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Sofria de medo, uma doença dramática em quem tem imaginação.
É bom que se diga, ela é uma profissional reconhecida por sua inteligência afiada. Em público, ninguém desconfia do tamanho a que se reduz diante dele. Vedina poderia viver sem os trocados que Abel leva para casa… Mas ela acredita que um dia poderá penetrá-lo. Acredita estupidamente demais. Abel é uma rocha.
Há tanto tempo Vedina queria ter ido embora. Quem a impediu? Por que não foi? Por que se pôs assim na rota do imperdoável? Não dependia financeiramente de Abel, mas ficou. Ficou porque estava presa à inabalável convicção de poder penetrar na rocha! Talvez no miolo da rocha houvesse uma carne terna. E ela queria essa ternura mais do que tudo. Sabia Deus por que acreditava nisso. Sabe Deus por que acreditamos no que inventamos. Vedina fantasiou que no miolo da rocha havia fragilidade o suficiente para que Abel se entregasse às mãos cuidadosas. Tinha mãos disponíveis quando se casou com ele. E
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E uma mulher não deve se enganar quanto a isso: se é preciso força para tocar no amor de um homem, melhor deixá-lo. Mil vezes: melhor deixá-lo.
Podiam se distanciar, mas nunca tirar deles o que foram.
O mar é esse plano-fronteira entre o voo e o mergulho. Entre o revelado e o oculto. Entre a coragem e o medo.
Mas, no coração, tudo que vaza é vermelho. A omissão sangra o amor a conta-gotas e o perde um pouco a cada dia. Pode durar anos, como durou, até que o silêncio irrompa com a força do tempo.
Coisas ouvidas na fermentação dos anos. Nas famílias, desiste-se muito das palavras para evitar exílios e, assim, nascem desertos.

