Vital Moreira's Blog, page 25

May 5, 2024

Manifesto dos 50 (3): Contra a política do medo

1. Merece aplauso este oportuno artigo da Professora Maria de Lurdes Rodrigues - coautora do Manifesto dos 50 para a reforma da Justiça - contra o sentimento de medo inspirado pelos abusos do MP, que o processo disciplinar contra a magistrada Maria José Fernandes, por ter ousado criticar publicamente os abusos praricados, revela.

Com efeito, um dos traços do poder absoluto sem escrutínio externo é o silenciamento da crítica interna e o desterro de quem ouse divergir.

2. Mas não são somente os críticos internos que têm razão para ter medo, mas também os alvos preferidos do lawfare do MP: os titulares de cargos públicos, tendo a própria autora sido vítima da acusação do famigerado crime de prevaricação pelo Ministério Público quando foi Ministra da Educação, de que veio a ser judicialmente absolvida

Destaco esta passagem do referido artigo: 


«Hoje, quem ocupa cargos públicos tem medo de ser transformado em alvo do Ministério Público. E não vale aqui o popular ditado “quem não deve não teme”. Pelo contrário, o que retiramos da reiterada incapacidade de finalizar dezenas de processos com anos, ou de arquivamento ou prescrição [ou absolvição] de outros tantos, é que para temer não é preciso dever».

A receita é conhecida: uma denúncia oportuna de corrupção ou prevaricação, mesmo que patentemente malévola, uma manchete no Correio da Manhã soprada de dentro do MP, o imediato julgamento nas redes sociais, o arrastar da investigação por tempo indefinido, até ao arquivamento ou a absolvição judicial, epílogos quase sempre escassamente noticiados, quando o são, pela mesma imprensa que animou a sumária condenação pública sem defesa.

Ou seja, uma profunda subversão do Estado de direito constitucional (presunção de inocência, segredo de justiça, necessidade e proporcionalidade na restrição de direitos, julgamento em prazo razoável, etc.). Quando ninguém responde por estes abusos do MP, há de facto razão para ter medo.

AdendaNo seu célebre discurso de 1941 sobre as Four Freedoms - um dos mais inovadores textos da história dos direitos humanos -, o Presidente dos EUA, Roosevelt, incluiu a "freedom from fear" entre as principais garantias da liberdade individual. Eis um direito de que os titulares de cargos públicos não gozam entre nós.http://rpc.twingly.com/
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Published on May 05, 2024 07:41

May 4, 2024

Manifesto dos 50 (2): É bom ter estes adversários

Vinda de onde vem, a oposição ao nosso Manifesto sobre a reforma da justiça não só não surpreende como nos dá razão quanto às nossas propostas. 

De facto, o sindicato do Ministério Público tomou o poder na instituição, tornando-se o seu porta-voz, em substituição do Procurador-Geral, e defende com unhas e dentes os privilégios da corporação, nomeadamente a imunidade a qualquer escrutínio interno ou externo (salvo o seu); alguns jornais, tal como o Correio da Manhã (ver a manchete da sua edição de hoje), e jornalistas que "bebem do fino" junto de fontes do MP, fazem gala no "espetáculo mediático" a que nos referimos no Manifesto e não querem perder esse papel; e no seu pedestre populismo, o Chega acha que todos os políticos, salvo eles-mesmos, são corruptos e merecem ser julgados e condenados sumariamente na praça pública, por iniciativa sem controlo do MP.

É bom ter adversários destes. 

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Published on May 04, 2024 12:23

May 3, 2024

Manifesto dos 50 (1): Ineficiência do sistema judiciário

1. Pronunciando-se sobre o primeiro dos indicadores da crise de justiça enunciado no "Manifesto dos 50" (de que sou cossubscritor), que é a sua inaceitável morosidade, sobretudo na justiça administrativa e na investigação penal, a Ministra da Justiça, além de imputar as culpas para os governos precedentes - como se o problema não tivesse décadas! -, aduziu entre os fatores a falta de magistrados.

Mas não tem nenhuma razão. Se pode haver eventualmente défice de funcionários, tal não sucede com os magistrados, pelo contrário: comparativamente, estamos na média europeia quanto aos juízes e a acima dela quanto aos procuradores, como se pode ver aqui. O problema está noutras causas: deficiente gestão das magistraturas, falta de avaliação do seu desempenho, incluindo quanto ao seu output, e uma atitude predominante de laxismo, incluindo quanto ao cumprimento de prazos processuais. 

Em vez de aumentar desnecessariamente o número de magistrados, o Governo deveria começar, sim, por uma avaliação externa independente da eficiência do sistema judiciário.

2. O que surpreende também entre nós é a complacência com que a imprensa e a opinião pública encaram a falta de resposta da justiça. Enquanto os atrasos e as falhas no sistema de ensino ou no sistema de saúde são implacavelmente denunciados (e bem!) e podem levar à demissão dos respetivos responsáveis políticos, o mesmo não sucede com o sistema judiciário. Ora, a justiça não é um serviço público menos essencial do que aqueles para vida dos seus destinatários e da coletividade em geral. 

Por um lado, embora estatisticamente só uma minoria seja diretamente afetada pela justiça, ninguém pode dizer que "daquela água não beberei". Por outro lado, a justiça é fundamento essencial do Estado de direito, na garantia dos direitos privados, na punição penal, na justiça administrativa e constitucional. 

Decididamente, temos de ser coletivamente mais exigentes com a justiça.

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Published on May 03, 2024 07:26

May 2, 2024

Praça da República (80): "Manifesto pela reforma da justiça"

1. Sendo conhecidas as minhas profundas críticas à situação da justiça e em especial aos abusos do Ministério Público (a que ainda ontem voltei), não podia deixar de derrogar a minha já antiga posição de não entrar em abaixo-assinados ou petições coletivas, para subscrever este Manifesto dos 50 pela reforma da justiça, que acaba de vir a público (e que está disponível neste site aberto pelos seus autores), sendo subscrito por personalidades de variados perfis profissionais e de muito diferentes convicções políticas. 

A grande transversalidade social e política dos subscritores traduz a ampla radicação das suas preocupações na coletividade nacional.

2. Trata-se, antes de mais, de uma "pedrada no charco" para alertar a opinião pública e suscitar um "sobressalto cívico" sobre a profunda crise da justiça, cujos traços principais o Manifesto enuncia: inaceitável morosidade processual, falta de transparência e de escrutínio público do sistema judiciário, abusos recorrentes do Ministério Público na investigação penal, sobretudo contra agentes políticos, incluindo a violação das garantias constitucionais quando à restrição da liberdade individual e proporcionando bárbaros julgamentos públicos em substituição do julgamento judicial.

A crise da justiça redunda sempre numa crise do Estado de direito, que aquela deve rigorosamente servir.

3.  O Manifesto pretende ser, acima de tudo, uma proposta de profunda reforma da justiça, com um robusto conjunto de medidas, tão ambiciosas quanto é grave a crise a que pretende responder. É bom de ver esta "provocação" ao poder político e aos partidos políticos para encetarem uma tal reforma só pode chegar a bom termo e ultrapassar as inevitáveis resistências corporativas através de um "pacto de regime", nomeadamente entre os dois partidos de governo, PSD e PS.

É certo que os tempos de polarização política corrente não favorecem tal entendimento, que somente uma forte vontade política pode fazer vingar. Todavia, a noção de que esta reforma perde pela demora, agravando a crise da justiça, e que ela transcende os interesses partidários, tendo a ver com o bem comum da República, deveria prevalecer sobre os interesses imediatos da dialética entre o Governo e a oposição e os conflitos políticos conjunturais.


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Published on May 02, 2024 16:00

Um pouco mais de coerência sff (3): Abolição das portagens nas SCUT

1. Nunca deixei de manifestar-me, primeiro contra as autoestradas SCUT (por exemplo AQUI) e depois contra a redução ou abolição das portagens, uma vez instituídas. Por isso, não poderia apoiar o projeto do PS, aliás de acordo com o seu programa eleitoral, de tornar gratuitas algumas delas - que a seu tempo critiquei -, o qual, pelos vistos, vai ser aprovado, mercê do apoio do Chega, apesar da oposição do Governo.

O Governo PSD-CDS começa a pagar politicamente a sua situação ultraminoritária, como era de esperar. 

2. Porém, o que o Governo não pode fazer é vitimizar-se, acusando as oposições de "coligação negativa", muito menos de "conluiu" (que supõe um acordo), pela simples razão de o PSD ter feito o mesmo no ultimo Governo minoritário do PS, convergindo com a oposição de esquerda para aprovar várias medidas de aumento de despesa pública ou de redução da receita, incluindo a redução em várias SCUT no orçamento para 2021. 

Se o PS faz agora ao Governo PSD aquilo que não gostou que este fizesse ao Governo minoritário socialista, o PSD não pode agora queixar-se daquilo que ele próprio fez quando era oposição. Impõe-se um módico de coerência política a ambos os partidos de governo, que têm de viver com a fórmula de governo minoritário. 

AdendaUm leitor comenta: «Que triste figura fazem ambos na história das portagens.Diminuir, ainda vá, mas suprimir?O PS não deve ter pressa de derrubar o Governo», nem - acrescento eu -  dar-lhe pretexto para se demitir e abrir nova crise política, imputando ao PS a responsabilidade. É um risco a evitar.http://rpc.twingly.com/
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Published on May 02, 2024 09:28

Antologia do non-sense político (26): As forças armadas como penitenciária

Do blogue do ex-embaixador Seixas da Costa:

«A ideia de que o serviço militar poderia vir a ser uma tarefa para expiar delitos cometidos é tão absurda que se torna muito estranho que haja sido adiantada por alguém a quem cumpre promover [como ministro da Defesa] a dignidade das Forças Armadas no seio das instituições. Parem um segundo e pensem!»

Inteiramente de acordo! 

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Published on May 02, 2024 08:30

Como era de temer (5): O desaforo do MP

Passados quase 6-seis-6 meses de completo silêncio sobre a suspeita pública lançada, no âmbito do processo Influencer, contra o então PM, António Costa - levando à sua demissão e à subsequente crise política -, o MP veio agora fazer saber, através de "fonte ligada do processo", que «o agendamento da data para o efeito [para ouvir AC] só será feito em momento processualmente adequado, tendo em conta o calendário de diligências priorizado para a investigação».

Isto é demais! Primeiro, é gritante a obrigação de esclarecimento público sobre o processo, como hoje, mais uma vez, vem defender a Transparência Internacional em Portugal; segundo, quem devia dar o necessário esclarecimento público era a própria Procuradora-Geral, que foi quem, em 7 de novembro, anunciou publicamente a investigação contra Costa; terceiro, depois de o Tribunal da Relação de Lisboa, a propósito de outros suspeitos, ter reduzido a nada o processo Influencer, onde não viu nenhum crime, a única reação decente do MP - se a decência institucional ainda lá morasse - era o arquivamento do inquérito.

Ao anunciar que o inquérito se mantém e ao adiar sem prazo a audição do antigo PM, o MP confirma, sem margem para dúvidas, que o seu objetivo é mantê-lo indefinidamente como refém pessoal e político, indefeso perante o seu poder arbitrário e irresponsável.

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Published on May 02, 2024 07:54

April 30, 2024

O que outros pensam (7): "O pior Presidente de todos"

A opinião de J. M. Júdice:

«Agora, com pena o digo, não tenho qualquer dúvida que [Marcelo Rebelo de Sousa] vai ficar na História como o pior presidente de todos».

Como mostra a minha série aqui no Causa Nossa sobre "O que o Presidente não deve fazer" - que vai em quase 50 episódios -, tenho sido, desde o início, um crítico persistente, mas durante muito tempo desacompanhado, do (mau) desempenho presidencial de MRS e das suas posições impróprias da função presidencial. 
Agora que os críticos de MRS se multiplicam, mesmo entre aliados e amigos, e que a degradação da sua cotação pessoal assume foros de irrecuperável, é caso para dizer: "eu bem fui avisando!"http://rpc.twingly.com/
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Published on April 30, 2024 15:25

April 28, 2024

Não concordo (48): À justiça o que é da justiça

1. Apesar de ser muito crítico do lawfare antipolítico do Ministério Público e da sua ostensiva irresponsabilidade pública (por exemplo, AQUI), não penso que seja pertinente a proposta do presidente da AR, de "convidar" a PGR a ir explicar perante o parlamento o caso Influencer e o caso da Madeira, que levaram à demissão dos governos nacional e regional, respetivamente. 

Uma coisa é a sujeição da atividade geral do MP e da orientação do/a PGR ao escrutínio parlamentar, designadamente quanto à sua eficiência e quanto ao cumprimento das prioridades da política penal, em especial - o que lamentavelmente não tem acontecido -, outra coisa é uma interpelação parlamentar sobre processos concretos em curso de investigação pelo MP, cujo controlo externo deve manter-se reservado aos tribunais. É de ressalvar, porventura, o caso especial de inquéritos parlamentares. 

De resto, face à assumida irresponsabilidade da PGR - cuja demissão já defendi - quanto aos referidos inquéritos (cuja legalidade e pertinência ela própria deveria controlar internamente), não se vê que esclarecimento poderia resultar de tal audição parlamentar.

2. É certo que, pelo menos no caso Influencer - que os tribunais já arrasaram e que, portanto, já devia ter sido arquivado -, o MP instrumentalizou os seus poderes de investigação como arma de perseguição política, mas o parlamento não deve contribuir, pelo seu lado, para a lastimável politização da ação penal, que, de resto, os partidos podem condenar sem terem de "chamar a capítulo" a PGR.

Se o MP parece não se inibir em violar a necessária separação entre a esfera da justiça e a esfera política, a AR deve ser mais escrupulosa em observar tal separação.


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Published on April 28, 2024 15:05

Não concordo (47): À justiça o que é da justiça

1. Apesar de ser muito crítico do lawfare antipolítico do Ministério Público e da sua ostensiva irresponsabilidade pública (por exemplo, AQUI), não penso que seja pertinente a proposta do presidente da AR, de "convidar" a PGR a ir explicar perante o parlamento o caso Influencer e o caso da Madeira, que levaram à demissão dos governos nacional e regional, respetivamente. 

Uma coisa é a sujeição da atividade geral do MP e da orientação do/a PGR ao escrutínio parlamentar, designadamente quanto à sua eficência e quanto ao cumprimento das prioridades da política penal, em especial - o que lamentavelmente não tem acontecido -, outra coisa é uma interpelação parlamentar sobre processos concretos em curso de investigação pelo MP, cujo controlo externo deve manter-se reservado aos tribunais. É de ressalvar, porventura, o caso especial de inquéritos parlamentares. 

De resto, face à assumida irresponsabilidade da PGR - cuja demissão ja defendi - quanto aos referidos inquéritos (cuja legalidade e pertinência ela prória deveria controlar inbternamente), não se vê que esclarecimento poderia resultar de tal audição parlamentar.

2. É certo que, pelo menos no caso Influencer - que os tribunais já arrasaram e que, portanto, já devia ter sido arquivado -, o MP instumentalizou os seus poderes de investigação como arma de perseguição política, mas o parlamento não deve contribuir, pelo seu lado, para a lastimável politização da ação penal, que, de resto, os partidos podem condenar sem terem de "chamar a capítulo" a PGR.

Se o MP parece não se inibir em violar a necessária separação entre a esfera da justiça e a esfera política, a AR deve ser mais escrupulosa em observar tal separação.


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Published on April 28, 2024 15:05

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Vital Moreira
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