Os Miseráveis
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Read between December 18, 2023 - February 14, 2024
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Ter feito tudo o que fizera para chegar àquele ponto! Para não ser ninguém!
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As estatísticas constatam que a mortalidade entre as crianças abandonadas é de cinquenta e cinco por cento.
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E o desespero é a última alma que, às vezes, consegue a vitória, já o afirmava Virgílio.
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Não terminou o verso. Uma segunda bala o interrompeu. Dessa vez, caiu de bruços e não se moveu mais. Sua pequena grande alma acabava de levantar voo.
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Aquelas pobres criaturas pertenciam agora à estatística das “crianças abandonadas” que a polícia constata, prende, assusta e torna a encontrar nas ruas de Paris.
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A primavera é um paraíso provisório; o sol ajuda a acalmar o homem. Há criaturas que não desejam mais do que isso; criaturas que, vendo o céu azul, dizem: — É o bastante!
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Pode-se ser imortal e coxo;
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Pode-se ser mais homem e menos homem. A natureza está cheia de coisas incompletas. Quem sabe se o sol não é cego?
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Comiam-se mais ou menos uns aos outros, mistério do mal misturado ao bem; mas nenhum animal ficava de estômago vazio. Os dois garotos abandonados haviam chegado perto do grande lago, um pouco perturbados por toda aquela luz, e procuravam esconder-se, instinto do pobre e do fraco diante da magnificência, mesmo impessoal, e se esconderam atrás da casinha dos cisnes.
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Seja humano. É preciso ter pena dos animais.
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Gavroche
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Talvez Deus tenha morrido — dizia um dia a quem escreve estas linhas Gérard de Nerval, confundindo o progresso com Deus e tomando a interrupção do movimento pela morte do Ser.217
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O ideal nada mais é que o ponto culminante da lógica, do mesmo modo que o belo não é nada mais que o ápice da verdade.
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O livro que o leitor tem sob os olhos neste momento é, do princípio ao fim, no seu conjunto e nos seus pormenores, sejam quais forem as intermitências, as exceções ou os desfalecimentos, a marcha do mal para o bem, do injusto para o justo, do falso para o verdadeiro, da noite para o dia, do apetite para a consciência, da podridão para a vida, da bestialidade para o dever, do inferno para o céu, do nada para Deus. Ponto de partida: a matéria; ponto de chegada: a alma. Hidra no princípio, anjo no fim.
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Polonceau,
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A velha monarquia não construiu senão vinte e três mil e trezentos metros de esgoto; assim estava Paris em janeiro de 1806. A partir dessa época, de que tornaremos a falar em seguida, a obra foi útil e energicamente retomada e continuada; Napoleão construiu, essas cifras são curiosas, quatro mil oitocentos e quatro metros; Luís XVIII, cinco mil setecentos e nove; Carlos X, dez mil oitocentos e trinta e seis; Luís Filipe, oitenta e nove mil e vinte; a República de 1848, vinte e três mil trezentos e oitenta e um; o regime atual, setenta mil e quinhentos; total, hoje, duzentos e vinte e seis mil ...more
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Dever a vida a um malfeitor, aceitar essa dívida e reembolsá-lo; estar, a despeito de si mesmo, no mesmo nível de um foragido da polícia e pagar-lhe um favor com outro; deixar que lhe dissessem: — Vá-se embora —, e dizer-lhe, por sua vez: — Está livre —; sacrificar por motivos pessoais o dever, obrigação de todos, e sentir nesses motivos pessoais também uma obrigação, talvez até superior; trair a sociedade para continuar fiel à própria consciência; que todos esses absurdos acontecessem e viessem acumular-se sobre ele era o que o assustava.
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Que fazer agora? Entregar Jean Valjean não era justo; deixá-lo livre também não era justo. No primeiro caso, o agente da autoridade caía mais baixo que o grilheta; no segundo caso, um forçado subia mais alto que a lei e a pisava.
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Pensar, sobre qualquer assunto fora do círculo estreito de suas funções, seria para ele, em qualquer caso, uma inutilidade e uma fadiga; mas o pensamento sobre o dia que acabava de passar era uma tortura. Contudo, julgava imprescindível olhar para a própria consciência, depois de tantos abalos, e dar-se conta de si para si mesmo.
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No mundo pode haver algo mais que tribunais, sentenças executórias, polícia, autoridade? Javert estava transtornado.
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Jean Valjean o desconcertava. Todos os axiomas que haviam constituído os pontos de apoio de sua vida desmoronavam-se diante desse homem. A generosidade de Jean Valjean para com ele, Javert, esmagava-o.
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Javert percebia que sua alma se via tomada por um sentimento horrível: a admiração por um forçado. O respeito por um grilheta; seria isso possível? Tremia, e não conseguia subtrair-se a essa admiração. Debatia-se, mas via-se a confessar em seu foro interior a sublimidade daquele miserável. Isso era odioso.
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Um criminoso magnânimo, um forçado compassivo, afável, caridoso, clemente, pagando o mal com o bem, dando perdão em troca de ódio, preferindo a piedade à vingança, achando melhor perder-se que perder o próprio inimigo, salvando quem o ferira, ajoelhado nos píncaros da virtude, mais vizinho do anjo que do homem. Javert via-se constrangido a acreditar que esse monstro existia. Isso não podia continuar assim.
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Todo um mundo novo se revelava à sua alma: o benefício recebido e retribuído, o devotamento, a misericórdia, a indulgência, as violências feitas pela piedade à austeridade, a acepção de pessoas, nada de condenações definitivas, nada de danação, a possibilidade de uma lágrima nos olhos da lei, certa justiça de acordo com Deus, caminhando em sentido inverso da justiça dos homens.
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Via-se obrigado a reconhecer a existência da bondade. Aquele grilheta tinha sido bom.
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O ideal para Javert não consistia em ser humano, em ser grande, em ser sublime; consistia em ser irrepreensível.
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esse grilheta, esse desesperado, que eu persegui sem descanso, que me teve sob os pés, que podia se vingar, que devia vingar-se, tanto para satisfazer seu ódio como para se pôr em segurança, concedendo-me a vida, o que fez? O seu dever? Não. Algo mais. E eu, perdoando-o, o que fiz? O meu dever? Não. Fiz algo mais. Existe então alguma coisa acima do dever?
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Esse novo chefe, Deus, percebeu-o inopinadamente, e ficava perturbado diante dele.
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Mas como fazer para apresentar sua demissão a Deus?
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Ser granito e duvidar! Ser a estátua do Castigo, fundida numa só peça nos moldes da lei, e perceber subitamente que se tem sob um peito de bronze uma coisa absurda e desobediente que se assemelha quase a um coração!
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Como tudo o que existe é Carnaval, não há mais Carnaval.
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Paris é a grande cidade da loucura, todas as vezes que não é a grande cidade sublime. Seu Carnaval faz parte de sua política. Paris, confessemo-lo, assiste gostosamente à comédia que lhe representa a infâmia.
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De que modo Jean Valjean iria comportar-se em relação à felicidade de Cosette e de Marius? Essa felicidade havia sido desejada e construída por ele próprio; ele mesmo a cravara nas entranhas, e, àquela hora, olhando-a, podia ter a estranha satisfação de um armeiro que reconhecesse a marca da própria fábrica num punhal ao retirá-lo ainda quente do peito. Cosette possuía Marius, Marius possuía Cosette. Eles tinham tudo, até riqueza. E tudo era obra sua.
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Participaria do destino de Cosette e de Marius? Tornaria ainda mais espessa a sombra da própria fronte e a nuvem que pairava sobre o jovem casal?
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O passado voltava-lhe diante do presente; ele comparava e soluçava. Uma vez abertas as comportas das lágrimas, o desesperado contorceu-se. Sentia-se preso.
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Que era o caso Champmathieu em confronto com o casamento de Cosette e o que dele poderia originar-se? Que era isto: voltar para as galés, em confronto com isto: voltar para o nada?
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Impor correntes de grilheta àquelas duas encantadoras crianças, ou abismar-se sozinho irremediavelmente. De um lado, o sacrifício de Cosette; de outro lado, o sacrifício de si mesmo.
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Por que motivo, aliás, um forçado chega e diz: — Eu sou um forçado? — Pois bem: o motivo é estranho. É por honestidade. Minha desgraça é um fio que tenho no coração e que me mantém preso. É sobretudo quando se é velho que esses fios se tornam mais sólidos.
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Eu não pertenço a nenhuma família. Não pertenço à sua, tampouco à família dos homens. Nas casas em que se vive em intimidade, eu sou demais. Há famílias, não porém para mim. Sou um desgraçado, fora de tudo. Tive pai e mãe? Quase chego a duvidar.
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Enquanto foi para o bem de Cosette, fui capaz de mentir; agora seria por mim, e não devo fazê-lo. Bastaria calar-me, é verdade, e tudo continuaria bem. O senhor quer saber o que me força a falar? Uma bobagem: a minha consciência.
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Champmathieu,
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Se eu continuasse sendo o Sr. Fauchelevent, tudo iria às mil maravilhas. Tudo, exceto minha alma. Haveria alegria por toda parte, porém o fundo de minha alma permaneceria às escuras.
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na presença de tanta felicidade eu seria um enigma, em meio a tanta luz eu seria trevas; assim, sem dizer “cuidado”, simplesmente, eu introduziria as galés no seu lar, eu me sentaria à sua mesa, certo de que, se soubessem quem eu sou, seria expulso; deixar-me-ia servir por criados que, se me conhecessem, diriam: — Que horror!
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Assim, eu, um morto, impor-me-ei a criaturas vivas, condenando-as a viver ligadas a mim por toda a vida.
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Acabo de ouvir através da porta meu pai Fauchelevent dizendo: — A consciência… Fazer seu dever…
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que a lareira do quarto de meu pai Fauchelevent
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Agora que o senhor sabe, julga o senhor, que é o dono da casa, que eu não deva mais ver Cosette? — Creio que seria melhor — respondeu Marius, friamente. — Eu não a verei mais — murmurou Jean Valjean.
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Um nome falso significa segurança; e ele havia rejeitado esse nome. Ele, um grilheta, poderia esconder-se para sempre no seio de uma família honesta; no entanto, resistira a essa tentação. E por qual motivo? Por escrúpulo de consciência.
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Agora havia Marius para tomar as funções da Providência ao lado de Cosette. Cosette viera encontrar novamente no céu azul o seu semelhante, o amante, o esposo, o macho celeste. Ao voar, Cosette, alada e transfigurada, deixava para trás, na terra, vazia e feia, sua crisálida, Jean Valjean.
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tratava-se de um forçado; isto é, de um ser que, na escala social, nem tem lugar, ficando abaixo do último degrau.