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Quando se estuda um assunto, ponham-se os outros de parte, de sorte que haja entre eles solução de continuidade, e só se passe a outro depois de esgotado o primeiro.
a tenacidade em trilhar o mesmo caminho e a persistência em o retomar, seguidas de repousos oportunos, isto é, depois de completa a primeira fase da ação, é o meio de produzir ao máximo e ao mesmo tempo de guardar o frescor do pensamento e a coragem intacta.
leitura desordenada não alimenta, entorpece o espírito, torna-o incapaz de reflexão e concentração e, por conseguinte, de produção; exterioriza-o no seu interior, se assim se pode dizer, e escraviza-o às imagens mentais, ao fluxo e refluxo das ideias que ele se limita a contemplar na atitude de simples espectador.
Em resumo: podendo recolher-vos, ponde de parte a leitura; lede unicamente, exceto nos momentos de distração, o que respeita ao fim em vista, e lede pouco, para não devorar o silêncio.
O homem inteligente encontra em toda a parte inteligência, o louco projeta sobre todas as paredes a sombra da sua fronte estreita e inerte.
Lemos para nos formarmos e ser alguém; lemos com a mira nalgum fim particular; lemos para nos animarmos a trabalhar e praticar o bem; lemos por motivo de distração. Há leituras de fundo, leituras de ocasião, leituras de estímulo ou de edificação, leituras de repouso.
A escolha dum pai intelectual é negócio muito sério. Aconselhamos Santo Tomás para as doutrinas superiores; contudo, não podemos circunscrever-nos a ele. Três ou quatro autores estudados a fundo para a cultura geral, três ou quatro para a especialidade e outros tantos para cada problema que surja,
Quem lê, com a mira num trabalho, tem o espírito dominado pelo que pretende realizar; não mergulha na onda, bebe nela; fica na margem, guarda a liberdade de movimentos, reforça as próprias ideias com o que de fora lhe advém, em vez de as afogar nas ideias de outrem, e sai da leitura enriquecido e não despojado, como sucederia, se a fascinação da leitura prejudicasse o intuito de utilização que a justificava.
Ter assim, nos momentos de depressão intelectual ou espiritual, autores favoritos, páginas reconfortantes, tê-las à mão, prestes para inocularem no espírito a boa seiva, é recurso incomparável.
É trabalho muito mais fecundo aplicar-se à reconstituição da verdade integral através das deformações do que passar o tempo a criticá-las.
“A obediência é a base do aperfeiçoamento”, diz Augusto Comte, não é o aperfeiçoamento.
A leitura propõe-nos verdade: temos de a fazer nossa.
A fonte do saber não está nos livros, está na realidade e no pensamento. Os livros são indicadores do caminho;
O principal benefício da leitura, pelo menos da leitura das grandes obras, não é a aquisição de verdades esparsas, mas o acréscimo de sabedoria.
O livro é sinal, estimulante, ajuda, iniciador, não apenas substituto, nem prisão.
Lendo, não devemos ir para os mestres, devemos partir deles.
São quatro as regras propostas por Santo Tomás: 1ª ordenar o que se quer reter; 2ª aplicar a isso o espírito; 3ª meditar nisso com frequência; 4ª no ato de reminiscência, tomar pela extremidade a cadeia das dependências, que o resto seguir-se-lhe-á.
Se quereis reter, atendei as ligações e às razões das coisas; analisai, procurai os porquês, observai a genealogia dos acontecimentos, as sucessões e dependências, imitai a ordem matemática, onde a necessidade, partindo do axioma, chega às mais longínquas conclusões.
Ou estabeleceis um plano pormenorizado e só depois vos documentareis, ou começareis pela documentação, lendo e refletindo em obediência a diretivas tomadas, mas sem plano propriamente dito.
Escrevei e publicai, desde que juízes competentes vos julguem capazes disso e desde que vos sintais aptos para voar. O pássaro sabe muito bem quando há de lançar-se no espaço; melhor do que ele o sabe a mãe; apoiado em vós e numa prudente maternidade espiritual, voai logo que puderdes.
O estilo forma-se, escrevendo; o mutismo diminui a personalidade. Se quereis ser alguém, intelectualmente, precisais de saber pensar alto, pensar explicitamente, isto é, formar, dentro e fora de vós, o vosso verbo. Chegou a ocasião de dizer em breves palavras o que deve ser o estilo para corresponder aos fins sugeridos aqui ao intelectual.
A humildade não oferece dificuldade,
Uma frase, um trecho escrito devem ser como ramo vivo, como os filamentos da raiz, como a árvore. Nada de mais, nada ao lado, tudo na curva pura que vai do germe ao germe, do germe desabrochado no escritor ao germe que deve desabrochar no leitor e propagar a verdade ou a bondade humana.
O estilo exclui a inutilidade; é economia no seio da riqueza; gasta o que é preciso, poupa aqui, prodiga ali para a glória da verdade. O seu papel não é brilhar, mas fazer aparecer: quando ele se apega, é que a sua glória reluz.
Não sejais escravos da moda. Dai água de nascente, não drogas de farmácia. Muitos escritores, hoje, criam sistemas: ora um sistema é algo do artificial e o artificial ofende a beleza.
Uma forma de personalidade particularmente hostil ao trabalho é a hipocrisia que projeta a aparência de saber onde a sinceridade se confessaria ignorante.
É belo viver só para aquilo que se está fazendo, como Deus que nunca se separa da sua obra.
Uns momentos de leitura dum autor favorito, uma recitação em voz alta, uma oração feita de joelhos para modificar o estado orgânico e para libertar o espírito, uns momentos de respiração ao ar livre, alguns movimentos rítmicos: eis os remédios possíveis.
E vós, não tendes de vos libertar do erro, de conquistar a liberdade do espírito numa obra feita? Reparai no trabalho concluído: é uma aparição que vos infundirá coragem.
Pergunta Amiel no seu Diário: “Por que és fraco? – Porque cedeste dez mil vezes, convertendo-te em joguete das circunstâncias. Foste tu que as fizestes fortes, não elas que te fizeram fraco”.
Sereis então um homem. O trabalhador sem constância não passa de criança.
Perseverar é querer; quem não persevera, não quer, projeta.
Discerni em todas as ocasiões o esforço que vos convém, a disciplina de que sois capazes, os sacrifícios em que podeis consentir, a matéria que podeis tratar, a tese que podeis escrever, o livro que vos pode ser útil, o púbico a quem podeis servir. Julgai de tudo isto com humildade e confiança. Se preciso for, pedi conselho, sem esquecer no entanto que nos conselheiros abundam a leviandade e a indiferença. Fixai-vos o melhor que puderdes. Após o quê, aplicai-vos ao trabalho de alma e coração.
Infiel a si, a nada é fiel; é chama apagada.
As condições do êxito são as mesmas em todas as coisas: refletir ao princípio, começar pelo começo, proceder com método, envidar todos os esforços.
“estudar tempo de mais é uma maneira de preguiça”. É preguiça diretamente, por ser incapacidade de dominar um determinismo, de manejar um freio. É preguiça indiretamente, porque recusar um repouso é recusar implicitamente um esforço que o repouso permitiria e que o excesso de cansaço compromete. É preguiça ainda de outro modo mais oculto. Com efeito, o repouso é, fisiologicamente, um enorme trabalho.
a cultura não é filha principalmente do gênio; nasce do trabalho, do trabalho qualificado, organizado e aturado, do trabalho que tentámos descrever.