O Chamado do Falcão (O Sonhador, #1)

by Maggie Stiefvater

gosto. Os irmãos Lynch, os órfãos Lynch. Todos tinham sido feitos por sonhos, de uma forma ou de outra. Eram lindos pra diabo, até o último deles.

Os sonhos não são a base mais segura sobre a qual se pode construir uma vida.

Tédio e segredos: uma combinação explosiva. Algo iria queimar.

Ele amava a Barns, estava entediado com a Barns, queria ir embora, queria ficar. Na Barns, Ronan estava a dois segundos de suas lembranças de infância e a duas horas de carro de seus irmãos. Ele sabia que poderia sonhar com segurança ali, cercado por nada além de outros sonhos. Lá ele sabia quem ele era. Quem seria Ronan Lynch em Cambridge? Ele não fazia ideia.

Adam. Adam Parrish era o destino daquela viagem. Existe alguma versão sua que poderia vir comigo para Cambridge?, Adam perguntou no dia em que partiu.

Adam. Ronan sentia falta dele como se tivesse perdido um pulmão.

Mágica. É uma palavra barata agora. Coloque uma moeda de vinte e cinco centavos na máquina e ganhe um truque de mágica para você e seus amigos. A maioria das pessoas nem se lembra o que é. Não é cortar uma pessoa ao meio e tirar um coelho da cartola. Não é tirar uma carta da manga. Não é: Você está prestando bem atenção? Se você já olhou para uma chama e não conseguiu desviar o olhar, é isso. Se já olhou para as montanhas e descobriu que não estava respirando, é isso. Se já olhou para a lua e sentiu lágrimas nos olhos, é isso. É o que há entre as estrelas, o espaço entre as raízes, que faz a eletricidade acender de manhã.

Você é feito de sonhos e este mundo não é para você.

Ronan não sabia nada sobre quem era Adam na época e, se possível, sabia ainda menos sobre quem ele mesmo era, mas, conforme se afastavam do menino com a bicicleta, foi assim que começou: Ronan recostando-se em seu assento e fechando os olhos e enviando uma oração simples, inexplicável e desesperada a Deus: Por favor.

Eles sabiam quem eram. Adam, um estudioso. Ronan, um sonhador.

As costelas de Adam se encaixaram em suas costelas da mesma forma que antes. Seus braços envolviam o corpo estreito de Adam da mesma forma que tinham envolvido antes. Sua mão ainda pressionava a nuca de Ronan como sempre quando eles se abraçavam. Sua voz estava sem o sotaque, mas agora parecia a dele de sempre quando murmurou contra a pele de Ronan: — Você tem cheiro de lar.

Amigos eram um negócio sério para Ronan Lynch. Ele demorava a adquiri-los e demorava mais ainda para perdê-los. A lista era pequena, porque os segredos complicavam os relacionamentos e porque os amigos, para Ronan, consumiam muito tempo. Eles o consumiam por completo. Você não poderia, pensava Ronan, se entregar totalmente a muitas pessoas, ou não sobraria nada.

Eu quero muito isso — disse Adam. Essa frase, Ronan pensou, foi o suficiente para desfazer todos os maus sentimentos que ele pudesse ter tido ao conhecer os amigos de Adam em Harvard, todos os maus sentimentos por parecer um perdedor, todos os maus sentimentos por se sentir preso, todos os maus sentimentos, desde sempre. Adam Parrish o queria, e ele queria Adam Parrish.

Era isso que significava ser Ronan Lynch. Sonhar e tornar realidade.

Um sonhador, um sonho e Declan: esses eram os irmãos Lynch.

Porque Declan só conseguia lidar com um irmão em crise. Porque ele era tão treinado em segredos que tudo era um segredo até que fosse provado o contrário ou roubado dele.

No fim das contas, essa era a diferença entre Hennessy e Jordan. Enquanto Hennessy se imaginava jogando-se de um telhado e caindo, Jordan se imaginava jogando-se de um telhado e voando.

A maioria dos homens não vai à missa todos os domingos e a maioria dos homens não se apaixona por outros homens. E ninguém dá vida aos sonhos. Ninguém dá vida aos sonhos. Ninguém dá vida aos sonhos. Essas eram as características que faziam de Ronan Lynch ele mesmo, mas ele não havia percebido até conhecer o resto do mundo.

A arte era uma parte sólida de Jordan. Não arte como pegue no pincel e deixe a alma vazar através dos pigmentos, mas arte como objeto no porta-malas do carro, arte como prova física de identidade cultural, arte como mercadoria. Jordan tinha cicatrizes, manchas e bolhas por causa da arte.

Lynch. Ora, esse nome era coincidência. Ela gostou; parecia significar que as coisas iam dar certo.

Como Hennessy, Jordan tentava quase tudo, mas no final, Jordan sempre poderia jogar fora o que era ruim para ela antes que a matasse. Exceto Hennessy. Hennessy era o hábito mais mortal que qualquer uma delas tinha, e nenhuma delas poderia abandoná-la.

Pertencer a mais de um mundo significa que você acaba não pertencendo a nenhum deles.

Eles se abraçaram de novo, alegres, valsando sem jeito na cozinha, e se beijaram, alegres, valsando mais.

Parecia incorreto que a visita de Adam tivesse piorado sua solidão, mas Ronan sentia muita falta dele, mesmo olhando diretamente para ele.

Havia apenas o silêncio que vinha depois de todas essas coisas. Havia apenas o silêncio que vinha quando você era o único que restava. Apenas o silêncio que vinha quando você era algo estranho o suficiente para sobreviver às coisas que tinham matado ou expulsado todas as pessoas que você amava.

Jordan teve apenas um pensamento: Ninguém sabia que eu existia. Toda a sua vida passada como Jordan Hennessy, uma existência compartilhada com seis a dez outras entidades a qualquer momento. Mesmo rosto, mesmo sorriso, mesma carteira de motorista, mesma carreira, mesmos namorados, mesmas namoradas. Um fluxograma onde as únicas opções disponíveis eram aquelas que ela poderia coletar para as outras garotas. Por que você só pinta o que outras pessoas já pintaram?, Declan Lynch havia perguntado. Porque seu pincel já tinha vindo pré-carregado com a paleta de outra pessoa.

Ela havia pintado centenas de quadros com habilidade surpreendente e ninguém saberia que ela existira. Ela só tinha vivido a vida de outra pessoa. Ninguém sabia que eu existia.

Jordan não sabia como Hennessy se sentia em relação àquilo, porque não olhou no espelho quando a deixou para trás. Pela primeira vez, Jordan teve certeza de que ela e Hennessy estavam vivendo duas vidas diferentes.

Era uma sensação estranha ser estudado depois de anos tentando evitar que os outros o estudassem.

— Todo mundo pensa que seu mundo é o único que existe.

E o que há aí é perigoso. — Coisas perigosas conseguem proteger a si mesmas — disse Ronan. Ela podia ver que ele não julgava Lindenmere por isso. Ronan Lynch também podia ser perigoso.