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A verdade é que vivemos encurralados e refugiados no nosso próprio território há muito tempo,
O mundo não pode parar. E o mundo parou.
Se durante um tempo éramos nós, os povos indígenas, que estávamos ameaçados da ruptura ou da extinção do sentido da nossa vida, hoje estamos todos diante da iminência de a Terra não suportar a nossa demanda.
De modo que há uma sub-humanidade que vive numa grande miséria, sem chance de sair dela — e isso também foi naturalizado.
O que vemos nesse homem é o exercício da necropolítica, uma decisão de morte.
E temos agora esse vírus, um organismo do planeta, respondendo a esse pensamento doentio dos humanos com um ataque à forma de vida insustentável que adotamos por livre escolha, essa fantástica liberdade que todos adoram reivindicar, mas ninguém se pergunta qual o seu preço.
O vírus não mata pássaros, ursos, nenhum outro ser, apenas humanos. Quem está em pânico são os povos humanos e seu mundo artificial, seu modo de funcionamento que entrou em crise.
Temos que abandonar o antropocentrismo; há muita vida além da gente, não fazemos falta na biodiversidade.
Os únicos núcleos que ainda consideram que precisam se manter agarrados nessa Terra são aqueles que ficaram meio esquecidos pelas bordas do planeta,
Fomos, durante muito tempo, embalados com a história de que somos a humanidade e nos alienamos desse organismo de que somos parte, a Terra, passando a pensar que ele é uma coisa e nós, outra: a Terra e a humanidade. Eu não percebo que exista algo que não seja natureza. Tudo é natureza. O cosmos é natureza. Tudo em que eu consigo pensar é natureza.
Não sou um pregador do apocalipse, o que tento é compartilhar a mensagem de um outro mundo possível.
Vemos algumas pessoas defenderem a manutenção da atividade econômica, dizendo que “alguns vão morrer” e é inevitável.
É uma banalização da vida, mas também é uma banalização do poder da palavra.
Pois alguém que fala isso está pronunciando uma condenação, tanto de alguém em idade avançada, como de seus filhos, netos e de todas as pessoas que têm afeto uns com outros. Imagine se vou ficar em paz pensando que minha mãe ou meu pai podem ser descartados.
Governos burros acham que a economia não pode parar. Mas a economia é uma atividade que os humanos inventaram e que depende de nós. Se os humanos estão em risco, qualquer atividade humana deixa de ter importância. Dizer que a economia é mais importante é como dizer que o navio importa mais que a tripulação. Coisa de quem acha que a vida é baseada em meritocracia e luta por poder. Não podemos pagar o preço que estamos pagando e seguir insistindo nos erros.
Com o avanço do capitalismo, foram criados os instrumentos de deixar viver e de fazer morrer: quando o indivíduo para de produzir, passa a ser uma despesa. Ou você produz as condições para se manter vivo ou produz as condições para morrer.