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Kindle Notes & Highlights
by
Karina Heid
Charlotte sempre tivera, como o castelo, seus nichos escondidos, protegidos por aparatos elaborados à prova de intrusos. O Conde descobriu todas as formas de entrar, fazendo do coração dela sua morada.
— Bem, essa moça tem um problema sério e de difícil solução. Ela ama um cavalheiro avesso a relacionamentos.
— Estão por toda parte — a Condessa de Hagen adicionou aborrecida, como se homens avessos a relacionamentos fossem algum tipo de praga.
Querem ser as enfermeiras de seus pares. Tudo que conseguem, ao final, são corações partidos.
o amor nem sempre redime um homem.
Nunca mais tocaria outra mulher, porque só sabia querê-la, e nada mais.
Charlotte entendia o tamanho de sua devoção? Não parecia certo chamar de amor. Uma palavra de quatro letras era muito pequena para caber tanta coisa. Era louco por ela. Insano. Não parecia haver palavras que dessem sentido ao que explodia no peito.
— Hora de me escutar, Mondschein. — Sou toda ouvidos. Ele beijou sua testa, orelha e nariz, chegando à boca outra vez, sussurrando as palavras dentro dela: — Não só ouvidos. Você é toda minha.
Entrei como sócio minoritário em um empreendimento pouco ortodoxo, e mais tarde assumi o controle inteiro do negócio. — Está me deixando curiosa, Theodor. — O clube é meu, Charlotte. Sou o dono do Lust.
— O clube é uma fonte inesgotável de lucro — ele continuou. — Como você bem sabe, romances vendem. Os proibidos, um pouco mais.
O Rei fazia vistas grossas para o estabelecimento. Ele mesmo esteve nas dependências do clube uma ou duas vezes nas nossas noites. — Com mulheres? Theodor coçou a cabeça, indeciso sobre o que diria. Por fim, negou com um movimento de cabeça. Não com mulheres.
— Eu fui enfeitiçado pela mulher mais complicada do reino. A única a infringir mais leis do que eu.
Serei um homem bastante desonrado caso um dia me descubram. A mulher que estiver ao meu lado terá seu nome jogado na lama. Sou uma cilada. Um problema de proporções nacionais. Entretanto, amo-a do fundo do coração, e acho que lhe devo a verdade.
Se for louca, aceitará meu pedido e se tornará a Condessa de Urach, mesmo sabendo que o marido trabalha na ilegalidade.
Eu sempre a quis, meu amor. Sempre.
Axel realmente não tinha conseguido o afeto de ninguém da família. — Não queria vestir nada que remetesse à morte — Charlotte explicou. — É hora de vida. Antes que Frau Herta respondesse, uma voz antiga ecoou por trás: — Fez muito bem.
— Ganha quem receber mais beijinhos na bochecha, que tal? — ela sugeriu vibrante, depositando logo dois na bochecha molhada de lágrimas da sobrinha. Ella soltou uma gargalhada deliciosa. Theodor olhou para Fritz, que se esquivou do tio.
— Também quero beijos — o Conde murmurou, como se falasse algo muito sério. — Entretanto, não na bochecha. Charlotte corou, respondendo igualmente séria: — Da próxima vez em que me colocar no colo, lhe darei mais do que beijos. Theodor inclinou o rosto, ameaçador, implorando que ela não brincasse assim com ele. Não ali.
— Posso confessar uma coisa? — Theodor perguntou baixo, a voz grossa e morna causando alvoroço nos pelos da nuca de Charlotte. — Sempre. — Foi a resposta imediata. — Fiquei tocado ao vê-la com um bebê. Verdadeiramente impactado. Ela sorriu, encabulada. — Também fiquei bastante mexida com a situação. Confesso que jamais me vi embalando uma criança. A sensação foi bastante agradável. Eles se olharam por um tempo, mil frases impróprias e proibidas ditas em silêncio.
— Quero filhos — Theodor confessou, chegando mais perto. — Na verdade, quero uma fileira deles. Com você.
— Não podemos fazer isso aqui, Theodor. — Ela observou os arredores. — Não saberei esconder meus sentimentos por muito tempo, Mondschein. — Soube esconder seus negócios por anos. Não saberia fazer o mesmo com seus interesses? — Você é maior que o outro segredo. Seria como tentar esconder uma montanha.
Estamos brigando internamente, Charlotte. Ficando cada vez mais polarizados. Não demorará para que a divisão atinja assuntos externos também.
Como Theodor se manteve longe de confusões administrando aquilo? A resposta era simples: quem estava no clube não queria confusão; quem o livrava das confusões frequentava o clube.
Não iria mais a lugar algum. Esperou demais para tê-la, sofreu demais por perdê-la. Nada os separaria agora.
Ele não fazia ideia do que a entristecia, mas descobriria eventualmente. E, quando acontecesse, resolveria tudo que a inquietava só para vê-la feliz de novo.
— Ele seguiu seus ideais, ergueu suas bandeiras, lutou pelo que acreditava. Seu amor e desamor pela pátria veio em primeiro lugar. Sua amiga, em segundo.
Assim nos contam os mitos e sagas que norteiam o imaginário de todos: homens partem rumo a aventuras; mulheres, esperam por eles.
"Esse ainda é um mundo extremamente masculino e temos poucos direitos, mas qualquer espera precisa ser uma escolha, não uma imposição. A consequência de quem parte é perder o que deixou para trás. Esse é o preço da escolha.
Charlotte e Wilhelmine trocaram um último olhar cheio de significados. Foi breve, entretanto, inquestionável. A Duquesa viúva sabia.
— Mas não vou ficar com você. Um dos motivos é porque estou esperando um filho de Theodor.
— Você está esperando um filho meu? — Ela ouviu Theodor perguntar, incrédulo. — É cedo para dizer — Charlotte olhou para trás, tentando não sorrir —, mas pela primeira vez na vida, tive atrasos. Sei que alguma coisa está acontecendo com o meu corpo. Eu sinto.
Em algum momento do último mês, Charlotte havia pedido por um milagre. Algo que a salvasse do marido e o fizesse ir embora por bem. Então, percebeu que suas regras estavam atrasadas, que o milagre estava nela. Estava esperando um filho de Theodor. Isso a encheu de uma alegria desconhecida e sem precedentes.
Nunca fez apologia à maldade ou perversão. Tudo o que queria era que mulheres pudessem sonhar. Sentia apenas medo pelas irmãs e uma dor sem nome por causar decepção ao pai. Contudo, se pudesse voltar no tempo, teria escrito as mesmas coisas, feito tudo da mesma forma. Foram os romances que a levaram até Theodor, e tudo o que veio depois.
Não tenho tempo para melindres. Isto são apenas livros, e livros não mordem.
Eu me pergunto frequentemente, Herr Seidel, quão firmes são as estruturas que sustentam este Reino, se acham que romances singelos, escritos para a diversão feminina, podem abalá-las.
e que ninguém nunca mais foi preso ou acusado de escrever aqueles romances.
sua sogra fenomenal, a quem adorava,
Lembro aos leitores que chegaram até aqui que esse é um livro de época escrito para agradar leitoras do século XXI.
Mocinhos eram bem mais encantadores no mundo fantasioso de suas ideias. De ogros insensíveis a realidade estava cheia.
Retirando o excesso de água do rosto, traçou um plano simples: ignorá-la do começo ao fim da viagem. Não dar chance ao azar, ao acaso ou à tentação.
Foi apenas um exemplo sobre não querer punir alguém por causa de rompantes precipitados.
Só estou mal-humorado. Quem aguenta quatro horas de assuntos femininos? — Quem só acha assuntos masculinos interessantes. —
Nem posso dizer que você é burro como uma pedra, Hans, porque, na minha cultura, pedras são sábias.
— Pare de falar essas coisas. É por isso que as pessoas acham você estranho. — Elas acham isso independentemente do que penso ou falo. Tudo que não é espelho lhes parece estranho.
Milorde é o meu correspondente fantasma, já que desconfio que nem mesmo abra os envelopes.
Os olhos de Hans transbordavam diversão. — Eu a machuquei, mingauzinho? — Ming… — Arabella arregalou os olhos. — Você acabou de me chamar de Mingauzinho?
Procurem os idosos e as crianças. São eles quem costumam recontar as histórias.
De qualquer maneira, ler livros escritos por mulheres tem me feito bem. Sinto como se existíssemos no mundo.
Não sei se percebeu, mas no conto da ervilha, nem a princesa, nem o príncipe tiveram voz. Essa é a realidade que precisamos engolir, lorde Hans.
No lugar onde batia o coração de Hans, uma escuridão sem precedentes se alastrava. O espaço, agora oco, parecia mais frio e mais escuro, como se tivessem soprado a última vela dentro dele. Sem Arabella, ele perdia sua única referência de luz.

