Pedro Guilherme Moreira's Blog, page 9
June 15, 2016
Vai passando Hannah
vai passando Hannah com a sua pele impoluta e nívea,vai parando Hannah, vai parando Hannah,
um carro contendo um rapaz jovem e bonito abranda no zebrado
para a deixar passar
Hannah está aparentemente velha
velha como os corpos que se preparam para estiar
desta vez o rapaz jovem e bonito repara em Hanna
e sucede na sua cabeça uma cena que raiaria o ridículo se se passasse
fora da sua cabeça
desliga o carro
sai do carro
intercepta Hannah a meio do percurso que a levaria
ao outro lado da rua
toma-lhe as mãos para ter a certeza
daquele olhar ancestral
que a contém toda
e todos
desde o princípio dos tempos
o adjectivo macilenta é muito usado para definir a pele de um velho
mas a pele de Hannah é impoluta e nívea
as rugas não definem ninguém e não definem Hannah
a rendição do olhar e do corpo sim
mas Hannah usa sempre os melhores vestidos para passar
que na primavera são estampados com a primavera
e quando se esquece do perfume é capaz de
fazer todo o caminho de volta só para
passar
Calha Kevin, assim se chama o jovem rapaz que intercepta Hannah
a meio do zebrado,
tomar as mãos dela em frente a um descampado que hoje funciona
como depósito de lixo e outrora
era o jardim dos amores
que rompiam a regra da soleira
e da vista dos pais
e ter sido nesse jardim que Joseph, o amor da vida dela
entre o final da guerra da Coreia
e a véspera do próprio funeral,
quando se despediu da vida com delírios românticos transformando
a desventura da morte no altar de uma vida e Hannah beijou o seu soldado
deitada ao lado dele na cama
como fizera naquela lixeira que fora jardim e dizendo
nunca mais partes para longe de mim sem eu te poder perder
perante o mundo
e foram de si próprios, ali mesmo, no jardim, no mais sublime
desespero atrás de uma faia centenária
que eles cortaram pelos pés para abrir
o aterro
é por isso que quando Hannah vai passando
o zebrado se vê sempre inteira e infinita
e é por isso que sucede na cabeça de Kevin
a cena ridícula
ele toma Hannah pelas mãos e já não há
cinquenta anos a separá-los
e beija-a na boca e os lábios
dela, só ligeiramente mais finos
do que no tempo da faia,
respondem sem pudor
Vai agora passando Hannah
do lado do aterro
e em fundo todas as tempestades
e venturas das mulheres elegantes
vai erguida e agradece
ao rapaz que parou
não segue imediatamente em frente
porque repara que para ele, desta vez,
como acontece quase sempre quando
cruza aquele zebrado, ela não está
transparente
mantém a classe do seu corpo delgado
no vestido estampado
o rímel e o lápis com o exagero certo
da sedução eterna
o perfume intenso, importante
para os abraços e para
passar
como se o corpo impoluto e níveo
se replicasse por todos
os lugares
em que passa Hannah
Vai passando Hannah e Kevin
sorri-lhe e Hannah
hesita
olha para trás, mas a faia
não está lá, Kevin
estica o braço e toma-lhe a mão
e todos os homens e mulheres esticam os braços e tomam as mãos deles
e retomam esta cena dos seus dias
o momento em que pararam e repararam
em Hannah ou em Kevin ou em Joseph
antes de morrer
nem a sedução nem o desejo
têm um tempo ou um corpo
evidente
nem Hannah engana os tempos
ou os corpo evidentes
só passa erguida
no vestido estampado e
o rímel e o lápis com o exagero certo
vai passando Hannah com a sua pele impoluta e nívea,
vai parando Hannah, vai parando Hannah,
um carro contendo o mundo inteiro abranda no zebrado
para a deixar passar
PG-M 2016
fonte da foto
Published on June 15, 2016 03:11
June 13, 2016
Os meninos e o livro do dia
há momentos do caraças. Provavelmente, quando o Carlos Nuno Granja escreveu no mural que um dos detalhes mais saborosos do sábado dele na Feira do Livro de Lisboa foi o facto de ouvir e ver que "A manhã do mundo" foi livro do dia, não sabia que me estava a activar uma multiplicidade de sentimentos (todos intensos); reflecti muito na alegria que senti por saber disso; não posso esconder que o facto "Feira do Livro de Lisboa" me traz sentimentos dissonantes que convergem num só sentimento consonante de gratidão aos leitores e aos pares; mas quando a FLL começa, todos os anos, vai para quatro anos, eu lembro-me da aflição em que andei para que ela não acabasse no Porto; lembro-me da chamada do rapaz Luís Miguel Rocha para nos unirmos a norte e levarmos à praça dos momentos mais bonitos das nossas vidas e das vidas dos leitores que lá estiveram na primeira semana, ainda sem imprensa e mediatismo; lembro-me quando o menino Luís me escreveu para fazermos um vídeo do Happy na FLL com os leitores e com os pares e depois, pianinho, às primeiras horas do dia, foi morrer; lembro-me de quando era um leitor pequenino que, pela mão do meu pai, percorria o parque com os olhos a brilhar e ficara apaixonado pelos escritores atrás de mesas, sozinhos, à espera dos leitores por ofício e honra; lembro-me de ter desejado estar sozinho atrás de uma mesa dessas e de ter cumprido esse sonho precisamente na penúltima feira do livro da Apel no Porto; pensei em colocar aqui a notícia de que "A manhã do mundo" tinha sido livro do dia no sábado, e isso quer dizer que o nome do livro foi propagado pelos altifalantes do parque através de uma voz bonita e que esteve em destaque nos pavilhões da minha editora; provavelmente já aconteceu outras vezes, mas esta foi a primeira em que soube, por aquele que é hoje um dos meus maiores amigos e que, nesse dia bonito do protesto dos escritores no Porto, se aproximou de mim com os olhos a brilhar tanto como os meus brilhavam pela mão do meu pai, e me pediu um autógrafo com uma humildade desconcertante; hoje é o responsável pela programação do festival literário mais livre e independente do país, o de Ovar (FLO); pensei vir dizer, com alegria de menino, precisamente, que o meu querido livro, um filho, como sabem, que eu adoro e cujas memórias em projecto me comovem sempre que o vejo, tinha voltado à vida ao sol de Lisboa, no último sábado; como se vê, porque hoje é segunda-feira, não o escrevi. Pensei noutras coisas, pensei em continuar sossegadinho e calado no meu canto, se me entendem; mas, caramba, como provinciano que sou, a emoção voltou hoje, logo pela manhã, e eu pensei que há tantas coisas nesta partilha que podem fazer bem aos outros - como estas pequenas memórias do menino Luís, que nos falta -, que não tenho direito de as guardar só para mim. E, no improvável acaso de a expressão da emoção me fazer bem só a mim, aqueles que me amam, mesmo com estranheza, vão sentir esse orgulho e esse arrepio por mim. Bom dia. A começar assim, só pode ser uma grande semana.
Published on June 13, 2016 03:04
June 7, 2016
Muguruza
Muguruza. Nova rainha de Roland Garros. Bateu a eterna Serena na final, há pouco. Desde que esta campeã espanhola bonita e elegante perdeu a final de Wimbledon, no ano passado, que a sua base de fãs alargou. Eu incluí-me logo entre eles, abandonando a minha favorita até ali, Kerber, que acabou por ganhar o Open da Austrália. Ah, talvez seja para vocês uma surpresa eu ser doido por ténis. Há poucas coisas que me dão mais prazer do que ver um jogo de ténis com os excelentes comentadores portugueses da Eurosport, e olhem que não é por haver identidade com o meu voleibol (são desportos muitíssimo diferentes, quase como a água do vinho - o futebol acaba por ter mais identidade com o voleibol do que o ténis) ou por saber jogar, porque não sei (joguei algum ténis de mesa, que também é muito diferente do ténis). Já gostava de ténis quando li o ensaio do Foster Wallace sobre o Federer, mas a partir daí passei a ver cada jogador como uma personagem romanesca. Muguruza, nascida na Venezuela, tem algo de branca-de-neve e rainha má ao mesmo tempo. É uma miúda, tem 22 anos, mas observar os atletas de excepção, mesmo os muito novos, traz sempre lições. É meu costume demitir-me de fã depois da glória dos meus ídolos, mas é muito cedo para debandar deste. Certo, o deslumbramento e o excesso de atenção depois de Wimbledon afundou-a por alguns meses e parecia que estávamos a perder aquela pancada violenta e assertiva para a linha de fundo, aquela raça espanhola, aquele sorriso permanente que não é um sorriso, mas uma cara de poker, e a forma como dedilha e acaricia a raquete gisando o próximo ponto ou controlando os momentos de euforia e decepção da mesma forma. E hoje, ao vencer o seu primeiro "major", Muguruza também começou o percurso da humildade. Foi claro, para quem quis ver, que ela só aceitou que tinha ganho quando já não havia hipótese de o sonho ruir ou os deuses confirmarem que tinha sido tudo mentira. Caiu no chão de costas muito depois de o árbitro confirmar que o último desenho, um grande arco, que fez passar sobre Serena como se lhe devotasse essa catedral, tinha caído dentro. Serena chorou como uma menina pequenina, falando em francês - que bonito foi ver isto em quem já ganhou tudo e agora só colecciona recordes - e a menina Muguruza aguentou a comoção como uma senhora. Que ela e a sua raça latina fiquem no topo por muito tempo. Porque Serena, essa, aterrará sempre de pé.
Published on June 07, 2016 11:59
May 27, 2016
O meu campeão
De anos a anos, o meu campeão tem de passar no blogue, até porque ele cresce e fica homem e quem lê apenas o blogue também merece saber - e ele, não sendo, é meu, como não sendo a minha vida toda, é tudo na minha vida - e ainda há o voleibol, que está acima de uma paixão para os dois. Em blogue, falo pouco ou quase nada da paixão absoluta que tenho pelo Voleibol, desporto que está há, praticamente, 60 anos na minha família, atravessou três gerações de internacionais e tem agora como intérpretes máximos os elementos da nova geração, Guilherme, 16, (o meu filho), Simão, 18, e António, 15 (sobrinhos). Esta é a oportunidade de deixar aqui algum lastro: um vídeo e algumas fotografias do rapaz que fez toda a sua formação no Clube Atlântico da Madalena e, no último ano, na selecção nacional, com quatro treinos diários por semana, projecto que ele abraçou com paixão naquele que é, provavelmente, o ano mais duro na escola - e tem trabalhado tanto e com tão bons resultados, escolares e desportivos, que é neste ponto que merece o destaque aqui. É uma excepção à regra, mas é um boa excepção. O meu Guilherme, pois, o 3 no clube e o 8 no último Europeu Wevza na selecção nacional de Sub17, que agora passa a Sub18, apresentado ao mundo. Em primeiro lugar, o vídeo:
Bilateral com Espanha Dezembro de 2014,começo do projecto da selecção nacional:
Partida para estágio
No estágio das selecções de praia, em Castro Verde, 2015
Já em Itália, com Joaquim Pacheco em fundo
Itália-Portugal, 24-07-2015 (aqui é o 8)
No início da época 2014-2015, ainda com 15 anos, Pavilhão Municipal Póvoa de Varzim
Fase Final Nacional Juvenis, 2016, Pavilhão 2 da Luz
Published on May 27, 2016 07:43
May 16, 2016
O segundo alpendre
Ao olhar os outros através do fumo da noiteestimo os que não olham para cá e temo
os que reparam na mancha do meu corpo curvado sobre o cigarro a tomar sentido de amanhã
deixem-me em paz, direi
deixa-me em paz, dirão
Vai um cigarro?
Não me levanto no alpendre. Não sorrio.
Inclino a cabeça atrás de outra baforada. A vénia.
E a semana entra de laço
com estranhos
PG-M 2016
fonte da foto
Published on May 16, 2016 09:07
May 14, 2016
para ser poeta
para eu ser poeta para os poetas
podia dissolver a pele
na rua
deixar o sangue em vez das casas
o cheiro em vez
dos carros
mas eu sou só poeta
para ti
e a poesia é a linha de luz
do teu corpo
ou o sábado de
manhã ou
o escritório vazio
e nós aqui
PG-M 20016
fonte da foto
Published on May 14, 2016 06:06
Sábado-madrugada
meu amor, o dia nasce
os galos replicando a aurora
o derrame das ursas nos quintais celestes
copiam breves pautas pequenos pássaros em vastas copas de pomar
e há um só risco de luz no fundo dos olhos, primeiro de maio, depois de ti,
que de mim nasces numa volta da cama
os lençóis quentes puxados para cima dos ombros, bom dia,
que horas são?, é cedo, dorme,
voltam-se os corpos no espaço sideral
e o dia nasce e a revolução está feita
nós não
nós ainda não
ainda se dorme dentro da casa
PG-M 2016
fonte da foto de Vin Scott
Published on May 14, 2016 05:58
April 27, 2016
(o apuro das estações) da instalação da primavera
reparei a descer um caminho de barro entre campos que os animaispresos a um ponto fixo para pastar entregam todos
ao fim do dia um círculo perfeito
que subtraem ao campo
e pus-me a pensar que aqueles círculos que se vêem do espaço
podem não ter sido obra de civilizações extra-terrestres,
mas apenas de civilizações atadas a pontos fixos
sem liberdade a entregar círculos perfeitos
depois do almoço
e, para não me parecer tanto com o Eme Tavares,
tenho forçosamente de escrever que não foi só nisto que
reparei durante a instalação tardia
da primavera
embora eu tenha a certeza de que, se estivesse frio e chuva e mar
alteroso, não teria reparado nos animais a pastar,
eram cavalos, póneis, burros, um bode e
eu, sigam em frente, não há metáforas
aqui
eu próprio, com o dano do corpo e da vida na praia,
tinha marcado o início da primavera para domingo,
mas só desci o caminho a pé quando fui trabalhar,
agora eu vou trabalhar a pé todos os dias,
os sapatos ficam cheios de pó, os olhos
não, o povo estranha que o advogado
saia calçado e de pasta e passo,
quando o mundo anda todo descalço e de telefone
móvel nas patas e a correr, mesmo parados
dentro de carros ou de cabines
telefónicas que já não existem
a chorar
buzina-se menos nos invernos modernos
estar parado é bom, podemos ver os mails,
os likes, as declarações
amigáveis, sorrimos ao dia todo
sozinhos, temos saudades
de um olhar, talvez do
nosso próprio olhar, e depois,
nos funerais, fixamos o chão por
respeito, suplicamos o céu por
agonia
e a vida esvazia por
desventura
foi aflitivo descer o caminho de barro sem saber
nem querer saber
o nome das flores
e eu peço desculpa por não ser importante
de facto,
só abri este poema para fixar
os círculos perfeitos dos
seres imperfeitos
e explicar um detalhe da primavera:
à hora do almoço, porque o vento é
liso e o resto do silêncio quente,
já se ouvem os gritos abafados
dos miúdos no recreio da escola,
como os ouço da varanda sobre a praia
antes das sestas de verão
e essa inocência abafada e longínqua
é toda a primavera que há
em mim
PG-M 2016
Published on April 27, 2016 06:53
April 11, 2016
este atraso da primavera
não me lembro de uma primavera tão atrasada a norte, já fui a sule vi-a lá curvada a pedir alimento, porém nas caixas
torácicas das mulheres e dos homens do norte
não está
não é tanto
o frio ou a chuva ou até
a temperatura, mas o
elemento; eu vivo
junto ao mar e pelo menos esse sinal,
de o mar continuar nervoso e agitado mesmo
em dias exultantes,
basta. o sol
não faz o verão,
a chuva não tem no corpo
o inverno e o corpo
não sobrevive sem
outonos
é uma operação matemática basilar dizer
que a primavera é o outono do inverno
e que o verão é o outono da primavera
e que o outono somos
nós
também já sabemos das nossas aulas de álgebra
que o algoritmo do amor perverte as estações
seria forçar o poema dizer que a primavera está atrasada porque toda a gente
vive com máquinas na mão e sob iluminação artificial entre a casa onde o
medo tem pausas e o carro onde transita entre estados de raiva e o trabalho
onde por vezes mirra, porque isso é assim de norte a sul e a primavera
só se atrasou a norte
é verdade que desligar tudo menos os olhos e os pêlos dos braços e
caminhar na rua faz sempre com que a essência do outono que somos
perverta as mesmas estações que o amor, porque o amor e o elemento
são o chão dos homens e das mulheres todas, mesmo dos frios
como invernos polares ou abrasadores como verões
tropicais
(estar no feminino o plural
de homens e mulheres não foi
lapso, mas porque chove a
intenção não apressa a
primavera)
este atraso da primavera, contudo,
mudar-me-á menos como pessoa
do que continuar a ler Sebald
e caminhar nas ruas com
o telemóvel desligado
é mais estranha a sensação de, trinta anos depois,
ter a mesma música como primeira da playlist,
cuja repetição envolvia, não um toque, mas a operação de
fast rewind e play, fast rewind e play, fast rewind e play,
ou voltar a um jogo oficial de voleibol
antes escrevesse um livro sem ninguém
onde em silêncio a escutasse chegar
e dissesse aos homens e mulheres
todas
que estar encerrado num beijo
é o agasalho certo
os lábios ligeiramente secos a mostrar a solidão
as línguas com o tempero da espera
as salivas mornas do adeus do
ano passado e depois os
círculos e semi-círculos
as elipses e as tangentes
dos beijos bem dados
e o tempo, o tempo longo,
o cheiro como as magnólias
a abdicar das folhas
pode já ser verão quando as bocas
descolarem
há abraços, sim, mas nem todos
com a consistência certa
os beijos não mentem
o mar também não
o vento às vezes
Sebald nunca
e a primavera a norte só se atrasa
de vez em quando
PG-M 2016
fonte da foto
Published on April 11, 2016 08:44
April 10, 2016
Frey e a memória daquele verão
Não é que me importe que a morte do Glenn Frey - não apenas o guitarrista dos Eagles, como vi por aí dito e escrito, mas um dos génios de um grupo genial, como são os Eagles - tenha ocorrido quase à sombra do silêncio, até porque não condeno o barulho que hoje se faz quando um grande - como David Bowie - morre. É assim mesmo, estamos no tempo em que todos nos podemos expressar e ser visíveis publicamente e, desde que não pensemos que o que dizemos é mais importante do que diz o vizinho do lado, desde que não disputemos o nosso protagonismo nem sejamos frívolos, acho muito bem que os grande se celebrem, forte e feio, à partida, já que raramente o são à chegada. Mas, dizia, não me importo que a morte do Glenn Frey tenha ocorrido quase em silêncio. Sou egoísta. Parece quase íntimo. Pois se o cultivo assim mesmo há tantos anos, porque haveria de morrer em histeria? Entre as muitas composições brilhantes de que foi autor, instrumentista e vocalista nos Eagles, devem achar estranho que anexe a esta celebração uma música menor, como Sexy Girl. Eu até concordo que é uma música sem uma qualidade supimpa, mas acontece que, se eu tivesse de me despedir do Glenn Frey, esta seria a banda sonora. Lembro-me perfeitamente: Corria o ano de 1985, eu estava na sala grande da casa dos meus pais, onde tínhamos uma aparelhagem de qualidade que eu estava proibido de utilizar, mas que utilizava todos os dias, desde que o meu pai não estivesse em casa. Às 14h, hora em que o Adelino Gonçalves arrancava com o power play da "Discoteca", na Rádio Comercial, eu estava sempre a postos com os dedos no pause do leitor de cassetes. Quando o Adelino se calava, soltava o botão e gravava. Eram cassetes e cassetes assim, com "misturas" quase psicadélicas. Imaginem então um dia de Verão na casa da praia de Francelos, a janela da sala aberta para o ar quente da rua onde, a cerca de cem metros, víamos deliciados passar as raparigas com as saídas de praia e as seiras com tolhas, cremes e lanches. Nesse preciso momento, as primas da Rua da Alegria, três belíssimas mulheres - uma com quase um metro e oitenta, uma com isso, outra com mais do que isso - acenam da rua e o Adelino Gonçalves fala da carreira a solo do Glenn Frey e da grande música do verão que naquele dia tinha a sua estreia na Comercial: e arranca o Sexy Girl. Não sei porque é que sempre a liguei mais à Cristina, que das três primas era a do meio. Talvez porque no meio esteja a virtude. E à notícia da morte do Glenn Frey, foi, claro, o sexy girl que ouvi na minha cabeça. She moved in next door to me, and she showed me the world. Então até já, Glenn. Para nos vingarmos, não está mal cultivar o irmão de Eagles, Don Henley, que lançou em 2015 um grandíssimo álbum: ouçam o "No, Thank You" e digam-me alguma coisa. Até lá, you are all sexy girls. PG-M 2016fonte da foto
Published on April 10, 2016 05:00


