Ricardo Santos's Blog, page 2
November 18, 2018
Vem aí a 2ª edição da Estranha Bahia!
Agora posso anunciar. Galera, vem aí a 2ª edição da Estranha Bahia, nossa coletânea de contos de terror, fantasia e FC! Publicada originalmente em 2016, foi finalista do prêmio Argos 2017. Os contos foram revistos pelos autores. Furos de roteiro foram corrigidos, passagens foram reescritas ou cortadas. As histórias estão mais coesas e elegantes, além de ter ganhado uma nova revisão. O nosso projeto gráfico emulando as revistas pulp continua. O acabamento da edição será melhor, com capa cartão (antes era papel couchê) e costura mais robusta. Vamos gastar um dinheirinho em divulgação e tentar ser um pouco mais criativos na promoção do livro. E será mais fácil adquiri-lo por meio de loja virtual. O lançamento das edições digital e física será em março de 2019 a um preço atraente.
Published on November 18, 2018 07:07
November 15, 2018
Saiu conto novo!
Saiu um conto novo meu na Amazon. Uma ficção científica chamada Wonder, publicada originalmente na revista Trasgo número 15, em 2017. Em um mundo onde os wonders, crianças com uma inteligência nunca antes vista, tanto fascinam quanto causam temor, um pai especula sobre o futuro do seu filho que vai nascer. A vida dessa família nunca mais será a mesma. https://www.amazon.com.br/Wonder-Rica...
Published on November 15, 2018 18:50
October 21, 2018
Homem com Mochila saiu!!!
O meu "Homem com Mochila" saiu, galera! Este é um livro de viagens tratado como um livro-reportagem, em que o mais importante não é ir a lugares exuberantes nem entrevistar personalidades, e sim cobrir o cotidiano em outro ritmo, prestando atenção aos detalhes. Uma prova de que jornalismo sério, bem apurado, socialmente relevante, é feito também se cobrindo pautas “corriqueiras”. Tudo depende de como se conta a história. Me acompanhem nessa aventura de descobertas e autoconhecimento. https://www.amazon.com.br/Homem-com-M...
Published on October 21, 2018 08:39
October 8, 2018
Capítulo de "Homem com Mochila", meu livro de viagens
Neste dia do tão bravo nordestino, leiam um capítulo do meu livro de viagens que será lançado ainda em outubro:
A REVOLTA DE SEU JOSÉ
─ Como o senhor se chama?
─ José.
─ José de quê?
─ José de Souza.
O homem na poltrona vizinha se mostra disposto a tornar a viagem menos maçante. Não levo comigo nenhum aparelho de mp3 nem a paisagem me interessa. É uma repetição de cenas que já conheço: o sol inclemente castigando a terra seca, pós-apocalíptica.
O ônibus está lotado, inclusive com algumas pessoas em pé. Mas ninguém reclama. As viagens são curtas, rumo a povoados e municípios próximos de Vitória da Conquista. O ônibus não é dos melhores, mas está inteiro. Por não existir concorrência em boa parte dos trajetos que faz, a empresa se acha no direito de prestar um péssimo serviço aos seus passageiros.
─ A vida não é brincadeira não. A gente dá um duro danado pra, no final, dá só um pouquinho de dinheiro ─ diz seu José, me olhando com firmeza. Os olhos ternos dão mais gravidade às suas palavras.
Ele tem 60 anos. Foi agricultor quase a vida toda. As mãos calejadas comprovam isso. Assim como as dores nas costas e no joelho direito, que o levam todo mês do município de Caraíbas, onde mora com a mulher e dois filhos, a Vitória da Conquista; um trajeto de 65 km.
─ A verdade é que a médica disse que eu tinha de fazer fisioterapia duas vezes por semana... Mas me diga, como, meu amigo? Como eu faço essa mágica? Dois ônibus pra ir, dois pra voltar... toda semana.
O filho que vive em São Paulo, dono de uma pequena lanchonete em Jundiaí, paga seu plano de saúde.
A seca em 2007 foi uma das piores dos últimos anos. O governo federal, auxiliado pelo Exército, pôs em prática ações de abastecimento de água e distribuição de cestas básicas na maioria dos estados do Nordeste. Em alguns municípios baianos, principalmente no norte, nordeste e sudoeste do estado, não choveu por oito meses ou mais. No mês de setembro, o governador da Bahia, Jacques Wagner, declarou situação de emergência em 90 municípios.
─ Nunca precisei da caridade de ninguém. Sempre o que tive, tive com o suor do meu trabalho. Isso é desde molequinho. Meu pai era um bicho perverso danado, mas ele respeitava trabalhador.
Para seu José, tanto os eleitores como os governos são culpados, igualmente, pela pobreza do povo, pela falta de perspectivas:
─ Prefeito, governador, presidente, tudo uma decepção. Mas o povo também é besta. O problema é que ninguém pensa pra frente. Só quer saber do agora. Aí o cidadão vota por qualquer agradozinho. E o político para a obra do outro pra começar a sua. E a gente fica nisso a vida inteira.
A seca também o atingiu. Ele perdeu plantações de feijão e milho. Seu alento foram as criações de galinhas e cabras. E alguns serviços gerais, principalmente, como pedreiro e eletricista.
─ Aprendi tudo em São Paulo.
Segundo ele, ter ido para lá, há mais de trinta anos, foi, ao mesmo tempo, sua fortuna e desgraça:
─ Muito trabalho, muita humilhação. Mas aprendi tudo o que eu sei. Assim, coisa que não é da roça...
─ E por que voltou pra Bahia?
─ Cansaço... Foram oito anos.
Voltaram ele, dois filhos e a mulher. O filho mais velho resolveu ficar.
─ A seca tem jeito, seu José?
Ele me garante que sim. E, para provar isso, começa a falar sobre sistemas de irrigação:
─ A terra é boa, homem. O que falta é cuidado. Interesse dos político... Funciona assim: a gente aqui da região tem que puxar água do poço com bomba, de óleo diesel, ou na bateria, porque o lugar é acidentado, a plantação fica no alto. É um atraso. Coisa de antigamente. É tudo na mão, com mangueira. O ideal seria a irrigação de gotejamento. A água é levada de tubo até a raiz da planta. Fica pingando o tempo todo. É uma beleza. A gente economiza água e energia. Mas é um troço caro danado. Precisa de investimento. Mas cadê?
Ele não tem mais tempo para completar a resposta, para eu ouvi-la. A viagem termina para mim, tenho de descer do ônibus.
A REVOLTA DE SEU JOSÉ
─ Como o senhor se chama?
─ José.
─ José de quê?
─ José de Souza.
O homem na poltrona vizinha se mostra disposto a tornar a viagem menos maçante. Não levo comigo nenhum aparelho de mp3 nem a paisagem me interessa. É uma repetição de cenas que já conheço: o sol inclemente castigando a terra seca, pós-apocalíptica.
O ônibus está lotado, inclusive com algumas pessoas em pé. Mas ninguém reclama. As viagens são curtas, rumo a povoados e municípios próximos de Vitória da Conquista. O ônibus não é dos melhores, mas está inteiro. Por não existir concorrência em boa parte dos trajetos que faz, a empresa se acha no direito de prestar um péssimo serviço aos seus passageiros.
─ A vida não é brincadeira não. A gente dá um duro danado pra, no final, dá só um pouquinho de dinheiro ─ diz seu José, me olhando com firmeza. Os olhos ternos dão mais gravidade às suas palavras.
Ele tem 60 anos. Foi agricultor quase a vida toda. As mãos calejadas comprovam isso. Assim como as dores nas costas e no joelho direito, que o levam todo mês do município de Caraíbas, onde mora com a mulher e dois filhos, a Vitória da Conquista; um trajeto de 65 km.
─ A verdade é que a médica disse que eu tinha de fazer fisioterapia duas vezes por semana... Mas me diga, como, meu amigo? Como eu faço essa mágica? Dois ônibus pra ir, dois pra voltar... toda semana.
O filho que vive em São Paulo, dono de uma pequena lanchonete em Jundiaí, paga seu plano de saúde.
A seca em 2007 foi uma das piores dos últimos anos. O governo federal, auxiliado pelo Exército, pôs em prática ações de abastecimento de água e distribuição de cestas básicas na maioria dos estados do Nordeste. Em alguns municípios baianos, principalmente no norte, nordeste e sudoeste do estado, não choveu por oito meses ou mais. No mês de setembro, o governador da Bahia, Jacques Wagner, declarou situação de emergência em 90 municípios.
─ Nunca precisei da caridade de ninguém. Sempre o que tive, tive com o suor do meu trabalho. Isso é desde molequinho. Meu pai era um bicho perverso danado, mas ele respeitava trabalhador.
Para seu José, tanto os eleitores como os governos são culpados, igualmente, pela pobreza do povo, pela falta de perspectivas:
─ Prefeito, governador, presidente, tudo uma decepção. Mas o povo também é besta. O problema é que ninguém pensa pra frente. Só quer saber do agora. Aí o cidadão vota por qualquer agradozinho. E o político para a obra do outro pra começar a sua. E a gente fica nisso a vida inteira.
A seca também o atingiu. Ele perdeu plantações de feijão e milho. Seu alento foram as criações de galinhas e cabras. E alguns serviços gerais, principalmente, como pedreiro e eletricista.
─ Aprendi tudo em São Paulo.
Segundo ele, ter ido para lá, há mais de trinta anos, foi, ao mesmo tempo, sua fortuna e desgraça:
─ Muito trabalho, muita humilhação. Mas aprendi tudo o que eu sei. Assim, coisa que não é da roça...
─ E por que voltou pra Bahia?
─ Cansaço... Foram oito anos.
Voltaram ele, dois filhos e a mulher. O filho mais velho resolveu ficar.
─ A seca tem jeito, seu José?
Ele me garante que sim. E, para provar isso, começa a falar sobre sistemas de irrigação:
─ A terra é boa, homem. O que falta é cuidado. Interesse dos político... Funciona assim: a gente aqui da região tem que puxar água do poço com bomba, de óleo diesel, ou na bateria, porque o lugar é acidentado, a plantação fica no alto. É um atraso. Coisa de antigamente. É tudo na mão, com mangueira. O ideal seria a irrigação de gotejamento. A água é levada de tubo até a raiz da planta. Fica pingando o tempo todo. É uma beleza. A gente economiza água e energia. Mas é um troço caro danado. Precisa de investimento. Mas cadê?
Ele não tem mais tempo para completar a resposta, para eu ouvi-la. A viagem termina para mim, tenho de descer do ônibus.
Published on October 08, 2018 17:56
August 4, 2018
Homem com Mochila, meu livro de viagens, sai em setembro
Em 2008, publiquei, em formato de bolso, um livro de viagens chamado "Homem com Mochila". Na verdade, foi meu trabalho de conclusão do curso de jornalismo. Eu não queria fazer nada acadêmico. Então resolvi passar uma semana batendo perna sem rumo pelo interior da Bahia (na época, eu morava no interior). Foi uma experiência enriquecedora. Dez anos depois, sairá uma 2ª edição em e-book. O lançamento será em setembro. Leiam um trecho do primeiro capítulo:
A hora passa, a temperatura sobe. O ritmo da maioria das pessoas na rodoviária é lento, inclusive o dos motoristas à espera da próxima partida e dos que acabaram de chegar, dos funcionários das empresas de ônibus fora e dentro dos guichês, do pessoal da limpeza e de quem mais trabalha por aqui, na loja Frutas 24h, na Bombonière e Sorvetes, na Sabor da Terra, na Banca Conquista, na Lembranças Conquista, na SM Conveniências, no restaurante Palheta, no guarda-volumes e no ponto de táxi. Será sono? Cansaço? Tédio? Só quando um ônibus chega e para na plataforma de embarque/desembarque é que se dá um novo momento de euforia. O motorista desce do ônibus, alguns passageiros também (vão ao banheiro, compram lanches, uma minoria desembarca), e aí as pessoas se aproximam com suas bagagens. São caixas de papelão e sacos plásticos de todos os tamanhos. Às vezes, uma pilha de caixas e um monte de sacos pertencem a um só grupo, ou mesmo a um só homem. Malas de todas as cores e formatos permanecem sempre juntas ao corpo, seja no chão, quando as pessoas estão de pé, ou sob o braço. Também servem como encosto, quando as pessoas estão sentadas nas fileiras de assentos plásticos na área externa, junto à plataforma. São mulheres, homens, crianças e velhos que conversam, cochilam, comem ou não falam nada, permanecendo quietos, com o olhar mirando o vazio ou quem está ao redor.
Uma mulher de uns quarenta anos brinca com uma menina de seis, sete. As duas estão numa fileira de assentos plásticos na área externa da rodoviária, do meu lado esquerdo, perpendicular à minha fileira, feito uma letra L. A mulher é gorda, tem pele morena, cabelo longo, preto e amarrado, veste uma saia marrom, que bate nos joelhos, e um moletom bege. A menina é muito parecida com ela, à exceção de ser magrinha e vestir um conjunto de frio cinza-escuro. Para afugentar a sisudez da roupa, a menina força a mulher a participar de sua brincadeira. Cheia de entusiasmo, a menina bate duas palmas rápidas e fala alguma coisa para a mulher (o que parece ser uma pergunta). Esta também fala alguma coisa (o que parece ser uma resposta) e também bate duas palmas, não tão rápidas assim, e sem esse entusiasmo todo. A brincadeira continua.
Enquanto faço anotações no meu caderninho de bolso, em ritmo frenético, de cabeça baixa, decido olhar para o meu lado direito. Alguns assentos adiante na minha fileira, um casal de velhos me encara, com espanto e desconfiança. Encaro-os de volta, duramente, desafiador. Eles então desviam o olhar. Sigo com as minhas anotações. Até que, num impulso, me levanto, coloco a mochila nas costas e vou até eles.
─ Bom dia ─ digo, tentando ser o mais simpático possível, para recomeçar tudo de outra forma.
─ Bom dia ─ eles respondem ao mesmo tempo, ainda ressabiados.
─ Eu sou jornalista e tô fazendo uma viagem pela Bahia. Será que eu poderia conversar um pouquinho com o senhor e a senhora?
Eles não sabem o que dizer. Mas visivelmente estão mais tranquilos.
─ Falar o quê, meu filho? ─ pergunta a senhora, ensaiando um sorriso.
─ Vocês estão indo pra onde?
─ Eunápolis ─ diz o senhor.
Na verdade, são mãe e filho. Agora percebo pela semelhança dos traços e os mesmos olhos azuis. Ela tem 68 anos e usa um longo vestido azul-claro, estampado com muitas florzinhas. Me lembra uma sobrevivente judia de um documentário sobre o holocausto que vi na televisão numa noite de insônia. Tem a mesma tristeza constante no rosto exaurido. Ela se chama Zenaide, dona Zenaide. Já o nome dele é Roberto, seu Roberto. Ele é o segundo mais velho de um total de oito irmãos.
─ É 51 ano nas costa.
A barba está por fazer e na camisa social, de cor salmão, surrada, falta um dos botões do meio. Estão indo para casa. Passaram o final de semana em Vitória da Conquista para visitar uma irmã de dona Zenaide e sua família, que moram na cidade há muitos anos. A irmã, Zilda, sofreu um acidente de carro. Estava com o marido e a filha caçula na Rio-Bahia quando houve um pequeno engavetamento. Ela quebrou a perna e teve escoriações pelo corpo. A filha, no banco de trás, bateu o rosto no banco do carona e teve um corte na testa. O marido partiu a boca no volante. Como tudo começou? De quem foi a culpa? Os dois não sabem ou não querem dizer. Seu Roberto me pergunta em qual jornal trabalho. Respondo que em nenhum.
─ É pra um livro de viagens.
Eles se agitam. O ônibus deles chegou. E também mais outro. Me despeço e agradeço pela conversa. Volto para meu lugar e abro meu caderninho de bolso. Eles permanecem sentados mais alguns minutos, até diminuir a nova aglomeração de gente e de bagagens.
Jequié, Itapetinga, Guanambi, Barra do Choça, Itabuna, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Vale do Café, Mossoró... Os destinos são muitos.
─ A maioria das vezes são viagens a trabalho e por causa de problema de saúde ─ diz Bruno, com um chiclete na boca. Ele tem 18 anos, um cara bonito, de pele morena, vestindo jeans e camisa polo. É agente de vendas de uma das empresas de ônibus. Antes de puxá-lo para uma rápida conversa, ele tirava passagens junto a um ônibus que iria a São Paulo. Desta vez consigo usar o gravador.
─ As pessoas vão trabalhar e se tratar, do coração, câncer. Na capital, Campinas, Osasco. É muito comum. Só no final do ano que é mais a passeio, todo mundo volta pra suas cidades.
─ Você já viu estrangeiros por aqui?
─ Já. Americano, belga, canadense...
─ E faziam o quê?
─ Intercâmbio. Estudantes.
***
E aqueles que ficam? Que não vão a lugar nenhum? Como o pequeno Luan? Antes de ele se aproximar, já sei o que pretende.
─ Tem um trocado pro café?
É um menino negro, a camisa do Palmeiras passando da cintura do short e de boné vermelho.
─ Onde tá sua mãe?
─ Tá ali na porta da rodoviária.
─ Você tem irmãos?
─ Quatro. Eu sou o mais velho.
Me espanto quando revela ter 12 anos. Pelo tamanho, parece ter bem menos.
─ E a escola?
─ Ah, essa pergunta de novo!
Então ele se acalma e jura que estuda à tarde.
Mesmo sabendo que talvez não seja uma boa ideia, entrego a ele uma moeda de 50 centavos.
Cheguei à rodoviária sem nem saber se existia horário pela manhã rumo à minha primeira parada. Por isso, tive que esperar mais de duas horas até meu ônibus aparecer.
Cerca de vinte minutos antes de embarcar, vejo que a mulher e a menina que brincavam ainda estão ali. Agora sem os moletons, sentadas uma do lado da outra, quietas e aborrecidas.
A hora passa, a temperatura sobe. O ritmo da maioria das pessoas na rodoviária é lento, inclusive o dos motoristas à espera da próxima partida e dos que acabaram de chegar, dos funcionários das empresas de ônibus fora e dentro dos guichês, do pessoal da limpeza e de quem mais trabalha por aqui, na loja Frutas 24h, na Bombonière e Sorvetes, na Sabor da Terra, na Banca Conquista, na Lembranças Conquista, na SM Conveniências, no restaurante Palheta, no guarda-volumes e no ponto de táxi. Será sono? Cansaço? Tédio? Só quando um ônibus chega e para na plataforma de embarque/desembarque é que se dá um novo momento de euforia. O motorista desce do ônibus, alguns passageiros também (vão ao banheiro, compram lanches, uma minoria desembarca), e aí as pessoas se aproximam com suas bagagens. São caixas de papelão e sacos plásticos de todos os tamanhos. Às vezes, uma pilha de caixas e um monte de sacos pertencem a um só grupo, ou mesmo a um só homem. Malas de todas as cores e formatos permanecem sempre juntas ao corpo, seja no chão, quando as pessoas estão de pé, ou sob o braço. Também servem como encosto, quando as pessoas estão sentadas nas fileiras de assentos plásticos na área externa, junto à plataforma. São mulheres, homens, crianças e velhos que conversam, cochilam, comem ou não falam nada, permanecendo quietos, com o olhar mirando o vazio ou quem está ao redor.
Uma mulher de uns quarenta anos brinca com uma menina de seis, sete. As duas estão numa fileira de assentos plásticos na área externa da rodoviária, do meu lado esquerdo, perpendicular à minha fileira, feito uma letra L. A mulher é gorda, tem pele morena, cabelo longo, preto e amarrado, veste uma saia marrom, que bate nos joelhos, e um moletom bege. A menina é muito parecida com ela, à exceção de ser magrinha e vestir um conjunto de frio cinza-escuro. Para afugentar a sisudez da roupa, a menina força a mulher a participar de sua brincadeira. Cheia de entusiasmo, a menina bate duas palmas rápidas e fala alguma coisa para a mulher (o que parece ser uma pergunta). Esta também fala alguma coisa (o que parece ser uma resposta) e também bate duas palmas, não tão rápidas assim, e sem esse entusiasmo todo. A brincadeira continua.
Enquanto faço anotações no meu caderninho de bolso, em ritmo frenético, de cabeça baixa, decido olhar para o meu lado direito. Alguns assentos adiante na minha fileira, um casal de velhos me encara, com espanto e desconfiança. Encaro-os de volta, duramente, desafiador. Eles então desviam o olhar. Sigo com as minhas anotações. Até que, num impulso, me levanto, coloco a mochila nas costas e vou até eles.
─ Bom dia ─ digo, tentando ser o mais simpático possível, para recomeçar tudo de outra forma.
─ Bom dia ─ eles respondem ao mesmo tempo, ainda ressabiados.
─ Eu sou jornalista e tô fazendo uma viagem pela Bahia. Será que eu poderia conversar um pouquinho com o senhor e a senhora?
Eles não sabem o que dizer. Mas visivelmente estão mais tranquilos.
─ Falar o quê, meu filho? ─ pergunta a senhora, ensaiando um sorriso.
─ Vocês estão indo pra onde?
─ Eunápolis ─ diz o senhor.
Na verdade, são mãe e filho. Agora percebo pela semelhança dos traços e os mesmos olhos azuis. Ela tem 68 anos e usa um longo vestido azul-claro, estampado com muitas florzinhas. Me lembra uma sobrevivente judia de um documentário sobre o holocausto que vi na televisão numa noite de insônia. Tem a mesma tristeza constante no rosto exaurido. Ela se chama Zenaide, dona Zenaide. Já o nome dele é Roberto, seu Roberto. Ele é o segundo mais velho de um total de oito irmãos.
─ É 51 ano nas costa.
A barba está por fazer e na camisa social, de cor salmão, surrada, falta um dos botões do meio. Estão indo para casa. Passaram o final de semana em Vitória da Conquista para visitar uma irmã de dona Zenaide e sua família, que moram na cidade há muitos anos. A irmã, Zilda, sofreu um acidente de carro. Estava com o marido e a filha caçula na Rio-Bahia quando houve um pequeno engavetamento. Ela quebrou a perna e teve escoriações pelo corpo. A filha, no banco de trás, bateu o rosto no banco do carona e teve um corte na testa. O marido partiu a boca no volante. Como tudo começou? De quem foi a culpa? Os dois não sabem ou não querem dizer. Seu Roberto me pergunta em qual jornal trabalho. Respondo que em nenhum.
─ É pra um livro de viagens.
Eles se agitam. O ônibus deles chegou. E também mais outro. Me despeço e agradeço pela conversa. Volto para meu lugar e abro meu caderninho de bolso. Eles permanecem sentados mais alguns minutos, até diminuir a nova aglomeração de gente e de bagagens.
Jequié, Itapetinga, Guanambi, Barra do Choça, Itabuna, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Vale do Café, Mossoró... Os destinos são muitos.
─ A maioria das vezes são viagens a trabalho e por causa de problema de saúde ─ diz Bruno, com um chiclete na boca. Ele tem 18 anos, um cara bonito, de pele morena, vestindo jeans e camisa polo. É agente de vendas de uma das empresas de ônibus. Antes de puxá-lo para uma rápida conversa, ele tirava passagens junto a um ônibus que iria a São Paulo. Desta vez consigo usar o gravador.
─ As pessoas vão trabalhar e se tratar, do coração, câncer. Na capital, Campinas, Osasco. É muito comum. Só no final do ano que é mais a passeio, todo mundo volta pra suas cidades.
─ Você já viu estrangeiros por aqui?
─ Já. Americano, belga, canadense...
─ E faziam o quê?
─ Intercâmbio. Estudantes.
***
E aqueles que ficam? Que não vão a lugar nenhum? Como o pequeno Luan? Antes de ele se aproximar, já sei o que pretende.
─ Tem um trocado pro café?
É um menino negro, a camisa do Palmeiras passando da cintura do short e de boné vermelho.
─ Onde tá sua mãe?
─ Tá ali na porta da rodoviária.
─ Você tem irmãos?
─ Quatro. Eu sou o mais velho.
Me espanto quando revela ter 12 anos. Pelo tamanho, parece ter bem menos.
─ E a escola?
─ Ah, essa pergunta de novo!
Então ele se acalma e jura que estuda à tarde.
Mesmo sabendo que talvez não seja uma boa ideia, entrego a ele uma moeda de 50 centavos.
Cheguei à rodoviária sem nem saber se existia horário pela manhã rumo à minha primeira parada. Por isso, tive que esperar mais de duas horas até meu ônibus aparecer.
Cerca de vinte minutos antes de embarcar, vejo que a mulher e a menina que brincavam ainda estão ali. Agora sem os moletons, sentadas uma do lado da outra, quietas e aborrecidas.
Published on August 04, 2018 07:05
July 28, 2018
Noite Invisível, meu livro de contos
Aqui vai o primeiro capítulo da noveleta "Noite Invisível", que dá título ao meu livro de contos de FC, terror e fantasia. Serão 15 contos num total de umas 60 mil palavras. Terá desde flash fictions a noveletas mais robustas. Reunirá histórias já publicadas em sites, revistas e coletâneas com nova revisão e coisas inéditas. Nos últimos quinze anos, tenho aprendido cada vez mais, com amigos, conhecidos e gente que admiro espalhada por aí, como um mundo cheio de diversidade é bem mais interessante e saudável. Mais do que juntar uns contos para publicar, esse livro foi pensado como a minha visão de autor de literatura fantástica hétero não-branco sobre vários temas contemporâneos, como homofobia, imigração, racismo, liberdade de culto, os papéis da mulher, fluidez de gênero, as consequências do capitalismo, sonhos anarquistas, "ecosuicídio" e por aí vai. O livro tem contos sombrios, mas também tem otimismo e até humor, vejam só! Pelo menos, uns betas bem críticos me disseram que realmente escrevi umas bizarrices divertidas. Também quero brincar um pouco com forma e conteúdo. E é por isso que eu amo tanto o formato do conto com suas possibilidades de experimentação. Alguns das melhores ficções gringas que estou lendo há algum tempo tem essa pegada de mostrar outras formas de fazer FC, terror e fantasia. E ótimos (mas infelizmente poucos) autores nacionais também estão seguindo esse caminho. Segundo semestre de 2019 é uma previsão realista de lançamento do livro. Vai ter versão em e-book e física, preparação de texto, leitura sensível, revisão, capa foda e projeto gráfico. Pode sair independente ou por editora pequena e séria, quem sabe? Esse trecho do primeiro capítulo ainda não está revisado e pode sofrer alterações. Todas as críticas construtivas são bem-vindas 😉:
1
Eu não conseguia respirar direito.
Estava encostada na lateral de um restaurante, no centro de Salvador, na região do Comércio. Era tarde da noite. Tudo estava fechado. Não havia ninguém estranho por perto, civil ou noturno. Apenas Oko.
─ Não me diga que vai vomitar? ─ ele perguntou, fazendo uma careta.
─ Sai fora ─ eu disse, de cabeça baixa.
Eu tentava recuperar o fôlego. A aporrinhação de Oko não ajudava em nada.
Não estava sentindo frio nem calor. Fome ou sede. Mas minha barriga doía mesmo assim.
E o coração estava acelerado.
Eu queria voltar para casa. Mas sabia que não podia fazer isso. Não podia voltar de mãos vazias. Tinha que voltar com o pagamento pelo serviço feito. Aliás, bem feito. A prova do meu triunfo.
─ A gente vai se atrasar ─ Oko alertou.
Eu estava nervosa. Não seria melhor dizer: estava com medo? Medo de falhar, de morrer, ou de sofrer coisa pior? De ser capturada pelos carcereiros? Ou até mesmo de sofrer alguma violência do meu cliente?
O que eu sabia dele? Apenas um nome: Azohá. E uma descrição vaga: ele tinha uma pele tão grossa e manchada quanto casca de árvore e quatro braços.
Mas até que ponto ele era perigoso? Qual tinha sido seu crime?
Nem minha mãe nem meu avô responderam a estas perguntas. Na verdade, eu nem as fizera. De certa maneira, ficara triste por não ouvir as respostas espontaneamente. Era como se minha mãe e meu avô não ligassem.
No fundo, eu tinha consciência qual era a intenção de minha mãe. Ela queria me tornar uma burladora impecável, forjada na adversidade.
Eu precisava aplicar o que sabia, o que me fora ensinado. Contando apenas com a proteção do meu olheiro, no caso Oko, e dos oxanás.
Mesmo assim, eu estava triste. Minha mãe é uma mulher justa, mas dura, de poucas palavras. Meu avô, parceiro de longas conversas, poderia ter dito algo mais. Porém ele mal quis receber a neta antes de eu partir para minha iniciação. “Seu destino pertence aos oxanás.” Foram as últimas palavras do meu avô. Aliás, mais Mestre Zuma do que vô Zumiro, naquele momento, em toda sua presença e autoridade.
Eu sei que os oxanás tudo governam, mas também sei que meu destino pertence a mim. Cabe aos oxanás me proteger, como um pai e uma mãe amorosos protegem os caminhos de uma filha querida. O resto é comigo. Que bosta.
Naquela noite, depois de eu respirar realmente fundo, a barriga doeu menos. O coração ficou menos acelerado. A respiração menos afoita.
Eu não me se sentia pronta. Mas essa era minha escolha. Qualquer outra decisão seria difícil de suportar. Até mais difícil do que o medo que perturbava minha mente, tirava minha paz.
Então, descolei da parede. Peguei minha mochila na calçada e coloquei nas costas. Eu e Oko continuamos nossa caminhada até o local combinado.
Comecei a andar apressada. Realmente os clientes ficavam nervosos com atrasos.
Oko forçava o passo. Eu tinha de acompanhar o ritmo dele. Afinal, eu era a mecânica, a encarregada daquele serviço. Eu andava e minha mochila balançava um pouco nas costas, carregando meu notebook, um HD externo, cabos e outros trecos.
Quando a noite cai, a cidade se transforma. A maioria das pessoas não percebe isso. Apenas nós burladores.
Cinco noites antes, eu andava por aquelas mesmas ruas, na companhia de minha mãe. Eu me sentia mais segura, mais dona de mim, até um pouco arrogante. Agora era o oposto.
Muitas vezes, à noite, eu passo pelas ruas, pelas pessoas e vejo o que outros, bem ao lado, sequer imaginam existir. Não me canso de pensar como reagiriam se soubessem o que se esconde nas sombras. Sempre me vem à cabeça as piores consequências.
Quando saio, mesmo sem minha mãe, alguns noturnos que encontro pelo caminho sentem minha presença. Reconhecem meu rosto. A filha de Naqane, a Feiticeira. Minha mãe ganhou esse apelido por causa de suas habilidades como mecânica. Ela consegue burlar qualquer trava inventada pelos carcereiros. Até hoje ela nunca falhou. Programadora de dia, Feiticeira à noite.
Na verdade, civis também podem ver os noturnos, mas apenas os metamorfos, quando na forma humana, ou aqueles com poderes hipnóticos, que podem enganar qualquer um, fazendo-o acreditar que o ser à sua frente, por mais bizarro que seja, não passa de alguém com um hálito terrível. Então estes noturnos se misturam aos notívagos, curtindo festas e boates na madrugada ou ganhando a vida enquanto muitos dormem, em trabalhos pagos em dinheiro, sem muitas perguntas. Os mais impacientes ou incontroláveis partem direto para o crime, para o roubo, cometem até assassinatos. Certos noturnos adoram o gosto da carne humana. Ainda mais numa cidade como Salvador, sem vacas, cavalos ou animais selvagens. Grande parte dos noturnos vive nas sombras, o tempo todo, presos a suas formas originais, monitorados constantemente pelos carcereiros, ou seja, travados. Sem conseguir usar seus poderes, sobrevivendo miseravelmente, um tormento sem fim. Ser destravado por um burlador significa uma vida melhor no exílio.
1
Eu não conseguia respirar direito.
Estava encostada na lateral de um restaurante, no centro de Salvador, na região do Comércio. Era tarde da noite. Tudo estava fechado. Não havia ninguém estranho por perto, civil ou noturno. Apenas Oko.
─ Não me diga que vai vomitar? ─ ele perguntou, fazendo uma careta.
─ Sai fora ─ eu disse, de cabeça baixa.
Eu tentava recuperar o fôlego. A aporrinhação de Oko não ajudava em nada.
Não estava sentindo frio nem calor. Fome ou sede. Mas minha barriga doía mesmo assim.
E o coração estava acelerado.
Eu queria voltar para casa. Mas sabia que não podia fazer isso. Não podia voltar de mãos vazias. Tinha que voltar com o pagamento pelo serviço feito. Aliás, bem feito. A prova do meu triunfo.
─ A gente vai se atrasar ─ Oko alertou.
Eu estava nervosa. Não seria melhor dizer: estava com medo? Medo de falhar, de morrer, ou de sofrer coisa pior? De ser capturada pelos carcereiros? Ou até mesmo de sofrer alguma violência do meu cliente?
O que eu sabia dele? Apenas um nome: Azohá. E uma descrição vaga: ele tinha uma pele tão grossa e manchada quanto casca de árvore e quatro braços.
Mas até que ponto ele era perigoso? Qual tinha sido seu crime?
Nem minha mãe nem meu avô responderam a estas perguntas. Na verdade, eu nem as fizera. De certa maneira, ficara triste por não ouvir as respostas espontaneamente. Era como se minha mãe e meu avô não ligassem.
No fundo, eu tinha consciência qual era a intenção de minha mãe. Ela queria me tornar uma burladora impecável, forjada na adversidade.
Eu precisava aplicar o que sabia, o que me fora ensinado. Contando apenas com a proteção do meu olheiro, no caso Oko, e dos oxanás.
Mesmo assim, eu estava triste. Minha mãe é uma mulher justa, mas dura, de poucas palavras. Meu avô, parceiro de longas conversas, poderia ter dito algo mais. Porém ele mal quis receber a neta antes de eu partir para minha iniciação. “Seu destino pertence aos oxanás.” Foram as últimas palavras do meu avô. Aliás, mais Mestre Zuma do que vô Zumiro, naquele momento, em toda sua presença e autoridade.
Eu sei que os oxanás tudo governam, mas também sei que meu destino pertence a mim. Cabe aos oxanás me proteger, como um pai e uma mãe amorosos protegem os caminhos de uma filha querida. O resto é comigo. Que bosta.
Naquela noite, depois de eu respirar realmente fundo, a barriga doeu menos. O coração ficou menos acelerado. A respiração menos afoita.
Eu não me se sentia pronta. Mas essa era minha escolha. Qualquer outra decisão seria difícil de suportar. Até mais difícil do que o medo que perturbava minha mente, tirava minha paz.
Então, descolei da parede. Peguei minha mochila na calçada e coloquei nas costas. Eu e Oko continuamos nossa caminhada até o local combinado.
Comecei a andar apressada. Realmente os clientes ficavam nervosos com atrasos.
Oko forçava o passo. Eu tinha de acompanhar o ritmo dele. Afinal, eu era a mecânica, a encarregada daquele serviço. Eu andava e minha mochila balançava um pouco nas costas, carregando meu notebook, um HD externo, cabos e outros trecos.
Quando a noite cai, a cidade se transforma. A maioria das pessoas não percebe isso. Apenas nós burladores.
Cinco noites antes, eu andava por aquelas mesmas ruas, na companhia de minha mãe. Eu me sentia mais segura, mais dona de mim, até um pouco arrogante. Agora era o oposto.
Muitas vezes, à noite, eu passo pelas ruas, pelas pessoas e vejo o que outros, bem ao lado, sequer imaginam existir. Não me canso de pensar como reagiriam se soubessem o que se esconde nas sombras. Sempre me vem à cabeça as piores consequências.
Quando saio, mesmo sem minha mãe, alguns noturnos que encontro pelo caminho sentem minha presença. Reconhecem meu rosto. A filha de Naqane, a Feiticeira. Minha mãe ganhou esse apelido por causa de suas habilidades como mecânica. Ela consegue burlar qualquer trava inventada pelos carcereiros. Até hoje ela nunca falhou. Programadora de dia, Feiticeira à noite.
Na verdade, civis também podem ver os noturnos, mas apenas os metamorfos, quando na forma humana, ou aqueles com poderes hipnóticos, que podem enganar qualquer um, fazendo-o acreditar que o ser à sua frente, por mais bizarro que seja, não passa de alguém com um hálito terrível. Então estes noturnos se misturam aos notívagos, curtindo festas e boates na madrugada ou ganhando a vida enquanto muitos dormem, em trabalhos pagos em dinheiro, sem muitas perguntas. Os mais impacientes ou incontroláveis partem direto para o crime, para o roubo, cometem até assassinatos. Certos noturnos adoram o gosto da carne humana. Ainda mais numa cidade como Salvador, sem vacas, cavalos ou animais selvagens. Grande parte dos noturnos vive nas sombras, o tempo todo, presos a suas formas originais, monitorados constantemente pelos carcereiros, ou seja, travados. Sem conseguir usar seus poderes, sobrevivendo miseravelmente, um tormento sem fim. Ser destravado por um burlador significa uma vida melhor no exílio.
Published on July 28, 2018 12:23
July 7, 2018
Início do meu romance Os Furiosos
Provável começo do meu romance Os Furiosos, minha salada de FC, terror e fantasia. Texto sem revisão:
1
Vagner estava naquela festa de gente da alta, sentindo-se fora de lugar, irritado, exausto, principalmente, mais confuso do que nunca sobre sua relação com Naira. Mas tudo isso deixou de ter importância, no momento em que Naira perfurou o olho da garotinha com uma faca de mesa.
Mais ou menos, meia hora antes de o sangue jorrar e ouvirem-se os gritos de muitos convidados, Vagner sentiu uma tontura mais forte. Mesmo já acostumado, a cabeça pesou, o corpo sofreu o baque, ele perdeu o equilíbrio. Ainda bem que estava sentado à mesa, com Naira na cadeira ao lado para socorrê-lo.
─ Mas que porra... ─ ela disse, no susto, pegando no braço de Vagner. Evitou assim que ele desse de cara contra o piso do salão.
Vagner sentiu a força da tração o puxando de volta. Tudo girava ao redor.
Ele se acomodou na cadeira.
Tomou fôlego. Respirou fundo. E virou-se para Naira.
A visão ainda estava confusa. Mas vê-la multiplicada e mesmo indefinida lhe deu certo alívio.
O coração estava acelerado. O conhecido gosto metálico invadiu sua boca. Ele precisava de uma bebida urgente.
A vantagem de ser uma pessoa desenganada pelos médicos é que você não precisa pensar no dia de amanhã. Beba à vontade, coma à vontade, foda à vontade. Se tiver estômago e fôlego para aguentar. E com dinheiro no bolso é sempre melhor.
─ Vagner, Vagner ─ Naira tentava guiá-lo com a voz baixa, agitada. Tentava mantê-lo calmo e focado nela. Uma maneira de fazer a mente dele parar de rodar.
─ Minha boca tá seca.
A impressão dele foi de que as palavras saíram todas decentemente.
Vagner não entendeu direito como, mas um copo chegou à sua boca. Mais uma dose do uísque puro, de primeira, que estava tomando.
1
Vagner estava naquela festa de gente da alta, sentindo-se fora de lugar, irritado, exausto, principalmente, mais confuso do que nunca sobre sua relação com Naira. Mas tudo isso deixou de ter importância, no momento em que Naira perfurou o olho da garotinha com uma faca de mesa.
Mais ou menos, meia hora antes de o sangue jorrar e ouvirem-se os gritos de muitos convidados, Vagner sentiu uma tontura mais forte. Mesmo já acostumado, a cabeça pesou, o corpo sofreu o baque, ele perdeu o equilíbrio. Ainda bem que estava sentado à mesa, com Naira na cadeira ao lado para socorrê-lo.
─ Mas que porra... ─ ela disse, no susto, pegando no braço de Vagner. Evitou assim que ele desse de cara contra o piso do salão.
Vagner sentiu a força da tração o puxando de volta. Tudo girava ao redor.
Ele se acomodou na cadeira.
Tomou fôlego. Respirou fundo. E virou-se para Naira.
A visão ainda estava confusa. Mas vê-la multiplicada e mesmo indefinida lhe deu certo alívio.
O coração estava acelerado. O conhecido gosto metálico invadiu sua boca. Ele precisava de uma bebida urgente.
A vantagem de ser uma pessoa desenganada pelos médicos é que você não precisa pensar no dia de amanhã. Beba à vontade, coma à vontade, foda à vontade. Se tiver estômago e fôlego para aguentar. E com dinheiro no bolso é sempre melhor.
─ Vagner, Vagner ─ Naira tentava guiá-lo com a voz baixa, agitada. Tentava mantê-lo calmo e focado nela. Uma maneira de fazer a mente dele parar de rodar.
─ Minha boca tá seca.
A impressão dele foi de que as palavras saíram todas decentemente.
Vagner não entendeu direito como, mas um copo chegou à sua boca. Mais uma dose do uísque puro, de primeira, que estava tomando.
Published on July 07, 2018 17:20
May 27, 2018
A diferença entre perseverança e teimosia
Perseverança é algo fundamental para um escritor. Mas não pode ser confundida com teimosia. Aí já é burrice. Finalmente entendi que vai ser melhor para mim, em todos os sentidos, focar esforços no meu romance stand alone, passado numa Salvador atual, misturando ficção científica, terror e o fantástico. O primeiro volume da minha série de fantasia vai ficar na gaveta por tempo indeterminado.
Eis a premissa do meu romance com título de trabalho Os Furiosos: Vagner Dias é um jovem e ambicioso executivo negro que ralou muito para construir uma carreira de sucesso. Às vésperas de concretizar seu grande objetivo, trabalhar na matriz da empresa em Nova York, ele fica doente e descobre um tumor cerebral incurável. Ele se revolta contra tudo e todos. Sai de São Paulo e volta para sua Salvador natal. Lá acaba involuntariamente salvando um cara de ser espancado e morto por alguns homens de terno bem estranhos. Então Vagner conhece Jesus Estrada. Os dois se tornam amigos improváveis e sócios no tráfico de uma substância valiosíssima, de origem extraordinária, conhecida como Peido de Fada, ou apenas Pumf. Para tocar seu negócio, Vagner e Jesus vão enfrentar corporações lovecraftianas e um submundo do crime new weird. Comédia, drama, crítica social, celebração da diversidade. Os Furiosos vai divertir o leitor e fazê-lo pensar sobre a ordem "natural" das coisas.
Eis a premissa do meu romance com título de trabalho Os Furiosos: Vagner Dias é um jovem e ambicioso executivo negro que ralou muito para construir uma carreira de sucesso. Às vésperas de concretizar seu grande objetivo, trabalhar na matriz da empresa em Nova York, ele fica doente e descobre um tumor cerebral incurável. Ele se revolta contra tudo e todos. Sai de São Paulo e volta para sua Salvador natal. Lá acaba involuntariamente salvando um cara de ser espancado e morto por alguns homens de terno bem estranhos. Então Vagner conhece Jesus Estrada. Os dois se tornam amigos improváveis e sócios no tráfico de uma substância valiosíssima, de origem extraordinária, conhecida como Peido de Fada, ou apenas Pumf. Para tocar seu negócio, Vagner e Jesus vão enfrentar corporações lovecraftianas e um submundo do crime new weird. Comédia, drama, crítica social, celebração da diversidade. Os Furiosos vai divertir o leitor e fazê-lo pensar sobre a ordem "natural" das coisas.
Published on May 27, 2018 09:16
May 20, 2018
Participando de coletânea de microcontos Sci-Fi
Pessoal, estou participando com 5 microcontos (págs.219 a 223) da seleção da coletânea Ocus Pocus High Tech, organizada pelo mestre Luiz Bras. Os 100 microcontos mais votados farão parte da edição final. https://www.facebook.com/ObjetoNaoIde...
Published on May 20, 2018 12:05
March 25, 2018
Meus próximos lançamentos
A melhor maneira de lidar com a ansiedade de livros seus que saem por editoras é tocar os projetos independentes. Para 2018, teremos:
- Lançamento da 2ª edição de Estranha Bahia, com contos revistos pelos autores (e-book e físico);
- Lançamento da 2ª edição do meu livro de viagens Homem com Mochila, publicado em 2008 (e-book);
- Lançamento de Noite Invisível, livro de contos meus já publicados e inéditos (e-book e físico).
- Lançamento da 2ª edição de Estranha Bahia, com contos revistos pelos autores (e-book e físico);
- Lançamento da 2ª edição do meu livro de viagens Homem com Mochila, publicado em 2008 (e-book);
- Lançamento de Noite Invisível, livro de contos meus já publicados e inéditos (e-book e físico).
Published on March 25, 2018 14:42


