Superproteção: Uma Introdução Pessoal

Menino Bolha
Antes de tudo gostaria de dividir a Superproteção entre interna e externa, neste primeiro momento me dedicarei apenas à segunda. Há uma série de fatores que culminaram na bolha onde eu vivi: 1) uma mãe neurótica brigada com a família, com poucos amigos e atividades de desenvolvimento pessoal; 2) nasci doente com bronquite asmática e uma diversidade de alergias algumas correlatas, outras não; 3) sou o filho caçula de 3, um irmão e uma irmã mais velhos.

Alérgenos
A Superproteção com a qual meus pais me escudaram e me confinaram apresenta diversas dimensões. Alérgico a rajadas de vento, mudanças climáticas, pó, cheiro de produtos químicos, corantes, sabonetes, perfumes, desodorantes, shampoos, condicionadores, cheiros fortes, aromatizantes, sereno, pelo de animais, íons na água e qualquer forma de fuligem ou fumaça eu dormia sobre colchões embalados em plástico, minhas roupas de cama eram trocadas diariamente, eu não repetia roupas de um dia pro outro, logo o uso de pijamas se fazia desnecessário para não dizer perigoso. Costumava tomar remédios ao chegar ao e ao chegar do colégio, quando criança eu passava mal toda semana precisando de inalações e quase todo mês eu pagava uma visita ao hospital para receber nebulizações com oxigênio, vez ou outra quando as crises não cessavam por nada eu tomava injeções de anti-histamínicos. Sempre ia para a casa dos amiguinhos nos fins de semana com uma bolsa de remédios e não raro precisava voltar mais cedo, cancelando assim a visita ou o sleep over.

Reações Alérgicas
Meus país me proibiam de usar transporte público e morávamos na última casa de um condomínio de casas em uma ladeira enorme, o condomínio se encontrava de frente para uma avenida de alto movimento, quase uma marginal ou interestadual. Muitas vezes não desci do segundo andar onde se encontrava meu quarto porque estava com tosse e urticárias demais para descer e brincar com os meninos, fosse de bola, pipa, bicicleta ou piscina, muito perigoso, não poderia arriscar assim a minha saúde por nada, mas tudo isso eu escondia bem, nunca falhei nas aulas de educação física, tênis, natação, capoeira, judô, tai chi chuan ou yoga. Entretanto confesso que por vezes saí dali direto para remédios, inalações e repouso. Toda minha locomoção entre escola, atividades esportivas externas, aula de inglês, casa de amigos e minha própria era mediada pelos meus país dirigindo, me deixando e me buscando, até meus 16 anos eu nunca havia pego um transporte público antes.
Até certo ponto tudo isso pode parecer um belo exemplo de zelo e amor, mas por outro eu nunca tive acesso a nenhum recurso financeiro ou mobilidade urbana, fui treinado desde pequeno a receber e não correr atrás, de aceitar o que me davam e a me resignar com o que não queriam que eu tivesse, não surpreendentemente desenvolvi uma ou uma série de incapacidades aprendidas, as quais demorei anos para desmanchar, desembolar e por vezes elas ainda voltam para me assombrar de tão enraizadas a minha conduta psicossocial. Mas incapacidade aprendida já é tópico para outro ensaio.

