não pode, e ponto.

Não sei latim, não sei grego, li poucas vezes a Ilíada e a Odisseia, e ainda por cima em prosa! O pouquinho que li da tradução da Ilíada de Odorico Mendes nem conta. Nunca li as traduções feitas por Carlos Alberto Nunes, que foram recentemente lançadas na coleção Saraiva de Bolso.
Dito isso, o que sei é que João Angelo Oliva Neto é respeitado e conceituado classicista, e Érico Nogueira também. Assim, se Érico explica que a troca de Odisseu por Ulisses é praticamente um crime de lesa-majestade:
Dois exemplos devem bastar; um da Ilíada:e se João Oliva comenta:
"Idomeneu, o fortíssimo Ajaz. Ulisses, porventura";
da Odisseia o outro:
"Palas a todos contava do divo Ulisses os trabalhos";
e em ambos o torpe assassinato de Odisseu e do ritmo dactílico, e versos antes perfeitos agora de pé quebrado.
Não bastasse o "Ulisses" fora do ritmo, a Odisséia de bolso, a despeito de três preparadores de originais, manteve erro de efeito semelhante que a 6a edição da Ediouro INSERIU na sua própria e melhor edição anterior.[...] no verso 38 lê-se:eu acredito. E não só acredito, como fico encantada em saber que temos tão bons classicistas, tão bons conhecedores de Homero e admiradores da obra de Carlos Alberto Nunes, capazes de alertar a nós leitores.
"do próprio Atrida se uniu imolando-o no dia da volta",
em que os acentos recaem em prÓ, trI, nIU, lAN, dI, e vOL
ou seja, 2a, 4a, 7a, 10a, 13a, e 16a como deve ser para manter-se o andamento datílico.
Pois bem, a edição de 2004, já em formato maior, e esta atual trazem "Átrida", proparoxítono, contra a forma que Carlos Alberto Nunes escolheu, que, inclusive, é a correta, abonada pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa da Academia de Ciências de Lisboa,
Outra coisa que eu sei também é que um dos direitos morais do autor da tradução é o direito à integridade de sua obra de tradução. Diz lá na lei 9610/98:
Capítulo IIJuntando a com b, mesmo em minha mais abissal ignorância do grego, de Homero, da tradução de Carlos Alberto Nunes e das técnicas de versificação, parece-me que alterar um determinado ritmo e quebrar o pé de um verso não são coisa pouca e prejudicam, sim senhor, a integridade da obra.
Dos Direitos Morais do Autor
Art. 24. São direitos morais do autor:
[...]
IV – o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la [...]
Então o que concluo é que a Saraiva (ou quem lhe licenciou a tradução) fez mal, errou, cometeu uma infração da lei 9610/98 ao modificar a tradução de Carlos Alberto Nunes e ao violar seu direito moral à integridade da obra.
Eu, se fosse da área ou se os direitos de Carlos Alberto Nunes estivessem sob minha guarda, recorreria aos meios legais para proteger a obra contra essas mutilações editoriais alopradas.
Deixo humildemente minha solidariedade aos lesados por essa violação dos direitos morais de Carlos Alberto Nunes: na verdade, incluo-me entre eles, como leitora.
O caso está no blog de Érico Nogueira, Ars Poetica, aqui . Agradeço o toque de Luiz de Carvalho.
.
Published on September 19, 2011 19:30
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