A primeira vez de um escritor





Mais um dos privilégios de ser um escritor é que somos amaldiçoados abençoados não só com uma primeira vez, mas com muitas...



Não me entendem?



É normal, acontece-me sempre o mesmo quando tento comunicar com a minha cabeleireira... (repararam no header do Blog por estes dias? Pois!)









As “muitas“ primeiras vezes de um escritor:



1° Livro

1° Palavra1° Frase1° Parágrafo1° Capítulo

Fantástico, não?… ainda mais se tivermos em atenção que à excepção do 1° Livro, todos os outros se repetem a cada novo livro.Por isso há que os manter debaixo de olho.



Um livro pode ser bem escrito, e até muito bem escrito, mas o 1° capítulo tem o poder de sabotar toda a história magnifica que lhe segue.



Isto pode ser a morte do artista escritor!



Como?



Quando estão numa livraria, alguma vez repararam em alguém a puxar um livro da prateleira, abri-lo, lê-lo por uns escassos segundo e voltar a pô-lo no mesmo sítio?

Infelizmente isto acontece muitas, muitas, MUITAS, demasiadas vezes.

O que não queremos é que aconteça com o nosso livro quando finalmente ele lá chegar.



Então, o que podemos fazer para que aquele leitor leve o nosso livro para casa?



A capa.

Claro que os olhos ”comem“, eles sabem bem do que gostam e decidem o que levar para casa.

A capa do teu livro deve dizer numa imagem o género de história que contém e transmitir o ambiente que o leitor pode esperar encontrar nas horas de leitura.

O título e a sinopse são os melhores amigos da capa e ninguém melhor que eles para comprovar que ele ”diz“ a verdade.



Capa, título e sinopse ajudam o leitor na primeira decisão... depois vem o unicórnio negro do 1° parágrafo!

Muitas vezes, se a sinopse faz bem o seu trabalho e desperta o interesse, a primeira página é a paragem seguinte dos olhos e o 1° parágrafo tem direito ao seus momento de fama.



O assustador em tudo isto? Tens uns quatro segundos para convenceres.



Com os ebooks acontece a mesma coisa... só com mais umas desvantagens... a capa aparece num quadrado minúsculo onde o título é mais minúsculo ainda, a sinopse exige um click e quando há um download não é apenas do primeiro capítulo mas dos primeiros, o que te dá mais páginas onde podes ”borrar a escrita toda”... mas também encantar!



Estas coisas acontecem! Portanto mais vale tomar precauções.





Há alguns meses atrás, andei obcecada com as primeiras linhas dos meus livros e no processo (para além de mais uma neurose) encontrei algumas dicas interessantes:



- Aprender com os melhores. Ler as primeiras frase dos melhores livros e estudá-las. O que te faz gostar mais de uma ou de outra? Como podes usar a mesma técnica e recriá-la para o teu livro.

No site http://americanbookreview.org/100BestLines.asp e no http://www.stylist.co.uk/life/the-best-100-opening-lines-from-books/ (meu preferido) podes encontrar exemplos de clássicos.



- Considerar o uso de uma narração em tempo diferente do resto do livro



- Abre as hostilidades logo à partida. Um desafio. Uma tragédia. Algo que desencadeie acontecimentos que obriguem a tua personagem principal à acção e deixem o leitor curioso em saber o que irá fazer



- Meter os personagens a trabalhar desde a primeira frase e explora as suas personalidade e NUNCA descrições fisicas... a não ser que lhes falte um braço ou uma perna (ou os dois) e seja esse o drama todo.





No final do 1° Capítulo devemos conseguir:



- Apresentar as personagens principais

- Saber onde e quando decorre a história

- Sentir o ambiente da história

- Saber qual o principal enredo / acção

- Sentir algum tipo de emoção que permita empatia



É claro que eu me esforcei, mas não tenho a certeza de ter conseguido cumprir estas coisas todas com as quais concordo.



No entanto, o exercício valeu sem dúvida a pena. Mudei o início dos meus livros e quero acreditar tenho a certeza que para melhor.



Para os mais curiosos, aqui fica o exemplo de um antes e um depois no meu livro “Inverso” .

Espero que dê para notar a diferença...







O antes (a ler o mais rápido possível)





"O toque estridente da campainha roubou o silêncio da sala de aula. Nos vários pavilhões da Escola Secundária dezenas de portas abriram-se em simultâneo libertando centenas de alunos que fugiam ao confinamento da sala de aula em direcção à liberdade do fim-de-semana.



No meio da peregrinação ondulada de vários tons de cabeças castanhas ao longo do corredor, o movimento de uns cabelos ruivos rompia a monotonia de cor.



“Ivana! Ivana!” Gritava uma rapariga com os olhos postos na figura que se destacava e tentando furar por entre a barreira humana que as separava."








O depois





"Um relógio é apenas um relógio, mas os que vivem na parede de uma sala de aulas são temidos e odiados como guardiões de mundos e carcereiros de liberdade.



Confinada entre a cadeira e a secretária, Ivana acompanhou com olhar hipnotizado os últimos movimentos do ponteiro dos segundos, até que finalmente o toque estridente da campainha roubou o silêncio da sala de aula numa explosão de sons e movimentos.



Nos vários pavilhões da Escola Secundária as portas abriram-se em simultâneo libertando centenas de alunos que fugiam da clausura da sala de aula para a liberdade do fim-de-semana.



No meio da peregrinação ondulada de vários tons de cabeças castanhas ao longo do corredor, o movimento de uns cabelos ruivos rompia a monotonia de cor.



“Ivana! Ivana!” Chamou uma figura enérgica que rasgava sem cerimónia por entre a barreira humana que as separava. “Desaparece da frente...” Resmungou Lia para a última pessoa entre elas dando-lhe um encontrão.



Ivana riu da constante hostilidade que a amiga fazia questão de usar com toda agente à sua volta. Para ela, que a conhecia, só a tornava mais cómica."




Liliana






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Published on July 23, 2012 21:30
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