmo governo Dilma (64% no Datafolha), destacando o quesito moralização. Infelizmente, pente-fino não pega conto do vigário. A presidente corre o risco de tropeçar de repente num saco de dinheiro que atravessa o governo rumo ao PAC.
Mas o show tem de continuar. E, já que o público está gostando, a presidente se espalha no picadeiro. Depois da farra da Delta, que teve seu filé-mignon no famigerado Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), Dilma diz que quer saber se a faxina no órgão favoreceu Carlinhos Cachoeira. Tradução: depois de ter de demitir apadrinhados de seus aliados porque a imprensa revelou suas negociatas, Dilma quer ver se ainda dá para convencer a plateia de que o escândalo foi plantado pelo bicheiro. É claro que dá: se Lula repete por aí que o mensalão não existiu (e não foi internado por causa disso), por que não buzinar a versão de que o caso Dnit foi uma criação de Cachoeira?
Pelo que revelam as escutas telefônicas da Polícia Federal, o bicheiro operava com a Delta na corrupção de agentes públicos. Dilma e o PT são candidatos a vítimas desse esquema – daí Lula ter forçado a CPI do Cachoeira. O problema na montagem dessa literatura é que a Delta, mesmo depois da revelação do esquema e da prisão do bicheiro, continua recebendo dinheiro do governo Dilma – R$ 133 milhões só em 2012, e através do Dnit...
A atribulada mãe do PAC não notou a Delta, não percebeu Cachoeira, engordou o milionário esquema deles no Dnit durante anos por pura distração – e agora vai moralizar tudo isso com seu pente-fino mágico. Na próxima rodada das pesquisas de opinião, o vigilante povo brasileiro saberá reconhecer mais essa faxina da mulher destemida, dando-lhe novo recorde de aprovação.
Nesse ritmo, a CPI do Cachoeira acabará concluindo que até o escândalo do mensalão foi provocado pelo bicheiro (essa tese já existe). E Dilma conquistará para o PT o monopólio da inocência.
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Published on April 30, 2012 14:57
Meu Brasil brasileiro
MARCO ANTONIO, VILLA - HISTORIADOR; É PROFESSOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS (UFSCAR) - O Estado de S.PauloO Brasil é um país, no mínimo, estranho. Em 1992, depois de grande mobilização nacional e de uma comissão parlamentar mista de inquérito (CPMI) acompanhada diariamente pela população, o então presidente Fernando Collor de Mello teve o seu mandato cassado. Foi o primeiro presidente da República que teve aprovado um processo de impeachment no País. De acordo com os congressistas, o presidente foi deposto por ter cometidos crimes de responsabilidade. Collor foi acusado de ter articulado com o seu antigo tesoureiro de campanha, Paulo César Farias, um grande esquema de corrupção que teria arrecado mais de US$ 1 bilhão. Acabou absolvido pelo Supremo Tribunal Federal por falta de provas. Passados 20 anos, o mesmo Fernando Collor, agora como senador por Alagoas, foi indicado por seu partido, o PTB, para compor a CPMI que se propõe a investigar as ações de Carlinhos Cachoeira. Deixou a posição de caça e passou a ser um dos caçadores.Quem mudou: Collor ou o Brasil? Provavelmente nenhum dos dois. Algo está profundamente errado quando um país não consegue, depois de duas décadas, enfrentar a corrupção. Hoje, diferentemente de 1992, as denúncias de corrupção são muito mais graves. Estão nas entranhas do Estado, em todos os níveis, e em todos os Poderes. Não se trata - o que já era grave - simplesmente de um esquema de corrupção organizado por um grupo marginal do poder, recém-chegado ao primeiro plano da política nacional.Ao longo dos anos a corrupção foi sendo aperfeiçoada. Até adquiriu status de algo natural, quase que indispensável para governar. Como cabe tudo na definição de presidencialismo de coalizão, não deve causar admiração considerar que a corrupção é indispensável para a governabilidade, garante estabilidade, permite até que o País possa crescer - poderia dizer algum analista de ocasião, da turma das Polianas que infestam o Brasil.Parodiando Karl Marx, corruptos de todo o Brasil, uni-vos! Essa poderia ser a consigna de algum partido já existente ou a ser fundado. Afinal, a nossa democracia está em crise, mas não é por falta de partidos. É uma constatação óbvia de que o Brasil não tem memória. O jornalista Ivan Lessa escreveu que a cada 15 anos o Brasil esquecia o que tinha acontecido nos últimos 15. Lessa é um otimista incorrigível. O esquecimento é muito - mas muito - mais rápido. É a cada 15 dias. Caso contrário não seria possível imaginar que Fernando Collor estivesse no Senado, presidisse comissões e até indicasse diretores de empresas estatais, como no caso da BR Distribuidora. E mais: que fosse indicado como membro permanente de uma CPMI que visa a apurar atos de corrupção. Indo por esse caminho, não vai causar nenhuma estranheza se o Congresso Nacional revogar o impeachment de 1992 e até fizer uma sessão de desagravo ao ex-presidente. Como estamos no Brasil, é bom não duvidar dessa possibilidade.Em 1992 muitos imaginavam que o Brasil poderia ser passado a limpo. Ocorreram inúmeros atos públicos, passeatas; manifestos foram redigidos exigindo ética na política. Até surgiu uma "geração de caras-pintadas". Parecia - só parecia - que, após a promulgação da Constituição de 1988 e a primeira eleição direta presidencial - depois de 29 anos -, a tríade estava completa com a queda do presidente acusado de sérios desvios antirrepublicanos. O novo Brasil estaria nascendo e a corrupção, vista como intrínseca à política brasileira, seria considerada algo do passado.Não é necessário fazer nenhum balanço exaustivo para constatar o óbvio. A derrota - de goleada - dos valores éticos e morais republicanos foi acachapante. Nos últimos 20 anos tivemos inúmeras CPIs. Ficamos indignados ouvindo depoimentos em Brasília com confissões públicas de corrupção. Um publicitário, Duda Mendonça, chegou mesmo a confessar - sem que lhe tivesse sido perguntado - na CPMI do Mensalão que havia recebido numa conta no exterior o pagamento pelos serviços prestados à campanha do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva. A bombástica revelação foi recebida por alguns até com naturalidade. O que configurava um crime de responsabilidade, de acordo com a Constituição, além de outros delitos, não gerou, por consequência, nenhum efeito. E, vale recordar, com a concordância bovina - para lembrar Nelson Rodrigues - da oposição.A aceitação de que política é assim mesmo foi levando à desmoralização da democracia e de seus fundamentos. Hoje vivemos um simulacro de democracia. Ninguém quer falar que o rei está nu. Democracia virou simplesmente sinônimo de realização de eleições, despolitizadas, desinteressadas e com um considerável índice de abstenção (mesmo com o voto obrigatório). Aqui, até as eleições acabaram possibilitando expandir a corrupção.Na política tradicional, a bandeira da ética é empunhada de forma oportunista, de um grupo contra o outro. Na próxima CPI os papéis podem estar invertidos, sem nenhum problema. É um querendo "pegar" o outro. E muitas vezes o feitiço pode virar contra o feiticeiro.E as condenações? Quem está cumprindo pena? Quem teve os bens, obtidos ilegalmente, confiscados? Nada. O que vale é o espetáculo, e não o resultado.O Brasil conseguiu um verdadeiro milagre: descolou a política da economia. O País continua caminhando, com velocidade reduzida, por causa da má gestão política. Mas vai avançando. E por iniciativa dos simples cidadãos que desenvolvem seus negócios e constroem dignamente sua vida. Depois, muito depois, vão chegar o Estado e sua burocracia. Aparentemente para ajudar, mas, como de hábito, para tirar "alguma casquinha", para dizer o mínimo. E a vida segue.Não vai causar admiração se, em 2032, Demóstenes Torres for indicado pelo seu partido para fazer parte de uma CPI para apurar denúncias de corrupção. É o meu Brasil brasileiro, terra de samba e pandeiro.
Published on April 30, 2012 08:31
A palavra feia
Luiz Felipe Pondé, Folha de SP
Anos atrás, tive o prazer de conhecer o filósofo alemão Peter Sloterdijk. Encontrei com ele algumas vezes em sua casa em Karlsruhe, Alemanha.Partilhamos o gosto pelo charuto cubano, pelo vinho branco em grandes quantidades, pelo frango que sua esposa faz, pela visão trágica de mundo, pela heresia cristã pessimista conhecida por gnosticismo e pela pré-história. E também por usar palavras feias na filosofia e no debate público.Cheguei a entrevistá-lo para esta Folha duas vezes. Em uma delas, em 1999, a pauta era a acusação que outro filósofo alemão, Jürgen Habermas, fazia a ele de retomar a palavra "eugenia" em solo alemão.Eugenia quer dizer criar jovens belos, bons e perfeitos. Esta controvérsia chegou até nós e ficou conhecida com o título do livro causador dela, "Regras para o Parque Humano", publicado entre nós pela editora Estação Liberdade. "Parque Humano" aqui significa parque num sentido quase zoológico.Nesta peça filosófica, Sloterdijk dizia que o projeto eugênico ocidental é filho de Platão ("A República", por exemplo), e que se ele não deu certo nas engenharias político-sociais utópicas modernas, nem na educação formal propriamente, estava dando certo na biotecnologia e nas tecnologias de otimização da saúde.Alguém duvida que academias de ginástica, consultoras em nutrição, espiritualidades narcísicas ao portador (como a Nova Era e sua salada de budismo, decoração de interiores e física quântica), cirurgias e tratamentos estéticos, checkups anuais, ambulatórios de qualidade de vida, pré-natal genético e interrupção aconselhada da gravidez de fetos indesejáveis sejam eugenia?E a primeira causa do impulso eugênico é o fato de que a vida é um escândalo de sofrimento, miséria física e mental.Mas, a reação a Sloterdijk na época não foi propriamente uma negação de seus postulados (difíceis de serem negados), mas sim uma reação pautada pela covardia filosófica e política diante da palavra feia que ele falava.Esta palavra feia era sua recusa em negar nossa natureza eugênica e a opção contemporânea pós-nazismo por realizar a eugenia no silêncio de uma razão cínica que nega suas motivações morais: tornar a vida perfeita sem dizer que está fazendo isso.Ao tentar por "na conta do nazismo" a fala de Sloterdijk, Habermas e seus discípulos fugiam do debate, negando a fuga da agonia humana diante do sofrimento via nossa decisão (silenciosa) de tornar a vida perfeita a qualquer custo, mesmo que esta decisão venha empacotada em conceitos baratos como "qualidade de vida", "felicidade interna bruta" ou "direito a autoestima".Mas, engana-se quem pensar que Sloterdijk está querendo "aliviar" a intenção eugênica ao remetê-la a miséria estrutural da vida. Sloterdijk é um filósofo trágico, e por isso ele parte da aporia (impasse) da condição humana para pensar sua história, sua moral, sua política.Sua intenção é trazer à luz aquilo que não se quer trazer à luz, ou seja, que nossa cultura e nossa ciência são eugênicas apesar de dizer que não são. A palavra feia aqui é um grito contra o cinismo dos que negam a intenção eugênica.Mesmo que alguns intelectuais de esquerda tentem afirmar que o projeto político utópico revive nas mãos dos árabes e suas eleições islamitas, ou da crise do Euro, ou de desocupados que ocupam os espaços públicos dos que têm o que fazer, intelectuais estes que se apropriam de modo quase oportunista das constantes crises que acometem o mundo, sejam elas capitalistas, sejam elas de qualquer outra natureza, a verdadeira "esquerda" hoje é a afirmação do direito humano a ser mestre do seu destino através das ciências biotecnológicas e seu inegável impacto sobre as condições imediatas da vida cotidiana: longevidade, cirurgias transformadoras do corpo "original", vacinas, antibióticos, psicofármacos, contraceptivos, Viagras, terapias genéticas preventivas.Diante do cinismo, Sloterdijk me disse uma vez que nos restava o "terrorismo pedagógico": dizer palavras feias que as pessoas não querem ouvir em seu sono dogmático.
Anos atrás, tive o prazer de conhecer o filósofo alemão Peter Sloterdijk. Encontrei com ele algumas vezes em sua casa em Karlsruhe, Alemanha.Partilhamos o gosto pelo charuto cubano, pelo vinho branco em grandes quantidades, pelo frango que sua esposa faz, pela visão trágica de mundo, pela heresia cristã pessimista conhecida por gnosticismo e pela pré-história. E também por usar palavras feias na filosofia e no debate público.Cheguei a entrevistá-lo para esta Folha duas vezes. Em uma delas, em 1999, a pauta era a acusação que outro filósofo alemão, Jürgen Habermas, fazia a ele de retomar a palavra "eugenia" em solo alemão.Eugenia quer dizer criar jovens belos, bons e perfeitos. Esta controvérsia chegou até nós e ficou conhecida com o título do livro causador dela, "Regras para o Parque Humano", publicado entre nós pela editora Estação Liberdade. "Parque Humano" aqui significa parque num sentido quase zoológico.Nesta peça filosófica, Sloterdijk dizia que o projeto eugênico ocidental é filho de Platão ("A República", por exemplo), e que se ele não deu certo nas engenharias político-sociais utópicas modernas, nem na educação formal propriamente, estava dando certo na biotecnologia e nas tecnologias de otimização da saúde.Alguém duvida que academias de ginástica, consultoras em nutrição, espiritualidades narcísicas ao portador (como a Nova Era e sua salada de budismo, decoração de interiores e física quântica), cirurgias e tratamentos estéticos, checkups anuais, ambulatórios de qualidade de vida, pré-natal genético e interrupção aconselhada da gravidez de fetos indesejáveis sejam eugenia?E a primeira causa do impulso eugênico é o fato de que a vida é um escândalo de sofrimento, miséria física e mental.Mas, a reação a Sloterdijk na época não foi propriamente uma negação de seus postulados (difíceis de serem negados), mas sim uma reação pautada pela covardia filosófica e política diante da palavra feia que ele falava.Esta palavra feia era sua recusa em negar nossa natureza eugênica e a opção contemporânea pós-nazismo por realizar a eugenia no silêncio de uma razão cínica que nega suas motivações morais: tornar a vida perfeita sem dizer que está fazendo isso.Ao tentar por "na conta do nazismo" a fala de Sloterdijk, Habermas e seus discípulos fugiam do debate, negando a fuga da agonia humana diante do sofrimento via nossa decisão (silenciosa) de tornar a vida perfeita a qualquer custo, mesmo que esta decisão venha empacotada em conceitos baratos como "qualidade de vida", "felicidade interna bruta" ou "direito a autoestima".Mas, engana-se quem pensar que Sloterdijk está querendo "aliviar" a intenção eugênica ao remetê-la a miséria estrutural da vida. Sloterdijk é um filósofo trágico, e por isso ele parte da aporia (impasse) da condição humana para pensar sua história, sua moral, sua política.Sua intenção é trazer à luz aquilo que não se quer trazer à luz, ou seja, que nossa cultura e nossa ciência são eugênicas apesar de dizer que não são. A palavra feia aqui é um grito contra o cinismo dos que negam a intenção eugênica.Mesmo que alguns intelectuais de esquerda tentem afirmar que o projeto político utópico revive nas mãos dos árabes e suas eleições islamitas, ou da crise do Euro, ou de desocupados que ocupam os espaços públicos dos que têm o que fazer, intelectuais estes que se apropriam de modo quase oportunista das constantes crises que acometem o mundo, sejam elas capitalistas, sejam elas de qualquer outra natureza, a verdadeira "esquerda" hoje é a afirmação do direito humano a ser mestre do seu destino através das ciências biotecnológicas e seu inegável impacto sobre as condições imediatas da vida cotidiana: longevidade, cirurgias transformadoras do corpo "original", vacinas, antibióticos, psicofármacos, contraceptivos, Viagras, terapias genéticas preventivas.Diante do cinismo, Sloterdijk me disse uma vez que nos restava o "terrorismo pedagógico": dizer palavras feias que as pessoas não querem ouvir em seu sono dogmático.
Published on April 30, 2012 07:07
April 28, 2012
Decadência moral ou saudosismo idealizado?
Rodrigo Constantino
Em artigo na Folha hoje, a senadora Kátia Abreu culpa o crescente ateísmo pela crise que assola os Estados Unidos e a Europa. Segundo a senadora, a crise não é do capitalismo em si (o que concordo), mas sim de um capitalismo mais hedonista, materialista e ateu (o que discordo). Ao retirar Deus da história, diz ela, os valores morais se perderam e tudo entrou em decadência. Sem Deus, tudo é permitido!
Não creio que os dados empíricos corroboram com tal visão. A crise não seleciona de acordo com a fé. Ataca países de todos os tipos. Por outro lado, os países asiáticos seguem em melhor situação, e tampouco creio que seja por causa da fé em Deus (muito menos por causa do cristianismo). Não consta também que os muçulmanos, repletos de fé religiosa (até demais), naveguem em um mar de prosperidade.
Também questiono se há de fato este hedonismo todo nesse mundo moderno e mais laico, quando vejo tanta gente abraçando novas formas de fé na "imortalidade", postergando os prazeres do momento em nome de uma vida (qual vida?) sempre mais longa. As cruzadas anti-tabagistas e contra o açúcar e fritura ilustram bem isso. Tem muita gente com medo de viver o presente!
Mas o que eu gostaria de questionar aqui é se há mesmo uma decadência moral em curso, para começo de conversa. Sim, eu não posso negar que vejo certos valores em declínio, valores estes que eu respeito e admiro. Só que nem tudo é decadência moral. Os hábitos e costumes mudam, e muitas vezes temos dificuldade de adaptação. Quando tais mudanças ocorrem em ritmo muito acelerado, esta aceitação fica ainda mais difícil. Portanto, eu já colocaria em xeque a principal premissa da senadora (e de muitos conservadores): há mesmo este declínio moral ou estamos diante de novidades que incomodam, mas que não necessariamente vão tornar o mundo um lugar pior?
Nesse meu artigo, falo mais dessa questão dos "saudosistas". Acho que devemos tomar muito cuidado com este julgamento precipitado de que tudo vai de mal a pior com o mundo moderno. Creio que o cético David Hume, que não pode ser acusado de ingênuo e esperançoso, colocou o dedo na ferida quando disse: "O hábito de culpar o presente e admirar o passado está profundamente arraigado na natureza humana". Em seu novo livro "Civilization: The West and the Rest", Niall Ferguson arrisca uma boa explicação para este fenômeno tão comum, principalmente entre pessoas com mais idade. Ele afirma que a idéia de que estamos "fritos", que o declínio é inevitável, que as coisas só podem piorar, está altamente conectada à noção de mortalidade que temos. Como vamos degenerar enquanto indivíduos, então, de forma instintiva, nós sentimos que as civilizações em que vivemos devem seguir o mesmo destino.
Longe de mim apresentar um quadro muito esperançoso e otimista, ignorando os enormes riscos existentes e até mesmo os aspectos que considero degenerados de fato em nosso mundo atual. Mas eu iria com menos fervor neste diagnóstico e prognóstico. O crescimento da riqueza mundial pode representar simplesmente a ascensão de uma classe média, e comparar seus gostos (sempre medíocres por definição) com as preferências aristocráticas do passado é uma injustiça (Michel Teló x Mozart, por exemplo).
Não acho, portanto, que exista esse declínio moral todo e que ele se deve ao ateísmo. Até porque, como dizia Humboldt, "A moralidade humana, até mesmo a mais elevada e substancial, não é de modo algum dependente da religião, ou necessariamente vinculada a ela". Eu concordo, e vejo isso no dia a dia. Pessoas com profunda fé espiritual que não são ícones de moralidade, e ateus ou agnósticos que se mostram pessoas rigorosamente corretas. O capitalismo depende mesmo da fé religiosa? Eu penso que não.
Por fim, e para ilustrar com um bom exemplo o alerta de Hume, segue uma constatação feita pelo jesuíta espanhol Baltasar Gracián, em "A Arte da Prudência". Detalhe: o livro foi escrito em 1647!
Muitos valores vieram a parecer antiquados: falar a verdade, manter a palavra. Os bons parecem pertencer aos velhos bons tempos, embora sejam sempre queridos. Se é que ainda há alguns, são raros, e nunca são imitados. Que triste época essa, quando a virtude é rara e a maldade está no cotidiano.
Será que o mundo fica cada vez pior mesmo, ou será que são nossos olhos, nosso saudosismo de um passado idealizado, nossa insegurança diante das novidades, que criam esta imagem sombria do presente e futuro? Deixo com o leitor a resposta.
Em artigo na Folha hoje, a senadora Kátia Abreu culpa o crescente ateísmo pela crise que assola os Estados Unidos e a Europa. Segundo a senadora, a crise não é do capitalismo em si (o que concordo), mas sim de um capitalismo mais hedonista, materialista e ateu (o que discordo). Ao retirar Deus da história, diz ela, os valores morais se perderam e tudo entrou em decadência. Sem Deus, tudo é permitido!
Não creio que os dados empíricos corroboram com tal visão. A crise não seleciona de acordo com a fé. Ataca países de todos os tipos. Por outro lado, os países asiáticos seguem em melhor situação, e tampouco creio que seja por causa da fé em Deus (muito menos por causa do cristianismo). Não consta também que os muçulmanos, repletos de fé religiosa (até demais), naveguem em um mar de prosperidade.
Também questiono se há de fato este hedonismo todo nesse mundo moderno e mais laico, quando vejo tanta gente abraçando novas formas de fé na "imortalidade", postergando os prazeres do momento em nome de uma vida (qual vida?) sempre mais longa. As cruzadas anti-tabagistas e contra o açúcar e fritura ilustram bem isso. Tem muita gente com medo de viver o presente!
Mas o que eu gostaria de questionar aqui é se há mesmo uma decadência moral em curso, para começo de conversa. Sim, eu não posso negar que vejo certos valores em declínio, valores estes que eu respeito e admiro. Só que nem tudo é decadência moral. Os hábitos e costumes mudam, e muitas vezes temos dificuldade de adaptação. Quando tais mudanças ocorrem em ritmo muito acelerado, esta aceitação fica ainda mais difícil. Portanto, eu já colocaria em xeque a principal premissa da senadora (e de muitos conservadores): há mesmo este declínio moral ou estamos diante de novidades que incomodam, mas que não necessariamente vão tornar o mundo um lugar pior?
Nesse meu artigo, falo mais dessa questão dos "saudosistas". Acho que devemos tomar muito cuidado com este julgamento precipitado de que tudo vai de mal a pior com o mundo moderno. Creio que o cético David Hume, que não pode ser acusado de ingênuo e esperançoso, colocou o dedo na ferida quando disse: "O hábito de culpar o presente e admirar o passado está profundamente arraigado na natureza humana". Em seu novo livro "Civilization: The West and the Rest", Niall Ferguson arrisca uma boa explicação para este fenômeno tão comum, principalmente entre pessoas com mais idade. Ele afirma que a idéia de que estamos "fritos", que o declínio é inevitável, que as coisas só podem piorar, está altamente conectada à noção de mortalidade que temos. Como vamos degenerar enquanto indivíduos, então, de forma instintiva, nós sentimos que as civilizações em que vivemos devem seguir o mesmo destino.
Longe de mim apresentar um quadro muito esperançoso e otimista, ignorando os enormes riscos existentes e até mesmo os aspectos que considero degenerados de fato em nosso mundo atual. Mas eu iria com menos fervor neste diagnóstico e prognóstico. O crescimento da riqueza mundial pode representar simplesmente a ascensão de uma classe média, e comparar seus gostos (sempre medíocres por definição) com as preferências aristocráticas do passado é uma injustiça (Michel Teló x Mozart, por exemplo).
Não acho, portanto, que exista esse declínio moral todo e que ele se deve ao ateísmo. Até porque, como dizia Humboldt, "A moralidade humana, até mesmo a mais elevada e substancial, não é de modo algum dependente da religião, ou necessariamente vinculada a ela". Eu concordo, e vejo isso no dia a dia. Pessoas com profunda fé espiritual que não são ícones de moralidade, e ateus ou agnósticos que se mostram pessoas rigorosamente corretas. O capitalismo depende mesmo da fé religiosa? Eu penso que não.
Por fim, e para ilustrar com um bom exemplo o alerta de Hume, segue uma constatação feita pelo jesuíta espanhol Baltasar Gracián, em "A Arte da Prudência". Detalhe: o livro foi escrito em 1647!
Muitos valores vieram a parecer antiquados: falar a verdade, manter a palavra. Os bons parecem pertencer aos velhos bons tempos, embora sejam sempre queridos. Se é que ainda há alguns, são raros, e nunca são imitados. Que triste época essa, quando a virtude é rara e a maldade está no cotidiano.
Será que o mundo fica cada vez pior mesmo, ou será que são nossos olhos, nosso saudosismo de um passado idealizado, nossa insegurança diante das novidades, que criam esta imagem sombria do presente e futuro? Deixo com o leitor a resposta.
Published on April 28, 2012 11:26
Mordaça na CPI
Guilherme Fiuza, O Globo
Na CPI do Cachoeira, os parlamentares precisam estar alertas para impedir as manipulações da mídia, que vaza informações e induz resultados.
Quem disse isso foi o senador Fernando Collor de Mello. Não foi um cochicho, um recado cifrado ou uma ameaça em off. Collor soltou seu brado contra a imprensa de viva voz, da tribuna do Senado, para quem quisesse ouvir. Os senadores ouviram calados, e o resto dos brasileiros, também.
O ex-presidente da República está muito bem colocado. É membro da CPI que pode ser a maior de todas. Está onde está graças aos ex-inimigos Lula e Sarney, num afinado trio de ex-presidentes regido pela "presidenta".
Collor disse que aceitou o convite para a CPI como uma missão.
Começou a cumpri-la com êxito, usando sua habilidade para serviços insalubres com uma desinibição que seus companheiros palacianos não têm.
O Brasil engole qualquer coisa. Fernando Collor de Mello é o ex-chefe do lendário PC Farias, que extorquiu meio mundo em nome do patrão. A imprensa — cuidado com ela! — descobriu que PC pagava contas pessoais de Collor. Ele teve que abandonar o palácio pela porta dos fundos. No aniversário de 20 anos da CPI do PC, Collor aparece para ensinar como deve funcionar a CPI do Cachoeira.
Ameaçador, avisa que não permitirá a destruição de reputações por jornalistas, ou melhor, "rabiscadores".
Se o Brasil, ou pelo menos o Senado Federal, tivesse um pingo de autoestima, ou quem sabe um resto de vergonha na cara, alguma voz teria surgido para mandar o chefe do PC engolir o que disse.
Não é a primeira vez que Collor canta de galo no Congresso como se estivesse no quintal da Casa da Dinda.
Quando o filho mais esperto de Sarney, Fernando, conseguiu censurar "O Estado de S. Paulo", o senador Pedro Simon reagiu. Foi à tribuna dizer que a investigação da família Sarney por tráfico de influência, no caso Agaciel, não podia ser abafada.
Quem se encrespou em defesa da honra dos Sarney, ameaçada pelos rabiscadores intrometidos? Ele mesmo, o guardião das reputações ilibadas. Colérico, olhos vidrados e dentes trincados, Collor partiu para a intimidação contra Simon, chegando a proibi-lo de voltar a pronunciar o seu nome.
Simon recuou, obedeceu. (Depois disse que se lembrou do assassinato cometido pelo pai de Collor no Senado e temeu a repetição do crime.) O fato é que a censura ao "Estadão" vai completar três anos. E o presidente expelido continua mandando os outros calarem a boca, como se estivesse dando ordens ao PC.
Não é difícil entender por que, na CPI do Cachoeira, a confraria presidencial Dilma-Lula-Sarney-Collor escalou o pitbull da turma para rosnar contra a imprensa. Em 2011, depois que os rabiscadores revelaram a farra dos superfaturamentos nos Transportes, o governo popular escapou por pouco da CPI do Dnit. Foi salvo pela tal frente nacional contra a corrupção — esse movimento despistado que protesta nos feriados contra tudo isso que aí está. Os senadores (Pedro Simon à frente) que poderiam conectar as ruas com o pedido da CPI preferiram aderir ao clube da indignação genérica. A oportunidade passou, e Dilma ainda virou musa das vassouras cenográficas.
Com a CPI do Cachoeira, o esquema do Dnit volta ao centro das atenções.
E aí não vão mais adiantar faxinas cosméticas para acalmar as manchetes.
Surfando nas fraudes do Dnit, a construtora Delta, flagrada em con luio com Cachoeira, tornou-se a campeã das obras do PAC — mesmo após o governo Dilma ser informado das irregularidades envolvendo a empreiteira.
A bomba está no colo dos companheiros.
A CPI foi fomentada por Lula para explodir os oposicionistas Marconi Perillo, governador de Goiás, e Demóstenes Torres, o senador que prostituiu a ética. Eram os prepostos mais visíveis do bicheiro, até o pavio passar pelo governador petista do Distrito Federal e ir parar no seio do PAC, já botando a mãe no meio. Desta vez, o instituto do "eu não sabia" pode não dar conta de esconder todos os rabos. Aí o jeito será tentar intimidar a imprensa. Ouçam o guardião Fernando Collor de Mello: "Não é admissível, num país de livre acesso às informações e num governo que se preza pela transparência pública, aceitar que alguns confrades, sob o argumento muitas vezes falacioso do sigilo da fonte, se utilizem de informantes com os mais rasteiros métodos, visando ao furo de reportagem, mas, sobretudo, propiciar a obtenção de lucros, lucros e mais lucros a si próprios, aos veículos que lhes dão guarida e aos respectivos chefes que os alugam." Explicação aos rabiscadores que não entenderam a mensagem: se alguém encontrar na CPI um cheque como aquele do fantasma do PC que pagou o Fiat Elba de Collor, não mostre a ninguém. Não se meta em negócios privados.
Esse Brasil catatônico merece tomar lição de Collor sobre métodos rasteiros. Chega de intermediários, Cachoeira para presidente.[image error]
Na CPI do Cachoeira, os parlamentares precisam estar alertas para impedir as manipulações da mídia, que vaza informações e induz resultados.
Quem disse isso foi o senador Fernando Collor de Mello. Não foi um cochicho, um recado cifrado ou uma ameaça em off. Collor soltou seu brado contra a imprensa de viva voz, da tribuna do Senado, para quem quisesse ouvir. Os senadores ouviram calados, e o resto dos brasileiros, também.
O ex-presidente da República está muito bem colocado. É membro da CPI que pode ser a maior de todas. Está onde está graças aos ex-inimigos Lula e Sarney, num afinado trio de ex-presidentes regido pela "presidenta".
Collor disse que aceitou o convite para a CPI como uma missão.
Começou a cumpri-la com êxito, usando sua habilidade para serviços insalubres com uma desinibição que seus companheiros palacianos não têm.
O Brasil engole qualquer coisa. Fernando Collor de Mello é o ex-chefe do lendário PC Farias, que extorquiu meio mundo em nome do patrão. A imprensa — cuidado com ela! — descobriu que PC pagava contas pessoais de Collor. Ele teve que abandonar o palácio pela porta dos fundos. No aniversário de 20 anos da CPI do PC, Collor aparece para ensinar como deve funcionar a CPI do Cachoeira.
Ameaçador, avisa que não permitirá a destruição de reputações por jornalistas, ou melhor, "rabiscadores".
Se o Brasil, ou pelo menos o Senado Federal, tivesse um pingo de autoestima, ou quem sabe um resto de vergonha na cara, alguma voz teria surgido para mandar o chefe do PC engolir o que disse.
Não é a primeira vez que Collor canta de galo no Congresso como se estivesse no quintal da Casa da Dinda.
Quando o filho mais esperto de Sarney, Fernando, conseguiu censurar "O Estado de S. Paulo", o senador Pedro Simon reagiu. Foi à tribuna dizer que a investigação da família Sarney por tráfico de influência, no caso Agaciel, não podia ser abafada.
Quem se encrespou em defesa da honra dos Sarney, ameaçada pelos rabiscadores intrometidos? Ele mesmo, o guardião das reputações ilibadas. Colérico, olhos vidrados e dentes trincados, Collor partiu para a intimidação contra Simon, chegando a proibi-lo de voltar a pronunciar o seu nome.
Simon recuou, obedeceu. (Depois disse que se lembrou do assassinato cometido pelo pai de Collor no Senado e temeu a repetição do crime.) O fato é que a censura ao "Estadão" vai completar três anos. E o presidente expelido continua mandando os outros calarem a boca, como se estivesse dando ordens ao PC.
Não é difícil entender por que, na CPI do Cachoeira, a confraria presidencial Dilma-Lula-Sarney-Collor escalou o pitbull da turma para rosnar contra a imprensa. Em 2011, depois que os rabiscadores revelaram a farra dos superfaturamentos nos Transportes, o governo popular escapou por pouco da CPI do Dnit. Foi salvo pela tal frente nacional contra a corrupção — esse movimento despistado que protesta nos feriados contra tudo isso que aí está. Os senadores (Pedro Simon à frente) que poderiam conectar as ruas com o pedido da CPI preferiram aderir ao clube da indignação genérica. A oportunidade passou, e Dilma ainda virou musa das vassouras cenográficas.
Com a CPI do Cachoeira, o esquema do Dnit volta ao centro das atenções.
E aí não vão mais adiantar faxinas cosméticas para acalmar as manchetes.
Surfando nas fraudes do Dnit, a construtora Delta, flagrada em con luio com Cachoeira, tornou-se a campeã das obras do PAC — mesmo após o governo Dilma ser informado das irregularidades envolvendo a empreiteira.
A bomba está no colo dos companheiros.
A CPI foi fomentada por Lula para explodir os oposicionistas Marconi Perillo, governador de Goiás, e Demóstenes Torres, o senador que prostituiu a ética. Eram os prepostos mais visíveis do bicheiro, até o pavio passar pelo governador petista do Distrito Federal e ir parar no seio do PAC, já botando a mãe no meio. Desta vez, o instituto do "eu não sabia" pode não dar conta de esconder todos os rabos. Aí o jeito será tentar intimidar a imprensa. Ouçam o guardião Fernando Collor de Mello: "Não é admissível, num país de livre acesso às informações e num governo que se preza pela transparência pública, aceitar que alguns confrades, sob o argumento muitas vezes falacioso do sigilo da fonte, se utilizem de informantes com os mais rasteiros métodos, visando ao furo de reportagem, mas, sobretudo, propiciar a obtenção de lucros, lucros e mais lucros a si próprios, aos veículos que lhes dão guarida e aos respectivos chefes que os alugam." Explicação aos rabiscadores que não entenderam a mensagem: se alguém encontrar na CPI um cheque como aquele do fantasma do PC que pagou o Fiat Elba de Collor, não mostre a ninguém. Não se meta em negócios privados.
Esse Brasil catatônico merece tomar lição de Collor sobre métodos rasteiros. Chega de intermediários, Cachoeira para presidente.[image error]
Published on April 28, 2012 07:00
April 27, 2012
Ainda o caso do aborto
Rodrigo Constantino
Como já disse várias vezes, considero o tema do aborto um dos mais cabeludos de todos. A maior convicção que tenho é que devemos rejeitar ambos os extremos, quais sejam: os que alegam ser o feto um "parasita" no corpo da mãe e que, portanto, seu direito de propriedade é total (ela poderia retirar o feto já em fase adiantada da gestação); e os que assumem que no segundo da concepção já temos uma vida humana e, portanto, tomar a pílula do dia seguinte seria assassinato tal como uma mãe que estrangula seu bebê. Parecem posturas bem bizarras. Para quem tiver mais interesse em meus argumentos, gravei um vídeo sobre o assunto.
Mas o que eu queria focar agora é no grau de atraso do debate e das leis no Brasil, e também aproveitar para mostrar como nossa direita mais religiosa e fanática pode ser reacionária. Esta direita adota a segunda postura citada acima. Para eles, o feto no milésimo de segundo após a concepção já é um ser humano, e até a pílula do dia seguinte seria então crime hediondo, análogo a dar um tiro na nuca do bebezinho. Os membros desta direita acusam qualquer um que aceita a legalização do aborto, ainda que só para casos de estupro ou anencefalia, de "nazistas". Segundo eles ainda, uma pessoa não pode se dizer defensora das liberdades se tolera tais casos de aborto, pois estaria delegando ao estado o poder de dizer quem é ou não um ser humano.
Vamos, então, fazer uma rápida busca pela Wikipedia mesmo, para verificar um pouco da história do aborto. Aos que repetem tanto a questão dos tais valores "judaico-cristãos" e se sustentam na visão da Igreja Católica como bastião sobre o assunto, alguns trechos são bem interessantes. Por exemplo:
Os hebreus penalizavam somente os abortos causados por violência. Os antigos hebreus acreditavam que o feto não tinha existência humana antes do seu nascimento, e que o aborto em qualquer época da gravidez era completamente permissível, se se fazia em favor da vida e da saúde da grávida.
Aristóteles defendia que o feto se convertia em “humano” aos 40 dias da sua concepção se fosse masculino, e aos 90 se fosse feminino. Aristóteles recomendava o aborto para limitar o tamanho da família e na sua obra “Política” reservava esse direito à mãe.
Nem Santo Agostinho nem São Tomás de Aquino consideravam homicídio o aborto com início de termo (o segundo com base cm que o embrião não parece humano). Este ponto de vista foi adoptado pela Igreja no Concílio de Viena, em 1312, e nunca foi repudiado. A primeira colectânea de direito canónico, em vigor durante muito tempo (segundo o principal historiador da doutrina da Igreja sobre o aborto, John Connery, S. J.), defendia que o aborto só era homicídio depois de o feto já estar "formado" — mais ou menos no fim do 1." trimestre.
O Código Penal francês de 1791, em plena Revolução Francesa, determinava que todos os cúmplices de aborto fossem flagelados e condenados a 20 anos de prisão. O Código Penal francês de 1810, promulgado por Napoleão Bonaparte, previa a pena de morte para o aborto e o infanticídio. Depois, a pena de morte foi substituída pela prisão perpétua.
O que podemos notar de interessante é que tanto os hebreus, como os gregos e os dois principais nomes da Igreja Católica medieval, Santo Agostinho e São Tomás de Aquino, tinham uma visão do aborto bem mais moderada que a dos atuais conservadores radicais. É verdade que eles todos não contavam ainda com a ajuda da ciência microscópica, e que a Igreja determinou a excomunhão pela prática do aborto em 1869. É o avanço da ciência mudando as crenças religiosas. Por outro lado, é curioso notar que os revolucionários franceses e depois Napoleão Bonaparte, que se arrogavam o monopólio racionalista, condenaram com veemência o aborto em todos os casos.
A direita atual fica do lado dos jacobinos, e não de Aristóteles, Santo Agostinho ou Tomás de Aquino. No mínimo irônico, especialmente quando os liberais que aceitam a legalização do aborto com ressalvas são acusados por esta mesma direita de "jacobinos" (ou marxistas), de fazer o jogo da esquerda em prol da revolução cultural que irá destruir os valores da liberdade.
Falando nisso, resta então verificar um pouco as legislações sobre aborto nos diferentes países. Será que esta direita está certa em sua paranóia, e que a legalização parcial do aborto é o começo do fim das liberdades, pela total relativização da vida "humana"? Será que permitir o aborto em certos casos leva ao nazismo? Vejamos:
Em 1935,o aborto foi legalizado na Islândia, na Dinamarca em 1937, e na Suécia em 1938.
O aborto não é restringido pela lei canadense. Desde 1969 que a lei permite a prática de aborto em situações de risco à saúde, e, a partir de 1973, a interrupção voluntária da gravidez deixou de ser ilegal.
O aborto é legal, desde os anos 70, na esmagadora maioria dos estados [americanos], só não é legal no Dakota do Sul. É também legal quando a mulher invoca factores socioeconómicos.
Alemanha: O aborto é permitido até às doze semanas a pedido da mulher após aconselhamento médico, ou em consequência de violação ou outro crime sexual. É também permitido após as doze semanas por razões médicas que possui, segundo a lei alemã, uma definição lata, incluindo saúde mental e condições sociais adversas.
Áustria: O aborto é permitido até as doze semanas a pedido da mulher (lei de 1975). Permitida após as doze semanas em caso de perigo de vida, risco de malformação do feto, mulher menor de 14 anos.
Bélgica: O aborto é permitido até as doze semanas quando a gravidez coloca em risco a mulher, razões sociais ou económicas. Permitida após as doze semanas em caso de sério risco para a saúde.
Itália: O aborto é permitido até aos noventa dias (entre as doze e treze semanas) por razões sociais (incluindo as condições familiares e/ou as circunstâncias em que se realizou a concepção), médicas ou económicas: de facto, a pedido da mulher. Permitida em qualquer momento em caso de risco de morte ou saúde física ou mental da mulher, risco de malformação do feto, violação ou crime sexual.
O aborto na França é permitido até as doze semanas a pedido da mulher caso não tenha razões para ser mãe; razões sociais ou económias. É exigido o aconselhamento da mulher. Permitida após as 12 semanas em caso de risco de morte ou saúde física da mulher, risco de malformação do feto. É necessária a certificação de dois médicos da situação.
O aborto na Espanha é permitido até a 14ª semana de gestação e, até a 22ª, desde que a gestação possa comprometer a vida ou a saúde da gestante ou constatada malformação no feto, se certificada por dois médicos. Após esse período, o aborto fica condicionado, a partir de laudos de um painel de médicos, à anomalia fetal que signifique risco à vida ou quando o feto sofrer de doença grave e incurável.
O aborto é permitido em Portugal até às dez semanas de gestação a pedido da grávida.
O aborto é legal na Inglaterra, Escócia e País de Gales desde 1967.
Austrália: O aborto é permitido, desde 1977, até as vinte semanas de gravidez, e depois das vinte semanas, se prejudicar a saúde da mulher. A regulamentação requer que o aborto após as doze semanas de gestação têm que ser realizadas em “instituições licenciadas”, que são normalmente hospitais.
Como fica claro acima, a imensa maioria dos países ditos civilizados, desenvolvidos e com maior liberdade individual aceita o aborto em diversos casos. E em muitos casos há décadas! Isso apenas ilustra como o debate em nosso país é atrasado em vários aspectos, especialmente quando a religião se mete em demasia na vida dos outros. Ninguém vai virar ditadura comunista só porque aceitou que a mulher possa decidir manter ou não sua gestação, especialmente em casos delicados.[image error]
Como já disse várias vezes, considero o tema do aborto um dos mais cabeludos de todos. A maior convicção que tenho é que devemos rejeitar ambos os extremos, quais sejam: os que alegam ser o feto um "parasita" no corpo da mãe e que, portanto, seu direito de propriedade é total (ela poderia retirar o feto já em fase adiantada da gestação); e os que assumem que no segundo da concepção já temos uma vida humana e, portanto, tomar a pílula do dia seguinte seria assassinato tal como uma mãe que estrangula seu bebê. Parecem posturas bem bizarras. Para quem tiver mais interesse em meus argumentos, gravei um vídeo sobre o assunto.
Mas o que eu queria focar agora é no grau de atraso do debate e das leis no Brasil, e também aproveitar para mostrar como nossa direita mais religiosa e fanática pode ser reacionária. Esta direita adota a segunda postura citada acima. Para eles, o feto no milésimo de segundo após a concepção já é um ser humano, e até a pílula do dia seguinte seria então crime hediondo, análogo a dar um tiro na nuca do bebezinho. Os membros desta direita acusam qualquer um que aceita a legalização do aborto, ainda que só para casos de estupro ou anencefalia, de "nazistas". Segundo eles ainda, uma pessoa não pode se dizer defensora das liberdades se tolera tais casos de aborto, pois estaria delegando ao estado o poder de dizer quem é ou não um ser humano.
Vamos, então, fazer uma rápida busca pela Wikipedia mesmo, para verificar um pouco da história do aborto. Aos que repetem tanto a questão dos tais valores "judaico-cristãos" e se sustentam na visão da Igreja Católica como bastião sobre o assunto, alguns trechos são bem interessantes. Por exemplo:
Os hebreus penalizavam somente os abortos causados por violência. Os antigos hebreus acreditavam que o feto não tinha existência humana antes do seu nascimento, e que o aborto em qualquer época da gravidez era completamente permissível, se se fazia em favor da vida e da saúde da grávida.
Aristóteles defendia que o feto se convertia em “humano” aos 40 dias da sua concepção se fosse masculino, e aos 90 se fosse feminino. Aristóteles recomendava o aborto para limitar o tamanho da família e na sua obra “Política” reservava esse direito à mãe.
Nem Santo Agostinho nem São Tomás de Aquino consideravam homicídio o aborto com início de termo (o segundo com base cm que o embrião não parece humano). Este ponto de vista foi adoptado pela Igreja no Concílio de Viena, em 1312, e nunca foi repudiado. A primeira colectânea de direito canónico, em vigor durante muito tempo (segundo o principal historiador da doutrina da Igreja sobre o aborto, John Connery, S. J.), defendia que o aborto só era homicídio depois de o feto já estar "formado" — mais ou menos no fim do 1." trimestre.
O Código Penal francês de 1791, em plena Revolução Francesa, determinava que todos os cúmplices de aborto fossem flagelados e condenados a 20 anos de prisão. O Código Penal francês de 1810, promulgado por Napoleão Bonaparte, previa a pena de morte para o aborto e o infanticídio. Depois, a pena de morte foi substituída pela prisão perpétua.
O que podemos notar de interessante é que tanto os hebreus, como os gregos e os dois principais nomes da Igreja Católica medieval, Santo Agostinho e São Tomás de Aquino, tinham uma visão do aborto bem mais moderada que a dos atuais conservadores radicais. É verdade que eles todos não contavam ainda com a ajuda da ciência microscópica, e que a Igreja determinou a excomunhão pela prática do aborto em 1869. É o avanço da ciência mudando as crenças religiosas. Por outro lado, é curioso notar que os revolucionários franceses e depois Napoleão Bonaparte, que se arrogavam o monopólio racionalista, condenaram com veemência o aborto em todos os casos.
A direita atual fica do lado dos jacobinos, e não de Aristóteles, Santo Agostinho ou Tomás de Aquino. No mínimo irônico, especialmente quando os liberais que aceitam a legalização do aborto com ressalvas são acusados por esta mesma direita de "jacobinos" (ou marxistas), de fazer o jogo da esquerda em prol da revolução cultural que irá destruir os valores da liberdade.
Falando nisso, resta então verificar um pouco as legislações sobre aborto nos diferentes países. Será que esta direita está certa em sua paranóia, e que a legalização parcial do aborto é o começo do fim das liberdades, pela total relativização da vida "humana"? Será que permitir o aborto em certos casos leva ao nazismo? Vejamos:
Em 1935,o aborto foi legalizado na Islândia, na Dinamarca em 1937, e na Suécia em 1938.
O aborto não é restringido pela lei canadense. Desde 1969 que a lei permite a prática de aborto em situações de risco à saúde, e, a partir de 1973, a interrupção voluntária da gravidez deixou de ser ilegal.
O aborto é legal, desde os anos 70, na esmagadora maioria dos estados [americanos], só não é legal no Dakota do Sul. É também legal quando a mulher invoca factores socioeconómicos.
Alemanha: O aborto é permitido até às doze semanas a pedido da mulher após aconselhamento médico, ou em consequência de violação ou outro crime sexual. É também permitido após as doze semanas por razões médicas que possui, segundo a lei alemã, uma definição lata, incluindo saúde mental e condições sociais adversas.
Áustria: O aborto é permitido até as doze semanas a pedido da mulher (lei de 1975). Permitida após as doze semanas em caso de perigo de vida, risco de malformação do feto, mulher menor de 14 anos.
Bélgica: O aborto é permitido até as doze semanas quando a gravidez coloca em risco a mulher, razões sociais ou económicas. Permitida após as doze semanas em caso de sério risco para a saúde.
Itália: O aborto é permitido até aos noventa dias (entre as doze e treze semanas) por razões sociais (incluindo as condições familiares e/ou as circunstâncias em que se realizou a concepção), médicas ou económicas: de facto, a pedido da mulher. Permitida em qualquer momento em caso de risco de morte ou saúde física ou mental da mulher, risco de malformação do feto, violação ou crime sexual.
O aborto na França é permitido até as doze semanas a pedido da mulher caso não tenha razões para ser mãe; razões sociais ou económias. É exigido o aconselhamento da mulher. Permitida após as 12 semanas em caso de risco de morte ou saúde física da mulher, risco de malformação do feto. É necessária a certificação de dois médicos da situação.
O aborto na Espanha é permitido até a 14ª semana de gestação e, até a 22ª, desde que a gestação possa comprometer a vida ou a saúde da gestante ou constatada malformação no feto, se certificada por dois médicos. Após esse período, o aborto fica condicionado, a partir de laudos de um painel de médicos, à anomalia fetal que signifique risco à vida ou quando o feto sofrer de doença grave e incurável.
O aborto é permitido em Portugal até às dez semanas de gestação a pedido da grávida.
O aborto é legal na Inglaterra, Escócia e País de Gales desde 1967.
Austrália: O aborto é permitido, desde 1977, até as vinte semanas de gravidez, e depois das vinte semanas, se prejudicar a saúde da mulher. A regulamentação requer que o aborto após as doze semanas de gestação têm que ser realizadas em “instituições licenciadas”, que são normalmente hospitais.
Como fica claro acima, a imensa maioria dos países ditos civilizados, desenvolvidos e com maior liberdade individual aceita o aborto em diversos casos. E em muitos casos há décadas! Isso apenas ilustra como o debate em nosso país é atrasado em vários aspectos, especialmente quando a religião se mete em demasia na vida dos outros. Ninguém vai virar ditadura comunista só porque aceitou que a mulher possa decidir manter ou não sua gestação, especialmente em casos delicados.[image error]
Published on April 27, 2012 17:47
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