O Sol e o Peixe
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Kindle Notes & Highlights
Read between November 14 - November 16, 2023
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Dizer a verdade sobre si mesmo, descobrir a si mesmo de tão perto, não é coisa fácil.
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Pois, para além da dificuldade de comunicar aquilo que se é, há a suprema dificuldade de ser aquilo que se é.
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Esta alma, ou a vida dentro de nós, não combina absolutamente com a vida fora de nós.
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Comunicar é a nossa principal tarefa; a associação e a amizade são nossos principais prazeres; e ler, não para adquirir conhecimento, não para ganhar a vida, mas para ampliar nossa interação para além de nossa época e de nossa província.
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Compartilhar é nosso dever; mergulhar energicamente e trazer à luz aqueles pensamentos ocultos que são os mais mórbidos; não esconder nada; não fingir nada; se somos ignorantes, dizê-lo; se gostamos de nossos amigos, fazer com que o saibam.
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Mas chega de morte; é a vida que importa.
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Nenhum fato é demasiado insignificante para que o deixe escorregar pelos dedos, e além do interesse dos fatos em si há o estranho poder que possui de mudá-los pela força da imaginação. Observem como a alma está sempre projetando suas próprias luzes e suas próprias sombras; como torna oco o substancial e substancial o frágil; enche a plena luz do dia com sonhos; é tão animada por fantasmas quanto pela realidade; e, no momento da morte, diverte-se com uma bobagem qualquer. Observem, também, sua duplicidade, sua complexidade. Fica sabendo da perda de um amigo e se solidariza, mas tem um malicioso ...more
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Observe, observe perpetuamente e, enquanto houver tinta e papel, “sem cessar e sem fadiga” (III, 9), Montaigne escreverá.
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É o prazer o fim de tudo? De onde vem esse avassalador interesse pela natureza da alma? Por que esse desejo avassalador para se comunicar com os outros? É a beleza do mundo suficiente ou existe, em algum outro lugar, alguma explicação desse mistério? A isso que resposta pode haver? Nenhuma. Apenas mais uma questão: “Que sçay-je?” [“Que sei eu?”].
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Ele tinha paixão pelo pensamento claro; odiava a sentimentalidade e a efusão; mas isso não significava, de maneira alguma, que ele fosse frio ou imperturbável, perpetuamente crítico e condenatório. Pelo contrário, era sua capacidade de sentir fortemente e de expressar seu sentimento com vigor que às vezes o tornava uma companhia tão assustadora.
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Ler o que a gente gostava porque gostava, nunca para fazer de conta que admirava o que a gente não admirava – esta era sua única lição sobre a arte da leitura. Escrever com o mínimo possível de palavras, tão claramente quanto possível, exatamente o que se queria dizer – esta era sua única lição sobre a arte da escrita. O resto devia ser aprendido por própria conta.
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Romances, poemas, histórias, memórias, livros caros em couro, livros baratos em brochura – detemo-nos diante deles e, num assombro passageiro, perguntamos: que prazer extraímos ou que proveito tiramos ao percorrer com os olhos essas inumeráveis linhas em letra de imprensa?
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Ler é uma arte muito complexa – é o que nos revelará até mesmo o exame mais apressado de nossas sensações como leitores.
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Durante a leitura, novas impressões estão sempre anulando ou completando as velhas. Deleite, raiva, enfado, riso se alternam, enquanto lemos sem parar. O julgamento fica em suspenso, pois não podemos saber o que está por vir. Mas agora o livro acabou. Tomou uma forma definitiva. E o livro como um todo é diferente do livro há pouco absorvido em variadas e diferentes partes. Ele tem uma forma, ele tem um ser. E essa forma, esse ser, pode ser retido na mente e comparado com a forma de outros livros e se lhe pode atribuir o seu próprio tamanho e insignificância em comparação com os deles.
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É só depois que formamos nossa opinião que as opiniões dos outros se mostram mais esclarecedoras.
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Assim, pois, quando os moralistas nos perguntam o que ganhamos quando nossos olhos percorrem essa pilha de páginas impressas, podemos responder que estamos fazendo nossa parte como leitores no processo de colocar obras-primas no mundo.
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Mas essa não é a real razão. A real razão continua inescrutável – a leitura nos dá prazer. É um prazer complexo e um prazer difícil; varia de época para época e de livro para livro. Mas ele é suficiente.
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É possível que nunca ninguém tenha querido um lápis tão apaixonadamente.
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Assim como o caçador de raposas caça para preservar a espécie e o jogador de golfe joga para manter os espaços abertos ao abrigo das construtoras, assim também a nós, quando nos vem o desejo de flanar pelas ruas, o lápis serve de pretexto, e levantando da cadeira dizemos: “Tenho mesmo que comprar um lápis”, como se sob o manto dessa desculpa pudéssemos nos entregar sem risco ao maior dos prazeres da vida urbana no inverno: flanar pelas ruas de Londres.
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O entardecer nos permite, além disso, desfrutar da irresponsabilidade que a escuridão e a luz da lâmpada nos conferem. Não somos mais exatamente o que somos.
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Pois aqui nos sentamos rodeados por objetos que perpetuamente expressam a excentricidade de nossos humores e impõem as memórias de nossa experiência.
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Como é bonita uma rua no inverno! Ela se revela e, ao mesmo tempo, se torna obscura.
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Mas, afinal, estamos apenas deslizando suavemente na superfície. O olho não é minerador, não é mergulhador, não é caçador de um tesouro enterrado. Ele nos faz flutuar suavemente regato abaixo; descansando, parando, o cérebro dorme, talvez, enquanto olha.
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Há sempre a esperança, enquanto alcançamos algum livro esbranquiçado de uma prateleira superior, atraídos por seu ar de desleixo e de abandono,
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O número de livros no mundo é infinito, e somos forçados a dar uma espiada e balançar a cabeça e após um pouco de conversa, um lampejo de compreensão, seguir adiante, tal como, lá fora na rua, captamos de passagem uma palavra, e de uma frase ao acaso fabricamos toda uma vida.
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Ainda assim, enquanto nos aproximamos, de novo, dos degraus de nossa própria casa, é confortador nos sentirmos envolvidos pelas velhas posses, pelos velhos preconceitos; e sentirmos o eu – que foi jogado de um lado para o outro em tantas esquinas, que foi golpeado como uma mariposa na chama de tantas e inacessíveis luzes – abrigado e protegido.
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E o resto da viagem se passou na deliciosa companhia de meu próprio corpo.
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“Estou na cama com gripe”, diz ele, quando, na verdade, a queixa é de que ninguém lhe é solidário. Estou na cama com gripe – mas isso pouco transmite a respeito da dimensão da grande experiência: que o mundo mudou de forma; os instrumentos de trabalho se afastaram; os sons de alegria, tal como um carrossel ouvido através de campos longínquos, se tornaram um inalcançável objeto de desejo; e os amigos mudaram, alguns ganhando uma beleza estranha, outros, deformados, reduzidos à atarracada estatura dos sapos, enquanto toda a paisagem da vida permanece distante e límpida, como a praia vista de um ...more
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Sobre a solidariedade, por exemplo; podemos passar sem ela. Essa ilusão de um mundo moldado de forma a ecoar cada gemido, de seres humanos tão atados uns aos outros por necessidades e temores compartilhados que uma fisgada num pulso provoca uma outra, um mundo onde, por mais estranha que seja a nossa experiência, outras pessoas também a viveram, onde, por mais longe que viajemos em nossa mente, alguém esteve ali antes... é tudo uma ilusão. Não conhecemos a nossa própria alma e muito menos a dos outros. Os seres humanos não vão de mãos dadas por toda a extensão do caminho. Há, em cada um de ...more
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Recursos incomensuráveis são postos a serviço de algum propósito que nada tem a ver com o prazer ou o proveito humano. Se fôssemos todos postos de bruços no chão, imobilizados, rígidos, ainda assim o céu faria experimentos com seus azuis e seus dourados. Talvez, então, se olharmos para baixo, para algo muito pequeno e próximo e familiar, encontraremos solidariedade.
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viver e continuar vivendo até termos vivido inteiramente aquelas vidas embrionárias que ficam ao nosso redor na adolescência até serem suprimidas pelo “Eu”.
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que o poeta, sabendo que as palavras são descarnadas em comparação com as ideias, espalhara por sua página para evocar, quando reunidas, um estado de espírito que nem as palavras podem expressar nem a razão explicar.
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Mas é impossível fazer essa acusação contra Proust, Hardy, Flaubert ou Conrad. Eles utilizam os olhos sem, de forma alguma, incapacitar a pena, e os utilizam de uma maneira que nenhum romancista antes deles utilizou.
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Um escritor tem, assim, necessidade de um terceiro olho cuja função é acudir os outros sentidos quando eles gritam por socorro.
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Nós os vemos tais como eles são quando nós não estamos ali. Nós vemos a vida tal como ela é quando nós não temos nela nenhuma participação. Enquanto contemplamos, parecemos distanciados da insignificância da existência real, suas preocupações, suas convenções.
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O cérebro acrescenta tudo isso ao que o olho vê na tela.
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Mas obviamente as imagens do poeta não são esculpidas em bronze ou traçadas com lápis e tinta. Elas consistem de mil sugestões, das quais a visual é apenas a mais óbvia ou prevalente.