Nuno R.'s Blog, page 106
September 29, 2022
#### #001125 - 29 de Setembro de 2022
É misterioso o sítio de onde vêm as palavras escritas. Avança-se na página, vendo mal, de mãos à frente a abrir caminho nas teclas. Frases, imagens, diálogos, personagens inteiras se revelam. É infinito esse lugar, existe apenas ao se escrever, e perdura mais que a realidade.
#### #001124 - 28 de Setembro de 2022
Alforges na bicicleta. Guarda-lamas, roupa para a chuva. O longo e inspirador The Dawn of Everything para continuar a ler. E o rio Minho.
September 27, 2022
#### #001123 - 27 de Setembro de 2022
Ler o Two Years on a Bike, do Martijn Doolaard, ocupa-me inteiramente. O livro é imenso. As enormes páginas estão cheias de fotos de pessoas, montanhas, desertos. Sabe bem ler assim, sentado, com o volume do livro a ocupar a mesa. Penso que irei retomar a leitura do Gormenghast assim, apreciando as ilustrações de Mervyn Peake e a dimensão física do livro.
September 26, 2022
#### #001122 - 26 de Setembro de 2022
Itália. O país de Primo Levi, de Franco Berardi, de Fellini e Pasolini, do meu querido Italo Calvino, do nosso amigo Tabucchi, da boa comida, da dolce vita, do Adriático e do Tirreno, dos Alpes e da Sardenha, de milhões de pessoas que ainda não desistiram do futuro, é muito maior que este triste momento político. A nossa solidariedade começa já. Um dia, talvez não demore muito, poderemos vir a precisar da mesma empatia. Da força de quem não se derrota pelo ódio e, em vez disso, não aceita fronteiras à colaboração de pessoas de boa vontade, de todas as cores, géneros e nacionalidades. A nossa causa comum é a humanidade.
September 25, 2022
#### #001121 - 25 de Setembro de 2022
Em Homecoming, a construção da personagem Walter Cruz é essencial para a estrutura da história. Cruz procura adaptar-se e, ao contrário dos outros veteranos em tratamento, consegue fazê-lo. É a sua conformidade, a sua boa natureza, o seu sentido de humor, que nos perturbam. Num ambiente em que pessoas estão a ser testadas subrepticiamente, num plano maior em que serão de novo atiradas à guerra, é patológico o comportamento afável e dócil de Cruz. Sofremos ao perceber que ele não percebe. Não me lembro de ver outra história assim, outra personagem tão genuinamente encantadora e perturbadora.
September 24, 2022
#### #001120 - 24 de Setembro de 2022
A vida persistente das personagens é desconcertante. Encontram morada na imaginação, algumas mesmo no consciente colectivo. Tornam-se familiares, intervêm na cultura, mesmo sem dar entrevistas e sem sequer existirem. São mais amplas que a história que lhes deu vida. Sobrevivem aos autores, como bem sabia Flaubert sobre Mme Bovary.
#### #001119 - 23 de Setembro de 2022
Não me lembro do primeiro livro que escolhi ler, na biblioteca infantil, teria eu uns 7 ou 8 anos. Mas lembro-me de ali estar perante um adulto, e ter sido eu a escolher as páginas que me iriam ocupar nos próximos dias. Acto tão simples, tão impulsionador da liberdade.
#### #001118 - 22 de Setembro de 2022
Pré-adolescente, entrava na biblioteca da Figueira da Foz, com a bola de basket, vindo do campo, ainda suado. Ficava a ler Herberto Helder, ou desfolhava os arquivos à procura de um título que me chamasse a atenção ou a ver que livros havia dos autores de que intrigavam. Adulto, levo o leitor de ebooks na bicicleta. Ainda ligo o prazer do esforço físico ao estímulo proporcionado pela literatura. Aza Raskin recomenda que todos os dias tenhamos algum tempo de movimento consciente. O desporto é naturalmente flow, autotélico. A leitura é ainda mais que isso.
#### #001117 - 21 de Setembro de 2022
Li boa parte do Delhi, do Khushwant Singh, em cafés. Nessa altura, chegava sempre meia-hora, às vezes uma hora mais cedo aos encontros com os amigos. Ainda hoje me sabe bem estar numa sala de espera a ler. O livro é esse amigo essencial, que me transporta através do tempo, aniquilando o tédio e a ansiedade.
#### #001116 - 20 de Setembro de 2022
Penny-farthing. Há quadros do final do século XIX que mostram grupos de aristocratas e pedalar numa estrada de campo. Estes biciclos foram rapidamente substituídos pelas bicicletas modernas, ainda no mesmo século. Os novos veículos foram publicitados como bicletas seguras. Pedalar uma penny-farthing em estrada, parece-me uma bizarra mistura de excentricidade e desporto radical. Ainda assim, são parte da história das viagens de bicicletas, por mais inverossímil que isso seja. Hoje, há quem faça viagens de longo curso em monociclos com alforges, como o Wally Watts nos anos 1970 ou Ed Pratt recentemente.