Breve História de Sete Assassinatos

Livro de Marlon James, Jamaica/EUA – 2014
Breve História de Sete Assassinatos me atraiu desde o seu lançamento. Muitos comparavam o romance com Ulysses de James Joyce, pelo tamanho e a complexidade da leitura. Além disso, era um romance jamaicano, ainda que seu autor vivesse há anos nos Estados Unidos, e eu conhecia muito pouco da realidade e nada da literatura daquele país. O terceiro elemento que me atraiu foi o núcleo central da trama, a história verídica do atentado a Bob Marley, dois dias antes do concerto pela paz que ele faria numa Jamaica polarizada às vésperas da eleição. Quem e porque estava por trás do atentado e como, apesar da enorme quantidade de tiros, alguns à queima-roupa, ninguém foi morto, é algo que despertou minha curiosidade, assim como a do autor que escolheu construir sua ficção em cima desse mistério verídico. O cantor e o atentado ao cantor são o centro da narrativa, ao menos na primeira parte e desse centro irradia-se tramas para todos os lados. Na segunda e, principalmente na terceira parte, os personagens dessas tramas seguem adiante, navegando por outros mares, porém ainda ligados ao evento longínquo.
Mais de uma dezena de personagens narra a epopeia marloniana, alguns mudam de nome ao longo de suas trajetórias, o que desafia o leitor ainda mais. O primeiro narrador é um fantasma e nesse primeiro capitulo o autor já apresenta um texto poderoso e altamente sofisticado, um sarrafo alto que nem sempre será alcançado no restante do livro. O livro altera gírias, jargões e idiomas, boa parte dele é narrado na linguagem das favelas de Kingston. Eu li em inglês, mas me auxiliei inicialmente da tradução em português, até pegar os sentidos das gírias e termos. Na tradução perde-se bastante dos duplos sentidos, trocadilhos e referências às letras de músicas, mas principalmente perde-se a sonoridade do texto na qual reside boa parte de sua força. Se você lê em inglês recomendo aplicar o mesmo método: ler o original com o auxílio da tradução nos primeiros capítulos e depois seguir em frente. O dicionário do Kindle também ajuda em termos de inglês mais antigo e de algumas gírias.
Além de muitas subtramas e personagens, o romance é recheado de violência. Violência radical, explícita, cruel e chocante. Violência que irriga os canais de comunicação entre as favelas, o poder político, a polícia, a CIA e os cartéis colombianos. Canais que ligam a geopolítica global da Guerra Fria dos anos 1970 e 80 com as disputas territoriais nas zonas mais esquecidas da empobrecida Jamaica. E questiona qual o papel da arte no meio de tanto conflito, ou melhor, se a arte chega a conseguir desempenhar um papel, ou acaba sendo tragada pelas forças em conflito. O sangue, terror e dores vertidos aos borbotões não são violência pela violência, mas parte de uma profunda reflexão sobre identidade e a herança da colonização/escravidão nas Américas.
Breve História de Sete Assassinatos obteve vários prêmios importantes, entre eles o Man Booker Award de 2015. No Brasil, o livro foi publicado pela editora Intrínseca em 2017, com tradução de André Czarnobai.
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