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Estas expressões não traduzem exatamente o que sinto porque sem dúvida nada pode traduzir exatamente o que alguém sente.
Quisera, quisera... Mas há sempre o sol quando o sol brilha e a noite quando a noite chega. Há sempre a mágoa quando a mágoa nos dói e o sonho quando o sonho nos embala. Há sempre o que há, e nunca o que deveria haver, não por ser melhor ou por ser pior, mas por ser outro. Há sempre...
Viajar? Para viajar basta existir.
Se imagino, vejo. Que mais faço eu se viajo? Só a fraqueza extrema da imaginação justifica que se tenha que deslocar para sentir.
É em nós que as paisagens têm paisagem.
Em Madrid, em Berlim, na Pérsia, na China, nos Pólos ambos, onde estaria eu senão em mim mesmo, e no tipo e género das minhas sensações?
A vida é o que fazemos dela. As viagens são os viajantes. O que vemos, não é o que vemos, senão o que somos.
mas talvez um dia, em velho, se lembre como é não só melhor, senão mais verdadeiro, o sonhar com Bordéus do que desembarcar em Bordéus.
Não há império que valha que por ele se parta uma boneca de criança. Não há ideal que mereça o sacrifício de um comboio de lata.
É frequente o desconhecer-me — o que sucede com frequência aos que se conhecem.
Por menos que eu faça, respiro; por menos que aja, movo-me.
Nunca encarei o suicídio como uma solução, porque eu odeio a vida por amor a ela.
E da janela do meu quarto fito, pobre alma cansada de corpo, muitas estrelas; muitas estrelas, nada, o nada, mas muitas estrelas...
O criador do espelho envenenou a alma humana.
À força de viver de imaginar, gasta-se o poder de imaginar, sobretudo o de imaginar o real.
Sofro de não sofrer, de não saber sofrer.
Falar é ter demasiada consideração pelos outros.
Toda a paisagem não está em parte nenhuma.
Caras que via habitualmente nas minhas ruas habituais — se deixo de vê-las entristeço; e não me foram nada, a não ser o símbolo de toda a vida.
E tudo quanto faço, tudo quanto sinto, tudo quanto vivo, não será mais que um transeunte a menos na quotidianidade de ruas de uma cidade qualquer.
perdidas ao fundo doutras épocas, onde invisíveis pares diversos vivem sentimentos que não temos.
Eu não te quereria para nada senão para te não ter. Queria que, sonhando eu e se tu aparecesses, eu pudesse imaginar-me ainda sonhando — nem te vendo talvez, mas talvez reparando que o luar enchera de os lagos mortos e que ecos de canções ondeavam subitamente na grande floresta inexplícita, perdida em épocas impossíveis.
A criança não dá mais valor ao ouro do que ao vidro. E na verdade, o ouro vale mais?
O universo inteiro não parece uma brincadeira, uma partida de criança travessa? Tão irreal, tão tão
era um banal e um estúpido, tinha de o ser porque existir é sempre estúpido e banal.
É fincando os pés no solo que a ave desprende o voo.
A ação desorienta-nos, em parte por incompetência física, ainda mais por inapetência moral. Parece-nos imoral agir.
Para quem faz do sonho a vida, e da cultura em estufa das suas sensações uma religião e uma política, para esse, o primeiro passo, o que acusa na alma que ele deu o primeiro passo, é o sentir as coisas mínimas extraordinária e desmedidamente.
Há um terceiro método para subtilizar em prazeres as dores e fazer das dúvidas e das inquietações um mole leito. É o dar às angústias e aos sofrimentos, por uma aplicação irritada da atenção, uma intensidade tão grande que pelo próprio excesso tragam o prazer do excesso,
Viver a vida em sonho e falso é sempre viver a vida. Abdicar é agir. Sonhar é confessar a necessidade de viver, substituindo a vida real pela vida irreal, e assim é uma compensação da inalienabilidade do querer viver.
O devaneio contínuo, a análise ininterrupta deram-me alguma coisa essencialmente diferente do que a vida me daria?
E contudo, sim, qualquer coisa de novo trouxe. Mas disso não sou responsável. Veio da Noite e brilha em mim como uma estrela... Todo o meu esforço não o produziu nem o apagou... Sou uma ponte entre dois mistérios, sem saber como me construíram...
Adia tudo. Nunca se deve fazer hoje o que se pode deixar de fazer também amanhã. Nem mesmo é necessário que se faça qualquer coisa, amanhã ou hoje.
Vive a tua vida. Não sejas vivido por ela.
Despreza tudo, mas de modo que o desprezar te não incomode. Não te julgues superior ao desprezares. A arte do desprezo nobre está nisso.
O artista supremo, o sonhador como eu o sou, tem só o esforço de querer que o sonho seja tal,
Quero sonhar-me rei... Num acto brusco quero-o. E eis -me súbito rei de um país qualquer.
Cada homem que vale, que outro homem não valha?
O que criaste para a humanidade, está à mercê do esfriamento da Terra. O que deste aos pósteros, ou é cheio de ti, e ninguém o entenderá, ou da tua época, e as outras épocas não o entenderão, ou tem apelo para todas as épocas e não o entenderá o abismo final, em que todas as épocas se precipitam.
Tudo quanto vive, vive porque muda; muda porque passa; e, porque passa, morre. Tudo quanto vive perpetuamente se torna outra coisa, constantemente se nega, se furta à vida.
A Morte é o triunfo da Vida!
Todo o interesse alheio por nós é uma indelicadeza ímpar.
Amar é cansar-se de estar só: é uma cobardia portanto, e uma traição a nós próprios (importa soberanamente que não amemos).
Como o presente é antiquíssimo, porque tudo, quando existiu foi presente,
As minhas reminiscências são tão vívidas que só as sensações mínimas, e de coisas pequeníssimas, é que eu vivo intensamente.
entre as sensações que mais penetrantemente doem até serem agradáveis, o desassossego do mistério é uma das mais complexas e extensas.
Nenhum de nós tem nome ou existência plausível.
A nossa vida era toda a vida... O nosso amor era o perfume do amor... Vivíamos horas impossíveis, cheias de sermos nós... E isto porque sabíamos, com toda a carne da nossa carne, que não éramos uma realidade...
Cada um de nós é dois, e quando duas pessoas se encontram, se aproximam, se ligam, é raro que as quatro possam estar de acordo.
Amar é entregar-se. Quanto maior a entrega, maior o amor.