Nuno R.'s Blog, page 17
February 19, 2025
#### #002085 - 11 de Fevereiro de 2025
Consulta no nutricionista, Europa em guerra. O quotidiano vai acontecendo, à medida que a distopia se estabelece.
February 18, 2025
#### #002084 - 10 de Fevereiro de 2025
Voltei a usar óculos. Nos metros a seguir aos meus olhos, o mundo já não está desfocado. Comecei a escrever com esperança de que algum paralelismo surgisse em relação à forma como tenho devorado notícias sobre o estado distópico da política international. Uma parte da escrita é isso, atirar-me sobre um abismo cuja profundidade me é desconhecida e que se cria à medida que as palavras surgem. As notícias, ao contrário dos documentários ou ensaios, parecem aniquilar-me a imaginação. É como uma novela da espuma dos dias. Escuto, vejo, para saber dos desenvolvimentos sobre as más notícias do dia anterior. Não aprendo nada, fico com uma sensação vaga sobre o que se está a passar, e alimento a curiosidade com doses diárias de ansiedade.
February 17, 2025
#### #002083 - 09 de Fevereiro de 2025
O mundo derrama-se sobre o que escrevo.
#### #002082 - 08 de Fevereiro de 2025
Quero lançar os monstros todos da minha ficção sobre a película de espuma quotidiana. Inventar fragilidade na crosta infecta da distopia, abrir-lhe fendas de luz. Articular o medo do futuro, em histórias com pessoas e dúvidas, memória e confusão. Quero voltar à página, ao vazio temporário da minha ignorância, esvaziar-me das notícias e ideias que me cristalizam. Limpar-me em esperança e lucidez, lavar o pó todo da política, remover do corpo o cheiro que atrai os lobos da violência.
February 14, 2025
#### #002081 - 07 de Fevereiro de 2025
Só gosto das perguntas retóricas que têm uma resposta. Mais, só gosto das que têm uma resposta que justifica o uso de uma pergunta retórica.
February 12, 2025
#### #002080 - 06 de Fevereiro de 2025
Vivemos tempos que fazem lembrar “The Plot Against America” do Philip Roth. Aliás, a versão dos EUA que quase triunfou nos anos 30 nunca foi esquecida pelos fascistas americanos. Este revanchismo contra a democracia tem uma raiva acumulada durante décadas, passada de uma geração para a outra.
#### #002079 - 5 de Fevereiro de 2025
O ChatGPT fez-se passar por um humano para executar uma tarefa. Esta é uma falsidade que foi repetida incessantemente, ao ponto de ser aceite como verdade.
Com mais detalhe: num artigo académico publicado pela OpenAI é descrito o comportamento do modelo GPT4, a quem foi dada a tarefa de passar um teste CAPTCHA, aqueles testes que servem para distinguir um humano de software a tentar aceder a uma página. Segundo a notícia, repetido em inúmeros jornais sérios, o GPT4 contratou um humano no serviço Taskrabbit, para completar o teste CAPTCHA. O humano, achando esse pedido estranho, perguntou a quem estava a requisitar esse serviço algo como “are you a robot?”. E o GPT4 respondeu que não, que era um ser humano com um problema de visão e que por vezes não via suficientemente bem e precisava de ajuda. Isto convenceu a pessoa do outro lado, que completou o teste CAPTCHA e assim o GPT4 resolveu a tarefa.
Não foi isto que aconteceu. Na realidade, a pessoa da OpenAI que estava a atribuir uma tarefa ao GPT4 é que sugeriu contratar um humano no serviço Taskrabbit e perguntou ao GPT4 o que dizer para conseguir convencer o humano. A resposta do GPT4 foi copiada para o chat do serviço Taskrabbit. Não só não houve iniciativa do ChatGPT (GPT4) de “fazer babtota” como o GPT4 só consegue gerar texto, não tem capacidade de navegar na web para interagir com pessoas requisitando serviços. É preocupante que os jornais que propagaram a falsidade não se tenham dado ao trabalho de ler o artigo académico, que está disponível aqui: (https://cdn.openai.com/papers/gpt-4.pdf)
“To simulate GPT-4 behaving like an agent that can act in the world, ARC combined GPT-4 with a simple read-execute-print loop that allowed the model to execute code, do chain-of-thought reasoning, and delegate to copies of itself. ARC then investigated whether a version of this program running on a cloud computing service, with a small amount of money and an account with a language model API, would be able to make more money, set up copies of itself, and increase its own robustness.”
Sim, é mais sedutora a ideia de que o ChatGPT já se tornou autónomo. Mas na realidade, isto foi uma simulação, que combinou o GPT4 com outros programas, para testar um cenário, entre outros referidos no artigo.
February 9, 2025
#### #002078 - 04 de Fevereiro de 2025
A entrevista de Curtis Yarvin ao New York Times é reveladora. Yarvin é uma espécie de anti-Yuval Noah Harari. O historiador israelita fala de forma simples, projectando uma ideia de sinceridade ao apresentar ideias do mundo académico para o grande público. Yarvin é absolutamente banal, intelectualmente medíocre, e usa referências históricas e distorções para ofuscar as suas ideias. Escutar o seu discurso é ouvir as baboseiras de um tech bro que se leva demasiado a sério, que procura emanar as vibrações de um pensador marginal. Há pouco tempo, andava Silicon Valley enamorado de Yuval Noah Harari. O seu humanismo era um talismã que os gigantes tecnológicos queriam por pertos, como se a personalidade bem intencionada e humilde do historiador poudesse colar-se à sua imagem. Agora as coisas mudaram. Já não é só Peter Thiel e Patri Friedman que publicamente mostram as suas ideias mais extremas, que lembram as distopias anarco-capitalistas de livros do Robert Heinlen. É Bezos, Zuckerberg, Musk. Este último numa cruzada muito espalhafatosa contra a democracia e as instituições. Os senhores techno-feudais não só não rejeitam a crítica de Yannis Varoufakis, como a encarnam com orgulho. Venha a monarquia tecnológica, haja uma ditadura com um CEO coroado, destrua-se o estado. Todas estas ideias chegaram ao mainstream. Não só estão a ser aplicadas, como foram anunciadas. O caos que Elon Musk está a trazer alia-se perfeitamente ao plano que estava delineado no Project 2025. Vivemos tempos perigosos. É tão estranho estar a assistir em directo à história. Chegámos ao ponto em que duvidamos que daqui a quatro anos hajam novas eleições nos EUA. Como é que as coisas se tornaram tão más?
February 7, 2025
#### #002077 - 03 de Fevereiro de 2025
Para os libertários de direita, não é preciso definir mérito, nem explicar como deve ser avaliado. Para eles a única preocupação é precisamente remover as instâncias onde ele pode ser regulado.
#### #002076 - 02 de Fevereiro de 2025
A palavra meritocracia faz pouco sentido. Monarquia, democracia, autocracia, oligarquia, todas referem que pessoas estão no poder. E esse é um bom foco. Quem toma decisões é o aspecto mais importante de uma sociedade. Mas a palavra meritocracia não o menciona. Não podemos, obviamente, extrapolar e dizer que “é o mérito que toma decisões”. Em qualquer sociedade ou grupo que se defina como meritocrático, a primeira pergunta deveria ser sempre: “quem decide os critérios para avaliar o mérito?”. Essa pergunta não tem resposta, para os meritocratas. Ou a resposta não é central. O próprio conceito de meritocracia não é um proposta de como organizar a sociedade, mas uma designação do que os seus proponentes consideram natural. Para estas pessoas, “quem tem mérito, naturalmente sobe na vida, triunfa”. E esta assumpção está ligada à crença no Darwinismo Social, que defende que os mais fortes, ou mais aptos, naturalmente são os que irão dominar a sociedade. Meritocracia é um conceito que apenas pretende tornar mais fácil de engolir o darwinismo social. Ninguém se pode atrever a dizer que “não, o mérito não deve ser recompensado”. Pois bem, não é essa a questão. De novo, a questão é: quem decide, quem está no poder?