Creio que...

...quem por aqui vai passando e se dá ao trabalho de ler aquilo que ainda me vou dando ao trabalho de escrever me vai conhecendo um pouco.
Saberão que não me identifico com campos ideológicos, mas com ideias concretas. Não acredito que alguma ideologia tenha a verdade ou se possa apropriar dela, e que o que é certo o é independente de quem o propõe.
Saberá que não me identifico com partidos políticos pela mesma razão e que acho que são os mesmos que inquinam a democracia que acaba por não existir.
Saberão eventualmente que acredito num determinismo e que o muito que olho para trás, quer para a história conhecida, quer para aquilo que não pode deixar de nos intrigar – quando olhamos para as coisas com olhos de ver – porque, sendo o universo determinista, uma enorme sucessão de causas e consequências que existem além da nossa vontade, para além da nossa suposta liberdade de escolha, apenas percebendo o passado se pode perceber o futuro. É como se o tempo fosse uma conta de somar, sendo o enunciado o passado, o sinal de igual o presente e o resultado o futuro. Se não soubermos o que está no enunciado, nunca saberemos o resultado e mantemo-nos sempre num limbo entre dois desconhecidos, um sinal sem significado algum até que a resposta nos entra pelas fuças adentro com a violência de um comboio de alta velocidade a embater contra uma parede à velocidade máxima. E ficamos atónitos a pensar “isto era imprevisível”!
Na verdade não era!
Na verdade, nada do que se passa à nossa volta era imprevisível.
Basta olhar para Aldous Huxley, George Orwell e outros autores semelhantes, ler “Admirável mundo novo”, “1984”, “A ilha” para percebermos que, com mais ou menos atraso, caminhamos a largos passos para uma distopia, para um universo de gente altamente conectada e plenamente desligada!
Vejo cada pequeno pormenor que nos leva a isso! Promessas de integração que apenas levam a uma exclusão do mundo, o substituir o pessoal pelo virtual, o quanto as pessoas cada vez mais se expandem num mundo virtual, cheias de opiniões acerca de tudo o que desconhecem, cheias de razões, agrupando-se de mil maneiras, proclamando a sua individualidade enquanto ficam cada vez mais iguais, formatados desde a nascença, endoutrinados por uma escola que produz competição desde os mais tenros anos, como se a competição fosse um fim em si…
Apenas entro em competição comigo. Sou a única pessoa que tenho de superar, em tudo na vida, ou pelo menos naquilo que me interessa…
Há muito que deixei de querer ser melhor guitarrista que um Steve Vai…
Há muito que deixei de querer ser melhor compositor que Bach…
Alegro-me quando consigo ser um pouco melhor do que fui no dia anterior. Nunca serei um Steve Vai ou um Bach... Não quero ser um Steve Vai ou um Bach!
Há muito que olho para o facebook com desconforto e o uso apenas para ir divulgando algumas coisas ou partilhando outras que acho pertinentes. Mas acho piada à maneira como é utilizado por alguns, como se o acto de partilhar uma frase célebre de alguém, uma oração ou uma fotografia de um refugiado de guerra fizessem algo mais do que ser uma justificação perante o próprio pela sua inercia em produzir um pensamento capaz, rezar ou tomar alguma atitude concreta em relação às dores de outro ser humano. A mesma maneira como há trinta anos atrás comprar um single de uma música era um descanso para a consciência de quem via imagens de crianças a morrer de fome na África subsariana. "Pelo menos contribuí com alguma coisa"...

Olho para o mundo com um desconforto crescente. Acho que começo a ser um animal estranho, uma relíquia do passado…
…e o mundo apenas quer relíquias nos museus!

Vejo o mundo continuar a avançar, cada vez mais rápido, mas com a cegueira de quem não sabe para onde vai, perdido no meio de um presente vasto demais para compreender se o enunciado não estiver bem claro.
Quantos de nós é que ainda se deslumbram quando olham as estrelas à noite, ofuscadas como estão pelas luzes das cidades?

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Published on October 10, 2016 03:09
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