Um Sopro de Vida
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Read between May 14 - May 22, 2025
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Se parar essa fonte que em cada um de nós existe é horrível. A fonte é de mistérios, mistérios escondidos e se parar é porque vem a morte.
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Cada um de nós é o segredo da vida e um é o outro e outro é um.
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A vida real é um sonho, só que de olhos abertos (que veem tudo destorcido). A vida real entra em nós em câmara lenta, inclusive o raciocínio o mais rigoroso – é sonho.
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O quotidiano contém em si o abuso do quotidiano: o quotidiano tem a tragédia do tédio da repetição. Mas há uma escapatória: é que a grande realidade é fora de série, como um sonho nas entranhas do dia.
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Que estou eu dizendo! É ou não é verdade. Eu minto tanto que escrevo. Eu minto tanto que vivo. Eu minto tanto que ando à procura da verdade de mim. Tu serás a minha verdade. Quero a veraz semente de ti. Se eu conseguir atravessar o denso bosque de enganos. Sou um quiproquó em labirinto feito de fios sangrentos de nervos.
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Descobri que eu preciso não saber o que penso – se eu ficar consciente do que penso, passo a não poder mais pensar, passo a só me ver pensar. Quando digo “pensar” refiro-me ao modo como sonho as palavras. Mas pensamento tem que ser um sentir.
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Não existe realidade em si mesma. O que há é ver a verdade através do sonho. A vida real é apenas simbólica: ela se refere a alguma outra coisa.
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Para começo de conversa, afianço que só se vive, vida mesmo, quando se aprende que até a mentira é verdade.
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A realidade não me surpreende. Mas não é verdade; de repente tenho uma tal fome de “coisa acontecer mesmo” que mordo num grito a realidade com os dentes dilacerantes. E depois suspiro sobre a presa cuja carne comi. E por muito tempo, de novo, prescindo da realidade real e me aconchego em viver da imaginação.
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A coisa é a materialização da aérea energia. Eu sou um objeto que o tempo e a energia reuniram no espaço. As leis da física regem meu espírito e reúnem em bloco visível o meu corpo de carne.
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Quando eu vejo, a coisa passa a existir. Eu vejo a coisa na coisa. Transmutação. Estou esculpindo com os olhos o que vejo. A coisa propriamente dita é imaterial. O que se chama de “coisa” é a condensação sólida e visível de uma parte de sua aura. A aura da coisa é diferente da aura da pessoa. A aura desta flui e reflui, se omite e se apresenta, se adoça ou se encoleriza em púrpura, explode e se implode. Enquanto a aura da coisa é igual a si mesma o tempo todo. A aura qualifica as coisas. E a nós também. E aos animais que ganham um nome de raça e espécie. Mas a minha aura estremece fúlgida ao ...more
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A aura é a seiva da coisa. Emanações fluídicas me cegam ofuscantes a visão. Tremo trêmula. Tremulo tremida. Há algo de esquálido no ar. Aspiro-o sôfrega. Quero impregnar-me toda com as físicas do que existe em matéria.
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Pergunto-te em que reino estiveste de noite. E a resposta é: estive no reino do que é livre, respirei a magna solidão do escuro e debrucei-me à beira da lua. Noite alta fazia tal silêncio. Igual ao silêncio de um objeto pousado em cima de uma mesa: silêncio asséptico de “a coisa”. Também existe grande silêncio no som de uma flauta: esta desenrola lonjuras de espaços ocos de negro silêncio até o fim do tempo.
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Entendo as belas mulheres árabes que têm a sabedoria de esconder nariz e boca com um véu ou um crepe branco. Ou roxo. Assim ficam de fora apenas os olhos que refletem outros objetos. O olhar ganha então um tão terrível mistério que parece um vórtice de abismo. Uso batom escarlate nos meus lábios: isto é a minha provocação. Tenho sobrancelhas que perguntam sem parar mas não insistem, são delicadas.
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Minha estupidez essencial no entanto quer fremir de luz, quer se nimbar de espírito. Minha pesadez precisa da aventura da adivinhação.
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Eu me abri e você de mim nasceu. Um dia eu me abri e você nasceu para você mesmo. Quanto ouro correu. E quanto rico sangue se derramou. Mas valeu a pena: és pérola de meu coração que tem forma de sino de pura prata. Eu me esvaí. E tu nasceste. E me apaguei para que tu tivesses a liberdade de um deus. És pagão mas tens a bênção da mãe.
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Cada minuto que vem é um milagre que não se repete.
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“cristais que se quebram com musical fragor de desastre”.
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Peguei a alegria e fiz dela como cristal brilhíssimo no ar. A alegria é um cristal. Nada precisa ter forma. Mas a coisa precisa estritamente dela para existir.
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Os brilhantes são pequenas alegrias em chuveiro de risos de crianças.
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O homem se senta. Por quê? O sentar-se é algo adquirido lentamente por intermédio do processo através dos milênios? Ou faz parte da natureza humana? Assim como faz parte da natureza do pássaro voar? Deitar-se é diferente: menos os bichos de penas, todo animal se deita.
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Mas uma coisa eu tenho certeza, esse nada é o melhor personagem de um romance. Nesse vácuo do nada inserem-se fatos e coisas.
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Um homem imaginou Deus e fez uma cadeira, nessa cadeira deve estar um pouco da energia desse homem. Tal é o espírito das coisas feitas, coisas vividas.
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Tenho que me querer para dar alguma coisa a mim. Tenho que valer alguma coisa? Oh protegei-me de mim mesma, que me persigo. Valho qualquer coisa em relação aos outros – mas em relação a mim, sou nada.
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Fui trêmula ao encontro de mim – e achei uma tola mulher que se debate dentro das paredes de existir. Rompo as comportas e me crio nova. Aí então eu posso me encontrar com eu, em pé de igualdade.
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Ela vive de soslaio.
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Ela rompeu meu sistema. Ela é minha ancestral e tão pré-história minha que chega a ser inumana, embora escreva com falsa ordem. Ângela é meu afrodisíaco.
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um gosto de voz aguda de lobo desejando a presa, eu! eu que aspiro à grande desordem dos desejos vis e as trevas que me possuem no orgasmo apocalíptico de meu existir.
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Quero abismo para ti e receber-te como uma rainha de Sabá.
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Minha maldade vem do mau acomodamento da alma no corpo. Ela é apertada, falta-lhe espaço interior.
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Refugiei-me na doideira porque a razão não me bastava.
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E do futuro esperaremos conscientes a falta de sentido, uma liberdade no dizer, no sentir Ah...
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O autor que tenha medo da popularidade, senão será derrotado pelo triunfo. Tem uma hora em que se deve tirar retrato de si mesmo. A fome é sempre igual à primeira fome. A carência se renova inteira e vazia.
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O que me sustenta é a necessidade. A necessidade me faz criar um futuro. Porque o desejo é algo primitivo, grave e que impulsiona.
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Pessoa feliz é quem aceitou a morte.
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Assusta-me quando num relance vejo as entranhas do espírito dos outros. Ou quando caio sem querer bem fundo dentro de mim e vejo o abismo interminável da eternidade, abismo através do qual me comunico fantasmagórica com Deus.
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Calar-se é nascer de novo.
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Receba em teus braços o meu pecado de pensar.
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Mas por que esse desejo e fome de prazer? Porque o prazer é o máximo da veracidade de um ser. É a única luta contra a morte.
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Sem falar na teoria da física da antimatéria, tudo tem verso e reverso, tudo tem sim e tem não, tem luz e tem trevas, tem carne e espírito, será nessa antimatéria que cairemos depois de mortos? Como se explica que cada corpo nascido tenha espírito? Acontece sempre o inesperado pois nunca ninguém pôs uma alma na vida que nasce.
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Eu não sei como a semente brota, eu não sei por que este céu azul, eu não sei para que esta minha vida porque tudo isso acontece de um modo que a minha mente humana desconhece. Vivo sem explicação possível. Eu que não tenho sinônimo.
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Eu quero ter acesso a mim mesmo na hora em que eu quiser como quem abre as portas e entra.
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Não quero ser vítima do acaso libertador. Quero eu mesmo ter a chave do mundo e transpô-lo como quem se transpõe da vida para a morte e da morte para a vida.
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O que distrai é o ódio espumante. Ódio seco e fustigador.
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Ângela fala do frêmito de vida, do “aço demasiado agudo da [sua] lâmina de vida”.
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