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quando as mãos mortas há anos, inchadas, fedendo a peixe, fecharam-se suavemente em torno de seu pescoço e o foram virando para que ele encarasse aquele rosto morto e roxo.
Aquilo chegara muito próximo a algum tipo de colapso, e Jack estava convencido de que era sua mente revoltada com o pedido extremamente arrogante que Al fizera, para desistir do projeto do livro.
Ele escreveria o livro. Se isso significasse o fim de sua amizade com Al Shockley, paciência. Escreveria a história do hotel sem rodeios, e a introdução seria sua alucinação causada pelos animais.
Escreveria porque o Overlook o encantara… poderia qualquer outra justificativa ser tão simples, ou tão genuína?
Escreveria pelo mesmo motivo que acreditava que toda grande literatura, ficção e não ficção, era escrita: a verdade aparece no fim, sempre aparece.
Seu relacionamento com o pai era como o muito aguardado desabrochar de uma flor, que, depois de totalmente aberta, acabara mostrando que estava podre por dentro.
Naqueles dias não parecia estranho para Jack que o pai ganhasse todas as discussões com os filhos usando os punhos, e não parecia estranho que seu amor andasse de mãos dadas com seu medo:
“Agora. Agora pelo amor de Deus. Acho que você vai tomar seu remédio agora. Fedelho maldito. Venha tomar seu remédio agora.”
O pai, que tinha ficado mais sóbrio (ou talvez com a esperteza estúpida de qualquer animal pressionado), disse ao médico que ela caíra da escada.
Jack sempre sentira que não fora apenas a surra repentina e irracional da mesa de jantar, mas o fato de que, no hospital, a mãe havia corroborado a história do pai, enquanto segurava a mão do padre da paróquia.
Três dias depois, o homem que dominara a vida de Jacky, o irracional divino fantasma branco, estava debaixo da terra.
Você tem que matá-lo, Jacky, e a ela também. Porque um artista verdadeiro precisa sofrer. Porque cada homem mata aquilo que ama.
Dê uma bengalada nele, Jacky, até ele quase morrer. Tome um gole, Jacky, meu filho, e vamos brincar de elevador. Depois eu vou com você, enquanto ele toma o remédio.
— Não! — gritou. — Você está morto, está no túmulo, não está de jeito nenhum dentro de mim!
Ele ficou olhando o rádio despedaçado. Agora só o snowmobile no depósito poderia colocá-los em contato com o mundo exterior.
— Quando eu estiver no caixão, você vai se debruçar e dizer: “Bem feito, lembra quando quebrou o braço de Danny?”.
Teria machucado Danny como Wendy estava pensando? Tentara estrangular o filho a pedido do pai morto? Não. Nunca machucaria Danny.
Nunca machucaria Danny agora.
Nunca na vida havia sido intencionalmente mau, quando sóbrio.
A confusão desaparecera um pouco na mente de Wendy, que descobria agora algo ainda pior: pânico.
Se fosse transmitida, talvez Wendy lembrasse que as mãos de Jack, quando a abraçou no escritório, aos soluços, estavam secas.
O garoto sofrera um choque muito grande. Precisava ser levado rapidamente, antes que qualquer dano permanente pudesse ser causado. Recusava-se a acreditar que algum dano permanente já tivesse sido causado.
Sabia que havia tomado uma decisão errada, quando foi contra seus instintos (e contra os de Danny), deixando que a neve os isolasse ali dentro… por causa de Jack.
há uma hora, ela estava dormindo, convencida de que as coisas estavam bem, e que em breve melhorariam. Agora, considerava a possibilidade de usar uma faca de açougueiro contra o marido, se ele tentasse fazer algo com ela e o filho.
Um sorriso ameaçador brotou de seus lábios com esse pensamento. Deixaria que viesse até ele. Ela viria no momento certo.
Ainda assim, ele podia jurar que tinha visto aquelas garrafas, mesmo que vagamente, da mesma forma que era possível visualizar a silhueta escura de móveis numa sala com as cortinas fechadas.
Era o primeiro bar onde pisava em dezenove meses, e a porcaria estava vazia… para a sua sorte.
Poucos homens voltam a beber, mas aqueles que voltam vêm com uma história terrível para contar.
Só as pessoas nas mesas, as pessoas do baile à fantasia, Jack quase podia ouvir as gargalhadas sufocadas, quando levavam as mãos à boca e apontavam, os olhos brilhando cheios de crueldade.
E em sua alma uma certeza se formava, e essa certeza era a de que ele estava ficando louco.
O que Jack estava fazendo ali sentado, falando sozinho, como um adolescente emburrado, enquanto o filho estava lá em cima em algum lugar, agindo como um louco, da mesma maneira que Wally Hollis disse que Vic Stenger estava, antes de OS HOMENS DE JALECO BRANCO terem vindo buscá-lo?
Papai, foi ela.
apesar de, no fundo, admitir que sentia certo prazer em ver as posições invertidas, a uma velocidade tão grande e desorientadora.
No fundo, sabia que era mais fácil a esposa se encharcar de gasolina e riscar um fósforo do que machucar o filho.
Foi acometida por um pensamento incômodo e assustador: Teria ela desejado culpar Jack? Seria tão ciumenta assim? Sua mãe teria pensado da mesma maneira, e isso era realmente horrível.
enquanto ele se sente vingado pensando que a culpa poderia ser da wendy... ela se sente mal por cogitar que culpou ele só por ciúmes
Carregava sempre consigo uma parte de sua mãe, fosse essa parte boa ou ruim.
E eu não podia entender como este lugar podia ser bom e ao mesmo tempo ruim para você.
Passando aquele tempo todo lá embaixo no porão, revirando aqueles papéis velhos, toda aquela história antiga.
“Para o inferno com isso, tragam pelo menos os caça-níqueis, ninguém vai saber, ninguém nunca vai saber”. Outra vez você me acordou, praticamente gritando: “Retirem as máscaras, Retirem as máscaras, retirem as máscaras”.
— E seus velhos hábitos de quando bebia também voltaram.
— Danny me contou. Danny sabia. Da mesma forma que, às vezes, sabe quando as coisas estão fora do lugar, ou quando as pessoas estão pensando em divórcio.
— Eu sabia que aqui era ruim — comentou Danny, baixinho. — Desde Boulder. Porque Tony me fez sonhar sobre isso.
Ela não estava nem pensando do jeito que você e papai pensam. Era feio… era pensamento mau… como… como as vespas aquela noite no meu quarto! Só querendo machucar. Como as vespas.
Nada no Overlook o assustava. Sentia que ele e o hotel eram amigáveis.
Era como se alguém tivesse acabado de se arrastar da banheira, com pressa, para saudar um visitante, concluindo que o visitante estava indo embora antes que as amenidades sociais tivessem sido concluídas, por isso corria para a porta, toda roxa e sorridente, para convidar o visitante a entrar novamente. Talvez para sempre.
E tinha quase certeza de que, quando havia chegado ao corredor, o bocal de metal estava virado de frente para o elevador. Agora estava virado para o outro lado.
Jack sentiu uma súbita explosão de alegria por isso: não estava sofrendo sozinho, isto era certo.
— Nada por lá — afirmou ele, surpreso com a sinceridade de sua voz. — Absolutamente nada.