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Para todos aqueles que, assim como eu, por algum tempo não conseguiram ver esperança no futuro. Ela existe, eu juro. Basta você estar aqui para ver.
Se não tivesse, não teria visto “Faça Um Pedido” e tantas outras histórias se tornarem verdade e chegarem a cada uma de vocês.
Com amor, Olivia Uviplais e Maeve Carter, as autoras.
A voz da minha mãe encheu minha mente com uma frase de eras atrás. “Faça um pedido”, Rebecca dizia a cada aniversário quando eu ainda era uma criança passível de ser amada. Quando garotinha, eu tinha pedido bicicletas, bonecas Barbie e viagens para Disney. Nada nunca tinha se realizado.
— Eu quero ser amada — disse baixinho, como se tivesse medo de ser ouvida, e assoprei fracamente. A luz causada pela pequena chama desapareceu e, de novo, tudo era escuridão.
A loirinha me deu um beijo meio babado enquanto a irmã subiu na cama, menos espoleta, para abraçar o pai, que fechou os olhos para apreciar o momento.
As crianças pareciam se sentir muito seguras comigo, uma mulher aleatória que estava na cama de seu pai. Seus bracinhos foram para meu pescoço e ela me abraçou apertado.
Eu perdi o fôlego por um segundo, e lágrimas imediatamente se formaram em meus olhos. Era muita crueldade. Quem quer que tivesse feito aquelas montagens estava brincando com meus sentimentos de maneira sádica, mostrando uma vida que eu nunca poderia ter. Lugar garantido no inferno.
Olhei para baixo. Entretanto, não foi a visão de nossas mãos dadas que me fez arfar, mas o delicado círculo de ouro no meu anelar. Uma aliança de casamento.
— Tenho certeza que ainda tem bolo do aniversário da mamãe e da Annie na cozinha. — Aquilo me fez questionar se eu dividia aniversário com a pequena que estava ao meu lado. Ele tinha convencido a criança que ela fazia aniversário junto comigo? Ou tinha me escolhido para aquela pegadinha porque eu tinha nascido no dia 24? Ou então era só canalha o suficiente para trazer para casa uma desconhecida no dia do aniversário da filha? — É meu bolo também, pai! — a garotinha no colo protestou e o homem gargalhou.
— Queremos ver os presentes logo, papai! — Zola, a garotinha cacheada e elétrica, bradou, jogando os bracinhos para o ar em animação enquanto a irmã tapou a boca para rir. Em outra situação, eu teria rido, porque aquela menina era claramente uma das minhas. Mas, naquele momento, tudo que eu conseguia fazer era ficar parada, confusa, e me perguntando como eu os distrairia para ir embora.
A vela... Um vinco se formou involuntariamente entre as minhas sobrancelhas, e me lembrei de minhas palavras antes de assoprá-la. Eu quero ser amada. Não, não, não, não, não. — Você me ama? — perguntei, engasgada, para o homem que tinha me dado o cupcake. Seu rosto se tornou suave e seus olhos se derreteram para mim. — Eu te amo mais do que eu consigo expressar em palavras
Porra, porra, PORRA! Que merda tinha acontecido enquanto dormia? O que tudo aquilo significava? Eu estava na porra de De Repente 30? O que era tudo aquilo?
— Ah! Eu estava morto de saudades de vocês, minhas afilhadas lindas — era ele. Andy Stone, meu amigo de infância e adolescência com quem eu não falava há meses. O único que tinha estado comigo quando Rebecca tinha me expulsado de casa, o amigo que Lucca me obrigou a abandonar de maneira cruel. Eu nunca me perdoei por aquilo.
Meu melhor amigo estava ali, saudável, feliz e tinha me perdoado. Eu tinha que me agarrar a aqueles momentos, mesmo que tudo estivesse de cabeça para baixo.
Era natal e eu queria estar naquela realidade. Por hora.
— Eu preciso fazer xixi — ela sussurrou, e eu franzi o cenho. — Pode ir — falei, tentando manter minha voz doce, mas ela revirou os olhos e cruzou as perninhas como se a vontade apertasse. — Eu não sei me limpar direito. — Entrei em pânico. Merda, eu não sabia limpar uma criança. — Então pede pra sua mãe! — respondi ansiosa e por impulso. — Tô pedindo! — ela respondeu, parecendo ficar brava. Meus olhos se arregalaram. Ela achava que eu era a mãe dela; fazia sentido que estivesse me pedindo aquilo. — E o papai está cozinhando. Vamos, por favor, mãe! — ela implorou, agoniada.
Esperei pela represália, esperei os gritos. A voz de Lucca no fundo da minha mente rosnou que eu era uma incompetente. Eu estava tentando a tarde toda cuidar para que elas não se machucassem, que ficassem bem alimentadas, querendo que Annie e Zola estivessem bem, mas com medo de como ele reagiria. No entanto, eu previ errado sua reação.
Ele não via os brinquedos espalhados pelo chão? Não via a bagunça que as meninas estavam? Não via a bagunça que eu era? Como aquele homem tinha acabado num relacionamento comigo, ou pelo menos com uma versão de mim?
Eu não o conhecia, havia simplesmente amanhecido em sua cama como num conto de fadas. Mas, de repente, me senti confortável ao seu lado.
Para minha surpresa, senti um aperto estranho no coração. Não estava acostumada a ter tudo aquilo. Pessoas que me amavam, numa rotina caseira e tranquila.
— Sonhei que você tinha feito igual o Stitch e voltado para o seu planeta — pisquei algumas vezes, assustada com o sexto sentido poderoso da menina.
— Até que um dia… — fez uma pausa dramática e eu fui incapaz de não sorrir enquanto ela pegou giz de cera e desenhou dois bonecos de palito meio tortos, uma com cabelos longos e outro com barba. — Mamãe e papai foram lá e olharam para Annie e Zola, e saberam que elas eram deles.
— O progresso não é determinado pelo quão duro você trabalha, mas pelo quanto você avança de maneira saudável no que quer.
Lágrimas inundaram meus olhos e eu abri, trêmula, a capa para ver a dedicatória. “Para Theo. Obrigada por realizar todos os meus sonhos” e os nos próximos estavam “para meu agora marido Theo. Te amo”, “para meu marido que sempre me apoiou.” e o último “para nossas recém chegadas Zola e Annie. Amo vocês”.
Não era só ser um cara inteligente e sarado, era ser um cara inteligente, sarado e socialmente comprometido. Ok, estou na presença do senhor perfeito.
A dica tinha sido clara: “o dia que tudo mudou”. 24 12 2015. 24 de dezembro de 2015. O dia em que eu tinha feito o pedido.
Você é o lugar para onde eu sempre quero voltar, sempre quero estar. Meu lar. E eu sou o seu também. Estou aqui, Maeve, você sempre pode voltar para mim
Aquilo era uma coisa que a outra Maeve fazia? Ficava para baixo com a retomada do ano escolar? E por que eu estava fazendo o mesmo? Não era mais um dos meus disfarces. Eu gostava mesmo de Zola e Annie.
Quando se vive para sobrevivência, parece impossível acreditar que as pessoas ao redor podem te amar. E eu vivia daquela maneira há bastante tempo.
Minha mãe seria diagnosticada com câncer três semanas depois do meu aniversário de vinte e dois, três semanas depois do dia em que eu vim parar na casa de Theo. Seria expulsa da sua casa. E eu, mais do que ninguém, sabia da dor de estar sozinha. Tinha que voltar para a minha realidade.
Era verdade. Pela primeira vez, eu estava sentindo esperança.
— Se sua filha encostar um dedo nela porque você mandou, eu vou te dar um soco na cara, me ouviu? Você vai ficar irreconhecível nesse uniforme escroto que usa como se fosse uma delas — falei, me levantando, mas deixando Annie atrás de mim. — O que? — Me ouviu? — perguntei de novo. Ela não podia ameaçar uma criança daquela forma. Ela não podia ameaçar Zola.
— Eu sei exatamente com quem estou falando, sua vadia burra! — disse e peguei Annie no colo, querendo desesperadamente tirar as meninas dali. — Estou falando com uma babaca que gritou com a própria filha o jogo todo e fez comentários inadequados contra as outras crianças. Mas acho que você não sabe com quem está falando. — Meu tom de voz se tornou mais baixo à medida que as meninas se aproximavam, só que mais ameaçador. Pela minha visão periférica, pude ver que os outros pais tentavam esconder seus sorrisos. — Você está falando com a mulher que vai socar sua cara se não tratar essas crianças
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— Papai. — Zola apareceu da porta e ele transformou seu abraço em algo mais puro, deixando de pressionar seu quadril contra o meu. Me contive para não choramingar pela perda de contato. — A mamãe já te contou que ela prometeu que a gente vai pra Disney? — desviei o olhar. — Ainda não tínhamos chegado nessa parte — o homem riu debochado. — Traidorazinhas!
— Jesus, Zola! — exclamei quando escutei exatamente o que bonitinho da One Direction estava cantando. — É sobre strip tease — falei sobressaltada, desligando o rádio. — O pai de vocês deixa que escutem coisas assim? — Papai adora Liam Payne — Annie reclamou quando o so put your hands on my body parou. — A gente sempre escuta voltando da escola.
Me conectei à sua agonia, principalmente sobre as meninas. Abandonadas horas depois de Annie nascer. O mundo nunca deixava de mostrar sua face cruel.
— Porque na primeira vez que nossas filhas pisaram na nossa casa, elas perguntaram se podiam comer. Raiva porque ninguém nunca percebeu que o chiado no peito de Annie não era normal, ela ficou doente e talvez seja para sempre. Raiva porque Zola, só um ano e nove meses mais velha, era obrigada a cuidar da irmã. Raiva porque não tem nada que eu possa fazer. E eu sinto medo, caralho, como eu sinto medo. Toda vez que você se fecha e eu não consigo te encontrar...
— O que eu quero dizer é que não existe vida perfeita, Maeve. Existe só a vida, e às vezes ela é terrivelmente cruel. Mas quando não é, ela é fantástica
Tinha tantas coisas que eu queria dizer, tantas perguntas que eu queria fazer, tantas dores novas e alegrias para serem sentidas. O quanto ele tinha vivido, o quanto as meninas tinham visto. Queria perguntar tudo, conhecê-lo de verdade. Saber sobre sua infância, sobre a vida com Rocco e a mãe que eu nunca tinha conhecido, sobre todo o antes que eu deveria saber. Mas eu escolhi dizer a única que eu poderia:
— Theo, acho que eu estou apaixonada por você — sussurrei e ele riu, sem ter dimensão do que estava acontecendo. Do quão grandioso era para mim.
Filhas. Eu nunca as tinha chamado assim porque não sentia que elas eram minhas filhas, mas sim de uma outra Maeve, uma que tinha conquistado aquele espaço. Mas ali, naquela cozinha cheirando a waffles, com duas crianças abraçando minhas pernas enquanto Theo começava a servir os pratos, a epifania me bateu como uma bola de demolição. Eu finalmente entendi. Não existia outra Maeve. Não era uma realidade paralela, uma dobra no tempo em que eu tinha vivido uma vida perfeita. Era a vida normal. A Maeve por quem Theo se apaixonou, que acolheu as meninas era eu, uma versão que não estava cega pela
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Amar Theo era fácil.
Imaginei-me ali, escrevendo meus próprios livros naquela mesma sala, esperando as meninas e Theo chegarem. Me encontrei ansiosa para viver o cotidiano de autora, meu sonho de vida. Eu tinha renegado a carreira, com medo de fazer alguma besteira, mas agora estava animada. Queria a vida completa.
E naquele momento, eu percebi que não podia mais continuar ali. Não tinha ideia de como aconteceriaou ainda mais importante: se eu teria forças para encarar de novo a solidão. Mas como uma bola de demolição se chocando contra meu peito, a constatação de que ali não era meu lugar zuniu em meu coração. Ali não era meu lugar ainda. Ver minha vida cinco anos no futuro tinha me dado aquilo que eu mais precisava: esperança. Mas minha vida não era aquela, não ainda. Eu ainda era a Maeve que tinha deixado em 2015, naquele apartamento frio e vazio. Bem, não exatamente a mesma, o amor tinha me mudado
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— O que é a vida perfeita para você? — pedi baixinho e ele riu, sonolento. — Um cachorro — disse com a voz grave. — Queria que a gente tivesse um cachorro. — Por que? — de todas as coisas para se pedir, todas as coisas para consertar, uma esposa melhor, uma casa mais espaçosa, um emprego chique. Theo queria um cachorro. — Se tivéssemos um cachorro, isso significaria que Annie e Zola não teriam sido negligenciadas. Annie não teria asma tão grave e Zola teria seu bichinho de estimação — falou, acariciando meu braço. — Essa é a vida perfeita para mim. — Parece bom
— O que teria acontecido se a gente nunca tivesse se encontrado? — sussurrei, incapaz de conter todo o medo que eu sentia. Mas, para minha surpresa, ele riu tranquilo. — Não se preocupe, Maeve — beijou minha testa —, eu teria te achado de qualquer maneira.
reconhecendo cada pedaço do apartamento precário em que eu vivia. Frio. Sem cor, sem vida. Sem Zola e Annie. Sem Theo.
Tinha sido uma idiota. De onde eu tinha tirado a ideia de que tinha que voltar para cumprir algum tipo de missão? Que estupidez tinha sido aquela? Não queria aprender nada, não queria esperar nada. Queria minha família de volta. Queria ser amada de novo.
Eu devia tê-los abraçado, devia ter segurado as meninas no meu colo e beijado Theo. Abraçado Andy e não ignorado as mensagens da minha mãe.