Daily Vlog: O problema com os linchamentos

Sempre que eu toco nesse assunto, sou criticado por uma quantia considerável de leitores e inscritos no YouTube. Por um lado eu até entendo o argumento que eles fazem — o que não é uma justificativa do comportamento, que fique claro –; por outro, quando acontece algo como o que acabou de acontecer no Guarujá, seria omissão quase criminosa não se pronunciar.


Eis os frutos da sua histeria justiceira de “TEM QUE MATAR MESMO!!!!”: nesta semana, mataram uma mãe de família com histórico de problemas mentais. O crime cometido foi… bom, nenhum. Ela teria sido confundida com uma suposta sequestradora de crianças. Não há registro sequer dos tais sequestros; ao que indica a história inteira foi fabricada como um boato de Facebook que, numa fatalidade, saltou da internet pro mundo real e vitimou uma mulher inocente.



http://www.youtube.com/watch?v=vPQffCX8dLk



É exatamente dessas cenas que pessoas como eu, que se opõe incondicionalmente a cultura de linchamentos (seja o sujeito culpado do crime ou não), têm medo. E sim, eu sei que depois da reforma ortográfica o “tem” plural não tem mais acento circunflexo mas EU VOU CONTINUAR DIGITANDO ASSIM E NÃO HÁ NADA QUE VOCÊ POSSA FAZER. Idéia, pára, pêlo, asteróide, lingüiça!


Mas voltando ao assunto. Essas cenas horríveis de assassinato covarde de inocentes (você pode ver o linchamento mulher aqui, se tiver a disposição. Desnecessário adicionar que são imagens fortes e revoltantes) vão continuar se repetindo enquanto vocês continuarem com esse brado de “bandido bom é bandido morto, dane-se o devido processo legal porque ninguém jamais foi acusado de algo que não cometeu, não é mesmo?”


E eu sei que é impossível corrigir isso de um ponto de vista macroscópico; esse pensamento é endêmico, especialmente entre as classes mais baixas e sem educação (o fato de que esses linchamentos geralmente acontecem em periferias não é coincidência).


Mas VOCÊ, leitor do meu site, que as estatísticas de uso do meu site indicam ter um nível razoável de educação civil e formal, não deveria se unir ao coro dos linchadores. Uma pessoa instruída não deveria precisar testemunhar a cruel tortura e morte de uma mulher indefesa pra concluir “é, pelo jeito há um motivo pelo qual inventamos um sistema jurídico…”.


“Ah, mas o sistema jurídico é ineficiente”


Não se troca um sistema ineficiente por um de completa brutalidade e troglodice. É uma substituição imbecil. Alguns criminosos não cumprem suas penas, então por isso deveríamos abolir o sistema legal completamente e dar o poder de execução a populares, embasados em nada além de uma mera acusação?


Diz-se muito que pessoas como eu não seriam tão “bonzinhos” com marginais se as vítimas de seus crimes fossem nossos familiares. Eu então volto o questionamento a você — e se a mulher assassinada pela multidão fosse sua mãe, pelo crime de se parecer um pouco com uma mulher suspeita de um crime que sequer foi provado…?


Você ainda estaria justificando a execução vox populi?


“Dessa vez a população errou, mas às vezes pegam a pessoa certa”


Não. Você precisa entender que desgraças como essas acontecem JUSTAMENTE pelo pensamento endêmico de que “às vezes” matam a pessoa certa; legitimizar as vezes em que a execução “acerta” é um mal que precisamos cortar pela raiz. Tenha em mente que mesmo quando matam um criminoso, essa execução continua sendo ILEGÍTIMA quando é aplicada fora da lei, e pela mesma entidade responsável por acusar o indivíduo de um crime; por que você acha que existe uma separação entre poderes…?)


Pelo simples fato desse hábito (que horror chamar o linchamento de pessoas em plena luz do dia de “hábito”, mas não há outro termo pra isso considerando o quão frequente é essa merda) transformar pessoas comuns em assassinas e tornar o terreno fértil pra morte de inocentes, ele deveria ser combatido.


Não vá na onda dos Alborghettis da vida. Aliás, se você é um desses que ainda defende que TEM QUE MATAR MESMO BANDIDO BOM É BANDIDO MORTO, eu insisto que você assista o vídeo da execução da mulher e tente internalizar o inegável fato de que você está legitimizando a morte de inocentes como se eles fossem uma casualidade aceitável no combate à violência.


Como se a vida humana não tivesse qualquer valor.


Dessa forma, totalmente despido da empatia pelo seu próximo, você se tornou indistinguível do monstro a quem você odeia.


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Published on May 07, 2014 07:57
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Izzy Nobre
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