Sejamos pragmáticos
João Luiz Mauad, O GLOBO
Tão logo surgiram as primeiras notícias do mais recente massacre de crianças nosEstados Unidos, começaram as pressões para a revisão da lei de controle de armas.O presidente Obama, por exemplo, em discurso emocionado, disse que algo precisavaser feito com urgência para evitar futuros episódios semelhantes e conclamou oCongresso a discutir a questão “sem ideologias”. Portanto, sejamos pragmáticos.
Quem quer que pretenda analisar os fatos e as possíveis soluções de forma racionale objetiva precisa, antes de mais nada, colocá-los em perspectiva. Muito emboramassacres como aquele sejam cruéis e chocantes, é necessário relativizá-lospara saber até que ponto uma ação política restritiva das liberdades individuais,francamente conflitante com alguns princípios constitucionais fundamentais da naçãoamericana, seria realmente necessária, urgente e efetiva.
Vejamos então alguns dados empíricos relevantes. No livro "Risco: a Ciência e aPolítica do Medo", o jornalista canadense Dan Gardner calculou que a probabilidadede um estudante americano ser assassinado na escola era praticamente irrisória- menos de 1 em 1,5 milhão. Muitos sequer imaginam, mas nos últimos 30 anosmorreram, em média, três vezes mais pessoas atingidas por raios nos EUA do quevítimas de atiradores possessos – 51 a 18 por ano.
Diante desses números, a pergunta lógica é: vale à pena fazer alguma coisa paratentar reduzir ainda mais as chances desses massacres, tendo em vista os eventuaisefeitos colaterais indesejáveis dessas medidas? Em outras palavras, será que otratamento não seria pior que a doença?
Calcula-se que existam na América 310 milhões de armas não militares nas mãos doscidadãos (mais de uma arma por cabeça), enquanto o índice de homicídios praticadospor tais armas é de cerca de 4 para cada 100.000 pessoas, com tendência fortementedeclinante nas últimas décadas. Não se sabe quantos crimes são evitados, todos osdias, por conta do farto arsenal mantido pela população ordeira, mas a lógica nosinduz a pensar que tirar do cidadão a prerrogativa de legítima defesa só dará maisvantagem e confiança aos bandidos. Senão, vejamos:
No Brasil, o acesso a uma arma, pelo menos legalmente, é muito difícil, quaseimpossível. Apesar disso, o índice de homicídios por armas de fogo está na casados 20 para cada 100.000 habitantes ou 5 vezes o padrão americano. Chacinas poraqui também não faltam, vide São Paulo nos últimos meses. A experiência brasileirademonstra, portanto, que dificultar a aquisição legal de armas não é sinônimo desegurança, muito pelo contrário.
Sejamos pragmáticos: alterar a constituição de um país, em vigor de forma eficazhá mais de 2 séculos, por conta de alguns casos isolados, ainda que chocantes,não é uma decisão sensata. Políticas públicas não devem ser ditadas no calordas emoções, simplesmente para apaziguar os ânimos mais exaltados, até porqueboa parte das pessoas não conhece as estatísticas ou vislumbra os possíveisefeitos colaterais de certas políticas. O clamor público, quase sempre irracional oumanipulado ideologicamente, nunca foi bom conselheiro.
Published on December 24, 2012 04:37
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