O POÇO
- É um poço!
- Estou a dizer-te que é um esgoto.
- Poço!
- Esgoto!
Sandra e Mafalda continuavam numa acesa discussão no intervalo entre as aulas.
Os amigos aproximaram-se cautelosamente, sabiam que quando aquelas duas discordavam acabava sempre por sobrar para eles. Sentaram-se perto, porém a uma distância segura das suas mãos que não paravam de gesticular.
Pareciam zangadas, mas para quem as conhecia sabia que não estavam, aquela era a sua forma de se expressarem.
- Poço!
- Esgoto!
- Será que podem parar por alguns minutos essa interessante conversa e dizerem-nos qual o motivo de mais esta discordância? – Pedro olhou primeiro para Sandra que parecia um pouco mais irritada do que a amiga.
- Aquele buraco ali ao fundo tapado com grades o que é que te parece? – apontou com o dedo na direção do extremo oposto do pátio voltando a cruzar os braços sobre o peito olhando para Mafalda com um olhar vencedor.
Gonçalo olhou para o amigo com uma certa pena dele sabia que independentemente da sua resposta nunca sairia vencedor pois uma delas não iria gostar do que dissesse.
Voltaram-se as duas para ele encarando-o, cada uma esperando que confirmação a sua suspeita.
Gonçalo sorriu-lhe levantando o polegar para cima tentando dar-lhe força.
- Bem… - Pedro começou a medo – parece-me um “poto” mas também pode ser um “esgoço”.
Olharam os três ao mesmo tempo para ele. Gonçalo começou a rir perante a diplomacia que o amigo utilizara para se safar daquela situação aparentemente sem escapatória possível.
- Um poto? – Sandra olhava-o com as mãos na cintura – Mas que raio é um poto?
- Um esgoço? – Mafalda aproximou-se olhando-o bem perto nos olhos – Mas tu estás bom da cabeça? Essa palavra não existe.
- Tens a certeza? – Pedro começava a sentir-se mais confiante. – Podia jurar que ou é um ou outro.
Gonçalo ria-se à socapa olhando para o amigo com admiração. Só mesmo ele para acabar com uma discussão entre as duas tão eloquentemente.
Pedro continuava a olhar para as amigas. Não se tinha mexido nem um milímetro sentia-se confiante.
- Olhem que é muito fácil descobrirmos o que é.
- E o que sugeres? – Sandra aproximara-se.
- Temos que retirar a grade e entrar.
- Enlouqueceste? – desta vez era Gonçalo quem se aproximava, perdera subitamente a vontade de rir.
– Estás maluco? Nunca nos deixarão lá entrar. Além do mais não me agrada muito a ideia de andar a passear num esgoto.
- Ah! Ah! Então tu também pensas que é um esgoto. – Mafalda virou-se de repente para Sandra batendo com o nariz na sua cara – Au! Magoaste-me.
- Eu é que te magoei? – esfregou a bochecha com a mão apesar de a amiga ter o nariz pequeno era forte como uma águia.
- Isso agora não interessa. – Mafalda continuava a esfregar o nariz. - Vês o Gonçalo também pensa que é um esgoto.
Olharam as duas para ele na esperança que confirmasse o que acabara de dizer. Pedro veio em seu auxílio.
- Não. O que ele queria dizer é que aquilo parece um esgoto, quando na realidade é um esgoço.
- E lá estás tu a inventar palavras. Afinal o que é que tu achas mesmo que é? E não nos tomes por tolas que não somos.
Tinha que pensar em algo muito rapidamente não queria que as duas ficassem zangadas consigo.
- Como já vos disse a única maneira que temos para tirar essa dúvida é irmos lá dentro. E eu tenho uma ideia de como o fazer. Hoje ao final do dia.
- Eu não quero ir. Ouvi dizer que ali vivem umas bonecas de porcelana que fazem mal a quem lá entre. – Sandra tremeu agarrando a mão de Mafalda.
- Podemos sempre espreitar lá para dentro e ver se vimos alguma coisa. – Sugeriu Gonçalo
Não foi preciso dizer mais nada. A medo, mas decididos avançaram através do pátio passando por outros colegas que pareciam alheios ao que pretendiam fazer. Baixaram-se, olhando para dentro daquele buraco escuro tapado por fortes grades. Pedro abanou-as, sem as conseguir mexer. Os seus olhos aos poucos começavam a habituar-se aquela escuridão que se via lá dentro quando começaram a ver pequenos pontos brilhantes bem lá no fundo, pareciam olhar para eles com a mesma curiosidade com que olhavam lá para dentro.
Mafalda começou a choramingar agarrando com mais força a mão da amiga.
- Eu disse-vos que aqui viviam bonecas de porcelana que nos querem fazer mal. Vocês não conseguem ver os olhos dela a seguir-nos?
- Não sejas tola – Gonçalo aproximava mais a cara da grade – aquilo devem ser ratos.
- Sim Mafalda – Pedro continuava a olhar lá para dentro como que hipnotizado. – Só podem ser ratos.
Saíram daquele marasmo quando ouviram a voz da professora atrás deles que os chamava. Saltaram assustados por terem sido apanhados a conspirar.
- Não me ouviram chamar?
- Desculpe professora, mas não. – Sandra desculpava-se por todos.
Já se tinham levantado, mas não se mexiam.
- Deixaram cair alguma coisa aí dentro?
- Bem…não…foi mais… - Gonçalo gaguejava não sabia o que dizer e os amigos também pareciam ter ficado sem desculpas.
- Sabem que se conta uma história muito antiga sobre este local?
Olharam todos para a professora com curiosidade, não foi preciso responderem porque os seus olhos pediam-lhe que lhes contasse essa história.
- Pois bem, – a professora sorriu-lhes – há muito tempo quando ainda não existia aqui a escola uma menina mais ou menos da vossa idade andava a brincar às escondidas com os seus irmãos e escondeu-se dentro de um poço, que estaria mais ou menos neste local onde estamos agora.
Sandra olhou para Mafalda com um olhar triunfante, mas não disse nada.
- Naquele final de tarde enquanto brincava com os irmãos às escondidas desapareceu. – Fez uma pausa - Como não voltara a aparecer e os irmãos não a conseguiam encontrar foram chamar os adultos. O mais estranho é que no local onde fora vista pela última vez apareceu uma boneca de porcelana igual a ela encostada à entrada do poço. O seu pai levou a boneca com ele para casa e continuou a procurá-la insistentemente. Com o passar dos dias o poço secou misteriosamente e foi fechado com grades para que a curiosidade não levasse outras crianças a procurarem aquele local.
- Como é que se chamava a menina? – Mafalda estava com lágrimas nos olhos, podia ter-lhes acontecido o mesmo se tivessem ido na conversa dos amigos.
- Benedita!
- E voltou a aparecer?
- Digam-me vocês.
- Estou a dizer-te que é um esgoto.
- Poço!
- Esgoto!
Sandra e Mafalda continuavam numa acesa discussão no intervalo entre as aulas.
Os amigos aproximaram-se cautelosamente, sabiam que quando aquelas duas discordavam acabava sempre por sobrar para eles. Sentaram-se perto, porém a uma distância segura das suas mãos que não paravam de gesticular.
Pareciam zangadas, mas para quem as conhecia sabia que não estavam, aquela era a sua forma de se expressarem.
- Poço!
- Esgoto!
- Será que podem parar por alguns minutos essa interessante conversa e dizerem-nos qual o motivo de mais esta discordância? – Pedro olhou primeiro para Sandra que parecia um pouco mais irritada do que a amiga.
- Aquele buraco ali ao fundo tapado com grades o que é que te parece? – apontou com o dedo na direção do extremo oposto do pátio voltando a cruzar os braços sobre o peito olhando para Mafalda com um olhar vencedor.
Gonçalo olhou para o amigo com uma certa pena dele sabia que independentemente da sua resposta nunca sairia vencedor pois uma delas não iria gostar do que dissesse.
Voltaram-se as duas para ele encarando-o, cada uma esperando que confirmação a sua suspeita.
Gonçalo sorriu-lhe levantando o polegar para cima tentando dar-lhe força.
- Bem… - Pedro começou a medo – parece-me um “poto” mas também pode ser um “esgoço”.
Olharam os três ao mesmo tempo para ele. Gonçalo começou a rir perante a diplomacia que o amigo utilizara para se safar daquela situação aparentemente sem escapatória possível.
- Um poto? – Sandra olhava-o com as mãos na cintura – Mas que raio é um poto?
- Um esgoço? – Mafalda aproximou-se olhando-o bem perto nos olhos – Mas tu estás bom da cabeça? Essa palavra não existe.
- Tens a certeza? – Pedro começava a sentir-se mais confiante. – Podia jurar que ou é um ou outro.
Gonçalo ria-se à socapa olhando para o amigo com admiração. Só mesmo ele para acabar com uma discussão entre as duas tão eloquentemente.
Pedro continuava a olhar para as amigas. Não se tinha mexido nem um milímetro sentia-se confiante.
- Olhem que é muito fácil descobrirmos o que é.
- E o que sugeres? – Sandra aproximara-se.
- Temos que retirar a grade e entrar.
- Enlouqueceste? – desta vez era Gonçalo quem se aproximava, perdera subitamente a vontade de rir.
– Estás maluco? Nunca nos deixarão lá entrar. Além do mais não me agrada muito a ideia de andar a passear num esgoto.
- Ah! Ah! Então tu também pensas que é um esgoto. – Mafalda virou-se de repente para Sandra batendo com o nariz na sua cara – Au! Magoaste-me.
- Eu é que te magoei? – esfregou a bochecha com a mão apesar de a amiga ter o nariz pequeno era forte como uma águia.
- Isso agora não interessa. – Mafalda continuava a esfregar o nariz. - Vês o Gonçalo também pensa que é um esgoto.
Olharam as duas para ele na esperança que confirmasse o que acabara de dizer. Pedro veio em seu auxílio.
- Não. O que ele queria dizer é que aquilo parece um esgoto, quando na realidade é um esgoço.
- E lá estás tu a inventar palavras. Afinal o que é que tu achas mesmo que é? E não nos tomes por tolas que não somos.
Tinha que pensar em algo muito rapidamente não queria que as duas ficassem zangadas consigo.
- Como já vos disse a única maneira que temos para tirar essa dúvida é irmos lá dentro. E eu tenho uma ideia de como o fazer. Hoje ao final do dia.
- Eu não quero ir. Ouvi dizer que ali vivem umas bonecas de porcelana que fazem mal a quem lá entre. – Sandra tremeu agarrando a mão de Mafalda.
- Podemos sempre espreitar lá para dentro e ver se vimos alguma coisa. – Sugeriu Gonçalo
Não foi preciso dizer mais nada. A medo, mas decididos avançaram através do pátio passando por outros colegas que pareciam alheios ao que pretendiam fazer. Baixaram-se, olhando para dentro daquele buraco escuro tapado por fortes grades. Pedro abanou-as, sem as conseguir mexer. Os seus olhos aos poucos começavam a habituar-se aquela escuridão que se via lá dentro quando começaram a ver pequenos pontos brilhantes bem lá no fundo, pareciam olhar para eles com a mesma curiosidade com que olhavam lá para dentro.
Mafalda começou a choramingar agarrando com mais força a mão da amiga.
- Eu disse-vos que aqui viviam bonecas de porcelana que nos querem fazer mal. Vocês não conseguem ver os olhos dela a seguir-nos?
- Não sejas tola – Gonçalo aproximava mais a cara da grade – aquilo devem ser ratos.
- Sim Mafalda – Pedro continuava a olhar lá para dentro como que hipnotizado. – Só podem ser ratos.
Saíram daquele marasmo quando ouviram a voz da professora atrás deles que os chamava. Saltaram assustados por terem sido apanhados a conspirar.
- Não me ouviram chamar?
- Desculpe professora, mas não. – Sandra desculpava-se por todos.
Já se tinham levantado, mas não se mexiam.
- Deixaram cair alguma coisa aí dentro?
- Bem…não…foi mais… - Gonçalo gaguejava não sabia o que dizer e os amigos também pareciam ter ficado sem desculpas.
- Sabem que se conta uma história muito antiga sobre este local?
Olharam todos para a professora com curiosidade, não foi preciso responderem porque os seus olhos pediam-lhe que lhes contasse essa história.
- Pois bem, – a professora sorriu-lhes – há muito tempo quando ainda não existia aqui a escola uma menina mais ou menos da vossa idade andava a brincar às escondidas com os seus irmãos e escondeu-se dentro de um poço, que estaria mais ou menos neste local onde estamos agora.
Sandra olhou para Mafalda com um olhar triunfante, mas não disse nada.
- Naquele final de tarde enquanto brincava com os irmãos às escondidas desapareceu. – Fez uma pausa - Como não voltara a aparecer e os irmãos não a conseguiam encontrar foram chamar os adultos. O mais estranho é que no local onde fora vista pela última vez apareceu uma boneca de porcelana igual a ela encostada à entrada do poço. O seu pai levou a boneca com ele para casa e continuou a procurá-la insistentemente. Com o passar dos dias o poço secou misteriosamente e foi fechado com grades para que a curiosidade não levasse outras crianças a procurarem aquele local.
- Como é que se chamava a menina? – Mafalda estava com lágrimas nos olhos, podia ter-lhes acontecido o mesmo se tivessem ido na conversa dos amigos.
- Benedita!
- E voltou a aparecer?
- Digam-me vocês.
Published on October 13, 2019 03:00
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