A Porta

Uma vibração percorre todo o meu corpo e desperta-me para a dor. Os meus ossos são sacudidos como se um terramoto tivesse o seu hipocentro dentro de mim. Abro os olhos em estado de choque. O que se passa? O que é isto?

O quarto está mergulhado numa luz esverdeada, doentia, sobrenatural. Olho para o meu corpo deitado na cama, coberto de suor e abalado violentamente por ondas sísmicas internas.

A intensidade aumenta e torna-se insuportável. Vou estilhaçar-me!

Tento gritar mas o ar é tão espesso como gelatina que abafa o som.

Isto não pode estar a acontecer! Só pode ser um sonho!

O meu cérebro luta para manter-se lúcido e sobreviver à dor.

Só pode ser um sonho! Repito vezes sem conta, até conseguir controlar o sofrimento real que o meu organismo está a experimentar.

Tenho que sair daqui! Tenho que acordar!

Ainda a ser atravessado por tremores de dor aguda, esforço-me por levantar da cama onde dormia até há instantes. Descubro com desespero, que a força da gravidade aumentou para o dobro e a atmosfera gelatinosa que me envolve, prende-me os movimentos.

Isto é só um sonho! Convenço-me. Eu consigo!

E com um esforço incrível de vontade e força física rasgo aquela substância pegajosa e avanço penosamente e com muito custo, rumo à porta do quarto.

Os abalos que me fustigam e drenavam a energia, ganham nova violência e espalham-se, agora, por todo o quarto. A própria matriz do Universo ameaça colapsar. Debato-me por manter o equilíbrio.

A porta está a poucos passos de distância mas aquela atmosfera densa, quase sólida, que me obriga a espremer-me para a atravessar, mais os tremores que abanam tudo que é interno e externo desta realidade contra-natura, tornam a minha progressão numa missão quase impossível!

A dor é insuportável! Estou esgotado! Não posso mais!

Conquisto mais um passo e a porta de saída fica mais próxima. A porta da minha salvação!

Tenho que conseguir!

Mais outro passo e estico a mão em direcção à maçaneta da porta, perfurando a gelatina que me envolve.

A dor! É tão intensa!

Estou quase a tocar-lhe com a ponta dos dedos. Estou quase a escapar deste inferno sísmico e gelatinoso de dor excruciante…

De repente, uma luz perfurante surge por detrás da porta, escapando-se pelas suas frinchas, atingindo-me os olhos. Fecho-os por reflexo.

O desespero invade-me como uma torrente furiosa e esmaga o meu espírito martirizado e esgotado. As dores não me dão tréguas. Estou a perder-me…

Não posso desistir! Volto a lutar para manter o controlo. Isto é só um sonho!

Semi-abro os olhos com receio de os ferir com a nova luminosidade e vejo a porta a ser abanada freneticamente por uma força invisível. Alguém ou alguma coisa está a tentar arrombá-la do lado de fora.

O que poderá ser? O que estará do outro lado?

Sinto medo.

A minha mão, presa pela gelatina, permanece esticada a uns meros milímetros da maçaneta.

Hesito em abri-la.

O que estará do outro lado?

O medo domina-me.

A porta ameaça saltar dos encaixes. O som dos abalos torna-se audível até se tornar insuportável. A sua violência é tanta que atinjo o ponto de saturação…

Acordo sobressaltado! Abro os olhos, aflito!

O quarto está mergulhado na penumbra. O mundo voltou ao normal!

Afundo-me na cama aliviado. O ar preguiçoso enche-me os pulmões sem pressa. O coração abranda o seu ritmo gradualmente até ficar sereno, quase imóvel, no meu peito. O corpo, ainda dorido pela experiência traumatizante, relaxa assim que esvazio os pulmões muito lentamente.

Sinto-me em segurança. Tudo não passou de um sonho…

Que sonho tão estranho e real!

Incrível! Ainda tenho dificuldade em digerir o que aconteceu…

Mas… agora que estou a salvo, fiquei curioso.

O que encontraria do outro lado se tivesse conseguido abrir a porta?
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Published on November 25, 2010 12:33
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