Sobre o hábito de se referir a animais de estimação como “filhos”
Primeiramente, feliz segunda-feira. Não entendo por que odiar a segunda feira. A segunda-feira é como um mini Ano Novo; você pode tentar tudo de novo e estabelecer novos objetivos de self-improvement. Se não deu certo na semana passada, você ao menos tem outra chance hoje.
Se você meter na cabeça a perspectiva de que só perdedores sem objetivos ou ambição reclamam de ter que trabalhar (te garanto que o Bill Gates, Sílvio Santos ou Richard Branson nunca ficaram reclamando que era segunda-feira), talvez você passe a ver as segundas-feiras de forma diferente.
Mas se você realmente precisa de algo pra animar seu humor, tome aí.

Melhorou?
Mas vamos ao post de hoje!
Tu pode xingar o time do sujeito, o deus que ele segue, seu partido político e até mesmo a mãe. Já testei todos estes e descobri empiricamente que aparentemente nada ofende mais alguém do que comentários sobre animais de estimação.
Eu e a Patroa agora temos um gato, como já informei há algum tempo aqui no blog. Descobri rapidinho que a Sociedade Protetora dos Animais tem muitos representantes nas redes sociais, e que adoram dar conselhos não-requisitados sobre como cuidar dos bichos. Uma garota chegou a (furiosamente) insinuar que aparar a pontinha das unhas do gato (pra que ele pare de rasgar minhas pernas quando pula no meu colo) seria o mesmo que AMPUTAR o gato, por exemplo.
Aceitei isso como uma característica dos amantes dos animais e aprendi a aceitá-los como são, pela boa convivência internética. Só que tem UM hábito dessa galera que eu não consigo engolir.
Se referir aos animais como filhos deles.

“Me desculpe cachorrinho mas zoofilia é crime, portanto não posso casar com seu pai”
Olha, eu entendo o sentimento. Tive cachorros durante toda a minha infância — certamente a feature dela que mais sinto falta por não poder recuperar hoje; apartamentos alugados que permitem cachorros são raríssimos aqui — portanto entendo SIM o apego que uma família desenvolve em relação aos bichos. Um dos momentos mais tristes da minha juventude foi quando o cachorro do meu irmão, um poodle chamado Alf, foi… pera, preciso explicar porque diabos meu irmão tinha um poodle, e ainda por cima um chamado “Alf”.
Era o seguinte. Meu pai tinha um colega de trabalho com uma esposa meio dondoca; a mulher um dia deu de criar poodles. Vá entender.
Os filhos da mulher se encarregaram em dar nomes pros bichinhos, apesar do fato de que era uma péssima idéia porque ela pretendia vender os bichos e um cachorro com nome já embutido seria uma merda pro novo dono. Antes que você chilique que “aiiin mas cachorro não se compra cachorro se adota meeeeu” — esta história aconteceu no começo dos anos 90. Naquela época podia TUDO rapá, tu não tem noção. O politicamente correto ainda não havia sido inventado.
Então, os garotos decidiram dar nomes de coleguinhas de sala aos cachorros — com intuito de sacanear mesmo. E assim um dos cachorrinhos foi batizado de ALFREDO, um nome infeliz pra caramba até pra ser humano, imagina pra um cachorro.
Calhou que minha mãe comprou esse cachorrinho pro meu irmão, mas o peste já estava relativamente acostumado com a sonoridade de ALFREDO. Meu irmão, um gênio, teve a idéia de chama-lo de algo similar o bastante pra que o cachorro respondesse aos comandos, e assim aos poucos aceitaria a nova alcunha. Assim, “Alfredo” virou “Alf” — um nome bem mais justificável.
O plano deu certo e a conversão foi total; quando os filhos do amigo do meu pai iam lá em casa e chamavam o cachorro de “Alfredo” meu irmão ficava putíssimo. “Você tem noção de quanto tempo demorou pra ele esquecer esse nome escroto que vocês deram pra ele, porra?!”
Pois bem. Uma das maiores tristezas foi o dia em que o Alf fugiu/foi sequestrado por algum malfeitor do bairro. A esperança de reaver o cachorrinho se diluindo à cada dia que se passava, a agonia de não saber que fim levou o bichinho, a revolta quando um colega da escola comentou, com total casualidade, que “a essa altura ele já virou sabão”. Foram dias horríveis.
Então, não me venham com esse papo de que eu sou desalmado e por isso não entendo a conexão que a família tem com um animal de estimação.
Acontece que eu acho a insinuação de ser “pai” de um animal meio… creepy. Cê tá ligado no processo biológico necessário pra gerar uma cria, né? Pra um overthinker como eu, apegado à literalidade de tudo, dizer que sou “pai” do Marshmallow implica dizer que eu conheci sua mãe biblicamente. Isso me causa arrepios de asco.
Alguém no tuíter falou que defender a literalidade do termo “pai” como progenitor da criatura em questão seria como dizer que dois gays não podem ser o “pai” de uma criança adotada. Sim, porque uma criança adotada e um ANIMAL IRRACIONAL DE ESTIMAÇÃO QUE VOCÊ PODE COMPRAR NA LOJA DA ESQUINA são seres equivalentes.
Sou o único que pensa assim? Não vejo meu gatinho como meu “filho” — se ter que cuidar da parada se equivale a paternidade, um carro e uma unha encravada são meus filhos também? –, tampouco como minha propriedade.
Eu pelo menos vejo como um companheiro. Como um amigo. Um amigo meio filho da puta às vezes, mas que amigo não é?

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