Os dias mais estranhos - 23. Complicações (enredos, implicâncias, dificuldades)

…mas a muito custo a noite chegou, e com ela uma viagem para Cascais. Embora o tempo estivesse lento, o meu carro voou na auto-estrada. Liguei-lhe e ela desligou a chamada. Esperei. Vi-a a sair de casa, pela primeira vez vestida em roupas casuais, umas calças de ganga e uma camisa simples. Entrou no carro. -Oi. – Disse.-Oi.-Onde queres ir? – Perguntou ela.-Não sei, não conheço bem a zona…-Então ‘bora. Sabes ir para a praia do Guincho?-Sei.-Tá lá um restaurante fixe.Fomos ouvindo música no caminho e fazendo conversa de circunstância. Tendo chegado, sentamo-nos numa mesa e pedimos ambos um Irish coffee. Ainda que quiséssemos conversar, não poderíamos. A música estava um pouco alta. Quando acabamos o café ela voltou-se para mim.-Quero-te mostrar um sítio.Segui-a incondicionalmente. Entramos ambos no carro e segui com ela dando-me indicações. Seguimos na direcção de Sintra, mas assim a linha das praias acabou ela pediu-me para virar à esquerda  numa pequena entrada. Seguimos a estrada que rapidamente deixou de ser alcatrão até uma altura em que a estrada abriu e estávamos numa arriba junto ao mar. Parei e ela saiu. Segui-a. Fomos até à beira dos rochedos. O cenário era verdadeiramente idílico, com o luar a bater sobre um mar que não acabava. Só então reparei que à minha direita havia uma minúscula baia escavada na rocha, com uma pequena praia ao fundo.-Não é lindo, isto? – Perguntou ela quebrando o silêncio.Achei que ela não precisava da minha resposta. -Anda até lá baixo… - disse ela arrancando.Descemos a ladeira íngreme que dava acesso à pequena praia. Lá chegados, ela sentou-se numa rocha. Eu sentei-me ao seu lado.Ela ficou ali, contemplativa. Eu resolvi quebrar o silêncio.-Porque é que me trouxeste para aqui?-Porque não me apetecia estar com ninguém… – senti-me menos de nada - …mas não queria vir para aqui sozinha…Fiquei novamente em silêncio.-Porque é que te foste embora naquela noite?A pergunta. E a resposta?Foi a minha vez de ficar em silêncio, a matutar no que dizer. Valia a pena eu desculpar-me?-É complicado para mim…O seu silêncio perante esta resposta era uma afirmação de que eu teria de dizer o que se passou comigo. Continuei.-Naquela altura cheguei a uma conclusão que eu não queria.-Que não querias?-Sim!-E a conclusão foi?...E era chegado o momento.-À conclusão de que estava a gostar de ti e não da Andreia. Afastei-me porque quis ser justo e não me magoar ou acabar por magoar a Andreia.-Gostavas de mim? – Perguntou ela com surpresa.-Parece-te assim tão descabido?Foi ela que caiu no silêncio.-Desde aquele beijo que demos no escritório nunca mais te consegui tirar da cabeça. A Andreia é uma grande mulher. Mas eu pensava era em ti …O silêncio dela continuou. O meu chegou  também, tendo acabado de despejar o que sentia. Esperava pela sua reacção. Um gesto redentor ou castigador. Neste momento para mim tanto fazia.Ela voltou de nova a contemplar a paisagem em silêncio. Encolheu-se devido a uma brisa fria, sentindo um arrepio. Eu tirei o meu blusão e pus-lho pelas costas, num gesto que parecia quase um abraço e ela encostou-se contra mim para se proteger da brisa.-Não fazia ideia... – disse ela tentando ainda racionalizar o que eu lhe havia dito.À medida que o fazia encostava-se mais contra mim, apanhando o calor do meu corpo. Pegou-me na mão e brincou com ela por uns instantes.-Estás com alguém neste momento? – Perguntou-me.-Não.-Porquê?-Pelo mesmo motivo. Ela levantou a cabeça e olhou-me nos olhos. Os seus olhos reflectiram o luar, dando-lhe um ar quase felino. Deixei-me ficar absolutamente sossegado.Ela depositou um suave beijo nos meus lábios. Abracei-a, ela fez o mesmo. O beijo seguinte foi completamente carregado de paixão, a mesma que me apertava desde há meses. Foi um beijo longo como só a paz daquele sítio podia permitir, sem tempo, em que as nossas línguas se tocaram e digladiaram. Neste momento nada nem ninguém nos poderia separar. Sentia nela a minha paixão. Se dúvidas restavam em mim acerca do que eu sentia elas dissiparam-se ali.Quando o beijo finalmente acabou, líamos nos olhos um do outro a vontade de repetir, mas contivemo-nos, como se soubéssemos que tínhamos o tempo todo do mundo.Fomos conversando, trocando palavras que fluíam como a paixão. Só ao fim de duas horas nos permitimos a liberdade de nos abandonarmos a outro beijo, brincando como adolescentes.A temperatura descia e acabamos por voltar para o carro onde ficámos curtindo um do outro e um com o outro.A proximidade dos nosso corpos deitados sobre o banco direito do carro completamente reclinado deu-me a ousadia para, enquanto nos beijávamos, passar a mão por baixo da sua camisa e repousa-la sobre o seu seio. Ela respondeu com mais força ao meu beijo. Depois o beijo quebrou-se e ela ficou a olhar para mim ternamente. -Vamos ficar por aqui…Eu retirei a mão com uma tristeza nítida.-Não me interpretes mal. – Disse – Eu neste momento queria muito fazer amor contigo…Eu olhei para ela com um ar de aceitação.-…mas não é o momento, e há complicações.Eu assenti.Ficamos ainda na companhia um do outro por mais uma hora até ao regresso. Antes de sair do carro despediu-se de mim com um beijo apaixonado. Acompanhei-a com o olhar enquanto ela se dirigia a casa. Não entrou sem antes me brindar com um olhar doce e um beijo soprado. Segui para casa com um sentimento de paz que não me lembrava nunca ter sentido antes.Mas, como é claro, havia o Francisco…
… e a Raquel…
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Published on November 05, 2015 04:08
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