O samba, o prazer e a obsessão de um escritor

(Entrevista publicada pelo Diário do Nordeste em 22/01/2016)
Depois de biografar Getúlio Vargas, a cantora Maysa e o Padre Cícero, o cearense prepara dois livros sobre o gênero e um acerca da porção brasileira na origem de Nova York
Seu novo projeto, sobre o samba, já tem título?
Os dois volumes ainda não têm título definido. Tenho algumas ideias iniciais, mas ainda irei discuti-las com a editora. Sempre gosto de ouvir a opinião dos editores na hora de decidir isso. A única certeza é que pretendo incluir a expressão “biografia do samba” no subtítulo. Será uma forma de alertar o leitor mais desavisado de que não se tratará de uma obra técnica sobre música, mas de um trabalho biográfico, valorizando as trajetórias de vida e os bastidores da carreira artística dos personagens.
O último "Getúlio" saiu em 2014 e, no fim desse ano, você já tem um novo livro de 500 páginas. Essa pesquisa andou mais rápida do que aquela?
O terceiro volume de “Getúlio” saiu em agosto de 2014, o que significa que entreguei os originais à editora muito tempo antes disso, ainda nos primeiros meses daquele ano. De lá para cá, fazendo as contas, já se vão dois anos. E emendei, como venho fazendo desde “Castelo”, um trabalho atrás do outro. É um vício, quase uma obsessão minha, muito mais do que um simples ofício. Ainda tenho mais algum tempo de pesquisa e redação pela frente, para que o primeiro volume possa sair no finalzinho deste ano, 2016. Serão, então, quase três anos de trabalho, apenas para o primeiro volume. Considero esse um tempo razoável. O segundo tomo ainda não tem data exata de publicação. Mas, por certo, “biografar” o samba me tomará pelo menos cerca de cinco anos. Para efeitos de comparação, biografei Getúlio em cinco anos e meio.
Você voltou a trabalhar numa história com mais de um volume. O que determinou o ponto de corte nessa história?
A ideia original era escrever um único volume. Mas a quantidade de material que fui levantando durante a pesquisa se mostrou tão colossal que isso provocou a alteração dos planos iniciais. Percebi que não daria para contar tantas histórias em 400, 500 páginas. Marquei então uma reunião com os editores, com o objetivo de tentar convencê-los a publicar a obra em dois volumes. Falei-lhes da montanha de coisas que tinha nas mãos e, antes mesmo que eu sugerisse algo nesse sentido, o Luiz Schwarcz perguntou-me, à queima-roupa: “Quer fazer em dois volumes?”. Bingo! Trabalhar com um editor arrojado e sensível, que às vezes parece ler seus pensamentos, faz toda a diferença.
Você se notabilizou como autor ao contar história de figuras extraordinárias, que ajudam a compreender um (ou vários) momento(s) histórico(s). Nesse projeto, biografa um "gênero". E mais: um gênero que raízes em diversos lugares e se desenvolve de forma descentralizada. Não pareceu um passo grande demais? Como dar conta de tanta informação?
Considero “biografar” o samba um desafio tão grande — ou, quem sabe, ainda maior — do que biografar Getúlio Vargas. Mas nunca tive receio de encarar desafios em minha carreira como jornalista e autor de livros. Quando maior me parece a empreitada, mas me animo e me mobilizo para enfrentá-la. A única forma de combater o frio na espinha é partir para o mãos à obra.
Ter escrito sobre uma artista do meio musical, como Maysa, ajudou na produção deste novo projeto?
É claro que ter escrito sobre Maysa me aproximou, profissionalmente, de muita gente da área. Mas o samba — especialmente a música dos grandes sambistas, como Noel Rosa, Cartola, Nelson Cavaquinho, Candeia, entre tantos outros — sempre esteve em meu universo imediato de interesse. É o tipo de música que mais escuto em meus momentos de lazer. Desse modo, pesquisar e escrever sobre o samba está me dando a bela oportunidade de, mais uma vez, unir trabalho e prazer.
Quando sai a reedição de "O Inimigo do Rei”?
A Companhia da Letras está estudando o cronograma de relançamento dos meus livros anteriores, publicados originalmente por outras editoras. Todos os contratos de republicação já foram assinados. Maysa abrirá a fila. Estou relendo os originais de “Só numa multidão de amores” e tenho o compromisso de liberá-los para a editora logo depois do Carnaval. Assim, a biografia da cantora deve ser relançada no início do próximo semestre. Depois, na sequência, virão “O inimigo do Rei” e “Castello”. É preciso uma certa parcimônia, dar algum intervalo de tempo entre uma republicação e outra, por circunstâncias próprias do mercado, senão vira uma overdose editorial.
O livro sobre os judeus que passam pelo Brasil e ajudam a fundar NY ainda está em seus planos?
Sem dúvida. Este é um projeto de longo prazo, que ainda envolverá muitas viagens internacionais e exigirá minha fixação, por uns tempos, em Nova York. Estou juntando material há muitos anos sobre o assunto. Fui convidado, pelo segundo ano consecutivo, a passar o verão norte-americano como writer-in-residence no Middlebury College, quando então aproveitarei para visitar bibliotecas e arquivos daquele país. O segredo é jamais ficar parado. Não passar um único dia sem pensar no livro que você está escrevendo e traçar planos para os que ainda escreverá.
Published on January 22, 2016 04:44
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