Deana Barroqueiro's Blog: Author's Central Page, page 74
December 11, 2010
Livros em campanha de Natal
"O Navegador da Passagem" ( http://www.wook.pt/ficha/o-navegador-da-passagem/a/id/202111 ) e o "D. Sebastião e o Vidente" ( http://www.wook.pt/ficha/d-sebastiao-e-o-vidente/a/id/185353 ) dão direito a um vale de 50%.
Assim, caros leitores, se não conseguiram achar os meus livros, em corpo presente nas livrarias, poderão adquiri-lo com algum proveito na Wook, para uso próprio ou para oferta de Natal.
November 24, 2010
Memórias de Estalo - Epílogo
Também do lado da Porta da Cruz, no Cais do Carvão e no Cais da Madeira, assim como nas Tercenas onde se fabrica a pólvora, dão por findo o trabalho mais três centos d'homens e mulheres, os quais começam a abandonar a Ribeira e nós com eles. A caminho do Hospital, seguimos pela rua da Fancaria e viramos à direita na de Julianes, até à Igreja de Santa Maria de Madanela e depois à esquerda, pela Rua da Correaria, bordeando a Judiaria Grande, cujas portas serão prestes cerradas, e vamos dar ao Convento das Carmelitas, no cruzamento da rua do Quebra-Costas com a dos Torneiros, a qual tomamos a rijo trote, que em Novembro mui prestes cai a noute. Chegados à Igreja de S, Nicolau, minha preciosa Esmeralda, não tem que saber, é sempre a direito pelas ruas das Arcas e da Palha até ao pátio de serventia do Hospital de Todos-os-Santos.Numa das 3 cozinhas do Hospital que vemos desde o pátio pera onde nosso amo nos carreou, os oficiais de serviço andam mui azafamados na preparação das comidas e mezinhas pera os cerca de cento e quarenta enfermos que tem a seu cargo, pois se acerca a hora da ceia e o enfermeiro-mor tem neles grande vigia, não os deixando lazeirar . Ajudado pelo azemel do Hospital, meu amo não perde tempo em nos atrelar à carrocinha, a mim e à doce Esmeralda, lado a lado, pera minha maior ventura e prazer! Que bem que cheira a jumentita e como busca o calor de meu corpo, no arrepio da noite!
Nosso amo inda s'atarda pera duas canadas de tinto com o azemel e quando sobe pera a carrocinha, tem de ser com muito socorro, que já mal se sustém nas pernas, o que lhe dá grande risa, a ele e a todos os que correm a alá-lo pera riba do banco, onde só com muito trabalho logra manter-se assentado. "Uxtix, 'Stalo,'bora p'ra casa, home! Arre, m'nina!" De tão tartamelo nem o meu nome lhe sai escorreito e muito menos o seu famoso estalido de lingua, que faz por soltar, não logrando mais que um triste assopro que sembra deixá-lo sem fôlego. Boto-me a caminho, que me prezo de o saber d'olhos cerrados, sem mister de chibata ou açoute e bastas vezes tenho carreado meu amo adormecido, de Lisboa até Belém.
Agora é seguir a direito, tomando tento nos carreiros, que não hão-de oferecer perigo, poisa noite é de lua cheia, tão clara como se fora dia. Mal sinto o cansaço da jornada que meu coração vai ligeiro como a brisa e o sangue corre quente e grosso no meu corpo. Uma orelha d'Esmeralda roça-me por vezes o pescoço e eu sinto ânsias de zurrar à lua. Meu amo, como que adivinha o meu pensamento e, de lingua inda tartamela, solta em altíssimas vozes os versos da canção: "Mê padre é almocrebo / Vende castanhas e nozes/ Quem quiser casar comego / Alevante-me essas vozes". Deus o guarde! Amen. Finis
Memórias de Estalo - Capítulo XI
Esmeralda não sabe para onde olhar, com tanta estranheza que vai neste Mundo. Tudo vem dar aos portos de Lisboa e a Ribeira Velha é o melhor lugar para deixar a carga mais rara e o muito fato trazido de longes terras, enquanto se lhe não acha outro destino. Gentes das mais desvairadas raças, cores e trajos cruzam-se no terreiro e na praia, monstros terríveis, em gaiolas de ferro arrancam gritos de pasmo a todos os que se acercam a vê-los. Nomes de bichos fabulosos, como Unicórnio, Tigre, Jaguar, Pantera, Crocodilo ou Girafa correm de boca em boca, assim como os de lugares nunca antes ouvidos: Patane, Narsinga, Chaul, Pegú, Timor, Cantão, Liampo ou Tanegashima!Esmeralda espanta-se, e zurra, cheia de terror ao ver um grupo de degredados a arrastar as correntes, carreados pelos beleguins para os barcos que os hão-de levar aos Brasis, Áfricas ou Índias, talvez para não mais volverem. Cruzam-se com um carregamento de escravos negros da Guiné, presos uns aos outros com grossos baraços e marcados a ferro em brasa como gado. Cheios de moléstias pela terrível viagem, magros e imundos, olham com assombro e medo o seu novo mundo. São inda menos do que nós!, murmura Esmeralda com dó.
Berros desesperados ouvem-se nos batéis que trazem
uma caravana de arábios com seus camelos do deserto que, temerosos de tanta água, espinoteiam com as altíssimas pernas e mordem os matelotes que se lançam ao mar em grande alvoroto. Só a duras penas logram os homens trazer os bestigos para terra, com as corcovas a balançar d'aflição. Que pena tenho de não os poder entender! Quantas cousas me haveriam de dizer de suas terras e aventuras vividas! Ora, com tudo isto, minha doce Esmeralda, o sol está quase a pôr-se e é hora d'ir buscar nosso amo que, como sempre, deve estar de pinguela, a dormir debaixo daquelas árvores. João do Restelo, como sabe bem do que a casa gasta e que sempre haverá d'acabar o dia bêbado (pois, como dizem os fradinhos Jerónimos escarnefuchando dele, "assi seco como é beberá a torre da sé"), nunca me deixa preso para que eu o possa recolher ao sol-posto e levar a Belém, depois de haver retomado a carrocinha no Hospital de Todos-os-Santos.
Assim, dou aviso a Esmeralda para beber mais um pouco d'água que o caminho é longo e não haverá tempo de paragens. Partimos então a buscar nosso amo e vou carreando com mil cuidados a minha jumentinha, por entre os ajuntamentos e azáfama das gentes que desarmam suas tendas e recolhem os pertences a fim de volver a casa. Um cego tange o seu arrabil e bandos de cachopos, enquanto esperam a ordem de marcha, saltam ao eixo berrando en cantilena desatada: Tonho medronho /Cabeça de conho / Fita amarela/ Rabo de cadela. E as meninas respondem em coro, saltando à corda: Una, duna trêna, condena / Txaca barraca / Catxapiz catxapez / Conta bem que são dez".Ora ali jaz nosso amo, como sempre dormindo a
bom dormir, soltando grandes silvos e roncos de bácoro regalado. Cães e gatos engalfinham-se pelos restos do apisto que derramaram no chão e o um fedor azedo deixa-me mareado. Sopro-lhe na cara e dou-lhe uns empuxões, ao de leve c'os focinhos, não vá ele despertar de má catadura. Abre os olhos a contragosto e diz tartameleando: "Já é chegada a hora, 'Stalo? Ora sus, que se faz noute e inda temos d'ir ao Hosprital a ver da carroça! Andor, andor!" Dicionário de Escritoras Portuguesas
Porque não o têm à venda, Senhores Livreiros?
Foi apresentado, durante o mês de Outubro e em vários locais e cidades, o Dicionário de Escritoras Portuguesas, organizado por Constância Lima Duarte, Conceição Flores e Zenóbia Collares Moreira, com a chancela da editora Mulheres, do Brasil.
Fui convidada para o lançamento desta obra na Casa Fernando Pessoa, a que não me foi possível assistir. Saudei com muitíssimo agrado esta obra pioneira e tão necessária para resgatar as escritoras portuguesas do limbo para onde são remetidas sistematicamente (com raríssimas excepções se compararmos com os escritores no masculino) pelos críticos e estudiosos (homens) que fazem os Dicionários e as Histórias de Literatura.
Sendo um trabalho original e de enorme interesse não só para os estudiosos e estudantes das escolas e universidades, mas também para o leitor em geral, tendo tido honras de apresentação nos canais televisivos, em muitos jornais e com milhares de entradas na Internet, julguei que poderia adquirir o Dicionário de Escritoras Portuguesas em qualquer livraria da nossa Lisboa. Engano meu!
Ando há um mês a percorrer as Fnac, Bertrand, Bulhosa e muitas outras livrarias, incluindo as universitárias. Nada! Não está nas listas...Nunca ouviram falar... Por outro lado vejo resmas dos mesmos livros e dos seus clones ou sequelas que, muitas vezes, não passam de um chorrilho de banalidades em mau português ou em péssimas traduções de banalíssimos autores estrangeiros; ou catadupas de lições de felicidade, sucesso e riqueza instantâneas. Que esmagam qualquer obra (das poucas) de qualidade que sempre vão aparecendo e nem se vêm.
Como este Dicionário! Não interessa aos livreiros portugueses. Porquê? Acham que não há "mercado" para tal obra? Ninguém estuda nesta terra? Seremos todos analfabetos? Terei de o comprar no Brasil? Mandar vir pela Net?
Já agora gostava de saber se faço parte dessas 2000 mulheres, apesar da minha marginalidade. Disseram-me que sim. Pelos vistos não vou ter oportunidade de o confirmar, para me narcisar. Que belo momento perdido!
Apresentação
"A publicação deste Dicionário de Escritoras Portuguesas concretiza um antigo projeto, que teve início em 1985. Nessa época, três professoras de Literatura Portuguesa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, de Natal, decidiram, por própria conta e risco, e muito entusiasmo, investigar a autoria feminina na literatura portuguesa. O grupo era constituído de Constância Lima Duarte, Diva Cunha Pereira de Macedo e Zenóbia Collares Moreira. Depois, à medida que os anos passavam, por diferentes razões a investigação foi sendo interrompida: uma hora era a tese de doutoramento que afastava as pesquisadoras; em outra, o acúmulo de tarefas acadêmicas que as ocupava integralmente. Recentemente, nos demos conta de que o trabalho que nos havia mobilizado por tanto tempo, e preenchido tantas horas e viagens até de nossas férias, estava abandonado há anos. Também nos demos conta da carência de um trabalho que permita fazer um balanço da produção literária feminina portuguesa, e ofereça uma listagem exaustiva de nomes e de obras, para auxiliar os estudantes e demais estudiosos. E decidimos retomar a pesquisa com o grupo assim configurado: Constância, Zenóbia, e Conceição Flores, açoriana residente em Natal, no lugar de Diva Cunha, que no momento dedica-se ao doutorado e à própria poesia.
O dicionário é composto de cerca de duas mil entradas e abarca escritoras consagradas pelo público e pela crítica e outras cujo nome é apenas conhecido em pequenas vilas ou pelos familiares. Resgata escritoras com vasta produção e acolhimento junto ao público da época e caídas, hoje, no ostracismo; identifica pseudónimos através de verbetes remissivos; colige informações dispersas de tempos diferentes, congregando mulheres que ao longo dos séculos têm publicado ou deixado seus textos manuscritos e, posteriormente, redescobertos por investigadores/as. Os verbetes reúnem informações biográficas e bibliográficas, munindo o leitor de dados que, regra geral, ele não encontra agrupados, o que constituí um instrumental indispensável para alunos, professores, investigadores e todos aqueles que se interessam pela literatura escrita por mulheres". (in Club Literário do Porto)
Link para o Vídeo de apresentação na Sic
Memórias de Estalo - Capítulo X
O Malcozinhado
O lanço de escadas do Celeiro e da Alfândega, com aquela formosa colunata que se estende até ao mar, abrigam o grande mercado de pescado (o Açougue do Pescado do Concelho) e de doces. Todos os dias aqui vêm muitos peixeiros, hortelãos, confeiteiros, cortadores, padeiros e doceiros a vender o que trazem para alimento da cidade. Nosso amo está bem mais satisfeito, por já lhe ter dado pelas ventas o cheiro do
Malcozinhado
, um lugar de dez cabanas onde grande soma de homens e mulheres estão de contínuo, com braseiros de fogo, a assar sardinhas e peixe de toda a outra sorte, segundo os chincheiros e linheiros os pescam. Para aí nos leva ele, pressuroso, e nos deixa junto à praia: "Vê lá se me aprontas mais alguma, meu tinhoso, que te vendo na Ribeira hoje mesmo! E toma-me tento na burrica…"
Ah, disso não há mister dar-me aviso, qu' Esmeralda protejo eu com minha vida e sem sermão encomendado! E lá vai João do Restelo a buscar lugar a uma mesa que já oiço seus brados pedindo de beber, salvado com muita festa de todos os comensais, que só os estrangeiros o não conhecem. Aí comem, à mistura, homens e mulheres, negros e negras, trabalhadores que ganham na Ribeira, estrangeiros que saem dos navios sem destino certo, também estudantes de pouco dinheiro e poetas, como aquele zarolho, ali, de cara repuxada pela cicatriz, que me conhece e me fala sempre com bondade. Ao que dizem, do muito que viajou e sofreu tudo escreveu em poemas qu' inda hão-de espantar o mundo. Não sei se será verdade, que por ora anda sempre depenado, mas o certo é que me apraz muito ouvi-lo.O Poeta acerca-se de mim com um sorriso. O sol da tarde, a descer
sobre o mar, dá-lhe uma cor de cobre, como se duma medalha se tratasse: "Com que então, Estalo, um novo amor? Espero que não seja um amor louco: tu por ela e ela por outro! Mui graciosa, sem dúvida, tal como uma jumentinha de Presépio!" - e a mão fina e nervosa do poeta guerreiro afaga docemente o pescoço d'Esmeralda que cerra os olhos de prazer. Remexo-me inquieto, de coração apertado. Dizem que mesmo desfigurado o Poeta continua a encantar as fêmeas… "Desejo-te melhor sorte do que a minha, velho amigo. Acaso, serão as jumentitas mais fiéis do que as mulheres…" Isto foi já dito para duas donas que passavam e riam, mirando o Poeta. A maior delas falou com sanha: "Que quer o Cara-sem-olhos? Melhor fora que se escondera!" A mão do Poeta ficou queda, um instante, no pescoço d'Esmeralda e o seu riso soou triste. Disse rijo para as damas que se afastavam:
"Sem olhos vi o mal claro
Que dos olhos se seguiu,
Pois cara sem olhos viu
Olhos que lhe custam caro.
De olhos não faço menção,
Pois quereis que olhos não sejam:
Vendo-vos, olhos sobejam;
Não vos vendo, olhos não são."
Elas, rindo, atiram-lhe de longe com um "Sois sempre o mesmo!". O Poeta dá-me uma palmadita amiga no lombo e diz, amargo: "O mesmo, Estalo, ouviste?! Só por escárnio me podem dizer tal! Uma máscara de causar medo ou horror! Perdigão perdeu a pena, não há mal que lhe não venha! Pois foi assi, meu amigo, num momento perdi a pena de voar e ganhei a pena do tormento… Mas nada de tristezas, meu bom Estalo, pois tu estás namorado, que é como se deve andar no mundo e eu vou beber uma canada à saúde dos vossos amores. Tomai de presente, um torrãozinho de açúcar desse Brasil que eu espero ver um dia!" E, com a liberalidade de um príncipe, o pobre Poeta botou em nossas bocas um seixito branco da doçura dos deuses.
November 23, 2010
Numa aula de escrita criativa

Na semana passada, a convite do jornalista e escritor José Couto Nogueira, fui a uma das suas aulas de Escrita Criativa para conversar com os seus alunos. É um privilégio estar com pessoas que gostam tanto de livros, têm tanto prazer na leitura e na escrita que se dispõem a frequentar um curso, depois do seu horário de trabalho, sacrificando o descanso, o jantar e o tempo da família, para se dedicarem a esse gosto da escrita, uns apenas por puro deleite do acto de escrever e de criar um texto seu, alguns com a ambição de se tornarem melhores escritores, outros apenas pela convivência com as obras literárias e os seus autores.
Não sei se lhes dei aquilo que esperavam; já não dou lições e só me atreveria a dá-las aos meus jovens alunos. Aos leitores adultos gosto de lhes contar histórias e falar-lhes dessa imensa paixão da escrita que foi desde sempre a essência do meu ser, a minha perdição e a minha salvação, tão necessária à minha vida como respirar. Quando falo com os leitores desnudo a alma por completo, eles vêem, então, mais de mim do que a minha família ou os meus amigos viram em muitos anos.
Gosto da partilha, da comunhão desta nossa Língua de Poetas, tão antiga e, por isso mesmo, tão rica, poderosa, dolorida e sábia. E da nossa memória colectiva, que contribuiu para fazer de mim o que sou hoje e para a transformação da poetisa que eu quis ser na escritora que sou de romance histórico.
Foi tão bom estar com esses amigos de leituras e escrevinhações! Melhor seria ainda se esse prazer foi recíproco. Porém, isso, só eles o poderão dizer.
Perdoem-me o atrevimento, queridos amigos (professor e alunos), mas não resisti a pôr aqui as vossas fotos, embora não vos tenha pedido prévia autorização. É a minha homenagem ao vosso trabalho.
November 22, 2010
Memórias de Estalo - Capítulo IX
Pela Rua da Misericórdia da Porta do Terreiro iremos dar à Ribeira Velha e passamos agora pela Igreja e Casa da Misericórdia, construída ao mesmo tempo que o Mosteiro dos Jerónimos (onde hás-de viver mui feliz de ora em diante, asninha preciosa!), nos terrenos que El-Rei D. Manuel deu por troca aos Cavaleiros da Ordem de Cristo. Nesta obra laboraram arquitectos e escultores estrangeiros mui famosos. Tem um portal mui bem lavrado na sua fachada, a sul, com a Senhora da Misericórdia a estender o manto da Justiça por sobre ricos e pobres. Da porta travessa tem aquela larga escaleira que desce até à praia. Por trás da Igreja, há dois recolhimentos d'órfãos, um hospital e casas de serviço para socorro d'enjeitados, presos e enfermos pobres, enterro de mortos desamparados e dotes para casar orphãs, tudo sustentado por esmolas de pessoas generosas e dádivas da Casa Real. Às quartas-feiras, sextas e Domingos, os irmãos fazem mesa e dão comida aos presos e necessitados. As procissões da Casa da Misericórdia são as mais belas e solenes de Lisboa.
Finalmente o Largo do Terreiro do Trigo! Encostado ao vestíbulo da Igreja da Misericórdia, no lado do nascente, está o Celeiro de Portugal que dá o nome ao Terreiro do Trigo, mandado fazer por El-Rei D. Manuel para agasalhar todo o pão de que há mister a cidade e mais o termo, dar franquia a quem o traz de fora do Rei no e aliviar o povo quando há fome. É mui famosa edifício, composto por dous lanços de casas que tem 24 braças de comprido e 62palmos de largo, com 32 arcos de pedraria por banda e entre cada arco tem uma loja que leva 50 moios de trigo.
As 48 lojas formam duas ruas abobadadas e ladrilhadas, tendo ao centro um pátio liso e estreito. Nele se encosta o assento da Alfândega Nova (onde se arrecadam os direitos das mercadorias), estendendo-se até à beirinha do mar, todo feito em pedra escorada com grandes estacas espetadas a maço no mar, fazendo espanto a quem o vê.
Já te vês perdida, formosa Esmeralda? não tardarás em saber o caminho, que to hei-de mostrar outras muitas vezes, que aqui vimos sempre nos dias de fazer a mercar todo o fato de que hão mister os nossos fradinhos Jerónimos. Não te quero enfadar, minha frol, com esta aravia, porém levo já tanto ano a sós comigo que já nem sei falar a uma asninha assi moça e çucarenta como tu… Gostas?! Que te conte mais?! Hufá!!! November 20, 2010
O que dizem os meus Leitores
"Este livro traz-nos a história do fabuloso Pêro da Covilhã, uma personagem do renascimento português que, pelos vistos, foi muito mais importante para a nossa história do que se pudesse pensar à primeira vista.
Não é por acaso que o seu nome é desconhecido da maior parte das pessoas uma vez que ele foi um espião secreto de D. João II.
Este livro representou para mim uma série de descobertas extraordinárias e foi uma verdadeira caixinha de surpresas que, confesso, adorei.
A ideia que tenho da espionagem é a moderna que os filmes nos transmite, ao pensar em
espionagem à centenas de anos pensei que esta fosse feita por pessoas com um ar minimamente discreto (para se poderem misturar com a multidão) e o que o fariam apenas por dinheiro traindo muitas vezes o seu próprio patrono.
Ora nada podia estar mais longe da verdade relativamente a Pêro da Covilhã (ou para qualquer outro dos nomes que tenha usado) que era um homem de uma grande inteligência e cultura que nos faz lembrar algumas das mentes mais brilhantes do Renascimento, tão grandes são os seus talentos e que ao ler a sua história trazida à luz do dia graças a esta fantástica autora e ao seu rigoroso trabalho de pesquisa histórica, não nos deixa dúvidas que foi uma das mentes mais brilhantes do Renascimento português.
Não nos surpreende apenas sua boa memória ou facilidade com que aprende línguas ou muda de identidade, mas pela sua extrema fidelidade e lealdade não apenas ao seu patrono, como aos seus amigos que nos surpreende por ser extramente rara nos espiões da época.
Com este fabuloso espião somos levados a viajar por diferentes países e culturas, que não o suprendem apenas ele, mas ao próprio leitor sendo por vezes difícil mesmo acreditar na veracidade de certos factos relatos sobre ele.
Um livro delicioso, que nos proporciona uma viagem, no tempo e no espaço ao sabor de uma escrita cuidada e requintada.
Joana Dias (Páginas com Memória)16/11/2010
"Ofereci este livro à minha mãe, depois de ter conhecido a autora na Feira do livro do porto, e espero em breve lê-lo pois parece bastante interessante e o pouco que li, gostei".
Ana C. Nunes 17/11/2010
Sobre O Romance da Bíblia
"Quando tive oportunidade de conhecer e falar com a autora d'O Romance da Bíblia, fiquei com imensa curiosidade em descobrir a sua obra. E ainda bem que decidi ler este livro!
Trata-se de uma narrativa na qual desfilam as personagens mais conhecidas (e outras nem tanto) do Antigo Testamento, sempre descritas com traços de ironia e humor negro.As personalidades masculinas apresentam-se-nos fatalmente humanas e manipuláveis pelas femininas que, tendo em conta as circunstâncias que lhes são oferecidas, tentam guiar o curso da história.Esta é uma história que não tem um carácter puramente ficcional, atingindo-nos a violência, a sexualidade e a maldade por vezes descritas, levando-nos a reflectir uma vez mais sobre o papel da mulher ao longo da História.
Gostei!"
Patrícia Pereira (Segredo dos Livros) 19/11/2010
November 19, 2010
Tigelada do Alvaiade (Castelo Branco)
Para os que gostam da doçaria antiga da nossa terra, uma receita de Tigelada, do cardápio da minha sogra Maria Fernandes Pires, uma cozinheira-de-mão-cheia, da airosa aldeia de Alvaiade, Vila Velha de Ródão. O nome deste doce deve-se a ser feito nessas grandes tigelas de barro, típicas da região.Tigelada (2)
1 litro de Leite;
8 ovos;
2 c. de sopa (rasas) de farinha de trigo;
8 c. de sopa de açúcar;
Sal, canela e raspa de casca de limão.
Aquece-se bem o forno e duas tigelas (de cerca de 23 cm de diâmetro por 7 cm de fundo.
Bate-se os ovos inteiros com a farinha, o açúcar, o sal e a canela. Depois de bem batido, vai-se adicionando o leite, batendo sempre.
Deita-se a massa em duas tigelas que têm de estar bem quentes (a massa deve "fervilhar" em contacto com o barro). Vai a cozer em forno quente até tomar cor vermelha. Baixa-se a temperatura e coze cerca de 1 hora. Servem-se frias.
Nota: As da foto ainda estavam quentes, acabadinhas de fazer pela minha querida colaboradora Ana Maria Pereira Gonçalves.
November 15, 2010
Memórias de Estalo - Capítulo VIII
"- Chamas-te Esmeralda, minha asninha de Belém?! Hui, pudera eu ser o teu burrico de Jericó, ó preciosa, e não haveria sendeiro mais feliz neste mundo! - Atardo o passo para que me acompanhe sem fadiga e ela arreganha-me os beiços num sorriso que me faz arrepios na espinhela: - Nem a jumentinha da fuga para o Egipto foi mais generosa do que tu, minha flor, nem mais merecedora de Presépio. não entendes o que te digo, minha bela? Que nunca ouviste um burro falar tais cousas? Perdoa-me, formosa, que isto d' estar sempre com os fradinhos já m' amoldou o pensar e o sentir à sua guisa. Ah, gostas que te fale assi? Pardeos, eu cuido sonhar…".
Mal escuto nosso amo resmoneando em voz lastimeira: - Guai! Se não foras tão garanhão, estaria eu est'hora na MancebiaE de acinte ferra-me com as biqueiras dos borzeguins na pança, mas eu nem faço caso, todo aceso a descrever à minha Esmeralda os tesouros de Lisboa que ela vê por vez primeira, com olhos de rasgado assombro. Não é çafea
Porém, no Arco dos Barretes, finco os cascos no chão e, ateimando com meu amo, viro para o Pelourinho Velho, livrando Esmeralda da Rua da Confeitaria, para que a não piquem as moscas e abelhas que ali tudo enxameiam, pela grande fartura de doces e bolos feitos com os finos açúcares do Brasil e da Madeira.
Ao Pelourinho Velho, sempre com muita gente, vem dar a rua Nova dos Ferros ou dos Mercadores, a do Aver-do-Peso (com a Casa do Conselho para vigiar os instrumentos de medir e de pesar dos mercadores, para estes não fazerem burla), as dos Ourives da Prata, de Julianes, da Fancaria e do Inferno, com o seu Beco do Espera-me Rapaz.
Há no Pelourinho Velho, e posto que o Natal se acerca, também muitas mulheres com suas mesas de mantéus mui alvos, cobertos de gergelim, pinhoada, nogada, marmelada, laranjada, cidrada e fartéis- Se dão ali pregão dos homens negros como se de bestas se tratara? Si, Esmeralda, também se vendem muitos homens para escravos, os quais estão agora mui caros, o que mete medo a toda esta gente, pois em Portugal ninguém quer fazer nada e não há miserável que não tenha um escravo ou escrava a trabalhar para ele.
Neste Largo, como no Rossio, há sempre 10 escrivães com suas mesas a escrever cartas e petições a quem lhas pede e nunca estão vagos, ganhando cerca de 200 rs. ao dia, isto segundo fala sempre nosso amo que os inveja muito.
Notas da Autora
A primeira imagem mosta uma panorâmica da Ribeira; a segunda é a Rua Nova dos Mercadores, a mais cosmopolita da Lisboa do Século XVI.
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