Urge ampliar o conceito de regulação
Entendamo-nos: o que incomoda em Fama Show não é a sua montagem tipo videoclip. Nem as suas incursões aos domínios da moda, da música ou do cinema. Nem – muito menos – as suas raparigas, apresentadoras e repórteres, todas lindas. Como lareira, em silêncio, Fama Show não tem, aliás, rival na televisão portuguesa: até em modo pause, parado num só frame, pode ser fulgurante. O problema é o seu conteúdo: todo o seu conteúdo, dos assuntos à forma como são tratados. É o conceito – um conceito tão equívoco e retorcido que vai para além do próprio programa, ou mesmo da TV em geral. Fama Show, como outros formatos do seu género, alimenta-se, com absoluto cinismo, do que de pior a fama tem: a ideia de que se trata de um fim em si própria (ou, vá lá, de um reflexo de si própria). Em Fama Show, regra geral, não se é famoso porque se fez isto ou aquilo: é-se famoso porque se é famoso – e, porque se é famoso, pode-se fazer isto ou aquilo, incluindo "cantar", "representar" ou "desfilar". Pois a disseminação dessa ideia precisa de ser regulada. Da mesma forma que a lei impede a publicidade ao tabaco ou a consciência obriga as manequins a avisarem as adolescentes para os riscos da anorexia, a atracção da fama-pela-fama também deveria ser, de alguma maneira, dissuadida. Ela própria é uma anorexia, aliás: uma anorexia intelectual. No meio de tudo isto, que entrevistadoras e entrevistadas olhem a cada instante para a câmara, fazendo beicinhos e olhinhos como se tivessem graça, é só má televisão. Temos tanta que eu nem saberia por onde começar.
Prós & Contras, às sextas-feiras na NTV (com Nuno Azinheira)


