Superman: It’s not easy...
Minhas primeiras leituras foram, principalmente, gibis. Para ser exato, comecei pela Turma da Mônica e, mais tarde, descobri os quadrinhos de super-heróis, bem como os títulos mais pesados, como os do selo Vertigo, que na época me provocavam, sei lá, uma sensação esquisita para a qual eu ainda não encontrei a palavra adequada — que talvez só exista em alemão.
Veja bem: não era medo. Naquela época eu já era uma espécie de enciclopédia viva de filmes de terror (uma qualidade que perdi em algum lugar entre os 15 e os 20 anos), do tipo que já viu quase tudo, que conhece diretores por nome e nacionalidade, assim como o ano de produção daquele filme esquisito que ninguém viu, esse tipo de coisa. Considerando que nasci e me criei numa província em meio a uma quase total inacessibilidade à informação, e que isso se deu numa era pré-popularização da internet, falo do assunto com certo orgulho e vaidade, e em outra oportunidade voltarei a ele.
Mas eu estava falando de quadrinhos. O primeiro super-herói que eu conheci foi o Superman (na época chamávamos Super-homem, pronunciando “Superomen”), que chegou às minhas mãos de uma forma que às vezes nem eu acredito.
Foi assim: eu tinha um vizinho que aqui vou chamar de P., dois ou três anos mais velho que eu. Seus pais eram evangélicos do tipo que sequer tinham TV em casa, e mantinham o filho no que considerávamos, eu e os outros garotos da rua, uma verdadeira prisão domiciliar: P. não saia para brincar na rua, como nós, e, às vezes, para brincar com ele tínhamos que ir até sua casa e brincar através da grade do portão.
Ele tinha um primo em uma cidade vizinha que era mais velho do que todos nós e que colecionava quadrinhos desde a infância. Um dia qualquer esse primo se converteu ao cristianismo (salvo engano, a igreja Assembleia de Deus) e, decidido a começar uma nova vida, crente de que os quadrinhos que ele juntara a vida inteira eram coisa do diabo, doou todos a P., que os aceitou num primeiro momento, mas que foi obrigado a se desfazer por causa de seus pais:
— Isso é coisa do diabo, vamos jogar no lixo.
P. nunca me contou como, mas convenceu os pais que melhor do que jogar os quadrinhos no lixo seria dá-los a alguém –— e eu fui o felizardo, provavelmente por se tratar do único de nossa turma inteira (4 ou 5 garotos, todos da mesma rua) que gostava de ler.
Disso eu lembro como se fosse ontem: P. me entregou três caixas enormes, ENORMES, totalmente cheias de quadrinhos os mais diversos: Batman, Superman, Homem-Aranha, Spawn, Wildcats, X-Men, Lobo, doze volumes de uma coleção do selo Vertigo, alguns exemplares da revista Wizard, em inglês, Juiz Dredd, The Savage Dragon, e muitos, muitos outros, alguns dos quais sequer cheguei a ler.
Claro, foi um presente e tanto e do qual, infelizmente, me desfiz alguns meses depois, uma ação da qual me arrependo (uma das poucas das quais REALMENTE me arrependo, diga-se de passagem). Apesar disso, tive grandes momentos com aquelas revistas, alguns inesquecíveis, como a leitura de ‘Lobo está morto’, em dois volumes, que fez com que eu me sentisse o maior de todos os pecadores, hereges ou sei lá o quê, simplesmente pelo fato de ter lido aquilo — mais tarde o czarniano se tornou um dos meus personagens favoritos, a propósito —, e as várias HQs do Homem de Aço, que, dentre as centenas de gibis, foram as primeiras que eu li pura e simplesmente por já conhecê-lo dos filmes (aqueles com o Christopher Reeve, que costumavam passar ad nauseam na Sessão da Tarde).
Naturalmente, me tornei um fã. Fã de verdade, veja bem, do tipo que discute sobre quem é o melhor o maior o mais foda. Revia os filmes do Reeve e adorava, apesar de no fundo ficar com a sensação de que ainda não era bem aquilo. Mas, como disse lá atrás, alguns meses depois me desfiz de todos os quadrinhos (negociei com o dono da única Banca de Revista do meu bairro, que talvez tenha feito naquele dia o melhor negócio de sua vida: ele me deu um crédito em compras, eu lhe entreguei todos os meus quadrinhos).
Aqui cabe outra digressão: sempre que lembro do fato, fico com vontade de ir lá na banca (ela ainda existe) e explodi-la. Okay, okay, exagero, verdade. Além disso, a culpa foi minha, não? Eu quem procurei o cara, fiz a proposta etc. Tudo porque, bem, queria quadrinhos que ainda não tinha lido e não tinha dinheiro para comprá-los. Mas voltemos ao Superman, que foi pra falar sobre ele que iniciei esse post.
O tempo passou etc., passei a me dedicar mais à leitura de livros do que de quadrinhos e esse tipo de coisa, mas um dia, em 2006, para ser preciso, o Superman – Returns estreou nos cinemas do mundo inteiro e eu, bem, fui à estreia acompanhado de Mínelo, grande amigo dos tempos da adolescência, e desenhista.
Não gostei do filme. Quer dizer, gostei, mas ainda não foi o que eu esperava e, naturalmente, fiquei um pouco decepcionado. Ainda não era aquilo, sabe? Faltava algo. Aquilo não era O Superman. Não O Superman que eu criei e cultivei em minha imaginação durante todos aqueles anos, e foi com uma sensação de derrota que saí do cinema naquele dia. Comentava com Mínelo que o filme era bom, mas que ainda não era um filme digno do Superman, que ainda faltava algo: drama, talvez, um pouco menos de caricaturismo, certamente. Assim, voltei para casa convicto de que jamais fariam ‘o filme certo’, e confesso que, em segredo, cheguei até mesmo a esboçar aquilo que considerava o roteiro ideal para uma trilogia do Super.
Então os anos passaram e Hollywood começou com a ideia de Man of steel (O Homem de Aço), que a princípio olhei com ceticismo e depois com, digamos, fé. Confiava no trio Nolan/Snyder/Goyer, mas não queria criar grandes expectativas. Apesar disso, foi inevitável, e foi com os olhos lacrimejando, e me arrepiando a cada segundo, que vi os primeiros teasers, os primeiros trailers.
Finalmente, o filme estreou. Não pude ir à pré-estreia, como havia planejado, e só ontem tive condições de ligar para Mínelo e:
— Simbora pro Man of steel?
— Como nos não tão velhos tempos!
— Sim, como nos (não tão) velhos tempos.
— Simbora.
E lá fomos nós: compramos nossas entradas para a sessão legendada não-3D (eu não tenho mais o menor saco para filme 3D), escolhemos nossos lugares, compramos o maior pacote de pipocas possível e, cada qual segurando um copo de refrigerante tamanho Hodor, fomos ver o filme.
O que dizer? Para começar, que finalmente saí satisfeito do cinema, que finalmente vi um filme do Superman, um filme maduro, com drama, com pouco caricaturismo e que eliminou até mesmo algumas das coisas que eu considerava um verdadeiro despropósito (a cueca por cima da calça, por exemplo) e que, apesar disso, não deixou de ser fiel aos quadrinhos, muito pelo contrário.
Saí da sessão ‘com a alma lavada’, como se costuma dizer, e desejando que o filme seja um verdadeiro sucesso para que, em breve, possamos ter a sequência.
Em resumo, posso dizer que gostei de tudo.
Mínelo concordou.
Agora fiquem com o videoclipe abaixo.
Para mim, Superman é um dos personagens dos quadrinhos com maior potencial dramático. Adorei esse vídeo.Ah, e se você ainda não foi ao cinema: vá. Se você for tão fã do Superman quanto eu, tenho certeza que não irá se arrepender.
Confie em mim.