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A mente seleciona, exagera, trai, os acontecimentos se esfumam, as pessoas esquecem e no final fica apenas o trajeto da alma, esses raros momentos de revelação do espírito. Não interessa o que aconteceu, e sim as cicatrizes que me marcam e diferenciam.
Ao me deixar na festa deu um conselho inesquecível, que apliquei nos momentos cruciais de minha vida: pense que os outros têm mais medo que você.
Cada noite os sonhos me esperam agachados debaixo da cama, com sua carga de visões terríveis, campanários, sangue, lamentos lúgubres, mas também com uma colheita sempre fresca de imagens furtivas e felizes.
Na dimensão do cosmo e no curso da história, somos insignificantes, depois de nossa morte tudo continua igual, como se nunca tivéssemos existido, mas na medida de nossa precária humanidade, Paula, você é mais importante para mim do que a minha própria vida e soma de todas as outras vidas. Cada dia morrem setenta milhões de pessoas e nascem mais ainda, no entanto só você nasceu, só você pode morrer.
O que há do outro lado da vida? Apenas uma noite silenciosa e solidão? O que sobra quando não existem desejos, recordações e esperanças? O que há na morte? Se eu pudesse permanecer imóvel, sem falar nem pensar, sem suplicar, chorar, lembrar ou esperar, se pudesse submergir no mais completo silêncio, talvez então eu conseguisse ouvir você, minha filha.
a dor é inevitável na nossa passagem pela vida, mas dizem que pode ser quase sempre suportável se não houver resistência e se não acrescentarmos a ela o medo e a angústia.
Tenho que fazer mil perguntas para ela, mas receio que quando consiga me responder já tenha esquecido como era o céu... Silêncio antes de nascer, silêncio depois da morte, a vida é puro ruído entre dois silêncios insondáveis.
O problema da ficção é que ela precisa ser verossímil, enquanto a realidade poucas vezes consegue sê-lo.
O que aconteceu conosco? Talvez a gente esteja no mundo para procurar o amor, encontrá-lo e perdê-lo, muitas e muitas vezes. Nascemos de novo a cada amor, e a cada amor que termina, abre-se uma ferida. Estou cheia de orgulhosas cicatrizes.

