in YGGDRASIL, PROFECIA DO SANGUE - cap 19

DEZANOVE

Com a nova rotina, aulas, biblioteca, treinos, mal dava pelo passar dos dias. Tinha o corpo coberto de hematomas que escondia de Rhenan. Habituara-se a levar tanta pancada que já nem estranhava as exigências de Lochan. Os dias acabavam com eles sentados no chão a conversar. Nas saudosas palavras de Lochan, o que mantinha a família unida eram um ilimitado amor e respeito. Sozinhos não eram nada, juntos ninguém os parava. O tom da sua voz era forte como a de Rhenan, mas de feitio não era tão sério como o seu gémeo, era mais parecido com Fionn. Maria bocejou.- Desculpa Lochan, estou estafada.- Sei que sim. Admiro a tua perseverança e força. – levantou-se esticando-lhe a mão para a ajudar – Vai descansar.- Até amanhã.- Dorme bem Maria. – beijou-a.Sorriu-lhe agradecida subindo a escada, fechou a porta, deixando-lhe a luz acesa, sabia que continuaria à volta dos documentos até a casa acalmar, só depois regressaria para o seu quarto.Maeve, Fionn e Rhenan já se tinham recolhido, viu que Eoghan continuava sentado à frente da lareira a ler. Entrou na cozinha às escuras, abriu o frigorifico retirando os restos do jantar, encheu um copo de água, tirou um garfo sem se dar ao trabalho de aquecer a comida. Fechou os olhos saboreando o resto da maravilhosa lasanha que Eoghan comprara naquela tarde. Precisava de tomar um banho bem quente e dormir, estava estafada.Eoghan aproximou-se em silêncio, sentando-se ao seu lado. - Se quiseres, amanhã compro outra. - via-a comer com satisfação.- Estava esfomeada! Até parece que não jantei.- Fico feliz que te sintas melhor, na realidade estás com muito bom aspecto, pareces mais forte.Maria ia-se engasgando, também via as alterações no seu corpo. Ainda não contara a ninguém que começara a treinar, quando se sentisse preparada surpreendê-los-ia.- Como está o meu irmão?Maria colocou-lhe uma mão sobre o braço.- Tenho muita pena que não o consigas ver. Dentro daquele estranho mundo onde se encontra, está bem. Tenho aprendido muito com ele, o Lochan é fantástico.- Eu sei. – Eoghan apertou-lhe a mão esperançado – Sabes se alguma vez o conseguirei ver?- Não sei! - Nunca me chegaste a contar como o encontraste.         - Estava destinado. Na noite do meu noivado, desci, reparei num vulto perto da janela da sala e soube logo que era ele, parecia que estava a olhar para o Rhenan. Chamei-o, quando se voltou, notei que estava tão espantado quanto eu. Tocou-me por acaso e foi quando percebemos que também o conseguia sentir. A felicidade foi tanta que rodopiou comigo pela sala. – Maria sorria ao lembrar-se dessa noite – Agora imagina a cara do Rhenan quando entrou na sala e me viu a voar. Riram-se os dois.- Consigo imaginar. – Eoghan levantou-se para a deixar acabar de comer descansada – Obrigado por lhe fazeres companhia.- É com prazer, temos os mesmos gostos. Julgo que encontrei a minha alma gémea.- O Rhenan que não te ouça. – piscou-lhe o olho divertido – Vou ficar na sala mais um pouco, se precisares de mim chama-me.- Vou subir. - colocou a loiça dentro da máquina.- Dorme descansada. Caminhava pelo corredor na direcção do quarto a pensar em Rhenan. Desde o susto da falsa gravidez que nunca mais lhe tocara e a verdade é que sentia a sua falta. Sempre que o procurava sentia-o retesar-se. Abriu a porta do quarto, ouvia a água, sentiu um arrepio, despiu-se decidida a juntar-se a ele.- Maria! Que fazes? - Agora foges de mim?Não respondeu enquanto Maria se insinuava, roçando o peito na sua pele, com as mãos a descerem até lhe tocar e sentir a sua erecção. Rhenan segurou-lhe nas mãos levando-as aos lábios.- Já não me desejas?- Mo ghrá! Desejo-te tanto que dói. - com o olhar perdido segurou-lhe a cara entre as mãos.- Então porque me evitas? Rhenan fechou os olhos encostando a testa à dela.- Tem alguma coisa a ver com a falsa gravidez?- Não te quero colocar em perigo.- Quando é que o fizeste?- A minha mãe tinha razão, não te devia ter trazido para a minha cama tão cedo, o meu dever é proteger-te.- Rhenan! Por favor, olha para mim. Abriu os olhos mantendo distância entre os corpos.- Achas mesmo que me forçaste a fazer algo que não queria? O que sinto por ti é tão forte que fico sem ar quando te vejo. Se não te tenho perto falta-me a minha melhor parte. Sem ti, sinto-me perdida. Amo-te e detesto que me afastes. Tínhamos prometido falar de tudo e não estás a cumprir com a tua parte.Rhenan puxou-a para si beijando-a, os corpos colavam-se colmatando a necessidade que tinham de se sentir. Pegou-lhe ao colo levando-a para a cama. Sem saberem que com a renovação dos seus votos o muro que os protegia ganhava força. Naquela noite Maria adormecia com o seu sabor, o toque da sua pele quente colada à sua.
Lochan começara a estar presente sempre que a família se reunia, gostava de sentir a energia e o calor que irradiavam. Só Eoghan e Rhenan se apercebiam da sua presença quando Maria reagia inadequadamente.- Maeve! Quem cozinha? Limpa a casa? Muda as roupas? Arranja o jardim? A cave não tem um grão de pó. - A nossa caseira, que vive ao fundo da rua. O marido trata do jardim. A sua família tem trabalhado para nós através dos séculos.- Não acham estranho o facto de não envelhecerem?- No início foi complicado, são pessoas muito supersticiosas, julgo que pensavam que éramos vampiros. - soava divertida – Porém a nossa família sempre foi muito discreta e asseguramo-nos que nunca lhes falte nada.- Como é possível que nunca os tenha visto?- Têm chaves, entram cedo e andam sempre nos locais onde sabem que não estamos. E nunca ficam depois do pôr-do-sol. – Maeve sorria divertida.- Vampiros! A única sanguessuga que me vem à cabeça é o Fionn.Sentaram-se as duas no sofá a rir.- Sanguessuga! Eu? Olha o descaramento! Até que gosto de pescoços, mas continuo a preferir um bom par de …- Fionn. - Eoghan avisou-o.Lochan ria-se deliciado com a saudável loucura de Fionn. Seguindo atentamente a conversa dos irmãos, faziam-no sentir-se vivo.             Caminhava descalça por um suave tapete de relva, envergando uma túnica azul da cor do céu, os cabelos presos no topo da cabeça, o sol brilhante aquecia-a. Ouvia o som da água bater ritmicamente nas pedras, os ramos das árvores agitavam-se com a suave brisa, à sua volta os animais corriam em liberdade. Toda a beleza que a rodeava foi quebrada por um choro. Como podia alguém sofrer no paraíso? Caminhou na direcção daquele som até chegar a um riacho. Uma rapariga que não devia ser muito mais velha do que ela, com um lindo cabelo cor de fogo, a pele alva como o dia, admirava o seu reflexo na límpida água.- Porque choras?Sobressaltada ao escutá-la virou-se de repente. Tinha os olhos mais verdes que as esmeraldas mais brilhantes. Era de uma beleza estonteante.- Desculpa se te assustei. Chamo-me Maria. - Eu sou Rhiannon.- Estou a sonhar? - Não!- Onde estamos? - Não sabes?Maria abanou a cabeça em negação, reparando que tinham as mesmas tatuagens.- Em Tara.Olhou à volta em pânico, baixando-se, sabia que não sonhava, não percebia como Danu a conseguira levar uma vez mais contra a sua vontade. Só esperava conseguir sair dali com a mesma rapidez.- És a escolhida! Fui eu que te chamei, mas nunca pensei conseguir fazê-lo. - Rhiannon fez-lhe sinal com a mão para que se sentasse ao seu lado. - Estamos em Tara, o que dizes não faz sentido.- Reparaste que temos as mesmas tatuagens? - Sim!- Não tens curiosidade em saber porque as temos?- Tenho tanto medo de aqui estar que não consigo pensar em mais nada. - Significa que teremos um papel importante a desempenhar e as nossas tatuagens identificam-nos.  - O que quer isso dizer?- Que a Profecia começa contigo. Maria anuiu com a cabeça enquanto aquela estonteante mulher lhe segurava na mão, o seu toque criara um inegável vínculo entre as duas. Sentia que a conhecia.- Há muitos séculos atrás, a minha tia Morgaine avisou-me sobre este dia.- A mesma Morgaine que criou Freya e Deirdre?- Sim! O sorriso quente de Rhiannon fê-la esquecer-se que estava em Tara.- Quando a minha tia falou com Surt a pedido da Deusa, para que desse o seu sangue às irmãs, ele fez um acordo com ela. Eu ficaria à sua guarda, seria ensinada e treinada por ele. E assim foi. - Quem é Surt? - sentia-se confusa.- O Dragão! O seu sangue corre-te nas veias. Maria nem prestava atenção ao que Rhiannon lhe dizia, o seu medo era verdadeiro, temia estar em Tara, não sabia quanto tempo tinham, rezava para que as Fadas não aparecessem.- Quando Surt achou que estava preparada, deu-me a beber o seu sangue tornando-me imortal. Desde então estou ligada à Profecia, a ti. - Como vieste aqui parar?- Dirigia-me para Yggdrasil quando fui perseguida pelos cães dos Sluagh durante uma das suas caçadas nocturnas, fui capturada.- Sluagh?- Fadas que caçam humanos. Trazem-nos para Tara e usam-nos como escravos.- Mas tu és diferente, és imortal.  - Danu pretende manter-me afastada, sabe que faço parte da Profecia que ajudará a libertar o Clã. Sei que me quer usar, só ainda não percebi como. - Quer trocar-te pelo Colar.- O Colar de Brisingamen? – os olhos de Rhiannon brilhavam de incredulidade. - O problema é que não o temos, não sabemos onde está e para piorar, temos de descobrir como te tirar daqui? – Maria sentia-se observada – Como é possível estarmos aqui sem que nos vejam?- Observam-nos! Mas suspeito que estás aqui com a ajuda da Deusa.- Deusa?- A nossa mãe.Havia algo nas suas palavras que fazia sentido.- E as nossas tatuagens! O que significam?- Protecção e adoração. Indicam que estamos protegidas pela Deusa. Maria, quando regressares não te esqueças da nossa conversa. És sidhe e tens mais poder do que julgas.- És a feiticeira pela qual aguardamos?- Sou! Agora irmã regressa.- Não te posso deixar aqui! - Encontrarei maneira de me libertar. Vai! Pensa no que te prende do outro lado e quando acordares lembra-te de tudo o que falámos. – Rhiannon beijou-a despedindo-se - Obrigada por teres vindo. - os olhos brilhavam de esperança. Fechou os olhos pensando em Rhenan, no calor dos seus braços e da última memória que tinha dele. Ao voltar a abri-los estava na sua cama, Rhenan dormia calmamente ao seu lado, apertando o abraço cada vez que a sentia mexer-se. Lembrava-se de tudo. As pessoas de que falava a Profecia começavam a aparecer, preparadas para o que o destino lhes reservara. Deitada com os olhos fixos no tecto fazia mentalmente uma lista de prioridades. Tinha de descobrir onde Lochan escondera o Colar de Brisingamen sem o entregar aos Tuatha;a Fivela de Aker; tinha de fechar as portas; reenviar as Sombras para Annwan; lidar com Fadas neuróticas; salvar Lochan do limbo em que se encontrava; retirar Rhiannon de Tara e acabar o primeiro ano do curso. Mas antes disso tinha de receber os pais mantendo-os em segurança. Era muita coisa e mesmo com a ajuda de todos não sabia por onde começar.
- Minha Rainha, a sidhe acabou de sair.- Correu tudo como previa. Lug despiu-se deitando-se a seu lado.- Em breve teremos o Colar e continuaremos livres para fazer o que sempre fizemos no seu mundo. Danu exigira que os seus caçadores lhe entregassem a feiticeira. Sentira-a mover-se ao encontro do seu destino e agira. A força do Clã aumentava, a proibição que lhe tinha sido imposta impedia-os de aceder a Yggdrasil e saber o que os MacCumhaill faziam. Mas tinha a feiticeira e não hesitaria em usá-la. Regozijava-se com a sua inteligência. Ao permitir-lhe a entrada nos seus domínios ficara a saber que não tinham o Colar. Mas tinha de ter cuidado, a sidhe gozava da protecção da Deusa, de Avalon, não lhe podia tocar, mas podia sempre ludibriá-la.Tempo não lhes faltava. Só queria pensar naquele belo homem deitado a seu lado, queria receber todo o prazer que só ele lhe sabia dar. Sentou-se em cima dele atirando a cabeça para trás. Lug encaixou-se segurando-a pelas ancas, movimentando-se ritmicamente debaixo dela ansiando pela libertação, o que tiravam um do outro ia muito além de qualquer fantasia.
 •  0 comments  •  flag
Share on Twitter
Published on April 04, 2020 02:00
No comments have been added yet.