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O pequeno não sabia que o pai estava ali. Talvez o inocente nem soubesse que tinha um pai. Este se conservava escondido detrás de uma coluna para que não o vissem. Olhava o filho e chorava. Esse pobre homem adorava o pequeno!
Tinha um sogro, uma tia rica, parentes, não sei quem mais, que o ameaçavam de deserdar a criança se ele, o pai, fosse visitá-la. Sacrificou-se para que o filho fosse rico e feliz.
Só porque um homem esteve em Waterloo não é, por isso, um monstro; esse não é um motivo para separar um pai de seu filho.
Ah! o senhor é o menino! Realmente agora já deve ser um homem. Pois bem! meu filho, pode estar certo de que tem um pai que o amou muito.
Marius conseguiu conhecer completamente aquele raro homem, sublime e manso, espécie de leão-cordeiro, que havia sido o seu pai.
Com efeito, era paixão. Marius estava quase prestes a adorar o próprio pai.
A história que acabara de conhecer o espantava. A primeira impressão foi de deslumbramento.
a República, na soberania do direito cívico restituída às massas, o Império, na soberania do ideal francês imposto à Europa; viu surgir da Revolução a grande figura do povo, e do Império a grande figura da França.
Marius percebeu, então, que até aquele instante não havia compreendido a própria pátria, como não havia compreendido o próprio pai. Não havia conhecido nem um nem outro; seus olhos estavam mergulhados numa espécie de noite voluntária. Agora, sim, via tudo claro; e, se por um lado sentia admiração, pelo outro sentia adoração.
A cada instante, novos brilhos da verdade vinham iluminar-lhe a razão. Operava-se nele como que um crescimento interior. Ele sentia uma espécie de exaltação natural, provocada por estas duas coisas novas para ele: seu pai e sua pátria.
Por outra consequência natural, à medida que se aproximava do pai, de sua memória e das coisas pelas quais o Coronel havia combatido durante vinte e cinco anos, afastava-se do avô. Como já dissemos em outro lugar, o caráter do Sr. Gillenormand não lhe agradava. Já existiam entre eles todas as dissonâncias naturais entre um jovem sério e um velho frívolo.
Não ver as pessoas permite-nos supor nelas todas as perfeições.
Era mais do que o velho Gillenormand podia ouvir. À palavra república, levantou-se, como se fosse impelido por uma mola.
Um Barão como o senhorzinho e um burguês como eu não podem ficar debaixo do mesmo teto. E, de repente, levantando-se, pálido, trêmulo, terrível, a fronte alargada pelos terríveis raios da cólera, estendeu o braço na direção de Marius e gritou: — Vá-se embora! Marius deixou a casa. No dia seguinte, o Sr. Gillenormand disse à filha: — Mandai cada seis meses sessenta luíses de ouro para esse bebedor de sangue, e não me faleis mais dele.
Convenção
Queria que a sociedade trabalhasse sem esmorecer para a elevação do nível intelectual e moral, a propagação da ciência, a divulgação das ideias, o desenvolvimento do espírito dos jovens, e temia que a atual pobreza dos métodos, a miséria do ponto de vista literário, limitado a dois ou três séculos tidos como clássicos, o dogmatismo tirânico dos pedantes oficiais, os preconceitos escolásticos e a rotina acabassem por fazer de nossos colégios viveiros artificiais para ostras.
Fazia parte dos que pensam que a ciência acabaria por contornar os acontecimentos.
Quero esquecer a vida. A vida é a invenção hedionda de não sei quem. Não dura nada e não vale nada, e todos se esforçam por viver. A vida é um cenário com poucas saídas. A felicidade é uma moldura velha pintada de um só lado. O Eclesiastes diz: Tudo é vaidade,
— 18 de junho de 1815: Waterloo.
Essa tarde causou em Marius um profundo abalo e uma triste penumbra em sua alma. Sentiu, talvez, o que sente a terra no momento em que a abrem com a enxada para nela depositar o grão de trigo; ela sente apenas o golpe; o estremecimento da semente e a alegria dos frutos só vêm mais tarde.
Nas pequenas lutas, fazem-se grandes ações.
Querendo vestir sempre o luto, vestia-se da noite.
Submeteu-se a todas as privações, fez de tudo, mas não contraiu dívidas. Tinha a consciência de não dever um vintém a ninguém. Para ele, uma dívida era o começo da escravidão. Convenceu-se mesmo de que um credor é pior do que um senhor, pois o senhor só pode possuir a pessoa, e um credor tem em suas mãos a sua dignidade, podendo, se quiser, danificá-la. Preferia não comer a pedir emprestado.
não era justo que o pai tivesse sofrido sozinho e ele nada; afinal, que eram seus sofrimentos e privações, comparados à vida heroica do Coronel?
O jovem pobre sacrifica-se para conseguir um pedaço de pão; come, e, depois de haver comido, só lhe resta sonhar. Frequenta os espetáculos grátis que Deus lhe proporciona; contempla o céu, o espaço, os astros, as flores, as crianças, a humanidade em meio à qual sofre, a criação em meio à qual brilha.
Um admirável sentimento então se manifesta nele: esquece-se de si próprio e se compadece dos outros. Pensando nos prazeres sem-número que a natureza oferece, dá e prodigaliza às almas abertas e recusa às almas egoístas; ele, o milionário da inteligência, chega a se compadecer dos milionários do dinheiro.
enquanto suas mãos ganham o pão, sua espinha dorsal ganha altivez, seu cérebro ganha ideias. Terminado o trabalho, volta aos êxtases inefáveis, à contemplação, à alegria; ele vive com os pés nas aflições, nos obstáculos, na pedra dura, nos espinhos, às vezes até na lama; mas a cabeça está sempre cercada de luz.
entregar-se o menos possível ao trabalho material, para dedicar-se o mais possível ao trabalho impalpável; em outros termos, conceder algumas horas à vida real e lançar o resto ao infinito.
Fouché respondia: — Aonde você quiser, imbecil!
Em primeiro lugar, o povo não quer saber da sua república; não quer porque tem bom senso, e sabe que sempre houve reis, que sempre haverá reis, e reconhece que povo não passa de povo, e se ri de sua república, está ouvindo, cretino!
Hernani?
Não leia tantos livros; olhe também um pouco para as meninas. Também elas têm coisas boas. À força de tanto fugir, você acaba por se embrutecer.
Marius tomara maquinalmente o hábito de passear por ali e os encontrava sempre, invariavelmente.
tinha-se idealizado. Como três dias de abril bastam para que certas árvores se cubram de flores, seis meses lhe foram suficientes para revesti-la de beleza. Seu abril havia chegado.
Esse primeiro olhar de uma alma que ainda não se conhece é como a aurora no céu! É o despertar de algo brilhante e desconhecido.
É muito raro que esse olhar não provoque, onde cai, um mundo de sonhos. Toda a pureza, toda a candura se reúnem nesse raio celeste e fatal, que, mais do que os olhares experimentados das coquetes, tem o poder de fazer desabrochar subitamente na alma essa flor sombria, cheia de perfumes e de venenos, chamada amor.
Evite os excessos. Meu filho, conserve-se a igual distância do despotismo e da anarquia.
Havia naqueles passos algo de ataque e, sem dúvida, um desejo de conquista. Por isso digo: marchou sobre o banco, como se dissesse: Aníbal marchou sobre Roma.
Tudo estava consumado. Marius amava uma mulher. Seu destino caminhava para o desconhecido.
Da fase de timidez passou, progresso natural, à fase da cegueira.
Há uma coisa bem mais triste que ver uma criança morta; é vê-la viver mal.
quem só viu a miséria do homem nada viu; é preciso ver a miséria da mulher; quem só viu a miséria da mulher nada viu; é preciso ver ainda a miséria da criança.
há um ponto em que os infortunados e os infames se misturam e se confundem numa só palavra, fatal palavra: são os miseráveis.
Segundo esses políticos, muito engenhosos para pôr nas ficções proveitosas a máscara da necessidade, a primeira necessidade de um povo depois de uma revolução, quando esse povo faz parte de um continente monárquico, é encontrar uma dinastia. Desse modo, dizem eles, pode-se ter paz depois da revolução, isto é, tempo para curar as feridas e reconstruir as casas. A dinastia esconde o cadafalso e encobre os hospitais militares.
A rigor, o primeiro homem de gênio, até mesmo o primeiro homem de dinheiro que apareça, basta para se fazer um rei.
Eis, portanto, a grande arte: dar ao sucesso o som de uma catástrofe, a fim de que os próprios vencedores o temam, encher de medo os acontecimentos, aumentar a curva da transição até o afrouxamento do progresso, tirar a beleza dessa aurora, denunciar e cercear as asperezas do entusiasmo, aparar os ângulos e as unhas, diminuir o triunfo, camuflar o direito, envolver o povo gigante em flanelas e mandá-lo dormir imediatamente, impor dieta a esse excesso de saúde, tratar Hércules como um convalescente, diluir os acontecimentos com expedientes, oferecer aos espíritos entusiasmados pelo ideal esse
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A burguesia é simplesmente a porção contente de um povo. O burguês é o homem que arranjou tempo para se sentar. Uma cadeira não é uma casta. Mas, por querer sentar-se cedo demais, pode-se deter a própria marcha do gênero humano. Essa é a falta mais frequente da burguesia.
Os 221 transformaram Luís Filipe em Rei. Lafayette encarregou-se da sagração.
Luís Filipe foi empossado da autoridade real sem violência, sem ação direta de sua parte, como efeito de uma reviravolta revolucionária, evidentemente diverso do verdadeiro intuito da revolução na qual ele, Duque de Orléans, não teve nenhuma iniciativa pessoal. Nasceu Príncipe e julgava-se eleito Rei. Não dera a si próprio esse mandato, tampouco o tomara; lho ofereceram e ele o aceitou, convencido, erroneamente mas convencido, de que a oferta era segundo o direito e que a aceitação era segundo o dever.
Todos os problemas que os socialistas se propunham, as visões cosmogônicas, separados de qualquer misticismo ou utopia, podem ser reduzidos a dois problemas principais. Primeiro problema: Produzir a riqueza. Segundo problema: Distribuí-la.

