Passa por mim com um semblante digno, grave, lábios pintados, olhar em frente, veio do wc e já pagou o café, vai percorrer alguns metros sozinha no passadiço junto ao mar, na íris já não lhe consigo ler a inocência como até há bem pouco tempo, apenas uma vida de sofrimento, as mãos deformadas, e agora isto, a trombose, o avc, os pés a arrastar, os passos pequenos, tão pequenos que são menos de metade dos de um bebé que começa a andar. Melhor: já não são passos, são pés a arrastar, só isso.Quando na cara já não vemos conhecimento, tendemos a desinteressar-nos e a enterrar a pessoa viva no talhão do nosso próprio subconsciente. Mas quando é assim soa um alarme.Aos setenta queria cá estar. E se cá estiver não queria arrastar os pés nem enfiar nos ombros o pescoço que já não suporto, mas se tiver de ser quero ter esta dignidade no olhar.Só peço mais leveza na expressão.E não me importo da comoção no olhar de um jovem.Tentarei sorrir e talvez lhe agradeça.
PG-M 2012
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Published on January 25, 2012 15:14